"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 21 de abril de 2013

MALDIÇÃO DA ILUSÃO


Foi Celso Furtado quem primeiro chamou atenção para a ideia da “maldição do petróleo”, a fim de explicar o atraso de países, um deles a Venezuela, cuja riqueza natural fez abandonar sua capacidade tecnológica e produtiva.
O Brasil, mesmo sem ser exportador de petróleo, tem sofrido desta maldição ao longo de nossa história. Acostumamos-nos com orgulho, de sermos uma terra onde “em se plantando tudo nela dá”, sem a necessidade de inventar produtos, tecnologias, aumentar produtividade, nem competitividade industrial.
Para crescer, bastava ampliar a fronteira agrícola, substituindo florestas por plantações de cana, algodão, café e soja, ou explorar ouro e prata. Não havia necessidade de inovação tecnológica e de poupança porque podíamos explorar a terra, como outros países faziam com o petróleo.
Esta é a principal razão que explica porque somos a 6ªeconomia mundial, mesmo sendo um país tão atrasado em educação, ciência e tecnologia. Por quase 400 anos de nossa história bastava colocar enxadas nas mãos dos escravos, depois bastava treinar operários no manuseio de máquinas.
Não precisávamos criar nem inventar máquinas e produtos de nossa indústria porque eles eram inventados e criados no exterior. Não foi necessário gastar dinheiro em educação, usávamos a educação dos países que por falta de recursos naturais eram obrigados a desenvolver conhecimento.
Chegado o século XXI, quando a grande riqueza já não é a terra, mas os cérebros, percebemos o desastre dessa opção de nossa história. Temos uma sociedade violenta, ineficiente, dependente como nunca antes, sobretudo, por falta do capital conhecimento.
Mas ao invés de despertarmos para a necessidade de assegurarmos educação de qualidade, e qualidade igual para todos, estamos caindo na ideia de que faremos isto quando o petróleo do Pré-Sal nos oferecer os recursos necessários.
Para reservar cem por cento dos royalties do petróleo para a educação de base, sou autor, junto com o ex-senador Tasso Jereissati, do primeiro projeto de lei com esta ideia. O projeto foi arquivado e agora reapresentado com o senador Aloysio Nunes. Mas esta alternativa acomoda a opinião pública e as lideranças a espera de uma renda futura, insuficiente para provocar o salto educacional que precisamos.
A revolução científica e tecnológica que ocorre no mundo exige que o Brasil rompa com a ideia do “em se plantando tudo nela dá”para a ideia de que “em se aprendendo nela tudo se cria”. Isto exige iniciar, desde já, a necessária revolução educacional que o país precisa.
Mesmo assim, ouve-se o acomodamento geral de que é preciso esperar pelo Pré-Sal. Pior do que outros países, que caíram na maldição do petróleo. Estamos caindo na maldição da ilusão de um petróleo ainda escondido nas profundezas do mar como a solução para a nossa crítica e vergonhosa situação educacional. Até aqui fomos vítimas da maldição dos recursos abundantes, agora estamos sendo vítimas da maldição de uma ilusão.

21 de abril de 2013
Cristovam Buarque é Professor da UnB e Senador pelo PDT-DF. Originalmente publicado em O Globo em 20 de abril de 2013.

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