Mesmo indo dormir com o dia quase amanhecendo
de uma segunda para terça-feira, Marcelo Tas não consegue ficar até muito tarde
na cama e acorda cedo como se tivesse trabalhado em um “horário normal”. Porém,
nas noites de segunda-feira seu expediente na Band avança madrugada adentro. Da
TV, o “CQC” vai para a internet em sua versão 3.0 e Tas, apresentador do
programa, vai junto.
Poderia ser uma terça comum, se na noite
anterior Tas não tivesse respondido ao vivo sobre as polêmicas envolvendo sua
equipe. A primeira "resposta" foi na edição de 23 de abril, mas não parou por
aí. No programa de14 de maio, o apresentador falou novamente sobre os "CQCs".
Crédito:Divulgação/BAND
Oscar Filho, Marcelo Tas e Marco Luque no CQC 3.0 logo após
o programa
“Um trabalho
degradante é de um jornalista [Felipe Andreoli] que faz uma pergunta e leva um
tapa na cara. [...]. Há três semanas outro repórter [Mauricio Meirelles] foi à
coletiva da Hillary Clinton com um pequeno gracejo, uma máscara de carnaval,
[...] e o sindicato de jornalistas de Brasília tentou limitar nossa ação em
eventos oficiais. E agora, um deputado bate no repórter do CQC. Cadê o sindicato
dos jornalistas?”, desabafou - e sem perder o bom humor.
Perguntas sem
resposta
Pouco após o desabafo, Tas chamou reportagem em
que Meirelles tentou questionar o envolvimento de um vereador de Curitiba no
desvio de 35 milhões, favorecimento de licitações, entre outras coisas, mas não
teve a chance. “O cara falou que não ia dar entrevista porque a gente não é
sério. Espera aí, cara pálida, quem é que está brincando com isso aqui tudo?”,
questionava Tas à IMPRENSA na manhã seguinte.
A cena do "cara pálida" ilustra como a Band
apresenta em seu site um dos programas de maior audiência da casa. “De microfone
em punho e munidos de uma cara de pau acima da média os homens e a mulher de
preto têm uma prioridade: perguntar o que ninguém tem coragem.
Crédito:
Integrantes da "mistura explosiva", sem o Ronald Rios, novo
repórter
Com a 5ª temporada no ar, o "CQC" começa a causar certo incômodo, não apenas aos políticos, mas também a alguns jornalistas presentes nas coberturas em que os “homens e mulher de preto” dão o ar da graça.
Em julho de 2008, IMPRENSA dedicou a capa da edição 236 ao programa na reportagem “Barrados no Congresso”.
Na época, a atração foi bastante defendida pelos jornalistas entrevistados. Após quase quatro anos dessa reportagem, retomamos o assunto abordando as recentes polêmicas envolvendo a equipe do programa.
Abaixo, trechos da entrevista com
Marcelo Tas. Leia a reportagem completa na edição de junho (279) de
IMPRENSA.
Crédito:Divulgação/BAND
Marcelo Tas, apresentador da "bagaça", como ele
chama
IMPRENSA – O que
mudou nesses anos? Por que tantas críticas à forma como o "CQC" age?
Marcelo
Tas
Há duas formas de enxergar esses quatro anos. Uma delas, e que considero muito positiva, é que as informações estão mais transparentes e começam a brotar de forma incontrolável. Há muitas denúncias de corrupção porque os caras que detinham o poder de controle têm cada vez mais dificuldade de fazê-lo e a quantidade de coisas que surge agora é assustadora, provoca grande tensão. O outro lado da moeda é que aumentam o interesse e as tentativas de controlar a opinião pública e as informações. Isso é muito grave e temos que estar atentos. O que aconteceu com o rapper Emicida - que fez uma música criticando a ação da polícia e acabou detido - e o clipe do cantor Alexandre Pires - acusado de racismo - são sintomas de pessoas que estão contaminadas com o vírus de voltar para uma época em que tudo era controlado.
Há duas formas de enxergar esses quatro anos. Uma delas, e que considero muito positiva, é que as informações estão mais transparentes e começam a brotar de forma incontrolável. Há muitas denúncias de corrupção porque os caras que detinham o poder de controle têm cada vez mais dificuldade de fazê-lo e a quantidade de coisas que surge agora é assustadora, provoca grande tensão. O outro lado da moeda é que aumentam o interesse e as tentativas de controlar a opinião pública e as informações. Isso é muito grave e temos que estar atentos. O que aconteceu com o rapper Emicida - que fez uma música criticando a ação da polícia e acabou detido - e o clipe do cantor Alexandre Pires - acusado de racismo - são sintomas de pessoas que estão contaminadas com o vírus de voltar para uma época em que tudo era controlado.
IMPRENSA – Como
você recebeu o pedido de “limites” ao "CQC" feito pelo Sindicato dos Jornalistas
Profissionais do Distrito Federal?
O tal sindicato me parece que foi picado pelo
mesmo inseto de “controle”. Querer dizer que a atuação do "CQC" prejudica o
jornalismo é dar um tiro no próprio pé. Os jornalistas, especialmente em
Brasília, tem que prezar pela liberdade de acesso da imprensa.
Surpreendentemente, um sindicato que se diz representante de jornalistas faz
isso. Trabalho na cobertura de Brasília desde 1984, mas nunca enfrentei uma
censura que partisse dos próprios colegas. O que é assustador é que essas
atitudes começam a ser toleradas por todos nós que, em última instância, somos
defensores de uma liberdade que conquistamos. Por vivermos uma realidade
surrealista, de dinheiro desviado, de corrupção, de sujeira, achamos que o mundo
é assim mesmo. Não é. Não podemos acomodar, temos que espernear. É essa
passividade que a gente procura cutucar com humor. Talvez, atrapalhando esse
marasmo, essa passividade, incomodando alguns, a gente traz um tônus novo para o
noticiário.
IMPRENSA – Como é
a relação com outros veículos?
Temos um relacionamento excelente com outros
colegas e veículos. Fomos convidados agora pela Associação Brasileira de
Jornalismo Investigativo (Abraji) para participar de seu sétimo Congresso. Vamos
debater o nosso quadro “Proteste Já”, que tem a equipe do programa com o maior
número de jornalistas, explicar com funciona, como trabalhamos... Porque tem
muita gente que julga de maneira apressada nossa equipe de 40 pessoas, das quais
metade é jornalista, e outros profissionais que fazem a mistura explosiva entre
jornalismo e humor que é a chave do "CQC". É uma forma ousada de trazer notícia.
Assim que fazemos e vamos continuar.
IMPRENSA – Por
que o "CQC" não entra no Senado?
Ontem [14/5], iniciamos uma campanha para
entrar no Senado. Quase 30 senadores já assinaram um pedido para que a
presidência nos autorize. Não nos dão justificativa nenhuma. É uma coisa de
dificuldade de credenciamento, pura e simples. O "CQC" não atua de maneira
truculenta, estamos novamente, democraticamente, questionando porque não
entramos. Teoricamente, a gente não precisa dessas assinaturas porque ali é casa
do povo...
IMPRENSA – Como
jornalista, o que achou da reação da imprensa às polêmicas com o Meirelles e o
Andreoli?
Hoje é o "CQC". Amanhã pode ser qualquer um. É
algo degradante, inadmissível. Eu fiquei chocado com o silêncio. Se todo mundo
falar ‘cada um que se vire’ será um problema. Creio que a gente começa a viver
uma época de muita passividade e desatenção com uma liberdade que foi
conquistada com o esforço de cada um. Há muitas tentativas desajeitadas de
censura. Quando o cara que diz que a gente não é sério, ele se diz sério, mas a
seriedade dele está em nos controlar. É a atitude de quem não tem argumento,
palavra essencial para o que estamos vivendo. É a era do debate. Não basta você
dizer que está correto, tem que provar, argumentar, passar pelo crivo da
democracia e os vários lados da moeda. Todos nós erramos porque é parte da
natureza humana. Você comete um erro, um equívoco, é normal. Quando isso
acontece, nos pronunciamos e reconhecemos o erro. Estamos abertos ao diálogo e a
qualquer tipo de retificação, assim como outros veículos. Por fazer um tipo de
jornalismo que chega no limite, às vezes, a gente erra.
Jéssica Oliveira* e Mariana Rennhard*
* Com supervisão de Vanessa Gonçalves
* Com supervisão de Vanessa Gonçalves
25 de maio de 2012