"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 11 de novembro de 2012

UM BOM TRUQUE PARA FICAR MILIONÁRIO


Aproveitando artigo de José Roberto de Toledo para o Estado de ontem (aqui) volto ao tema dos meios e modos de perseguir o sonho da democracia brasileira e das oportunidades que perdemos dando lições ao Primeiro Mundo em vez de tentarmos aprender alguma coisa com ele.
 
O que ele mostrava é a relação direta entre a conquista de prefeituras pelos partidos e o número de deputados e governadores que esses partidos “fazem” nas eleições seguintes, dois anos depois, confirmados por dois estudos científicos. Um de Leandro Piquet Carneiro e Maria Hermínia Tavares de Almeida cujos resultados foram divulgados na revista Dados em 2008 e outro apresentado em setembro passado pela Fundação Getúlio Vargas, intitulado Articulações interpartidárias e desempenho eleitoral no Brasil.
 
Essa vantagem”, explicam os autores deste último, “vem do maior acesso dos prefeitos aos recursos públicos, seu papel como implementadores de políticas públicas locais ou como intermediários de transferências estaduais e federais, ou até como emprestadores de credibilidade para as promessas eleitorais dos candidatos dos partidos”.
Até cansa de tão batido…
 

 A tradução em bom português é: eleições compra-se com dinheiro público, logo, quanto mais agentes com acesso a dinheiro público você plantar, mais cargos eletivos você vai conseguir comprar na eleição seguinte.
 
Destacava-se até o detalhe da variação que o Brasil experimentou ultimamente e o STF está tentando fazer retroceder aos padrões anteriores de que, sendo a “taxa média” de “conversão” próxima a dez prefeitos por deputado eleito por partido, ela varia de partido para partido, “tendo o PT convertido quase três vezes mais deputados por prefeito que o PMDB”, o que sugere o grau de voracidade com que cada partido, digamos assim, dispõe do dinheiro público para essa finalidade.
 
O problema dos analistas, da imprensa e dos políticos de oposição brasileiros, no entanto, é que eles em geral se contentam com a constatação dos problemas.
 
Assim, diante de estudos como estes, o analista e o jornalista “pluralistas” e “isentos”, como as nossas escolas os querem, mostram orgulhosos que conhecem como ninguém “os bastidores” da política dos quais nós, pobres mortais, somos ignorantes, e o político, de oposição ou não, trata de extrair o máximo da regra do jogo agora cientificamente definida. Mas todos se proíbem de partir do diagnóstico para o remédio, o que poderia parecer inteligente mas é apenas “tomar partido”, o que
afasta parte da freguesia.
 
 
Já os americanos – sempre esses caras insuportáveis que insistem em reagir à realidade! – tomaram ha mais de 100 anos a providência palmar de tornar suprapartidárias as eleições municipais, dando uma rasteira nos caciques dos partidos políticos da qual eles nunca mais foram capazes de se reerguer, posto que, só com isso, restringiu-se em quase 90% o tamanho do território privativo de caça dessas aves de rapina.
 
Desde então, a capilaridade de suas quadrilhas ficou restrita à uma União e às cinco dezenas de estados, ficando as dezenas de milhares de municípios livres para se organizar como bem quiserem.
 
Hoje, com exceção das megacidades onde isso é impraticável, nos municípios americanos candidata-se quem quiser. O passo seguinte foi deixarem de eleger prefeitos para elegerem conselhos mínimos, em geral de cinco membros, dos quais um, rotativamente, faz papel de CEO, e contrata e descontrata os serviços necessários ao bom funcionamento da cidade junto à iniciativa privada depois de fazer, a cada decisão, audiências prévias e abertas com seus eleitores.
 
A roubalheira continua onde é possível levá-la adiante, é claro, porque a natureza humana é a mesma em inglês e em português. Mas ninguém mais consegue formar máfias de extensão nacional e nem é mais possível alugá-las para conquistar pedaços do país onde a polícia só funciona para os inimigos porque cada município tem a sua polícia e ela é diretamente eleita por quem mora lá.
 
Foi assim que eles ficaram ricos a ponto do PIB do Estado de Nova York sozinho equivaler ao PIB do Brasil inteiro, ficando a diferença por conta do que, desde então, se tornou impossível roubar.

11 de novembro de 2012
vespeiro

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