"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A MÁFIA QUE GOVERNA A RÚSSIA

    
          Internacional - Rússia 
       
GodfatherPutin
Embora o percentual de assassinatos de jornalistas russos seja maior que o de jornalistas ocidentais, um passaporte ocidental nada garante.

O fato de a televisão russa estar nas mãos da KGB e dos jornalistas estarem sendo rotineiramente assassinados (e seus assassinos continuando soltos) é apenas a ponta de um iceberg muito maior de uma Guerra Fria.

 
Na segunda-feira (7/11/2011) eu conversei com Luke Harding, chefe do escritório em Moscou do jornal britânico The Guardian que foi expulso da Rússia em 5 de fevereiro de 2011.
 
“Para você a Rússia está fechada” foi o que ele ouviu quando retornava para Moscou após uma curta viagem à Grã-Bretanha.
O passaporte russo dele foi anulado e ele foi enxotado do país, mesmo sob protesto de seus colegas de profissão e amigos e mesmo ele tendo uma casa em Moscou (que por sinal fora invadida anteriormente pela polícia secreta russa a fim de intimidar Harding e sua família).
 
O Kremlin possui meios especiais de passar recados para os jornalistas que não cooperam: invadem a casa deles, mudam os objetos de lugar, abrem as janelas do décimo andar dos quartos das crianças e, se tudo isso falhar, eles expulsam o crítico indesejado do país.

 
Os efeitos colaterais desse tipo de ação não podem ser ignorados. Mas, segundo Harding, aqueles que dominam a Rússia – os siloviki – não estão muito interessados em ter boas relações com a Grã-Bretanha ou Estados Unidos.
Eles não dão a mínima para a nossa boa opinião. Eles estão mais preocupados em controlar a dissidência; e punir um jornalista britânico negando a ele acesso à Rússia serve de aviso para todos os jornalistas estrangeiros em Moscou. Não critique o Estado russo. Não critique a FSB ou o Presidente Putin.
 
 “Penso ser importante manter a honestidade ao falar sobre o regime de Putin”, explica Harding. O governo russo discorda violentamente.
 
Harding é bravo e, talvez, sortudo. Ele poderia ser raptado e morto, como sua colega Natalya Estemirova (amiga de Anna Politovskaya, uma crítica de Putin que foi morta a tiros em 7 de novembro de 2006, o dia do aniversário de 54 anos de Putin).
Embora o percentual de assassinatos de jornalistas russos seja maior que o de jornalistas ocidentais, um passaporte ocidental nada garante. Paul Klebnikov da revista Forbes morreu após levar quatro tiros em 9 de julho de 2004 em uma rua de Moscou. O editor da Forbes russa, ao expressar sua opinião, disse que o assassinato de Klebnikov estava ligado às “atividades profissionais” do jornalista no país.
 
Luke Harding escreveu um livro sobre suas experiências na Rússia intitulado Mafia State: How one reporter became an enemy of the brutal new Russia.
É o relato de um homem decente que entrou em uma zona política indecente. Harding tentou deixar claro na entrevista a necessidade da distinção entre o caloroso e de bom coração povo russo e os gângsteres no comando do país. “A Rússia não é a nossa inimiga”, disse. Os chefes do Kremlin e seus serviços de segurança são o problema.
Descrevendo a mentalidade de Putin como “empacado na Guerra Fria”, Harding disse que o Estado russo é uma competição caótica de interesses com atitudes soviéticas predominando nos altos níveis. “Eles não gostam dos Estados Unidos”, enfatizou.
 
Há alguma esperança de mudança positiva? Harding acha que não há perspectiva imediata de uma revolução laranja ou coisa do tipo na Rússia. “Talvez em quatro anos, ou dez”, explicou. Parece haver pouca dúvida de que Putin será eleito presidente no próximo ano [NT: Este artigo foi escrito em 2011].
 
Perguntei a Harding acerca da declaração do ex-presidente ucraniano Leonid Kravchuk sobre Putin estar “um escalão abaixo” dos verdadeiros governantes da Rússia. Harding descartou a ideia, dizendo que claramente era Putin quem estava no comando; embora em outra ocasião Harding tenha admitido que o sistema russo seja nebuloso. Em seu livro ele escreveu: “Em uma cidade inclinada à rumores e teorias da conspiração, é razoável dizer que durante o período de Medvedev poucas pessoas em Moscou realmente sabiam o que se passava no Kremlin. Mesmo o governo russo parece estar afundado na escuridão”.
 
Não podemos esquecer que Harding está escrevendo sobre um país que tem milhares de ogivas nucleares posicionadas estrategicamente, incluindo o ICBM mais avançado do planeta, o SS-27. O fato de a televisão russa estar nas mãos da KGB e dos jornalistas estarem sendo rotineiramente assassinados (e seus assassinos continuando soltos) é apenas a ponta de um iceberg muito maior de uma Guerra Fria.
 
O frio, por assim dizer, continua. Se a “nova” Rússia pode ser caracterizada como um regime de assassinato e censura doméstica, há alguma campanha russa de espionagem e subversão se propagando nos países estrangeiros?
 
Perguntei para Harding sobre o ex-agente da KGB Alexander Lebedev, um bilionário russo que atualmente é dono de dois jornais britânicos. “Ele não é o típico oligarca russo”, respondeu Harding, que descreveu Lebedev como “charmoso”, culto e elegante. “Como você se sente com um ex-agente da KGB sendo dono de dois jornais britânicos?”, perguntei. Embora Harding pessoalmente goste de Lebedev, ele não está completamente à vontade com a posição de Lebedev.
 
Estaria Lebedev usando seus jornais como instrumento de ocultação das notícias na Inglaterra? Supostamente Lebedev não interfere na política editorial, “Mas seus jornais esqueceram de analisar meu livro”, admite rindo Harding. Seria esse um inocente equívoco? Perguntei à Harding porque Lebedev não lida com o campeão mundial de xadrez e crítico de Putin, Garry Kasparov; ele admitiu que provavelmente Lebedev fosse um agente do Kremlin.
 
Então o que mudou na Rússia desde a queda da União Soviética? O rótulo comunista foi removido e a doutrinação ideológica não acontece mais. Mesmo assim o instrumento da ditadura continua com uma mentalidade soviética e um vasto arsenal nuclear; opressão e censura em casa, subversão no resto do mundo.
 
 Escrito por Jeffrey Nyquist
 
Publicado no FinancialSense.com

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