"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 16 de março de 2013

"NÚMEROS INCÔMODOS"

Governo brasileiro pode se abespinhar com defasagem da metodologia do IDH, mas faria melhor em recuperar o ímpeto para as reformas.

A divulgação de listas classificatórias e comparações internacionais sempre causa controvérsias. A necessidade de simplificar para cotejar impõe limitações a qualquer metodologia. Não poderia ser diferente com o Índice de Desenvolvimento Humano, da ONU.

Até por seu impacto político, o indicador é escrutinado com lupa pelos governos de turno.

O número procura sintetizar a evolução de cada país com base em três dimensões essenciais: acesso à educação (média atual de anos de escolaridade da população e expectativa de escolarização para novos alunos), expectativa de vida e renda nacional per capita.

O IDH brasileiro ficou em 0,730 (o máximo é 1), nota que deixa o país na 85ª posição (entre 187 nações), mas ainda no grupo com elevado desenvolvimento humano. Na comparação com os Brics, o país só perde para a Rússia -nada surpreendente, diante da renda per capita baixa de Índia e China.

O quadro é menos alentador quando se verifica que o IDH médio da América Latina (0,741) é superior ao brasileiro. Chile e Argentina, por exemplo, ocupam a 40ª e a 45ª posições, respectivamente.

Cabe a ressalva de que a ONU usou dados brasileiros de 2010 e que informações mais atualizadas colocariam o país em situação melhor. Ainda assim, a evolução dos últimos anos deixa a desejar. Após período de crescimento rápido entre 2005 e 2010, o ritmo caiu no último biênio, em especial por causa do baixo crescimento econômico.

Fora da comparação numérica -sempre útil, mas incapaz de capturar nuances-, o ponto de maior interesse está na discussão dos principais elementos que impulsionam o bem-estar humano.
O relatório elenca ao menos três: Estado engajado na meta do desenvolvimento, integração nos mercados mundiais e avanço continuado das políticas sociais.

Quanto ao papel do Estado, a questão de fundo é mobilizar a sociedade para o desenvolvimento por meio de reformas econômicas e institucionais. Nesse quesito, o Brasil falha. O ímpeto reformista perdeu força nos anos de bonança externa, quando o governo se limitou a surfar a onda.

O país também patina na integração global, pois segue fechado e cada vez mais à margem das cadeias produtivas de ponta e do comércio internacional de alto valor, com a crescente parcela de produtos primários nas suas exportações. Sem essa integração, é difícil incorporar tecnologia e aumentar a produtividade nacional.

Por fim, nas políticas sociais, a despeito dos bons resultados dos últimos anos, o futuro demanda uma nova visão.
As transferências de renda dão sinais de que não terão o mesmo impacto do passado, até por efeito de limitações orçamentárias.
Doravante, educação e saúde é que farão a diferença.

16 de março de 2013
Editorial Folha de São Paulo

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