"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 9 de março de 2012

FIM DA PICADA!

Eis o Brasil: ou segue a lei e se torna ingovernável, ou se ignora a lei para governá-lo!

O Supremo Tribunal Federal acabou sendo protagonista ontem — ainda que não lhe restasse outro papel — de um vexame que há de entrar para a história. Um dia depois de ter declarado inconstitucional a MP que criou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, teve de voltar atrás. O que tinha determinado a primeira decisão e o que determinou a segunda? Vamos lá.

Desde a aprovação da Emenda Constituição nº 32, em 2001, o Parágrafo 9º do Artigo 62 da Constituição ganhou esta redação:
§ 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.

O texto poderia ser mais claro? Acho que não! Ocorre que, desde 2001, a Constituição é simplesmente ignorada, e não há comissão mista nenhuma para avaliar as MPs. Se aquela que criou o Instituo Chico Mendes teve uma tramitação inconstitucional e está sem validade, todas as outras que a antecederam, de 2001 a esta data, também - mais de 500. Hoje, há 50 tramitando no Congresso que simplesmente não obedeceram a essa determinação. Restou ao Supremo voltar atrás no caso específico e decidir, então, que o que vai na Carta Magna só vale a partir de agora. As novas Medidas Provisórias precisarão passar pela tal comissão.

Problema resolvido? Não sei! Digam-me aqui: qual é a função de um tribunal constitucional? É fazer valer a Constituição. Existe a possibilidade, mesmo com a decisão de hoje, de o tribunal ser inundado por ações de pessoas, empresas, grupos e entidades que se sentiram lesados por MPs que, a rigor, não valem?? Existe.

O tribunal certamente dará um jeito de encontrar uma saída em nome da paz social, já que é impensável declarar a invalidade de mais de 500 MPs. Corresponderia a jogar o país na anomia. Nos últimos 17 anos, as Medidas Provisórias deram o tom da governança no país. De 2001 para cá, a tramitação de todas elas feriu a Carta. Vejam que coisa: fôssemos seguir a Constituição, todas elas deveriam ser declaradas sem efeito; se forem, o país se torna ingovernável.

Há algo de profundamente errado num país que se tornaria ingovernável caso seguisse a letra da lei. Assim, coube à nossa Corte Constitucional decidir contra a Constituição.

09 de março de 2012
Reinaldo Azevedo

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