"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 17 de junho de 2012

O CIRCO E A REALIDADE

A encenação na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira para tentar convencer o cidadão de que a investigação é séria parece mesmo coisa de profissional.
 Os parlamentares se apresentam como atores dispostos a desempenhar bem seus papéis e, ainda, alimentam a possibilidade de os depoentes se colocarem como grandes protagonistas. Tudo muito bem-ensaiado e, principalmente, combinado com o adversário.

As negativas do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), que, aparentemente, irritaram alguns parlamentares durante o depoimento de terça-feira, foram só o começo de uma historinha que termina, por agora, com uma conclusão tão óbvia quanto o desfecho de uma novela: os governadores Perillo e Agnelo Queiroz (PT-DF) não estão diretamente ligados ao esquema Cachoeira.

Todos os passos foram cuidadosamente pensados para que o roteiro da CPI tivesse força de convencimento – provocasse aquela sensação de veracidade que somente as boas tramas são capazes de despertar. Primeiro, Perillo nega tudo, se coloca na postura de vítima e não deixa seus sigilos à disposição dos parlamentares.
O PSDB se diz ofendido, aproveita para alfinetar o relator da CPI, o deputado petista mineiro Odair Cunha, que realmente não demonstra bom desempenho.

Os tucanos alegam que o relator não sabe distinguir os tratamentos que devem ser dados a uma testemunha e a um investigado. O depoimento termina sem nenhuma conclusão. E o PSDB mantém aquela postura de partido intocável, como deve ser uma sigla de oposição.

No dia seguinte, na vez do depoimento de Agnelo Queiroz, o palco muda. Agora, é o momento de o PT mostrar que é transparente. Agnelo diz que seus sigilos podem ser quebrados, porque se sente muito incomodado na condição de suspeito.

Os companheiros dele – os governistas – entram em êxtase e aplaudem a iniciativa de forma efusiva. Alguns momentos depois, aliados de Perillo anunciam que ele também aceita a quebra de seus sigilos. E, para confirmar tudo, em Goiânia, durante uma coletiva, o próprio Perillo confirma a informação.

Como não poderia deixar de ser, após cada um – tucano e petista – cumprir o seu papel, os parlamentares começam a sinalizar que a quebra dos sigilos não é necessária. Eles deixam a entender que as ligações dos dois governadores com o bicheiro Cachoeira já estavam explicadas. Mas, ainda assim, decidem pela quebra dos sigilos.

Todos começam a demonstrar uma certa satisfação, como se tivessem a certeza de que o espetáculo foi bem-recebido pelo público. Obviamente, não esperavam os gritos de “bravo” e de “mais um”, mas, certamente, avaliaram que o circo ganhou mais público do que a realidade.

17 de junho de 2012
Carla Kreefft (O Tempo)

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