"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A CAPIVARA E OS JUÍZES

BRASÍLIA - Talvez a capivara perdida e depois capturada perto do Supremo Tribunal Federal tenha sido um sinal para as Excelências ali dentro, sede do Poder mais opaco da República.

Desde a volta do país à democracia, a transparência foi avançando. Hoje, quase tudo se sabe sobre deputados e senadores.
De passagens aéreas a salários e vantagens obtidas no dia a dia. No Poder Executivo, o Portal da Transparência mostra uma vasta lista de despesas de cada órgão público.

O mesmo não se pode afirmar do Poder Judiciário. Nesta semana, as coisas pioraram. O presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, limitou o acesso - já pequeno - a processos disciplinares existentes contra seus pares.

Por um curto período foi possível conhecer as iniciais dos nomes de juízes processados. Agora, eliminou-se essa brecha. Houve uma justificativa legal, é claro. Um artigo da Lei Orgânica da Magistratura Nacional determina que "o processo e o julgamento das representações e reclamações [contra juízes] serão sigilosos, para resguardar a dignidade do magistrado".

Na categoria de iniquidade legal, esse artigo concorre como um dos mais indignos. A lei dos juízes está para ser reformada há anos, mas o Poder Judiciário não se move. O próprio Peluso, ao assumir, comprometeu-se a tratar do tema com vigor. Até agora, nada.

Qualquer cidadão em litígio na Justiça tem exposta a sua "capivara", jargão policial para folha corrida. Deputados, senadores e ministros são escrutinados todos os dias, com suas fotos e declarações publicadas na mídia.

A proteção indevida que os juízes se autoconcedem não serve só para proteger os incompetentes e os corruptos. Quando essa minoria fica escondida, todos têm a imagem prejudicada. Até a capivara que apareceu ontem no STF sabe disso.

Fernando Rodrigues
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/11/2011

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