"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 25 de abril de 2012

UMA COMISSÃO, UM CÓDIGO E UMA PIADA DE MAU GOSTO


Acontecem no Brasil certas coisas que soariam como uma piada de mau gosto em países considerados mais sérios ou mais evoluídos socialmente. Especialmente em matéria de legislação criminal, nosso país possui um emaranhado complexo, ineficiente e estranhamente favorável ao crime de leis que nos transformou no paraíso internacional da bandidagem. Sejam estrangeiros foragidos ou nativos espertinhos, a legislação brasileira é fonte de refúgio, impunidade e fomento para qualquer mente criminosa.


Menores podem matar, estuprar e cometer crimes com os mais variados requintes de crueldade e saem impunes, sem sequer poderem ser algemados. Verdadeiras bestas-feras são tratados como anjinhos caídos e têm garantidas comida grátis e abrigo até que possam cometer mais crimes.


Chovem casos de psicopatas mirins que possuem mais mortes nas costas do que os maiores traficantes do país e causam temor até em bandidos calejados. Com a legislação na ponta da língua, assassinos cruéis, ao atingirem a maioridade recrutam seus próprios exércitos mirins para perpetrarem o caos e a violência e continuar gozando da impunidade total. Mesmo assim, a legislação que rege as infrações cometidas por menores reina incólume.


Ao mesmo tempo, adultos assaltantes e homicidas contumazes matam com igual impunidade embalados por penas risíveis e um mar de direitos processuais que faria inveja a sociedades futuristas do século XXX, mas que no presente apenas servem para dar alegria aos criminosos.


Se você não tem antecedentes criminais; lhe é concedido pelo Estado brasileiro o direito automático de matar. Seja uma ou cem vítimas, desde que feitas em sequência, seu crime será julgado e apenado ridiculamente para – depois de uma enxurrada de recursos – talvez levar você a ser preso dez ou doze anos depois do crime cometido. Mesmo assim, você pode ter a sorte de já estar velho ou doente para ganhar um dos inúmeros indultos disponíveis que o mandarão para casa cumprir sua “pena” em prisão domiciliar.


E mesmo que venha a ser trancafiado; bastará se manter bem comportado ou arrumar algo para fazer na cadeia, que os tais “trinta anos” se limitarão a uma pena de cinco anos no máximo (um sexto).
Isso tudo (é claro) se você der o azar de ter cometido um dos 3% dos crimes que são elucidados pela polícia brasileira.


Se o seu crime for do tipo “de colarinho branco”, a coisa é mais fácil ainda. Roube milhões e milhões (e cause a morte de milhares de pessoas como o desvio de verbas da saúde, por exemplo), pois as chances de que vá para a cadeia são remotíssimas.
Caso um grande clamor popular se forme e você seja apanhado pelos braços da lei; sua pena efetiva não passará dos quatro anos e, mesmo que seja encarcerado, os milhões roubados estarão te esperando na saída (e antes; pagarão por privilégios na prisão).


Diante de tal quadro, único responsável pela banalização da violência em nosso país e pelas mortes sem sentido cometidas por verdadeiros animais, que vagam soltos pelas cidades brasileiras, resolveu-se criar uma comissão de juristas para mudar o código penal que, segundo os críticos, era “de 1940” e não surtia mais o efeito coercitivo desejado.


A tal comissão, formada por juristas que ninguém conhece e cujo trabalho não vislumbrou ouvir a vontade popular, vem soltando aqui e ali suas “ideias maravilhosas” para mudar a cara da impunidade no Brasil através da reformulação do código penal.


Infelizmente, os mesmos erros cometidos na elaboração e promulgação da Constituição de 1988 estão presentes no pensamento dessa comissão. Na ocasião, figuras tarimbadas da política e do direito nacional, chegaram à conclusão que a Constituição trazia “direitos demais” que poderiam provocar dificuldades na aplicação da lei penal.
Isso porque, contaminados pela “síndrome do preso político”, os legisladores acabaram sendo benevolentes demais com os criminosos comuns.


Assim, de lá para cá, toda sorte de artifícios legais foram criados para dificultar ao máximo a prisão de cidadãos e a expropriação de bens pelo Estado.
Chegou-se ao cúmulo de proibir as polícias de algemar presos. De instrumento de proteção para o policial e para o próprio criminoso (pois, diante da possibilidade de prisão, mesmo o mais calmo estelionatário pode tentar a fuga ou o suicídio) as algemas se transformaram em vilãs e símbolo da “crueldade do Estado”.
Quando, na verdade, deveriam ser usadas em qualquer prisão.


A esperança de modificações sérias, prometida pela tal comissão, cai por terra diante do que vem sendo anunciado como “proposta de mudança”.
A criminalização do enriquecimento ilícito é uma grande conquista. Contudo, as penas propostas para “punir” o crime transformam em piada essa “conquista”. “Punir” quem fica rico cometendo crimes com penas que vão de um a cinco anos é uma fantasia.
Sabemos que penas de até dois anos jamais são revertidas em aprisionamento. Elas se transformam em “cestas básicas” ou “serviços à comunidade”.
Mesmo que condenados aos cinco anos de cadeia, o “bom comportamento” reverterá isso para poucos meses ou a condenação será um “pequeno incômodo” que permitirá ao criminoso curtir os seus milhões depois de “pagar sua dívida com a sociedade”.


Exatamente a mesma coisa acontece com a proposta de mudança para os crimes hediondos. A concessão de condicional, que hoje se dá com um sexto da pena cumprido, mudará para um terço. Isso é muito pouco para punir alguém por tirar uma vida. Pois, se condenado ao máximo de nossa legislação (os tais trinta anos); bastará cumprir dez anos ao invés de cinco. Quando o correto seria exigir um mínimo de dois terços (no caso 20 anos) e a avaliação caso a caso por uma junta de condicional composta por membros do judiciário, psiquiatras, psicólogos e familiares da vítima (que teria peso maior na decisão).


Equipar e capacitar as polícias para que elucidem o maior número possível de crimes; endurecer as penas e garantir que os condenados as cumpram pelo maior tempo possível são a única forma de acabar com a impunidade e garantir para nossa sociedade um futuro mais pacífico e onde a vida humana tenha mais valor do que um par de tênis, um carro ou vinte “pratas”.
E você, o que pensa disso?

25 de abril de 2012
visão panorâmica

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