"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 5 de abril de 2013

COINCIDÊNCIAS TRIANGULARES

 

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A entrevista do Financial Times com Isabel dos Santos, “a primeira bilionária africana”, segundo a Forbes, reproduzida hoje no Valor (aqui só para assinantes), fez-me voar longe esta manhã.
Isabel é mais um dos produtos indiretos da “luta pela democracia” nos anos 70, que em tudo faz lembrar o nosso “Lulinha” só que mais andada na senda do poder.

Ela vem a ser a filha de José Eduardo dos Santos, ex-”comunista” e ex-paladino da luta “pela libertação” da África que, ha 33 anos ininterruptos tem sido o presidente de Angola.

Quando comecei a trabalhar em jornal, já lá vão 38 anos, a primeira coisa de maior responsabilidade que fiz foi assumir a redação dos textos que o Estdão publicava sobre as guerras de libertação da África.

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Naqueles anos de generalizada conflagração ideológica, coisa que quem não viveu jamais poderá imaginar a que ponto de pressão e de detalhe chegou, não afirmar que os guerrilheiros africanos eram santos heróis da democracia era quase tão grave quanto negar que os generais brasileiros fossem os demônios do mal em pessoa.

Hoje estão no poder lá e cá os que, naquela altura, treinados por Cuba e empunhando armas russas, tentavam derrubar as ditaduras estabelecidas nos dois lados do Atlântico.

O pai de Isabel, aliás, casou com sua mãe, uma jogadora de xadrez russa, no Azerbaijão, base avançada então ocupada pelos soviéticos onde a nata da KGB, a polícia política soviética, preparava as lideranças comunistas africanas envolvidas na disputa pelo poder naqueles países de localização estratégica e tão imensamente ricos em petróleo e diamantes que se preparavam para iniciar seu vôo solo.

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Passados 35 anos da “libertação” os angolanos continuam pobres, ainda que “com uma classe média em crescimento”, no julgamento de Isabel, e democracia é uma palavra de que já ninguém se lembra. Mas os antigos guerrilheiros comunistas que se tornaram seus governantes estão podres de ricos.

O regime de José Eduardo dos Santos, um homem obcecado pelo segredo sobre o qual paira sempre uma nuvem de mistério, “tornou-se sinônimo de desvio de recursos públicos para bolsos privados”, nas palavras de seus críticos, “uma espécie de capitalismo de compadrio” onde as pessoas ligadas ao Fatungo, como é conhecido o círculo íntimo do presidente, levam tudo, especialmente o petróleo e os diamantes (sim, aqueles “de sangue“), ficando o resto do país com as migalhas.
Faz lembrar alguma coisa?

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Ainda não? Pois veja:
A duas vezes bilionária (em dólares) filha do presidente diz que seu estrondoso sucesso econômico nada tem a ver com a posição do pai.
Eu tinha um talento para negócios desde muito novinha. Eu vendia ovos de galinha quando tinha seis anos”.

Assim como o talentosíssimo “Lulinha” que começou como zelador de parques zoológicos, Isabel deu sorte e saltou das galinhas para o ramo das telecomunicações onde fez seu primeiro grande negócio no fim dos anos 90, “ganhando uma licitação” para a operação de uma rede de telefonia móvel, a Unitel.

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Outra coincidência é que pai José, assim como pai Lula, perdoou os inimigos do passado. Hoje é umbilicalmente associado com os antigos colonizadores que combateu. Isabel não é menos desprendida.
Ela detém participações em dois bancos portugueses, o BIC e o BPI e uma participação indireta na Galp, um grupo do setor energético com interesses em vários países, de Moçambique à Venezuela. “Nada a ver com a Sonangol, a estatal angolana de petróleo“, é claro. Tudo é recompensa daquele seu talento nato…

Finalmente, Isabel é dona também da ZON Multimédia, um conglomerado de rádios, jornais e TVS na antiga África Portuguesa. A terceira ponta desse triângulo fecha-se também no Brasil.

A ZON chamava-se PT Multimédia e foi desmembrada da Portugal Telecom em 2007, quando estava em curso o plano do governo socialista de José Sócrates para criar, por baixo do pano, usando testas de ferro, uma rede de imprensa simpática à sua administração a ser comprada com dinheiro surrupiado da telefônica portuguesa que deu origem à nossa Vivo.

O principal agente do golpe, denunciado antes que fosse a cabo, era Nuno Vasconcelos.

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Infiltrado na Portugal Telecom por banqueiros portugueses com ações na companhia, Nuno enriqueceu fulminantemente mas teve de vir colocar os ovos amealhados para chocar – adivinhem! – no Brasil, depois que a conspiração socialista foi denunciada e barrada em Portugal.

O plano dos banqueiros portugueses estragado pela irrefreável sede de vingança de José Sócrates contra a “imprensa golpista” local era criar uma rede de mídia (jornais, rádios e TVs) e telecomunicações em todo o “universo lusófono” (Brasil, África e Ásia).

Degredado, Nuno comprou aqui os jornais do Grupo O Dia, do Rio de Janeiro, uma licença de TV a cabo e fundou o jornal Brasil Econômico, homônimo de sua matriz portuguesa, tudo contra a lei vigente.

E, claro, a atual mulher de Jose Dirceu, Evanise Santos, vem a ser a “diretora de marketing” do “grupo” ao qual pertence o portuguesíssimo Brasil Econômico

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A ZON Multimédia, que foi praticamente roubada de dentro da Portugal Telecom, acabou, como estamos vendo agora, nas mãos da “princesa” duas vezes bilionária de Angola.

E agora o melhor: para quem não se lembra, o banco associado a todo esse esquema vem a ser o Banco Espírito Santo, agente da operação de acerto de contas de campanha entre o PT e o PTB de Roberto Jefferson que acabou resultando no escândalo do Mensalão, aquele que nem Joaquim Barbosa em pessoa consegue vingar.

Donde se conclui que a “lógica triangular” do sistema colonial português unindo por laços estreitíssimos Portugal, Brasil e Angola, uma fornecendo braços escravos para as plantações de açúcar do outro, uma história cheia de personagens fascinantes que está magistralmente contada no livro “O Trato dos Viventes”, de Luis Felipe de Alencastro (aqui), deixou rabos que se arrastam até hoje atrás da mesma raça de ratazanas de sempre.

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05 de abril de 2013
vespeiro

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