"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 22 de abril de 2012

TROCA VIOLENTA DO REGIME NA SÍRIA FOI PLANEJADA HÁ MUITO TEMPO

A 13 de março eu reportei sobre o êxodo de jornalistas do Al-Jazeera por causa da abordagem unilateral da emissora. Agora, um desses jornalistas esclarece em uma entrevista à Real News Network, porque ele pediu demissão.

Ali Hashem disse que poucas semanas após o início das demonstrações na Síria há um ano, ele foi com sua equipe de filmagem até a fronteira entre Síria e Líbano e filmou como grupos fortemente armados se reuniam e operavam além da fronteira. Eles portavam Kalashinikows, granadas e morteiros e estavam dispostos a lutar com o exército sírio. Isso mostra que a troca de regime na Síria estava planejada há muito tempo.


Repórter Ali Hashem denuncia unilateralidade da Al-Jazeera

O grupo armado era composto de pessoas do Líbano e também da Síria. Ele forneceu o material da filmagem sobre estes intrusos armados à central da Al-Jazeera em Doha, Qatar, mas a emissora se recusou a mostrar as cenas. Era maio na época e eles exibiam apenas imagens de demonstrantes pacíficos que entravam em conflito com as forças de segurança da Síria. Diante de suas repetidas reclamações, por que Al-Jazeera não mostrava a invasão de rebeldes armados além das fronteiras, nada foi comentado.

Ele disse que de uma emissora que até há um ano exibia ambos os lados de um conflito, Al-Jazeera se transformou em um representante da política do governo do Qatar, que age intensamente contra Assad e faz propaganda apenas para os rebeldes. Na verdade esta mudança nas reportagens já começara com a guerra na Líbia, onde Al-Jazeera defendia apenas o lado dos rebeldes de Benghazi e não dava espaço para declarações do regime de Kaddafi.

Ali Hashem acredita que com isso, acabou a credibilidade da Al-Jazeera no mundo árabe e a emissora cometeu suicídio. Os telespectadores reconheceram côo negativa a mudança de postura da emissora. Não são os jornalistas que fizeram isso, mas sim os proprietários da emissora, os quais ditaram aquilo que seria ou não transmitido, ou seja, apenas aquilo que queria a família suprema do Qatar do Xeique Hamad bin Chalifa Al Thani, proprietária da Qatar Media Corporation.

Ali Hashem trabalhou anteriormente para a BBC e Manar TV e julgava a si próprio como um profissional que não podia conciliar tal forma de trabalho com seu ethos jornalístico. Na primavera de 2011 todos comentavam sobre uma mudança pacífica do regime na Síria, mas agora eles viram muitos rebeldes armados na fronteira e pensaram que isso é uma matéria única, a emissora vai fazer de tudo para publicá-la imediatamente. Mas lhe foi ordenado retornar a Beirute e as gravações nunca foram exibidas pela Al-Jazeera.

Ele tentou então solucionar a situação com a central e lhes explicar que ele tinha um problema de credibilidade. Ele tentou o melhor que pode e uma moderadora bastante querida lhe disse em Doha, que ela teria sido afastada das câmeras e eles fariam isso imediatamente, porque ela começou a questionar a unilateralidade dos noticiários. Durante este período, os emails da Al-Jazeera foram furtados por hackers e através tornou-se conhecido o diálogo entre ele e a central. As divergências de opiniões foram citadas na TV síria e apareceu um artigo na imprensa árabe:

Diante da pergunta se ele sabia como as armas foram parar nas mãos dos rebeldes, ele afirmou:

“Eu não pude identificar que realmente forneceu as armas, mas nós vimos homens armados que atravessaram o rio que separa a Síria do Líbano. Eles ultrapassaram esta barreira, foram até a Síria e lutaram contra o exército sírio. Isto foi em maio. Algo semelhante já tinha acontecido em abril, mas nós não tínhamos gravado. Nesta ocasião, nós éramos a única emissora de notícias na fronteira e queríamos ver o que estava acontecendo por lá”.

Ali Hashem disse,
“os protestos começaram de forma pacífica, mas transformaram-se rapidamente em um conflito armado. Algumas facções externas queriam militarizar a revolução e eles queriam confrontar Assad com as armas. Se esta revolução tivesse permanecido pacífica, talvez ela tivesse alcançado muito mais”, acredita Ali.

“Eu vi com meus próprios olhos, um mês após o início da revolução, muitas armas, pessoas com morteiros, pessoas com Kalaschnikows, que atravessaram a fronteira. Não eram um ou dois, mas uma verdadeira multidão, eles lotaram todo um vilarejo próximo à fronteira. A militarização da revolução começou muito cedo, eles queriam derrubar Assad o mais rápido possível”.

Quer dizer, o protesto na Síria foi quase desde seu início militarizado pelo estrangeiro e aquilo que eles nos dizem, os rebeldes se armaram bem depois, ao longo do outono, como uma reação desesperada diante da violência de Assad, não é verdade. Ao mesmo tempo, através da omissão das imagens dos grupos rebeldes armados atravessando a fronteira, eles queriam manter por mais tempo possível diante da opinião pública mundial aquelas imagens de demonstrantes pacíficos, que eram massacrados pelas “hordas de Assad”, e com isso conquistar a simpatia. Eles também conseguiram isto.

“O problema como jornalista é que, quando não se é respeitado e exigi-se que se faça algo conforme a cartilha do proprietário da emissora, isso é um grande problema para todo jornalista”, disse Ali. “Nenhuma governo promove o bem-estar, caso um governo pague uma emissora. Eu respeito meus colegas na Al-Jazeera, eles são profissionais e eles não são o problema. O problema está nos financiadores e estes são os qatarenses”.

A família dominante do Qatar era neutra antigamente e promovia uma política de “sem inimigos”. Eles eram amigos de todos os governos da região, seja o Irã, Israel ou também a Síria. Mas desde a primavera árabe, seu posicionamento se alterou completamente. Algo deve ter-lhe influenciado. Este apoio unilateral aos respectivos rebeldes para depor os regimes na Líbia e Síria, se consolidou como linha editorial da Al-Jazeera.

Quando Ali Hashem afirma que viu, já em abril de 2011, colunas de rebeldes armados invadindo as fronteiras sírias, então a preparação disto deve ter acontecido anteriormente há meses, ou seja, já no outono de 2010. Christoph Hörstel e eu defendemos a opinião de que a violenta “mudança de regime” na Síria foi planejada há muito tempo. As assim chamadas demonstrações pacíficas foram encenadas para motivar a já preparada luta armada, pois eles sabiam que as forças de segurança da Síria reagiriam duramente.

Nós também somos da opinião de que a mudança de comportamento do Qatar também tem alguma relação, Washington deve estar apontando a pistola no coração do clã governante. Ou vocês participam da mudança violenta da Líbia e Síria, incluindo aqui sua emissora Al-Jazeera como instrumento de manipulação, ou vocês mesmos irão vivenciar uma “primavera árabe” e assim perder o poder. Confrontados com essas opções, eles decidiram cooperar.

“Nós lhes faremos uma oferta que vocês não podem recusar. Ou vocês nos ajudam a incendiar as casas dos outros, ou nós vamos tocar fogo na sua casa!”


22 de abril de 2012
Alles Schall und Rauch,  21/03/2012.

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