"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 4 de julho de 2013

MANOBRA DO PLEBISCITO É INVIÁVEL

 

Surgido do fracasso do projeto lulopetista da “Constituinte exclusiva”, por inconstitucional, o remendo do plebiscito sobre uma reforma política vai pelo mesmo caminho — como se prevê desde o anúncio deste “plano b” elaborado às pressas para salvar a face do partido, manter o Congresso sob pressão e servir de escudo ao governo diante das ruas.

A resposta formal da ministra Cármen Lucia, do Supremo, no momento à frente do Tribunal Superior Eleitoral, dada à consulta da presidente da República, desenhou o mapa do caminho para o engavetamento da ideia pelo Congresso. Onde, por sinal, esta consulta popular mal-ajambrada transita cada vez com mais dificuldades, por motivos lógicos.

Em linhas gerais, há obstáculos insuperáveis de duas ordens: de tempo e em relação ao conteúdo da consulta, ambos condicionados a preceitos constitucionais.


No Congresso, houve quem, voluntariosamente, propusesse quebrar a regra da anualidade para viabilizar o capricho planaltino. Impossível, explicou a serena Cármen Lucia, porque a regra do prazo-limite de um ano antes das urnas para validar mudanças na legislação eleitoral é parte das cláusulas pétreas da Carta. Não podem ser mudadas, sequer por emenda constitucional. Só em golpe de Estado.

Assim, considerando-se os 70 dias fixados pelo TSE, depois de ouvir todos os tribunais regionais, para a consulta ser realizada, ela ocorrerá, na melhor hipótese, em 8 de setembro.

Como o prazo legal para a promulgação das novas regras vencerá em 5 de outubro — a um ano das eleições —, deputados e senadores contarão com menos de um mês para metabolizar o resultado do plebiscito, transformá-lo em projetos, discuti-los, emendá-los ou não, e aprová-los. Só em velocidade supersônica.

E o relógio já foi disparado, pois os 70 dias fixados pela Justiça para montar uma enorme e custosa infraestrutura — programar e distribuir 500 mil urnas eletrônicas em pouco mais de 5.500 municípios etc. — são contados a partir de segunda-feira, 1º de julho.

O outro obstáculo — o conteúdo da consulta — parece também insuperável. A obscuridade do tema está refletida nos itens sugeridos pela presidente Dilma ao Congresso, a quem cabe formular as questões do plebiscito: “misto restrito” (financiamento de campanha), “distrital puro” (sistema eleitoral), e por aí vai.

A ministra Cármen Lucia, na nota do TSE, é objetiva e clara: “(...) a Justiça Eleitoral não está autorizada constitucional e legalmente a submeter ao eleitorado consulta sobre cujo tema ele não possa responder ou sobre o qual não esteja prévia e suficientemente esclarecido (...).”

Quanto tempo será necessário para tornar o eleitorado “suficientemente esclarecido” sobre assuntos que para a grande maioria parecem falados em língua extraterrestre? É sensato concluir que o tema não é adequado para plebiscitos. Talvez um referendo, e em 2016.

04 de julho de 2013
Editorial O Globo

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