"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

NOVO DICIONÁRIO REVOLUCIONÁRIO - I

    
          Artigos - Movimento Revolucionário 
O envenenamento da língua produziu não apenas mentes distorcidas, mas também distorções morais e afetivas, pois atingiu a vida pública e a privada, a política, a justiça, a economia, a arte e atinge escolas elementares e até jardins da infância.

“A língua conduz o meu sentimento, dirige a minha mente de forma tão mais natural quanto mais inconscientemente eu me entregar a ela.O que acontece se a língua culta tiver sido constituída ou for portadora de elementos venenosos? Palavras podem ser como minúsculas doses de arsênico: são engolidas de maneira despercebida e aparentam ser inofensivas. Passado um tempo, o efeito do veneno se faz notar.”
Victor Klemperer - Lingua Tertii Imperii (LTI) – A Linguagem do III Reich

Klemperer era um filólogo judeu convertido ao luteranismo que, casado com uma ‘ariana’ escapou do Holocausto. Viveu em Dresden e escreveu um extenso diário dos dias de guerra. No pós-guerra permaneceu na zona de ocupação soviética, lecionando na Universidade de Dresden. Seu livro ‘LTI: Notizbuch eines Philologen ‘[[i]] é precioso para todos quantos se interessam pelas perversões revolucionárias de qualquer ideologia.

Sobre a linguagem, dizia:


Se puder se expressar com liberdade, qualquer língua consegue dar conta de todos os anseios humanos. As palavras se prestam à razão e ao sentimento, são comunicação, diálogo e monólogo, oração e súplica, ordem e invocação. A linguagem do III Reich só se prestava à invocação. (...) Nela tudo é discurso, arenga, alocução, invocação, incitamento à ação. O estilo é vociferante: quem berra mais alto, ganha. Era o estilo do Ministro da Propaganda (e do próprio Führer).

Desde os últimos estertores do ciclo de governos militares contra-revolucionários iniciou-se no Brasil um novo ciclo revolucionário que visa estabelecer aqui um estado totalitário onipotente e onipresente. Uma das principais áreas de ação foi envenenar lentamente a linguagem, a moral e os costumes da juventude. Deram por perdido os de meia idade e mais velhos.
O período que vai de 1985 a 1994, escassos nova anos, pode ser comparado, modus in rebus, com a República de Weimar sem a I Guerra Mundial, mas após um período de intensas ações revolucionárias no campo e nas cidades.
Com certa licença pode-se repetir a afirmação de Klemperer de que a República (democrática) liberou de forma suicida a palavra escrita e falada.

Os revolucionários apareceram em todo esplendor de seu cinismo, hipocrisia e despudor. Diziam que queriam a democracia e respeitavam a Constituição, enquanto atacavam as instituições e se lançaram furiosamente contra tudo que não coubesse em sua ideologia pseudo-democrática, satirizando tudo em sermões onde imperava o ‘você não está pensando direito, junte-se a nós para conhecer a verdade’.
Não vou comentar a já tão discutida novilíngua de Orwell, ou o politicamente correto. Abordarei a perversão de expressões já usadas classicamente.
O envenenamento da língua produziu não apenas mentes distorcidas, mas também distorções morais e afetivas, pois atingiu a vida pública e a privada, a política, a justiça, a economia, a arte e atinge escolas elementares e até jardins da infância.

1. Primeiramente vejamos a palavra ditadura. Quando a expressão é usada, as pessoas, tal qual cães de Pavlov, começam a salivar ódio puro! E isto uma maioria que nem era nascida em 1964 e não tem nenhuma idéia do que realmente se passou.
Ela funciona como um mero desencadeador de emoções e age subliminarmente: todos sabem, emocionalmente, o que ela quer dizer, mas racionalmente não são capazes de elaborar um conceito minimamente razoável e muito menos o conhecimento da história.
Imediatamente relembram o que lhes foi implantado como um chip mental que a liga com outras palavras como militar, tortura, torturadores, opressão, censura, etc.

2. Fanático, fanatismo: expressões unicamente utilizadas para se referir a cristãos, principalmente católicos, geralmente acompanhada de “intolerante” ou “intolerância”. Algumas vezes também usadas como sinônimo de fundamentalismo.
Se uma pessoa vai à missa ou ao culto e rege sua vida pelos preceitos dos Evangelhos, não aceitando o aborto nem a eutanásia e/ou a união gay nem a adoção de crianças pelos ‘casais’ gays, é intolerante, fanático, fundamentalista e extremista.

3. Extremista: termo antes importante para diferenciar de moderados de qualquer ideologia, passou a ser usado unicamente para quem defende o conservadorismo moral e o liberalismo econômico. É geralmente usado com o adjetivo de direita, ou direitista, jamais um comunista que apoiou os crimes de Stalin é considerado extremista.

4. Histórico: esta é uma palavra que sofreu as maiores distorções! Qualquer insignificância ou besteira que sirva aos propósitos revolucionários, qualquer discurso dos poderosos é histórico. Qualquer encontro de Lula ou Dilma com Chávez ou Kirchner é histórico, mesmo que apenas tomem umas e outras.
A distorção foi tão longe que até mesmo para os democratas de verdade, conservadores e liberais, o julgamento do Mensalão foi “histórico”. Ora, para Calígula, qualquer defecada de Incitatus, seu cavalo nomeado senador, era histórica! Aliás, no nosso Senado, haja Incitatus!

(Continua)

14 de dezembro de 2012
Heitor De Paola

Nota:

[i] Publicado em português pela editora Contraponto, 2009:Rio, em Tradução de Miriam Bettina Paulina Oelsner, do Laboratório de Estudos sobre a Intolerância – Módulo Holocausto, USP


Para o jornal Inconfidência, de Belo Horizonte.

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