"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 13 de novembro de 2011

MANIFESTO PELA MORALIDADE E PELA ATUAÇÃO FISCALIZADORA DO CONGRESSO NACIONAL: SALVANDO O BRASIL DA CORRUPÇÃO...

Na construção diuturna da contemporaneidade, a teorização da tripartição dos poderes teve de adaptar Montesquieu às necessidades de cooperação e subsidiariedade, no sentido de um poder auxiliar (suprir) ao outro.

A mutação na tradicional tripartição dos poderes se deu por vários motivos que se foram somando, desde a Revolução Francesa até o século XXI, dentre os quais: (1) a intensificação das relações internacionais no pós-guerra; (2) a relativização do conceito de soberania – que implicou no esvaziamento da ideia de que “quem manda é só o rei (ou o chefe do Executivo)”; (3) a omissão de um poder em exercer os seus encargos constitucionais, com o consequente perigo de paralisação das estruturas modernas e/ou pós-modernas da “polis”; (4) a redução do aparato estatal ocasionada pela readoção, em estilo (neo)liberal, da doutrina do “laisser faire, laisser passer”, fator este detectável após a derrocada do Império Soviético e da “percepção cega” das regras do consenso de Washington; (5) o sucesso obtido pelos Estados que adotaram a forma federal na repartição harmônica de competências; (6) a necessidade premente de implementação de instrumentos de garantia dos direitos humanos positivados pela Constituição e por tratados internacionais. Estes seis fatores, e mais dezenas de outros, mudaram a feição estatal em escala mundial, e isto, evidentemente, influiu nas competências de atuação dos três Poderes clássicos de Montesquieu. A partir de tais mudanças, os três Poderes passaram a ter que agir de modo a subsidiarem-se.

Seguindo algumas das tendências acima descritas e entorpecida pelo sentimento de liberdade alcançado após 21 anos de ditadura militar e pela eleição de Tancredo Neves – e não de José Sarney – , estabeleceu a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, no artigo segundo da atual Constituição brasileira que: “São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

O presente manifesto dirige-se, sobretudo, aos senhores senadores e deputados. “Eles não têm exercido o poder de fiscalização que a Constituição lhes outorgou. Daí o desmando e a corrupção endêmica no governo federal. Entretanto, dispõe também o presente texto – e por reflexo – sobre a atuação dos outros dois poderes e daquele que, na Constituição de 1988, foi erigido à condição de função essencial à justiça, o Ministério Público.

Os fatos que desencadearam a escrita deste manifesto são os que estamos a ver e ler, diariamente, nos noticiários brasileiros, e que dizem respeito à atuação da presidente Dilma Rousseff e de seus ministros “demitidos” (a propósito, Dilma não fez “faxina” alguma pois não exonerou nenhum deles; todos saíram por pressão da imprensa e por arranjos partidários).

As graves denúncias contra o governo do PT, desde os “mensaleiros” da época de Marcos Valério até as ONGs de Orlando Silva, deixam claro que o Parlamento do Brasil (Senado mais Câmara), em vez de “a Casa Democrática de Representação dos Estados Membros da Federação e do Povo Brasileiro”, mostra-se, ao atônito eleitorado nacional, na verdade, como “a incorrigível Casa Demagógica de Legitimação dos Atos Secretos, da Malversação, da Promiscuidade Política e da Falta de Observância do Princípio Constitucional da Moralidade”. Isso significa: o Parlamento do Brasil, que não fiscaliza por não ser isto de seu interesse, é um estímulo sedutor à conduta corrupta de políticos em todos os níveis.

Portanto, a atual crise não é só de essência ética e moral – dos integrantes do Parlamento –, mas ela é institucional, encontrando-se nas entranhas da Câmara e do Senado da República, devendo-se aqui fazer constar, outrossim, que não é somente o Senado e a Câmara Federal que se encontram infectados pelo vírus da malversação e pela prática constante da violação dos ditames constitucionais. Tais anomalias detectam-se também nas Assembleias Legislativas dos Estados e do Distrito Federal e nas Câmaras de Vereadores. Repita-se: os nossos parlamentos não fiscalizam nada!

Os Legislativos do Brasil, que deveriam cumprir as suas funções precípuas de legislar e fiscalizar, têm-se mostrado – malevolamente – à população como os Legislativos que, em verdade: (a) não legislam; (b) não fiscalizam; (c) aceitam ser os vassalos dos Poderes Executivos; (d) submetem-se à pressão externa de lobistas; (e) violam repetidamente os princípios constitucionais da administração pública constantes no artigo 37, quais sejam, os da legalidade, impessoalidade, publicidade, eficiência e sobretudo o princípio da moralidade. Em Legislativos assim, não é de se espantar que a própria presidente da República se sinta imune das acusações que contra seu governo são feitas, passando a esconder-se atrás da certeza da impunidade e de sua “tropa de choque” constituída por políticos e cabos eleitorais hipócritas.

Em contexto como o atual, concluem as brasileiras e os brasileiros que: (i) aqueles que deveriam legislar e fiscalizar estão a fugir de suas responsabilidades; (ii) os que deveriam julgar, estão também a fugir de suas responsabilidades; (iii) e os que deveriam somente governar, imiscuem-se indevidamente nos outros poderes para garantir apoios e arranjos; (iv) e, para completar o quadro, os que deveriam acusar e para isto são pagos, calam-se indevidamente.

No atual instante, os acusados e denunciados devem estar a pensar: “Se contra mim nunca fizeram nada, então continuarão a nada fazer, pois esta tem sido a ordem natural no trato com as oligarquias políticas brasileiras. E se contra mim ainda não fizeram nada, então continuarei a ser corrupto!”.

Passou da hora do Congresso Nacional abrir Comissões Parlamentares de Inquérito, no mínimo cinco, para investigar cada uma das saídas dos ministros que foram substituídos no governo Dilma. Nessas CPIs, cabe também ao Parlamento brasileiro apurar a responsabilidade, por ação ou por omissão, da própria presidente da República, isto porque o Brasil tem adotado tradicionalmente (desde 1889) o sistema presidencialista de governo – no qual o(a) presidente da República é diretamente responsável pelos atos de seus ministros e demais subordinados. Só com sucessivas e/ou concomitantes CPIs o Congresso se colocará nos trilhos daquilo que o mestre lusitano – Jorge Miranda – chama de ética republicana.

Eminentes representantes do povo, a palavra é vossa…

Alexandre Coutinho Pagliarini

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