"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 14 de janeiro de 2012

HISTÓRIAS DO SEBASTIÃO NERY

Eu, o historiador e Sarney

Na Tribuna da Imprensa, em 2008, o “historiador e analista político” Said Barbosa Dib dizia que “a persistência de Sarney em defender a cláusula democrática como critério para o ingresso no Mercosul se justificava pela vida do ex-presidente: são 52 anos de vida pública sempre comprometida com as liberdades democráticas” (sic). E citava três fatos inexistentes e estrambóticos.

1 – “Como udenista bossa-novista (sic), já havia participado (sic) da luta contra a ditadura Vargas, mais sanguinária do que a dos militares“.

Errado. Sarney nasceu em 1930. A ditadura Vargas acabou em 1945, quando a UDN surgiu, e Sarney era um fedelho de ginasial. A “Bossa-Nova” da UDN só iria ser criada no congresso da UDN em Recife, em abril de 1961, três meses depois da posse de Janio, pelos deputados Seixas Doria (de Sergipe), José Sarney (do Maranhão), Ferro Costa (do Pará), Adahil Barreto (do Ceará) e José Aparecido (ainda não deputado, só iria eleger-se em 62), que organizaram um grupo para apoiar as propostas “nacionalistas, reformistas e de interesse popular” de Janio, contra o grupo conservador “Banda de Música”, liderado pelo deputado Herbert Levy (de São Paulo). No fim, fizeram uma composição: Levy foi eleito presidente da UDN e Sarney vice.

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SAID DIB

2 – “Único governador (sic) que ousou criticar (sic) o golpe de 64“.

Errado. Em 64, Sarney ainda não era governador, apoiou o golpe (enquanto seus companheiros de fundação da Bossa-Nova foram todos cassados: Seixas, Ferro, Aparecido e Adahil – este já no PTB). Em 65, Sarney elegeu-se governador, ajudado pelo general Castelo Branco, que mandou o coronel João Figueiredo, do SNI, para participar da campanha de Sarney lá.

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UM SARNEY

3 – “Durante o governo Geisel, Sarney ajudou (sic) o presidente a quebrar as resistências (sic) da `linha-dura’ e de seu próprio partido, a Arena, contra o processo de distensão política“.

Errado. Em setembro de 73, a Arena homologou para presidente o nome de Geisel, que só assumiu em março de 74. Sarney fez tudo para Geisel nomeá-lo de novo governador e não conseguiu. Geisel sabia muito bem quem era Sarney e o que ele pensava. No dia 30 de dezembro de 73, com Geisel já escolhido presidente, o jornal “Estado do Maranhão”, de Sarney, republicou, na primeira página, uma entrevista de Sarney dada na véspera ao “Globo”:

“Sarney: a abertura só virá com a expansão (sic) do sistema“. “O senador Sarney, da Arena do Maranhão, advertiu que qualquer outra espécie de abertura que não seja a expansão (sic) do sistema é cair no irrealismo, na falta de objetividade“.

“Sistema” era o regime militar, a ditadura. Defendendo a “expansão do “sistema”, Sarney defendia a ampliação, o endurecimento do regime, da ditadura, mais ainda do que no governo Medici, o que era exatamente a posição da “linha dura”, que tinha sido derrotada com a escolha de Geisel.

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OUTRO SARNEY

4 – O “historiador” (sic) Said estava inteiramente certo é quando dizia que “assumindo a presidência (em 85), Sarney soube garantir o delicado processo de redemocratização pós-regime militar, acabando com o entulho autoritário, convocando a Constituinte, legalizando partidos clandestinos e garantindo liberdades essenciais, como a da imprensa e a sindical”.

São dois Sarney. O da ditadura e o da democracia. O da ditadura achava pouco e queria mais. O da democracia passou Kaol no seu nome para a História.

14 de janeiro de 2012
sebastião nery

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