"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 21 de março de 2013

REELEIÇÃO: ACONTECE QUE MEIA DÚZIA É IGUAL A SEIS


A desculpa de quem aderiu tardiamente à tese da reeleição foi, principalmente, a frase (eloquente!) de que "é impossível realizar o que quer que seja em apenas quatro anos de governo". Calei-me.

Não porque siga a cartilha do "manda quem pode e obedece quem tem juízo", mas porque tento seguir a sério a ideia de que ninguém pode estar certo durante o tempo todo neste mundo, sempre a mudar. Esperei para ver em que iria dar.

Num primeiro momento, confesso, cheguei a pensar que erráramos todos os que tínhamos lutado contra o projeto que permitiu a reeleição dos chefes do Poder Executivo no Brasil. A ideia vingara, pois, na maior parte dos pleitos pós-1996, quem pretendia ser reeleito acabou vitorioso. Uma certa corrente atribuiu o fato à aprovação do eleitor em relação às ações do governante conhecido; outra, mais marota, viu logo no poder da caneta e no controle dos meios de propaganda a maior razão para essa preferência do eleitorado.

Daí pra frente, explicações mais refinadas começaram a aparecer: em certos momentos, o eleitor vai às urnas querendo mudanças; noutras, vai para manter o que aí está. Nada mais nada menos que a tradução tupiniquim para "é a economia, estúpido", que, dizem, teria sido a explicação de um marqueteiro ao candidato Clinton, que temia a derrota para George Bush pai.

O QUE PENSA O ELEITOR

A julgar pelo que a gente mais ouve ou lê, os eleitores só se importam com o que lhes pesa no bolso, no seu próprio e no de sua família. Basta-lhes a sensação de segurança do aqui e agora. "Amanhã será outro dia", já avisava o poeta… Mas, se o emprego não está garantido e se o salário não chega nem ao meio do mês, aí, então, todos vão querer uma mudança. Surge, nesse quadro, a possibilidade de que a oposição seja vitoriosa.

Mas meu assunto hoje não é tratar das razões pelas quais a reeleição pegou no Brasil. Quero pedir a atenção de quem acreditou que são necessários mais de quatro anos para alguém poder fazer alguma coisa. Para tanto, basta acompanhar o que vem acontecendo em relação à sucessão presidencial. Na verdade, desde a aceitação da reeleição, todo governante não pensa noutra coisa a partir do terceiro ano de seu governo, o que faz com que, de verdade, ele só governe dois anos no primeiro mandato. Já no segundo, como ele (ou ela) só pensa em fazer seu sucessor, o mesmo vai se repetir: dois anos de governo e dois anos de disputa eleitoral.

É o que vem ocorrendo agora: a presidente vive em articulações políticas. E o restante fica emperrado. Vejam a confusão na batalha parlamentar e jurídica sobre os royalties. Dilma acaba de promulgar a queda de seus vetos, mas, ao mesmo tempo, tramita no Congresso uma medida provisória que trata de tema correlato. O que vão fazer com ela? E a tal reforma ministerial, que só anda ao sabor das conveniências de manter a base aliada?! Para não falar em pacotes de bondades que não saem do papel.

Ou seja, com a reeleição, tem-se, na verdade, um governo de apenas quatro anos: dois no primeiro, dois no segundo mandato. Como acontecia antigamente.

(transcrito do jornal O Tempo)

21 de março de 2013
Sandra Starling

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