"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 18 de fevereiro de 2012

OS CABIDES DA DESONRA

Como todos sabemos, os patrunfos, uma vez eleitos, tratam logo de arranjar uma boquinha para seus parentes, e vai a família inteira, os filhos dos financiadores de campanha, cujos interesses serão protegidos cuidadosamente durante o mandato, a seguir a amante e seu primo, quando não algum amiguinho sigiloso da moça, depois os cabos eleitorais, e por aí vai.

O roteiro é tão antigo quanto dramático. Você tem 19 anos e está se matando de estudar para aquele concurso de dois salários-mínimos, para poder largar o empreguinho que tem e ajudar mais na renda da família. Permite-se uma descansadinha no sábado, e casualmente é sábado à noite e você está defronte ao bar na avenida principal da cidade, bebericando e conversando com os amigos, de a pé, com roupas comuns, sapatos comuns, bolsos demasiadamente comuns, e eis que de repente chega aquele antigo colega de aula, estacionando um conversível novinho em folha. Todo alegrão, roupas lindas, perfume caro, um artista de cinema.
Logo mais no baile será o centro das atenções, quase todas as moças lhe lançarão olhares esperançosos. O quase vai por conta das suas ilusões, "aquela" de quem você gosta não, nunca. Nunca se sabe. Você se retira, ao tempo em que o sujeito é cercado por muitos conterrâneos, estes demonstrando felicidade em abraçar o "amigo", os coitados também anseiam por uma beirada na estatal. Logo, logo, o patrunfinho, pela força do dinheiro mal havido, também comprará um mandato. É o patrunfo do amanhã.

Tudo muito normal, uma vez que a prática é secular. Qual é mesmo a profissão do zé-bonito, tão novinho e já tão bem-sucedido? Acertou. Sim, parente de político. Tem um excelente salário para bater o ponto, quando bate - do mesmo modo que era esporádica visita no colégio -, mais mordomias, assistência médica de primeiro mundo, numa empresa sustentada com o sangue dos pés-de-chinelos.

É por estas e outras, caros amigos, que volta e meia dá vontade de pegar um pedaço de pau e incendiar o circo, com os ladrões, canalhas e hipócritas lá dentro. Sentimo-nos desonrados, junto com a nossa cidade, nosso estado e nosso país, vendo salários minguados, a fome, a falta de escolas, a falta de tudo. O sentimento de desonra, de revolta, é nosso, exclusivamente nosso.

Os patrunfos não sabem o que é honra nem vergonha. São mentirosos e covardes diante da vida.

SALITO

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