"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

OPINIÃO: O QUE FAZER COM POMPÉIA?

Nos últimos meses, o distinto público tem sido convidado a um passeio “de grátis” pelas entranhas da OAB paraense, envolta num pega-pra-capar nunca visto, a fazer corar até as nossas ilustres lavadeiras do Tucunduba.

É claro que não há santos em toda essa história, caríssimo leitor, mas uma impressionante disputa de poder, no seio de uma entidade que teve um papel fundamental na redemocratização brasileira.

E é a importância desse posto avançado da luta pela Democracia, num estado com as mazelas do Pará, onde a Justiça tem sido um mero porrete nas mãos dos poderosos de plantão, que talvez explique, em boa parte, essa disputa intestina.

Há, de fato, muitos “borrões”, muita informação “nebulosa”, nessa venda supostamente irregular de um terreno da OAB de Altamira, que culminou com o afastamento de Jarbas Vasconcelos da presidência da seccional paraense da entidade.

Em primeiro lugar, boa parte dos fatos midiáticos que resultaram no afastamento de Jarbas foi produzida por seus adversários, na própria entidade e na política em geral, que opõe os petistas aos tucanos.

Além disso, Jarbas também acabou se tornando “inimigo”de parcela dos magistrados paraenses, em especial, desembargadores, ao denunciar uma suposta troca de favores com o Executivo, a partir do emprego, em assessorias especiais do governador, de parentes de meritíssimos.

E tudo isso, por uma daquelas “meras coincidências”, tendo como pano de fundo pelo menos duas circunstâncias importantes.

A primeira, o retorno do tucanato, com o seu projeto de poder de uma hegemonia para décadas, o que pressupõe o silêncio, a cooptação, das instituições, entre elas a imprensa e, é claro, entidades com o peso de uma OAB.

A segunda, a brigalhada entre os dois principais veículos de comunicação do Pará, que vem atingindo decibéis inimagináveis e que tende a arrastar para a lama quem comete a burrice de se deixar usar nessa disputa.

O que o leitor precisa entender é que nem Ophir Cavalcante Junior nem Jarbas Vasconcelos são bandidos ou “demônios” – mas também não são exatamente “querubins ungidos”.

Ophir Cavalcante Junior e Jarbas Vasconcelos são apenas cidadãos de seu tempo. Cada qual com a sua visão de mundo. Cada qual com as suas circunstâncias. E ambos, apesar dos pesares, extremamente importantes para a guerra da sociedade brasileira pela Cidadania.

Tanto isso é verdade que, enquanto estiveram juntos, Jarbas e Ophir ajudaram a dar um novo fôlego, trouxeram uma vivacidade como há muito tempo não se via, na OAB local e nacional.

Sob o comando de ambos, a OAB ajudou a sociedade paraense e brasileira a refletir sobre questões importantíssimas, como o nepotismo, o comportamento dos homens públicos e o combate à corrupção.

E ainda hoje seria assim, se ambos não tivessem resolvido chafurdar numa disputa de poder, que, é preciso admitir, acabou por assumir sórdidos contornos.

Quando se examina a questão da suposta venda irregular de um terreno da OAB de Altamira, salta aos olhos a possibilidade de que Jarbas Vasconcelos tenha sido objeto de uma armação, de uma “casinha”, como se diz.

Ora, a ser verdadeira a informação de que o presidente da OAB de Altamira, que avaliou o terreno, é também corretor de imóveis, das duas, uma: ou ele é extremamente incompetente como corretor, a ponto de não perceber que a especulação imobiliária provocada por Belomonte levaria a duplicar ou triplicar o preço daquele imóvel; ou há aí alguma coisa que precisa ser mais bem explicada.

Outra nota nebulosa dessa história: se a advogada Cynthia Portilho, que falsificou a assinatura do vice-presidente da OAB local, Evaldo Pinto, trabalhava diretamente com ele e era da confiança dele, por que, então, ela se prestaria a uma armação em benefício do adversário de seu chefe? E uma armação, diga-se de passagem, que poderia lhe custar não apenas um emprego, mas, até mesmo a carreira.

Mas, de outro lado, como é possível que o ilustre advogado Robério D’Oliveira, que trabalha em Altamira e seria, inclusive, assessor da Prefeitura de Altamira, também desconhecesse a valorização dos imóveis daquele município, em função de Belomonte?

Acaso essa especulação era algum segredo altamirense? Acaso Robério nunca ouviu falar nisso, ainda que durante um cafezinho na prefeitura ou em algum boteco da esquina, ou em alguma conversa com o presidente da OAB de Altamira?

Tais lacunas, se devidamente preenchidas, talvez ajudem a formar um quadro mais veraz de toda essa história.

No entanto, isso inocenta Jarbas Vasconcelos?

É claro que não. Afinal, ele, no mínimo, aquiesceu à uma transação imoral, como a venda de um terreno da OAB a um conselheiro da mesmíssima OAB.

É aquela história: nem tudo que é legal é moral. E à mulher de César compete também PARECER de moral ilibada.

O mesmo se pode dizer em relação a Ophir Cavalcante Junior.

É legal ele advogar a favor e contra empresas públicas, apesar de afastado há 13 anos da Procuradoria Geral do Estado e da Universidade Federal do Pará, para dedicar-se à OAB, e apesar de continuar a receber remuneração da PGE?

Pode ser, sim, que isso até seja legal, apesar do que sustentam vários advogados, com base no Estatuto da categoria.

Mas, com toda a certeza, é, sim, imoral o comportamento de Ophir.

Pode ser que Jarbas não tenha visto qualquer imoralidade na venda do terreno de Altamira a Robério D’Oliveira.

Ou que Ophir tenha encarado como absolutamente normal o fato de estar de licença remunerada do cargo de procurador, mas continuar a advogar contra e a favor do Estado.

Pode ser que para ambos nada signifique ser flagrado na alcova, em companhia de um Clódio qualquer.

Pode-se até alegar, como atenuante, que ambos, como cidadãos de seu tempo, apenas agiram de acordo com a lassidão moral da sociedade que os pariu.

Mas aí só restará à “plebe rude” gritar: o tempora! O mores!

Afinal, se até esses dois grandes guerreiros da luta pela Cidadania se enrolam na separação entre o público e o privado, o que será de nós?

Será que em nenhum momento passou pela cabeça de Jarbas ou de Ophir o que pensaria a “plebe rude” acerca de tudo isso?

Será que nenhum deles conseguiu de fato compreender o papel que desempenhava como homem público; como representante de uma entidade com a história extraordinária da OAB; como linha de frente de campanhas contra a corrupção, a improbidade e o patrimonialismo que assalta, há 500 anos, o Pará e o Brasil?

De igual forma, de nada adianta ambos recorrerem a argumentos falaciosos, para intentarem a absolvição por esta “plebe rude”, que dantes os encarava com outros olhos.

No caso de Jarbas, o recurso é o “apelo à piedade”, por ter sido vítima, eventualmente, de uma armação.

No caso de Ophir, o recurso é o “argumento contra o homem”, com esse rame-rame de que tudo não passa de uma “vingança de Jarbas, o nefasto”.

Ora, se até um rábula sabe reconhecer tais falácias, que dirá, então, os nossos nobres causídicos, que todos os dias as utilizam em seus “considerandos” e nos tribunais?

Em verdade, o recurso a tais falácias só demonstra a falta de argumentos de ambos, diante da cristalina imoralidade dos comportamentos que adotaram.

E é possível que, se tivessem ao menos consultado um adolescente desta nossa “plebe rude”, até ele lhes dissesse: “tios, não façam isso, não, porque vocês vão se enrolar”.

O pior é que essa sórdida disputa de poder entre Jarbas e Ophir já arrasta para o olho do furacão todas as OABs e todos os advogados brasileiros.

Hoje, após Jarbas protocolar um pedido de afastamento de Ophir da presidência nacional da OAB, o colégio de presidentes de OABs emitiu uma nota graciosa, que recorre ao mesmíssimo lári-lári de que as acusações contra Ophir não passam de “vingança de Jarbas, o cruel”. No mesmo tom havia sido a nota de Ophir à imprensa, anteontem.

Como já visto, porém, pouco importa o porquê de cada qual: os fatos, e justamente porque são fatos, permanecem intocáveis por todas as falácias do mundo.

E a pergunta que fica é: o que fazer com Pompéia, essa esposa tão bela e amada?

Mas isso só quem poderá responder são os nobres Césares da advocacia nacional e paraense.

Postado por Ana Célia Pinheiro

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