"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 27 de outubro de 2012

SUPREMO: A REPERCUSSÃO DE UM JULGAMENTO EM RELAÇÃO AO PAÍS

 

O desfecho do julgamento do Supremo Tribunal Federal no caso do mensalão, Ação Penal 470, mobilizou o país, sensibilizou a opinião pública, mesmo que a maioria não veja no episódio, como é natural, motivos para festejar.



Afinal de contas, a rigor, condenações não se festejam. Lamentam-se. Mas no lamento inevitável, e interior da sociedade, projeta-se a surpresa de que tudo não acabou em pizza.

Ministros e ministras nomeados por Lula e pela presidente Dilma votaram pela condenação de personagens que integraram o governo lulista. Revelaram assim independência. Deixaram assinalado que a nomeação para a Corte Suprema é um reconhecimento, não um favor. E a gratidão da escolha não influiu e direcionou a consciência do voto de cada um. Houve ampla margem de votos para condenações como as de Marcos Valério e Delúbio Soares.
Outras mais apertadas. Mas o Supremo decidiu. Ninguém pode afirmar que o julgamento terminou num prato de pizza, com fatias divididas entre os réus apontados pelo Ministério Público e cuja peça acusatória acolhida pelo ministro Joaquim Barbosa, escolhido relator.

O relator acolheu a denuncia, melhor dizendo as denúncias em 2007. Cinco anos se passaram. A força da verdade prevaleceu. Aliás, prevalece sempre nos patamares mais altos dos Poderes.
A população nota pouco essa verdade, desfocada no tempo por tantas impunidades, sobretudo no plano econômico. Porém basta recuar no tempo, rodar o filme da história política brasileira desde agosto de 54, governo constitucional de Vargas, para que se descortinem as consequências.

O atentado da rua Toneleros causou a queda do governo com a morte do presidente. No ano seguinte, dois movimentos militares, 11 e 21 de novembro, asseguraram a posse de Juscelino em janeiro de 56, cumprindo-se assim a vontade das urnas. Naquela ocasião, o Supremo Tribunal Federal, acompanhando voto magistral do ministro Nelson Hungria forneceu substância jurídica aos dois movimentos político militares.

Em 61, Jânio Quadros, eleito em outubro de 60, renunciou ao mandato. Houve forte crise, mas o vice João Goulart assumiu. Não controlou as forças que o apoiavam, perdendo o rumo político e o equilíbrio que lhe era essencial.
Resultado: a ordem constitucional foi rompida em 64 e o país mergulhou numa noite de arbítrio que se estendeu por 21 anos. As diretas já e a vitória de Tancredo Neves no colégio eleitoral retomaram a avenida democrática da liberdade.

Observa-se, a rigor, que todos esses episódios de alto porte nunca terminaram em pizza. Agora, em 2012, o Supremo não condenou somente os personagens principais dos acontecimentos de 2003.
De fato condenou a impunidade, o conceito de que para poderosos nada dá em nada. Condenou a pizza como princípio, a pizzaria como um fim em si mesmo. As penas destinadas a cada um importam menos do que a abrangência da matéria julgada pelo STF. A sociedade se fez ouvir.

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