"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 17 de setembro de 2012

ELEIÇÃO À VENDA

O mercado de votos que ainda assola o Brasil

 

Capa Época 748 (Foto: divulgação)


Na lista das profissões em extinção num Brasil que se moderniza, está o carroceiro. Os poucos que resistem evocam gravuras de Debret (1768-1848), o pintor francês que fez a crônica visual do Brasil Colônia. No tempo de Debret, eles transportavam tonéis de água num Rio de Janeiro onde não havia saneamento básico.
No Brasil de hoje, puxam pesadas carroças de lixo reciclável, em troca de vencimentos que raramente chegam ao salário mínimo. Na cidade mineira de Betim, município da Grande Belo Horizonte, um carroceiro ganha em média R$ 600 por mês.

Para ele, R$ 280 fazem diferença no orçamento. É essa a quantia que o candidato Carlaile Pedrosa (PSDB) paga a carroceiros em troca de apoio político – como mostra um vídeo obtido com exclusividade por ÉPOCA e que evoca, na era da urna eletrônica, o Brasil do tempo das carroças. As imagens abaixo mostram Carlaile, postulante à cadeira de prefeito de Betim, chegando de carro a um bairro pobre da cidade.

Logo depois, uma correligionária dele se encontra com carroceiros. Tira do envelope um maço de dinheiro.
Eles ficam felizes. “Só de o pagamento ser em dinheiro já tá bom demais. Da outra vez foi em cheque”, afirma um deles. “Vai ter mais 140 ou é só este?”, diz outro – e é imediatamente informado de que receberá a mesma quantia depois do pleito, caso Carlaile seja eleito. As imagens evocam, tristemente, o folclore do tempo dos coronéis, quando lavradores descalços recebiam o pé direito do sapato antes da eleição, e o pé esquerdo depois, apenas no caso de vitória do candidato.

O Rio de Janeiro de 2012, cidade que se prepara para receber uma Olimpíada e uma final da Copa do Mundo, também tem práticas eleitorais que lembram o Brasil das carroças.
Um relatório obtido com exclusividade por ÉPOCA revela como as milícias – brigadas fora da lei que vendem proteção e outros serviços em bairros pobres – cobram pedágio de candidatos que querem fazer campanha em seus “territórios”.

De acordo com a apuração comandada pelo procurador da República Maurício da Rocha Ribeiro, chefe do Ministério Público Eleitoral no Estado do Rio de Janeiro, o preço-padrão cobrado de candidatos a prefeito é R$ 10 mil, enquanto os vereadores têm de pagar R$ 4 mil.

As milícias se concentram na Zona Oeste da capital carioca e na Baixada Fluminense. As investigações partiram de um relatório do disque-denúncia – que recebeu 126 queixas de irregularidades nas eleições, 25 delas apontando envolvimento de candidatos com milícias e outras 25 com traficantes de drogas.
Nas regiões dominadas por esses traficantes, o pedágio é ainda mais caro – pode chegar a R$ 50 mil.

A reportagem de capa da edição de ÉPOCA desta semana mostra como funcionam esses currais eleitorais modernos.

17 de setembro de 2012
MARCELO ROCHA E HUDSON CORRÊA

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