PT teme que o governo Dilma tenha posto seu projeto político em risco
Em desastres ferroviários de verdade, a atribuição de culpa tende a ser mais simples. No terrível acidente ocorrido na Espanha, na semana passada, não foi nem preciso investigação mais profunda. Numa curva em que o trem não deveria ter entrado a mais 80 km por hora, o maquinista se permitiu conduzir a composição a 190 km por hora. Mas, na análise que aqui se faz, o descarrilamento é só uma metáfora. Apontar culpados já não é tão simples.
A dedução fácil, com livre trânsito no PT, é a que a culpa é do governo Dilma. A narrativa um tanto superficial é que tudo vinha excepcionalmente bem até 2010, quando o PIB chegou a crescer nada menos que 7,5%. A partir daí, as coisas começaram a desandar.
O novo governo acabou metendo os pés pelas mãos e não conseguiu manter o dinamismo da economia. O PIB cresceu apenas 2,7% em 2011 e míseros 0,9% em 2012. E, em 2013, talvez não cresça o suficiente para que a taxa média anual de crescimento do triênio 2011-2013 chegue a 2%.
Essa narrativa omite parte importante da história. Para começar, ao se permitir entrar na curva do ano eleitoral de 2010 com o PIB crescendo à irresponsável taxa de 7,5% ao ano, Lula legou um problema de estabilização espinhoso à sucessora. Problema que seria agravado, é verdade, pela fantasia do novo governo sobre a desaceleração do crescimento que se fazia necessária.
03 de agosto de 2013
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio. O Globo
Montagem sobre foto de Edu Andrade/Fatopress/Estadão
O PT anda alvoroçado com as dificuldades da economia e a queda de popularidade da presidente Dilma Rousseff. Teme que o projeto de poder do partido esteja prestes a descarrilar e que os acontecimentos dos últimos dois meses sejam só o início, em câmara lenta, de um acidente ferroviário de grandes proporções. E está em busca de culpados.
A quem culpar pelo possível malogro de um projeto de poder que, até há pouco tempo, parecia tão promissor?
O PT anda alvoroçado com as dificuldades da economia e a queda de popularidade da presidente Dilma Rousseff. Teme que o projeto de poder do partido esteja prestes a descarrilar e que os acontecimentos dos últimos dois meses sejam só o início, em câmara lenta, de um acidente ferroviário de grandes proporções. E está em busca de culpados.
A quem culpar pelo possível malogro de um projeto de poder que, até há pouco tempo, parecia tão promissor?
Em desastres ferroviários de verdade, a atribuição de culpa tende a ser mais simples. No terrível acidente ocorrido na Espanha, na semana passada, não foi nem preciso investigação mais profunda. Numa curva em que o trem não deveria ter entrado a mais 80 km por hora, o maquinista se permitiu conduzir a composição a 190 km por hora. Mas, na análise que aqui se faz, o descarrilamento é só uma metáfora. Apontar culpados já não é tão simples.
A dedução fácil, com livre trânsito no PT, é a que a culpa é do governo Dilma. A narrativa um tanto superficial é que tudo vinha excepcionalmente bem até 2010, quando o PIB chegou a crescer nada menos que 7,5%. A partir daí, as coisas começaram a desandar.
O novo governo acabou metendo os pés pelas mãos e não conseguiu manter o dinamismo da economia. O PIB cresceu apenas 2,7% em 2011 e míseros 0,9% em 2012. E, em 2013, talvez não cresça o suficiente para que a taxa média anual de crescimento do triênio 2011-2013 chegue a 2%.
Essa narrativa omite parte importante da história. Para começar, ao se permitir entrar na curva do ano eleitoral de 2010 com o PIB crescendo à irresponsável taxa de 7,5% ao ano, Lula legou um problema de estabilização espinhoso à sucessora. Problema que seria agravado, é verdade, pela fantasia do novo governo sobre a desaceleração do crescimento que se fazia necessária.
O que se anunciava no início de 2011 é que a economia passaria a manter uma expansão “mais moderada” da ordem de 5 ou 6% ao ano.
Levaria algum tempo para que o novo governo percebesse que a economia estava restrita pela expansão da oferta. Mas é importante ter em conta que boa parte das dificuldades enfrentadas pelo governo Dilma, para deslanchar investimentos e tentar remover restrições ao crescimento pelo lado da oferta, decorreram de heranças do governo anterior.
A corrupção em órgãos como o Dnit, para a qual o governo vinha fazendo vista grossa em nome da coesão da base aliada, acabou fugindo ao controle e exigindo desmantelamento de boa parte da cadeia de comando que acionava os programas de investimento público. E a verdade é que, até hoje, apesar de todos os PACs, o governo não conseguiu fazer o investimento público deslanchar.
A exploração do pré-sal — a melhor oportunidade de investimento com que o País contava — ficou entravada por regulamentação impensada, que alijou investidores privados, acirrou inoportuna disputa federativa pela receita de royalties e sobrecarregou a Petrobras com exigências de investimento absurdas, num momento que a empresa já vinha sendo mal gerida e fragilizada pelo controle de preços.
Veio também do governo anterior a resistência a investimentos privados em infraestrutura, que pudessem sugerir contemporização com a ideia de privatização. Muito tempo foi perdido até que o novo governo se rendesse às evidências e, afinal, aceitasse licitar concessões para tentar dinamizar investimentos na área de transporte.
Não é verdade, portanto, que tudo vinha muito bem até 2010. Muitas das dificuldades que redundaram na crise atual provêm do governo anterior.
Levaria algum tempo para que o novo governo percebesse que a economia estava restrita pela expansão da oferta. Mas é importante ter em conta que boa parte das dificuldades enfrentadas pelo governo Dilma, para deslanchar investimentos e tentar remover restrições ao crescimento pelo lado da oferta, decorreram de heranças do governo anterior.
A corrupção em órgãos como o Dnit, para a qual o governo vinha fazendo vista grossa em nome da coesão da base aliada, acabou fugindo ao controle e exigindo desmantelamento de boa parte da cadeia de comando que acionava os programas de investimento público. E a verdade é que, até hoje, apesar de todos os PACs, o governo não conseguiu fazer o investimento público deslanchar.
A exploração do pré-sal — a melhor oportunidade de investimento com que o País contava — ficou entravada por regulamentação impensada, que alijou investidores privados, acirrou inoportuna disputa federativa pela receita de royalties e sobrecarregou a Petrobras com exigências de investimento absurdas, num momento que a empresa já vinha sendo mal gerida e fragilizada pelo controle de preços.
Veio também do governo anterior a resistência a investimentos privados em infraestrutura, que pudessem sugerir contemporização com a ideia de privatização. Muito tempo foi perdido até que o novo governo se rendesse às evidências e, afinal, aceitasse licitar concessões para tentar dinamizar investimentos na área de transporte.
Não é verdade, portanto, que tudo vinha muito bem até 2010. Muitas das dificuldades que redundaram na crise atual provêm do governo anterior.
E isso deveria atenuar a culpa que o PT tenta atribuir ao governo Dilma. Mas, é importante notar, em nada atenua a culpa que pode ser atribuída a Dilma Rousseff. Como esclareceu a presidente, na entrevista de 28/7 à “Folha de S.Paulo”, ela e Lula são “indissociáveis”. “Eu estou misturada com o governo dele total. Nós ficamos juntos todos os santos dias, do dia 21 de junho de 2005 [quando ela assumiu a Casa Civil] até ele sair do governo.”
Não poderia ter sido mais clara.
Não poderia ter sido mais clara.
03 de agosto de 2013
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio. O Globo
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