"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 2 de abril de 2013

FAXINA URGENTE

 

Diversos países, que formam uma companhia não muito lisonjeira, têm a tradição de, digamos assim, privatizar o Estado. Funções públicas que exigiriam concurso sério e imparcial são entregues a amigos dos poderosos, com resultados que, pode-se dizer sem exagero, oscilam, com raras exceções, entre a incompetência e coisas piores.

Um dos exemplos brasileiros desse sistema obviamente inadequado reside na escolha dos titulares de cartórios privados. São privados, mas têm função obviamente pública. Com óbvios e indispensáveis motivos, eles devem ser preenchidos por concurso. Mas só descobrimos isso com a Constituição de 1988 — em mais uma das muitas provas, obviamente lógicas e indispensáveis, de que as suas prerrogativas e obrigações estão na área dos serviços públicos.

A Constituição criou o concurso — mas até hoje não eliminou inteiramente, longe disso, os chamados cartórios biônicos: seus titulares herdaram a boca rica de parentes e amigos, como se fossem bens particulares.

Faixa em defesa da realização de concurso público para os cartórios
Foto: Débora Santos / G1


E, para piorar a situação, a exigência do concurso público é objeto de uma guerra ainda indefinida. Em 2010, o Conselho Nacional de Justiça declarou vagos mais de 5.500 cartórios (um terço do total). Deveriam ser preenchidos por concurso — solução mais do que óbvia —, o que não impediu uma guerrilha nos tribunais contra os concursos.

A briga ainda não acabou: a situação está indefinida em mais de 16% dos cartórios brasileiros. É, com certeza, um número muito alto: não é exagero considerar que há uma crise no sistema, prejudicando a eficiência da Justiça.

Um dado que agrava a situação está na falta de informações sobre a situação dos cartórios privados: eles se recusam a informar o faturamento anual nem abrem os seus livros de atos — dois sinais de que o negócio é altamente lucrativo.

A situação pode melhorar — ou pelo menos ficar mais clara — com uma ofensiva do CNJ sobre esse sigilo, e também outras formas de agir dos cartórios.
Também é positiva a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, impondo a necessidade de concurso público para cargos nos cartórios.
Não é uma simples mudança de caráter burocrático, e sim uma medida destinada a limpar a área. Uma operação de limpeza obviamente e tristemente necessária.

02 de abril de 2013
Luiz Garcia

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