"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 4 de novembro de 2012

CELSO DANIEL. CORRUPÇÃO, SEQUESTRO, TORTURA E MORTE.

CELSO DANIEL

09 maio 2012

Polícia não quis investigar a fundo morte de Celso Daniel, diz promotor do caso

09/05/20120

Guilherme Balza, do UOL, em São Paulo

O júri de cinco acusados pela morte de Celso Daniel, um dos crimes mais misteriosos da história recente do país, será realizado nesta quinta-feira (10), no Fórum de Itapecerica da Serra (Grande São Paulo). Até agora, o único condenado pela morte do ex-prefeito de Santo André foi Marcos Bispo dos Santos, que pegou 18 anos de prisão após condenação do júri em novembro de 2010.

Agora, serão julgados Elcyd Oliveira Brito, Itamar Messias da Silva Santos, Ivan Rodrigues da Silva, José Edison da Silva e Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira. Todos faziam parte de uma quadrilha da favela Pantanal, na divisa da capital com Diadema. Eles são acusados de homicídio duplamente qualificado e podem ser condenados de 12 a 30 anos de prisão.

O inquérito policial que levou os acusados ao banco dos réus concluiu que a morte do ex-prefeito de Santo André (SP), em 18 de janeiro de 2002, no município de Juquitiba (também na Grande SP) foi um crime comum, resultado de um sequestro mal executado pela quadrilha.

O promotor de Justiça Roberto Wider Filho, que investigou a morte de Daniel, contesta a versão da polícia e afirma que o assassinato do ex-prefeito foi encomendado por uma quadrilha responsável por um esquema de corrupção na Prefeitura de Santo André, cujo objetivo era levantar recursos para financiar campanhas eleitorais do PT (Partido dos Trabalhadores). Para ele, a investigação policial foi “incompleta” e deixou de apurar as “verdadeiras razões da morte”.

QUEM FOI CELSO DANIEL

Celso Daniel nasceu em 16 de abril de 1951 em Santo André. Foi professor de economia e ciências sociais da FGV e PUC e participou da fundação do PT. Foi eleito prefeito de Santo André em 1989, 1997 e 2000, um ano antes de sua morte.
Em 1994, elegeu-se deputado federal com 97 mil votos. Pouco antes de morrer, havia sido escolhido para coordenar a campanha Lula à Presidência. Era cotado para ser um dos ministros do primeiro escalão do governo de Lula.

O Gaeco (Grupo de Atenção Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público do ABC sustenta que um dos mandantes do crime é o empresário Sérgio Gomes da Silva, o “Sombra”, amigo de Celso Daniel e uma das figuras mais importantes dentro da quadrilha de Santo André –ele deverá ir a júri popular ainda neste ano em um processo diferente, já que responderá por homicídio triplamente qualificado.

Segundo o MP, o grupo arrecadava dinheiro por meio da extorsão de empresas de transporte, coleta de lixo e obras públicas, que eram coagidas a pagar uma “caixinha” todo mês. Só com as empresas de ônibus a quadrilha estaria levantando R$ 100 mil por mês. Mas, a galinha dos ovos de ouro do esquema, diz Wider Filho, eram as empresas que operavam radares de trânsito, com as quais os corruptores arrecadavam até R$ 50 milhões por mês.

Para o Gaeco, a morte do ex-prefeito foi resultado de um “desarranjo” no interior da quadrilha: a tese da promotoria é que Daniel sabia e participava do esquema de corrupção em Santo André, mas decidiu impor limites ao perceber que os desvios tinham também como finalidade engordar as contas pessoais, e não só as do partido.

Por participação no esquema, o MP denunciou, além de Sombra, o então secretário de Serviços Municipais Klinger Luiz de Oliveira, os empresários Ronan Maria Pinto, Luiz Marcondes Júnior e Humberto Tarcísio de Castro. Todos foram absolvidos em segunda instância pelo TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) por falta de provas.

José Dirceu, na época presidente do PT, e Gilberto Carvalho, então secretário de governo em Santo André e braço direito de Celso Daniel, hoje secretário-geral da Presidência da República, não foram investigados pelo MP por força de uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de 2004, na qual o ex-ministro Nelson Jobim considerou que a promotoria não pode realizar investigações criminais.

Em entrevista ao UOL, Wider Filho falou sobre as investigações da morte de Celso Daniel e conta como funcionava o suposto esquema de corrupção em Santo André.

ENTENDA O CASO

Celso Daniel foi encontrado morto em 20 de janeiro de 2002, em uma estrada de terra de Juquitiba, após receber 11 tiros. A morte ocorreu dois dias depois de ter sido sequestrado no trajeto entre uma churrascaria na capital e Santo André.

No momento do sequestro, o ex-prefeito estava dentro de seu carro, que era blindado, acompanhado do empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, seu amigo e segurança, que dirigia o veículo. Os sequestradores fecharam o carro de Daniel com outros três veículos e levaram apenas o ex-prefeito, deixando Sombra no local. Antes de matar o ex-prefeito, os sequestradores o mantiveram em cativeiro na favela Pantanal, na divisa entre São Paulo e Diadema.

O caso já foi reaberto duas vezes, investigado pelo Ministério Público, pela Polícia Civil e até pela CPI dos Bingos, em Brasília. Investigação do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) concluiu que seis pessoas participaram do crime, entre elas um menor. Para a polícia, os acusados sequestraram Daniel por engano, já que estavam planejando o crime contra outra pessoa.
O Ministério Público contraria a versão policial e sustenta que a morte foi encomendada por uma quadrilha que atuava na Prefeitura de Santo André extorquindo empresários com objetivo de arrecadar dinheiro para campanhas eleitorais do PT. Para o MP, a investigação policial foi incompleta e não apurou quem foram os mandantes do crime, que para a promotoria foi Sombra, um dos líderes do esquema.
Segundo o MP, Daniel foi morto ao perceber que o dinheiro desviado pela quadrilha também estava sendo utilizado para o enriquecimento dos integrantes, e não só para fins partidários, e decidir impor limites à atuação da quadrilha.
Pelo menos sete pessoas, entre testemunhas e outros envolvidos no crime, morreram após a morte do ex-prefeito --sete delas vítimas de homicídio. O único condenado --a 18 anos de prisão-- pela morte de Daniel foi Marcos Bispo dos Santos. O júri de Sombra deve ocorrer ainda este ano. O MP denunciou seis pessoas, entre empresários e secretários de governo, por participação no esquema de corrupção, mas a Justiça rejeitou as denúncias.

Envolvidos que morreram ao longo das investigações
Dionísio Aquino Severo
Suposto sequestrador de Celso Daniel e uma das principais testemunhas no caso, foi morto por uma facção rival antes de ser ouvido sobre o crime
 
Sergio 'Orelha'
Teria escondido Dionísio após o sequestro. Foi fuzilado em novembro de 2002
 
Otávio Mercier
Investigador da Polícia Civil que telefonou para Severo na véspera da morte de Daniel, foi morto a tiros em sua casa
 
Antonio Palácio de Oliveira
O garçom que serviu Celso Daniel na noite do crime morreu em fevereiro de 2003 após ser perseguido em sua moto
 
Paulo Henrique Brito
Testemunhou a morte do garçom e foi morto com um tiro nas costas, 20 dias depois
 
Iran Moraes Redua
O agente funerário foi o primeiro a identificar o corpo de Daniel e chamou a polícia. Morreu com dois tiros em novembro de 2004
 
Carlos Alberto Delmonte Printes
Médico-legista que constatou indícios de tortura ao examinar o corpo de Daniel


UOL - Qual a tese do Ministério Público para a morte de Celso Daniel?
Roberto Wider Filho - O que nós apuramos foi a participação do Sérgio Gomes da Silva [o Sombra, amigo de Celso Daniel], que já era apontado em Santo André como o encarregado por um esquema de corrupção e concussão na prefeitura. Identificamos um elo entre esse esquema e a morte do Celso Daniel. O Sérgio foi um dos mandantes da morte em decorrência de um desarranjo no esquema de corrupção. A morte do ex-prefeito foi a mando, não foi um homicídio aleatório, como diz a Polícia Civil. Para a polícia, o sequestro foi aleatório: escolheram qualquer um na rua e por azar pegaram o prefeito. Isso ficou completamente descaracterizado na investigação e na Ação Penal que se seguiu. Verificamos que o Sérgio participou e que o crime foi premeditado.

UOL - Por que, então, a investigação policial concluiu que ocorreu crime comum?

Wider Filho - A apuração policial foi muito útil porque identificou a quadrilha responsável pela morte, que é a da favela Pantanal [na divisa entre São Paulo e Diadema] --são os que vão ser julgados agora. Mas a investigação se encerrou prematuramente. Eles não avançaram na investigação até para verificar se a versão dos integrantes da quadrilha era correta --e não era. Os integrantes da quadrilha disseram que perseguiram o empresário desde o Ceagesp [zona oeste de São Paulo]. Quebramos o sigilo telefônico da quadrilha e verificamos que não houve essa perseguição, que os integrantes ficaram o tempo todo na avenida Dr. Ricardo Jafet [zona sul]. A Polícia Civil sequer analisou o exame necroscópico do prefeito. Um adolescente admitiu ter sido o executor da morte, e foi feita até reconstituição, mas sem que houvesse o exame de corpo de delito. Pedimos o exame do cadáver do prefeito, para confirmar se a versão do adolescente batia com as agressões no corpo do prefeito, e o laudo de exame necroscópico. Havia incoerências grandes. Ouvimos esse adolescente várias vezes, e, no final, ele admitiu que não foi o executor. A polícia aceitou passivamente a confissão dos integrantes da quadrilha. Não se aprofundou nos verdadeiros motivos e razões da morte.

UOL - Como foram as tentativas de reabertura das investigações policiais?

Wider Filho - Nós tentamos contar com o apoio da polícia durante todo o tempo. Fizemos uma investigação preliminar e, logo que essa investigação apontou novos elementos, fomos no DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa). Foi instaurado um inquérito complementar e nomeado um novo delegado, o Luiz Fernando. Começamos a fazer diligências em conjunto, mas o DHPP sempre mostrou uma resistência muito grande. Chegou ao ponto de testemunhas levadas pelo MP serem intimidadas no DHPP. Parece-me que a Polícia Civil insiste na tese de crime comum por uma questão de honra, para provar que a tese deles estava certa. Em nenhum momento dissemos que a investigação estava errada, mas ela foi interrompida antes da obtenção dos resultados mais importantes.

UOL - A investigação do MP detectou o envolvimento de pessoas ligadas ao PT no planejamento da morte de Celso Daniel?

Wider Filho - Identificamos o Sérgio [Sombra] como sendo um dos mandantes. Embora existam indícios da participação de outras pessoas na quadrilha de Santo André, não conseguimos aprofundar as provas e não tivemos elementos para oferecer denúncia contra elas. Se não consegui prova suficiente para oferecer denúncia, não posso imputar nada contra essas pessoas. Seria uma irresponsabilidade minha.

UOL - O senhor acha que essa investigação precisa ser retomada pela polícia?

Wider Filho - Existem algumas questões que podem ser investigadas. Depois da conclusão do inquérito complementar, fizemos outro pedido, tempos depois, para a retomada do caso. Foi indicada a delegada Elisabete Sato, na época do 78º DP (Jardins). Pedimos que fossem feitas nove diligências. Também a doutora Sato, prematuramente, relatou o inquérito --com uma posição surpreendente, cometendo vários erros no relatório, um trabalho que não é do histórico dela-- reafirmando a tese do DHPP. Nós acreditamos que houve uma pressão do DHPP para que ela fizesse isso, porque a investigação dela caminhava num rumo bom. Entre outros elementos na investigação dela, colheu-se provas de que dinheiro de corrupção foi encontrado dentro do apartamento do Celso Daniel. Isso era uma prova relevante que demonstrava esse desarranjo no interior da quadrilha.

UOL - Como funcionava o esquema de corrupção em Santo André? Qual a ligação da quadrilha com a morte do ex-prefeito?

Wider Filho - Existia uma quadrilha que fazia arrecadação destinada a financiamento de campanhas eleitorais do PT. Em um determinado momento, Celso Daniel descobre que boa parte desses recursos eram desviados para o enriquecimento pessoal dos integrantes dessa quadrilha. Com isso, ele não concordava. Havia secretários do PT, filiados ao partido, que eram integrantes da quadrilha, mas a investigação para outros integrantes do partido foi cerceada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que impediu que a gente investigasse o José Dirceu, o Gilberto Carvalho e a destinação final desses recursos. Nós não podemos investigar, nem a Polícia Federal, que era a instância competente. Depois eu tentei retomar essa investigação e o ministro Eros Grau, também atendendo a uma reclamação do José Dirceu, impediu. Então a gente nunca conseguiu fazer essa investigação. Portanto, não posso falar nada sobre o que eu não investiguei. Mas existe uma reclamação nossa no STF para investigarmos o José Dirceu que ainda não foi julgada.

UOL - O que foi esse “desarranjo na quadrilha” que o senhor menciona?

Wider Filho - Quem levava o dinheiro da quadrilha para o partido era o Gilberto Carvalho. Quem arrecadava era o Ronan Maria Pinto [empresário do ramo de transportes e das comunicações] e o Sérgio [Sombra]. De repente, o dinheiro foi parar no próprio apartamento do Celso Daniel, o que demonstra como ele tinha desconfiança do funcionamento daquela quadrilha. Para ele, o dinheiro deveria ter como destinação exclusiva o financiamento de campanha eleitoral. Ele continuou arrecadando, mas o dinheiro não circulava como anteriormente. Essa investigação foi realizada pela Elisabete Sato, e, infelizmente, não teve prosseguimento. Existem outros elementos a serem investigados e aprofundados, inclusive com relação a outros mandantes, mas, fora o cerceamento que houve no Supremo, nós também tivemos problemas com a polícia.

UOL - Além do DHPP, mais alguém fez pressão sobre a Polícia Civil para não investigar o caso corretamente?

Wider Filho - Houve uma interferência muito grande do então deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT). Ele foi indicado pela Comissão de Direitos Humanos do Congresso para acompanhar a investigação. E o que ele desenvolveu na investigação não foi um acompanhamento passivo. Temos notícias de que, inclusive, ele orientava parentes de Celso Daniel a como prestar depoimento. Então isso é uma interferência censurável. Eu acho que o partido não deveria colocar um deputado para fazer um acompanhamento com o intuito de desviar o foco da investigação.

UOL - Sete testemunhas da morte de Celso Daniel foram mortas. Como foram as investigações desses crimes? Os autores foram presos?

Wider Filho - Algumas dessas mortes têm uma relação bem próxima do caso, principalmente a do Dionísio [Aquino Severo, um dos sequestradores do ex-prefeito], que fugiu da delegacia de Guarulhos em data próxima da morte do Celso Daniel. Depois do crime, ele foi recapturado em Taboão da Serra (SP) e declarou para o delegado Romeu Tuma Júnior que, sobre o caso Celso Daniel, só se manifestaria em juízo. Dias depois, ele foi assassinado no CDP (Centro de Detenção Provisória) da Penha enquanto estava no parlatório com o José Edison da Silva, um dos integrantes da quadrilha que nunca prestou depoimento para nós e é um elo importante do caso. Os dois estavam no parlatório, só os dois, quando os presos se rebelaram e mataram o Dionísio. Houve a identificação dos presos que participaram da morte dele --eu mesmo ofereci denúncia. A morte estava relacionada com uma organização criminosa [PCC], e a ordem vinha da facção, e a investigação da polícia não avançou, não foi para cima, só limitou a identificar entre os detentos aqueles que participaram. O curioso é que, uma semana depois da morte do Dioniso, ligaram para o Ivan Rodrigues da Silva, o chefe da quadrilha da favela do Pantanal, e perguntaram se era pra matar o José Edison também. É uma questão curiosa: por que o Ivan mataria um integrante da quadrilha dele, sendo que os dois participaram do homicídio do Celso Daniel? Acredito que essa morte tenha relação direta com a morte do ex-prefeito, mas não houve uma apuração nesse sentido.

UOL - A quadrilha da favela do Pantanal pertencia ao PCC (Primeiro Comando da Capital)?

Wider Filho - A quadrilha não era do PCC. O chefe [Ivan] tinha ligações com o PCC, mas não era integrante da facção.

UOL - E as outras mortes de testemunhas?

Wider Filho - A segunda morte que tem uma ligação é do Sergio “Orelha”, que foi quem recebeu o Dionísio logo após a fuga da prisão. O Dionísio participou de uma reunião em que ele mencionou que iria participar do sequestro do Celso Daniel e que o Sérgio [Orelha] iria colaborar. Ele disse, inclusive, que o pagamento seria feito no momento do sequestro, com uma bolsa de dinheiro. Essa referência da bolsa com dinheiro depois foi confirmada em uma diligência feita pela CPI dos Bingos. Os senadores Magno Malta e Eduardo Suplicy ouviram uma testemunha que narrou que depois do arrebatamento do prefeito alguém retornou até o carro, abriu a porta de trás, pegou a bolsa e saiu. O corpo do Sérgio Orelha foi colocado dentro de um veículo que foi queimado. Não se apurou a autoria desse crime. As outras mortes não tem um vínculo direto com a execução do crime. São mortes de testemunha, como um investigador de polícia que manteve um contato muito longo por telefone com o Dionísio na véspera do crime. Nós o ouvimos e ele disse que não tinha nenhuma relação com a morte do Celso Daniel. Ele foi morto um mês depois.

UOL - O senhor acha que nesse júri algum dos acusados pode revelar alguma novidade?

Wider Filho - Eles já foram ouvidos muitas vezes. Nós mesmos os ouvimos diversas vezes porque queríamos esclarecer detalhes. Quando eles confessaram o crime, havia coisas muito obscuras, controvertidas, na confissão. Depois eles foram ouvidas pela CPI mais de uma vez, assim como pela Polícia Civil. Acho muito pouco provável que elas tragam para o plenário uma questão nova. Até acho que eles têm informação, principalmente o José Edison, mas a vontade deles de falar sobre o caso já foi bem determinada nas oitivas que fizemos.

UOL - O MP investigou algo sobre a morte do perito Otávio Mercier, que disse que o Celso Daniel foi torturado antes de ser morto?

Wider Filho - O depoimento do perito foi muito importante para a instrução do processo. Em primeiro lugar, ele fez um laudo, e houve uma dificuldade enorme para obtermos o próprio laudo que ele produziu. Esse laudo só foi juntado ao processo depois que os promotores participaram da investigação e mesmo assim com muita insistência. O laudo menciona que o Celso Daniel sofreu torturas, mas não deixa bem claro a espécie de tortura que ele sofreu. Depois, ouvindo o perito, ele consegue descrever a dinâmica da tortura pelas lesões que o ex-prefeito foi submetido. Ele sofreu queimaduras circulares nas costas que provocaram marcas compatíveis com as produzidas por armas de fogo. O Celso Daniel também apresentava ferimentos de estilhaços de projéteis na região da axila e da perna direita. Provavelmente ele foi deitado de barriga para baixo e alguém o torturou o ameaçando de morte, efetuando disparos do lado do corpo dele e fazendo queimaduras com essa arma. Isso é uma tortura clássica, realizada para obter informação. Não é uma tortura natural de um crime de sequestro, como a Polícia Civil sustenta. Em um sequestro comum, o tipo de tortura é para que a vítima perca a vontade. Eles deixam a pessoa nua, fazem tortura psicológica para que a vítima não queria fugir, não grite, não dê trabalho no cativeiro. Quanto mais quieta, mais seguro é o cativeiro para os bandidos. Já essa tortura de simular a morte do sequestrado você deixa a pessoa irrequieta. Não tem nenhuma compatibilidade com o sequestro comum, porque isso não vai obter maior vantagem financeira para os sequestradores. Disso nós estamos certos: o Celso Daniel foi submetido uma tortura clássica destinada à obtenção de informações.

UOL - Por qual motivo ele foi torturado?

Wider Filho - Que informações a quadrilha queria e quem torturou, não conseguimos esclarecer. Não houve nenhum testemunha presencial e ninguém que tivesse indicado isso. Talvez um dos caminhos possíveis seria a investigação barrada pelo STF para descobrir que caminho tomaram os recursos obtidos por meio de corrupção em Santo André. Foi tudo gasto? Existia algum recurso em conta secreta? Quem tinha acesso a essa conta? São questões que não foram solucionadas que talvez explicassem a razão da tortura, mas infelizmente o MP foi cerceado da obtenção de várias informações que seriam muito úteis para a solução do homicídio e do esquema de corrupção.

UOL - Como o MP avalia a atuação da Polícia Federal nesse caso?

Wider Filho - A PF até trouxe uma testemunha pra gente, mas teve uma atuação muito tênue nesse caso. Fizeram uma coisa marcante, que foram as escutas da quadrilha e de outros integrantes do PT logo depois da morte do Celso Daniel. Mas essas escutas foram obtidas com um “vício”: em vez de a PF informar o Judiciário que as escutas foram feitas para investigar a morte do Celso Daniel, eles colocaram no pedido como se fosse para apurar tráfico de drogas e inseriram os telefones. Com isso, escutas foram consideradas viciosas e jamais puderam ser usadas pelo MP validamente. Nos não utilizamos, nem tomamos conhecimento num primeiro momento. Só depois que essas fitas foram localizadas nós tomamos conhecimento. A atuação da PF não foi abrangente e trouxe esse vício que nos causou prejuízo.

UOL - Essas fitas foram descartadas?

Wider Filho - Elas tiveram uma longa história. O juiz Rocha Mattos [preso na Operação Anaconda] mandou destruir essas fitas. Elas foram apreendidas no MP e destruídas. Mas ele tinha um segundo lote, com cópias, e essas fitas acabaram indo para a CPI dos Bingos. Depois tivemos acesso às fitas, mas não há como utilizá-las porque paira sobre elas dúvidas sobre a legalidade. Não tem porque usarmos uma prova ilícita que pode contaminar todo o processo. Além disso, não sabemos se o lote que foi apresentado é completo.

UOL - Essas gravações ajudariam a esclarecer algumas questões relacionadas ao crime e ao esquema de corrupção em Santo André?

Wider Filho - Algumas questões sim. Mas não sabemos nem se o lote divulgado traz o conteúdo completo das gravações, nem se elas estão inteiras. Teríamos que pegar as grades dos telefones interceptados, o histórico das chamadas e verificar se há correspondência do histórico, porque quem colheu essas provas pode muito bem ter separado um pedaço de outro. A escuta quando envolve oponente político é muito delicada. Acho que tudo deveria ser remetido para o Judiciário, que deveria ser o guardião do material. E depois a polícia trabalhar com o material fornecido pelo Judiciário. Nesse caso há suspeita de que nem todos os áudios tenham sido revelados. É uma questão muito controversa. A decisão do Rocha Mattos pela destruição imediata das fitas foi tomada antes que pudéssemos recolher. O MP recorreu com uma liminar, mas quando obteve a liminar ela já estava prejudicada porque ele já havia destruído as fitas. Mas não se sabe se as fitas que ele divulgou posteriormente são a totalidade das gravações.

27 fevereiro 2012

Bruno Daniel no Roda Viva

Hoje, 27 de fevereiro, às 22h, Bruno Daniel Filho será o entrevistado do programa Roda Viva, da TV Cultura (SP), sobre o assassinato de seu irmão, Celso Daniel.

Divulguem, por favor.

13 julho 2010

Ô gente!

E o Celso Daniel, hein? Vai pras calendas? Ihhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh..... Vai não....

21 outubro 2009

VEJAM ISSO

Demora, eu sei, mas de vez em quando acontece:

http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/MINISTERIO+PUBLICO+TEM+PODER+DE+INVESTIGACAO+CRIMINAL+DECIDE+SUPREMO_66273.shtml

26 março 2008

Cartas de Bruno Daniel ao Brasil

Os documentos (cartas) a que se refere a deputada Janete Capiberibe em seu pronunciamento (publicado ontem, neste blog), são os que se seguem:



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França, 18 de janeiro de 2008
Exma. Sra.
Ellen Gracie
DD Presidente do Supremo Tribunal Federal


Senhora presidente

Em 03 de novembro de 2004, o Supremo Tribunal Federal recebeu das mãos do Diretor Executivo da entidade Transparência Brasil um manifesto do movimento INVESTIGAR É PRECISO, contendo mil e quinhentas assinaturas, “expressão espontânea da sociedade civil, neste particular representada por entidades de classe e de defesa de direitos sociais, por parlamentares e, individualmente, por funcionários públicos, jornalistas, profissionais liberais, aposentados, professores e estudantes”.

À época o movimento, do qual participávamos, manifestava seu apoio ao Ministério Público e posicionava-se contrariamente à supressão de seu direito de investigar.
Decorridos mais de três anos, o STF tem de novo em suas mãos uma solicitação feita por Sergio Gomes da Silva, indiciado no processo do assassinato de Celso Daniel, alegando a inconstitucionalidade do direito de investigação do MP. A sua intenção é clara: fazer invalidar as provas coletadas por promotores públicos, que não deixam dúvida quanto à sua participação em seu seqüestro e assassinato, de forma a se ver livre das acusações que lhe são imputadas.

Hoje, Senhora Presidente, vivendo como exilados estatutários na França, em função do Estado Francês ter reconhecido as perseguições, ameaças e intimidações que vivemos no Brasil, por causa da luta que ai travamos para o desvendamento das razões do assassinato de Celso Daniel, bem como de seus mandantes, não podemos deixar de manifestar nossa preocupação quanto ao posicionamento do STF. Por isso, de novo queremos deixar público o nosso apoio ao MP, nos posicionando contrariamente à supressão de seu direito de investigar e manifestando nossa preocupação, tal como o fez o movimento INVESTIGAR É PRECISO, em 2004, diante da possibilidade “do Supremo Tribunal Federal interpretar a Constituição do país, no sentido de impedir que o Ministério Público investigue os crimes de corrupção, de abuso de poder e de violência policial”.

Reafirmamos que “a diligência do Ministério Público foi e está sendo determinante na apuração e punição de significativos crimes e criminosos. Impedir a investigação de crimes por parte do MP significa suprimir da sociedade um estratégico meio de combate ao crime organizado, à corrupção política, ao abuso de autoridade e à lavagem de dinheiro.

Nossa luta é pela investigação plural de crimes, como fazem outras instituições e organizações da sociedade que hoje desenvolvem investigações em prol da lisura no trato dos recursos públicos, segundo os ditames da lei: Receita Federal, Controladoria da República, Conselhos de Medicina, Tribunais de Contas, entre outras”.

Tomando como nossas palavras as de Helio Bicudo, “na decisão a ser tomada, o Supremo Tribunal Federal deverá fazer profunda reflexão sobre a questão constitucional e infra-constitucional, sem esquecer o seu papel de árbitro maior não só da Lei Magna, mas da própria realidade brasileira, pois interpretar é descobrir tudo aquilo que a norma contém, para que ela seja instrumento da paz social. (...)Como na sociedade atual, onde a alta criminalidade viceja e se desenvolve, impedir-se a ampla atuação do Ministério Público será acoroçoar-se a ilicitude daqueles que se situam em patamares superiores da sociedade e que por isso mesmo se sentem imunes. A lei penal, segundo pensam, não é para eles, mas para aqueles que o sistema político-econômico marginalizou ou excluiu da vida social.”

Impedir que o Ministério Público possa investigar significa contribuir para a existência de novos exilados brasileiros em tempos de democracia, como é o nosso caso.

“Não se pode retirar meios, quaisquer que sejam, que impeçam ou dificultem a propositura da ação penal pelo Ministério Público. Se a tanto chegarmos, estaremos decretando a própria falência do atual ordenamento jurídico que o constituinte de 86/88 buscou normatizar, tendo em vista a contribuição do Ministério Público na construção do Estado Democrático” (Helio Bicudo).

Senhora Presidente, solicitamos que esse nosso posicionamento seja conhecido por todos os ministros desse Tribunal.

Atenciosamente,

Bruno José Daniel Filho e Marilena Nakano (irmão e cunhada de Celso Daniel, prefeito de Santo André, seqüestrado e assassinado em 20 de janeiro de 2002).

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França, 18 de janeiro de 2008

Querido Helio,

Te enviamos uma carta endereçada à Presidente do STF – Supremo Tribunal Federal, pedindo que a faça chegar até ela, e que a torne pública. Escolhemos você como nosso portador e nosso porta-voz por duas razões: a primeira, pela sua solidariedade, que foi e tem sido vital para nós. Não apenas para a luta que travamos para que se faça justiça no caso do assassinato do Celso, mas também porque hoje estamos em segurança em função do apoio que você nos deu no período de nossa saída do Brasil, após sofrermos tantas intimidações, perseguições e ameaças. A segunda razão pela qual o escolhemos é porque você representa para nós um símbolo da luta em defesa dos direitos humanos, pois jamais esmoreceu, mesmo em momentos tão difíceis como o da ditadura militar.

Pedimos que diga a todos aqueles que, como você, agiram, continuam agindo e se solidarizaram conosco, que eles também continuam sendo para nós exemplos de capacidade de luta por um mundo melhor e mais humano. Aqui não citamos o nome de cada um deles ou das instituições a que pertencem, pois felizmente a lista é imensa, e não queremos cometer injustiças. Cada um deles sabe o sentimento que nutrimos por eles.

Você e eles acompanharam passo a passo a nossa dolorosa decisão de sair do Brasil, após nossas ações incessantes no sentido de tentar viabilizar a descoberta das circunstâncias do assassinato do Celso. Saímos daí no dia 28 de fevereiro de 2006, em direção à França, que nos acolheu e reconheceu oficialmente que aí sofríamos risco de morte, nos outorgando o estatuto de refugiados.

Como exilados vivemos fisicamente em outro país, onde também temos grandes amigos, solidários, mas seguimos ainda fortemente atados ao Brasil, desejando que a democracia aí se aperfeiçoe.

Depois de termos vivido os duros anos da ditadura militar, não imaginávamos que alguém seria obrigado a sair do país e se refugiar em outro, na condição de exilado. Para nossa surpresa, aqui estamos diante dessa dura realidade. O país que nos acolhe nos oferece muito, temos muito a aprender com aqueles que nos concederam o refúgio. Mas faltam nele todos os amigos que aí deixamos, parte da família, nosso trabalho regular e isso torna o exílio muito difícil.

Cada um de vocês está conosco nos e-mails, nos telefonemas, nas coisas enviadas, nos nossos pensamentos e corações. Mas a ausência física, a impossibilidade de pegar o telefone e ligar a qualquer momento, a impossibilidade de nos encontrarmos no trabalho e nos movimentos sociais, de irmos para a casa de cada um, de conversarmos face a face, de jogarmos conversa fora, de darmos risada, de chorarmos, de falarmos das nossas preocupações, das nossas ansiedades, de falarmos de tudo, de comermos juntos, faz muita falta.

Hoje, passados quase dois anos de nossa partida, tentamos reconstruir nossas vidas. Mas isto não se faz deixando o passado para trás, como se ele não existisse mais. Nos caminhos de produçao da democracia não se deve apagar a memória. Os motivos do assassinato do Celso não foram ainda devidamente esclarecidos. Nem todos os mandantes de tão bárbaro crime foram ainda descobertos. Não sabemos ainda quem o torturou e o que se passou em seu cativeiro. Mesmo distantes do Brasil, é para nós difícil elaborar o luto de sua perda. Seu corpo segue insepulto para nós. Por isso, continuaremos na luta para que se desvendem por completo as razões de seu assassinato e para que se faça justiça. Para isso pedimos o apoio de todos, de você, dos nossos amigos e dos brasileiros, que como nós, não aceitam que assassinatos como o do Celso caiam no esquecimento.

Dia 18 de janeiro ele foi sequestrado e dia 20 completa-se o sexto aniversário de sua morte. Neste momento queremos que você diga a todos que também seguimos acreditando que nosso país poderá ser mais democrático e humano. Que não perdemos as esperanças nas instituições brasileiras e que um dia as razões do assassinato do Celso virão à tona e todos os envolvidos prestarão contas de seus atos à Justiça brasileira.

Acompanhamos o trabalho do Ministério Público, uma das poucas instituições do Estado com quem tivemos que nos relacionar desde 2002, em função do que ocorreu com o Celso, que com suas investigações sobre seu assassinato, nos dão a certeza de que podemos ter esperanças. O MP tem cumprido com suas atribuições com competência e independência (embora seja, como todas as instituições, heterogênea e deva ser sempre aperfeiçoada). Esperamos que ele possa terminar bem seu trabalho para desvendar por completo as razões, os mandantes, as circunstâncias de sua morte e todos os envolvidos nela.

De longe, acompanhando os acontecimentos no Brasil. Vemos novamente o risco que o Ministério Público corre de perder o direito de investigação. Muitos temem sua autonomia, temem que ele exerça na plenitude o papel que a Constituição lhe reservou, o de « advogado do povo ».

Há, no Supremo Tribunal Federal, outro processo em andamento, desta vez a pedido de Sergio Gomes da Silva, o “Sombra”, denunciado pelo MP como mandante da morte de Celso, solicitando a anulação das provas, porque segundo seus advogados o MP não teria o direito de investigar. Não podemos deixar de reagir a isso. Tal como fizemos quando participamos do Movimento Investigar é Preciso, em 2004, pensamos que o direito de investigação dessa instituição deve ser preservado como algo necessário ao exercício pleno da cidadania. Sem esse direito, num país em que os ricos e poderosos dificilmente vão para a cadeia, possivelmente crescerá o sentimento de que imperam a impunidade e a injustiça.

Por isso, pedimos a você e a todos os que pensam como nós, que mais uma vez, por todos os meios (abaixo-assinados, blogs, e-mails, solicitações de parlamentares, entidades de classe, de defesa dos direitos civis etc.), solicitem ao STF que se posicionem contrariamente ao pedido de invalidar todas as provas contra o “Sombra”. Acreditamos que o STF tem um importante papel a cumprir no sentido de dizer que no Brasil se faz justiça, não pelas próprias mãos, mas pelas instituições, porque elas, numa democracia, precisam ser aperfeiçoadas e reforçadas. Não é só o caso do Celso que está em jogo. O retrocesso institucional seria enorme.

Também pedimos a você e a todos os que acreditam como nós, que o assassinato do Celso não foi um crime comum, que da mesma forma sejam nossos porta-vozes junto à Justiça de Itapecirica, solicitando que o caso vá a júri popular o mais rapidamente possível. Decorridos 6 anos de sua morte, já não é sem tempo que essa decisão seja tomada. Mesmo que as investigações não estejam terminadas, já há implicados e provas suficientes para que um júri popular possa se pronunciar.

Querido Helio, aprendemos com você e tantos outros brasileiros que lutar vale a pena e por isso esperamos um dia voltar para o Brasil e juntos, lado a lado, seguirmos a nossa luta por um país mais democrático e humano.

Um grande abraço a você, a nossos amigos e àqueles que têm se solidarizado conosco.

Bruno José Daniel Filho e Marilena Nakano (irmão e cunhada de Celso Daniel)

25 março 2008

Discurso da Deputada Janete Capiberibe (PSB-AP)

Senhor Presidente;

Senhoras e Senhores Parlamentares;

Há seis anos, em 18 de janeiro de 2002, o então Prefeito de Santo André, Celso Daniel, desaparecia vítima de um seqüestro. Dois dias depois, em 20 de janeiro, era encontrado morto. Daí, apenas duas certezas: antes de ser assassinado Celso Daniel foi submetido a tortura; inconformada com a falta de uma investigação conclusiva sobre o caso, a família de Celso Daniel indignou-se, protestou e foi ameaçada de morte por isso e acabou tendo que submeter-se ao exílio político na França.

Bruno José Daniel Filho e Marilena Nakano (irmão e cunhada de Celso Daniel) estão, desde 2006, vivendo como exilados políticos em Paris. Não apenas o casal, mas também seus três filhos foram ameaçados de morte aqui no Brasil.

Bruno e Marilena experimentaram o sentimento amargo de ser subtraído da convivência de seu País e das pessoas queridas. Marilena é irmã de Maria Nakano, companheira de vida do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. Betinho e Maria militaram nos movimentos sociais e na política e se opuseram à ditadura militar, tendo sido obrigados a deixar o País.

Quero me solidarizar com a família de Bruno e Marilena . Sei o que é viver no exílio. Eu e minha família passamos nove longos anos longe do meu país na década de setenta porque aqui não havia liberdade. A ditadura que vigia no Brasil impedia qualquer tipo de manifestação contrária. Nossa vida, minha e da minha família, foi pautada pela consolidação da democracia.

Voltamos ao Brasil quando o país começou a respirar novos ares, passamos pela transição e vimos o primeiro presidente ser eleito, sempre acreditando que a cada dia a democracia se consolidava mais em nosso país.

Como diz o poeta Carlos Drummond: "no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho". Nunca imaginei que pudesse conhecer casos de exílio político de brasileiros, como o dos familiares do prefeito Celso Daniel, num governo eleito democraticamente. Menos ainda no governo do Presidente Lula.

Mas, infelizmente, essa é a realidade. E o que impulsiona nossa permanência na política é a defesa da democracia acima de tudo.

Não podemos admitir que essa pedra no meio do nosso caminho impeça a democracia de continuar avançando. Para retirá-la é necessário elucidar as circunstâncias da morte do prefeito Celso Daniel, doa a quem doer. É necessário exterminar da sociedade brasileira qualquer possibilidade de que a integridade daqueles que assumem a bandeira da justiça seja ameaçada.

Junto-me ao pedido da família do prefeito Celso Daniel, que considero justo:

Que o direito de investigar inerente ao Ministério Público não seja cassado, conforme se pretende, tornando nula toda a investigação e o levantamento de provas feito até agora no assassinato do prefeito.

O bom trabalho do Ministério Público deve ser louvado, pois é através dele que as investigações avançam, a despeito dos contornos políticos que motivaram o assassinato.

Anexo, Senhor Presidente, carta enviada do exílio ao jurista Hélio Bicudo e ofício remetido à presidente do STF, ministra Ellen Gracie.

Eles pretendem, desta maneira, tornar visível a injustiça que sofrem. Primeiro pela tentativa de descaracterizar as provas coletadas pelo Ministério Público e inocentar aquele que foi apontado como mandante do crime. Segundo, pelo exílio político a que foram forçados pelas ameaças sofridas por que buscaram a efetiva investigação, a elucidação dos fatos e a punição dos culpados.

Não é tolerável, de maneira alguma, que cidadãos e cidadãs brasileiros sejam obrigados ao exílio sendo-lhes negados seus direitos como se vivêssemos em regime de exceção, que combatemos durante toda a nossa vida. Para construirmos uma sociedade justa e democrática é preciso ter honestidade e coragem para chegarmos a verdade dos fatos.

Peço, Senhor Presidente, a divulgação nos órgãos de comunicação desta Casa.

Muito Obrigada.

29 fevereiro 2008

Anotem esse nome: Norma Cunha


Do blog do jornalista Cláudio Humberto

29/02/2008

Rocha Mattos: ex-mulher abre o bico
Em liberdade após quatro anos de prisão por envolvimento na Operação Anaconda com o ex-marido, juiz federal João Carlos da Rocha Mattos, que está preso, Norma Cunha diz ter revelações no caso do prefeito assassinado de Santo André, Celso Daniel. A primeira: era sócia oculta da agência de câmbio e turismo Havaí, investigada na CPI dos Bingos por suposta lavagem de dinheiro das contas da prefeitura no exterior.

Laços de família
Acusada de ser tesoureira da quadrilha de Rocha Mattos na venda de sentenças e lavagem de dinheiro, é cunhada da dona da Havaí, Neuma.

Mistério das contas
Neuma Kodama negou na CPI conhecer o suposto "esquema de Santo André", mas Norma teria provas de quem as movimentou e sacou.

Mistério do morto
Seriam US$ 48 milhões para a campanha de Lula, de "caixinha ilícita", movimentados mesmo após a morte de Celso.

Verdade ou blefe?
Promotor de Santo André, Roberto Wider desconhece a movimentação pós-morte, que a família de Celso confirma, mas Norma diz ter provas.


23 fevereiro 2008

Meia palavra

Da coluna do jornalista Cláudio Humberto:

23/02/2008 0:00
Amnésia salvadoraSó faltou o ex-secretário de Antonio Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto (SP), Rogério Buratti, dizer que além de desconhecer propina para o chefe, não se chama Celso nem é devoto de Santo André.

23/02/2008 0:00

Pensando bem......o ex-secretário de Antonio Palocci em Ribeirão Preto recuou nas acusações porque sabe que o Buratti é mais embaixo.

22 fevereiro 2008

Uma herança bendita?

Da coluna do jornalista Cláudio Humberto:
22/02/2008 0:00


Celso Daniel, falecido: no paraíso
Ao abrir o inventário, Bruno Daniel, irmão do prefeito assassinado de Santo André (SP), Celso Daniel, descobriu a existência de contas bancárias em paraísos fiscais, mas com o detalhe particularmente petista: o falecido assinou cheques depois de morto. Bruno, exilado em Paris temendo pela sua vida, receberá dia 4 o passaporte de refugiado político e planeja uma entrevista coletiva explicando a razão do asilo.

 

Não custa lembrar...

Ora Sr. Delegado: imaginar que em terra de Celso Daniel, de PC-Farias, e quejandos, seja possível manter a palavra, é querer um pouco demais, não?

Roberto Romano
, a respeito da atitude de Rogério Buratti, que retirou as acusações que tinha feito a Antonio Palocci.
 

20 janeiro 2008

Em busca do tempo perdido

Os dias talvez sejam iguais para um relógio,
mas não para um homem.
Marcel Proust, Em busca do tempo perdido
Há seis anos restam impunes os crimes de seqüestro, tortura e assassinato do prefeito de Santo André (SP) CELSO DANIEL.

Como se fosse um paliativo, um emplastro para diminuir a dor, sua família recebeu, na semana que passou, vistos de refugiados políticos na França, onde passam a morar por uma questão de segurança.

O Brasil não lhes garante a segurança. O Brasil se reconhece no Brasil que cala os mortos com outras mortes.

Aos 50 anos, Celso Daniel era um homem bonito, culto, inteligente, em ascensão no Partido dos Trabalhadores, na política, na vida.

Não deixa de ser tragicômico que seus companheiros de partido – Lulla, Marta, Zé Dirceu – estejam hoje buscando o que já foram há seis anos ou mais. Botox, peeling, enxertos de cabelo, tudo para voltar ao que parou para Celso Daniel há 6 anos.

Celso Daniel não envelhece e está insepulto. Seus companheiros estão envelhecendo e fugindo da morte. Querem voltar no tempo na aparência física, mas sem os transtornos passados.

O tempo também ajuda a esquecer o homem bonito, de 50 anos, professor universitário, vítima fatal de violência nunca esclarecida. Fico pensando se Celso Daniel estaria hoje, aos 56 anos, se vivo, injetando botox na testa, fazendo peeling facial, enxertando cabelos nas entradas calvas. Talvez. Não conheço ninguém que goste de se ver próximo da morte.

Mas ele morreu bonito e jovem. Não precisou gastar seu tempo e dinheiro para recuperar um tempo que para ele não passará. É fato, não adianta negar, não se recupera o tempo vivido fisicamente. Seus companheiros podem fingir à vontade que têm 30, 40, 50 anos de idade, mas suas histórias são mais longas, mais cicatrizadas a laser, mais recauchutadas.

Seis anos de tempo perdido irrecuperável. Para Celso Daniel e para todos os seus companheiros, quer queiram, quer não.

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