"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 3 de junho de 2012

HISTÓRIAS DO JORNALISTA SEBASTIÃO NERY

UM FUNCIONÁRIO PÉ-FRIO

Cabrera, sergipano, era da Varig. Funcionário exemplar. Foi mandado para Lima, no Peru, como gerente. Chegou, assumiu, na semana seguinte caiu um avião da Varig lá, morrendo tripulantes e passageiros.
Cabrera pediu transferência. Foi nomeado gerente em Monrovia, na Libéria. Chegou, assumiu, na semana seguinte caiu um avião da Varig lá, morreu a metade dos passageiros.
A bordo estava, inclusive, o jurista Victor Russomano, que se salvou.
Cabrera ficou novamente chateado, pediu transferência. Rubem Berta, presidente da Varig, mandou chamá-lo:
- Cabrera, você é um funcionário exemplar, competente, mas está havendo coincidência demais. Assim, você agora vai ser gerente onde só haja conexões e venda de passagens e não cheguem aviões nossos.
Cabrera foi para o Paraguiai.
Um dia, a Varig inaugurou uma linha para Assunção. Antes, Cabrera foi transferido para Tóquio. Mas a Varig inaugurou sua linha para Tóquio. Cabrera foi transferido. Por segurança, na véspera.

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CONSTITUIÇÃO

Noite de 13 de dezembro de 1968. Na televisão, o ministro da Justiça Gama e Silva, jornalista, advogado, promotor, professor de Direito na USP (Universidade de São Paulo), reitor da Universidade, biministro da Justiça e da Educação e Cultura, apesar de todos esses títulos e compromissos, mandava ser lido o AI-5 (Ato Institucional nº 5), o mais fascista, indecoroso e repugnante documento da história política do País.
O palácio do Congresso, em Brasília, humilhado em conchas, iluminava as angústias nacionais. O senador e ex-ministro da Justiça Mem de Sá, da Arena do Rio Grande do Sul, chegou à sala das taquígrafas do Senado, que estavam falando alto:
- Minhas filhas, falem baixo que a Constituição está morrendo.
Só faltava o Cabrera da Varig ter assumido a agência das empresas aéreas que funciona no prédio do Congresso.

03 de junho de 2012
Sebastião Nery

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