"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

TAXA DE PARTICIPAÇÃO DE ALUNOS DA REDE PRIVADA NO ENEM 2010 SUPERA A DA PÚBLICA EM 85%


Para especialistas, exame não motiva estudantes de escolas públicas, nem democratiza acesso deles ao ensino superior.

Nathalia Goulart

Tradicionalmente, as escolas privadas obtêm as primeiras colocações no ranking por instituições do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) – confira os resultados de 2010. Os dados divulgados pelo Ministério de Educação (MEC) nesta segunda-feira, relativos à edição 2010 da prova, revelam também que as instituições particulares são responsáveis por levar proporcionalmente mais participantes à avaliação federal.

Em média, 70,4% dos estudantes de escolas privadas compareceram ao exame. Entre as unidades públicas, a taxa foi de 38,07%. A primeira supera a segunda em 85%.

Leia mais sobre o assunto:
Como esperado, escolas particulares dominam Enem 2010

Pela primeira vez, o MEC decidiu dividir o resultado das instituições de ensino de acordo com a taxa de frequência de seus alunos na prova. São quatro os grupos:

Participação entre 75% e 100%
Participação entre 50% e 75%
Participação entre 25% e 50%
Participação menor que 25%

Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais (Inep), autarquia do MEC responsável pelo Enem, a intenção é evitar a formação de um ranking de instituições que poderia ser distorcido por situações pontuais. Como o exame não é obrigatório, uma escola poderia eleger seus melhores alunos para prova, deixando outros de fora, e, assim, obter uma maior pontuação no ranking. Outra instituição poderia obter média inferior, embora comparecendo em peso à avaliação.

Das 6.689 escolas privadas representadas por candidatos no Enem de 2010, 52% registraram alta participação de estudantes – o que significa que ao menos 75% de seus alunos compareceram à avaliação. Na rede pública, a situação foi oposta: apenas 6% das 17.211 escolas atingiram tal índice. Na outra extremidade, a das instituições que registraram baixa participação de alunos, apenas 6% das escolas privadas tiveram 25% ou menos de seus estudantes na prova; entre as públicas, a taxa foi cinco vezes superior, chegando a 30%.

Olhando de outra forma: na rede privada, 68% dos estudantes são oriundos de unidades de ensino que registraram alta participação. Na rede pública, a cifra é cinco vezes inferior: só 12% dos alunos estavam em instituições que levaram ao menos 75% de seus estudantes ao Enem 2010.

Para os especialistas, duas razões principais explicam a disparidade entre a participação de estudantes das redes privada e pública. A principal delas é o desinteresse dos estudantes das escolas públicas pelo Enem.

“Ainda existe entre alunos das escolas públicas a percepção de que eles não estão preparados para disputar uma vaga em universidades federais e estaduais, para as quais o Enem se tornou passaporte de entrada, ao ser considerado como parte integrante do processo seletivo”, diz o sociólogo Cesar Callegari, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) e presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada (IBSA). “Portanto, aqueles estudantes até se inscrevem no exame, mas optam por não fazer a prova porque têm a percepção – acertada, aliás – de que a educação que recebem é fraca e insuficiente para os levarem ao ensino superior público.”

A segunda razão para o desestímulo dos estudantes da rede pública estaria na já conhecida fraqueza desse setor de ensino nacional. “O que difere as duas redes, a pública e a privada, é a gestão do ensino. Existe uma presença maior dos diretores e professores na vida do aluno no setor particular: são eles que incentivam o estudante e o acompanham desde a inscrição até a realização de provas”, diz Amabile Pacios, presidente da Federação Nacional da Escolas Particulares (Fenep). “O envolvimento é o diferencial.”

Há ainda outra questão a salientar a gravidade do problema. Estudantes oriundos da rede pública que realizam o exame no ano em que se formam no ensino médio são isentos do pagamento da taxa de inscrição na avaliação federal, de 35 reais. Como mostram os números, contudo, muitos alunos favorecidos pela medida faltaram à prova.

“Isso nos faz repensar a idéia de que apenas livrar esses alunos do pagamento basta. Precisamos de outros mecanismos de incentivo para essa faixa de jovens brasileiros”, diz Isabel Cappelletti, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP e especialista em avaliação educacional. “O Novo Enem, como ficou conhecido esse novo modelo de prova, pretendia maior democratização no acesso ao ensino superior, mas isso ainda não acontece.”

Ainda de acordo com balanço do MEC, 23.900 escolas participaram do exame, sendo 6.689 (28%) privadas e 17.211 públicas (72%). Desse total, 4.486 instituições ficaram sem média porque registraram índices de participação inferior a 2%. As escolas que levaram à prova menos de dez estudantes também estão fora da lista. Foram consideradas unidades de ensino ensino médio regular, normal magistério e/ou integrado à educação profissional. Ao todo, 1.011.669 estudantes que concluíram o ensino médio em 2010 fizeram a prova.

O Enem 2010 foi aplicado entre os dias 6 e 7 de novembro e foi marcado por falhas, como o erro de impressão em um lote de provas da cor amarela e a inversão dos cartões de reposta. Alem disso, houve suspeita de vazamento do tema da redação e denúncias do uso do microblog Twitter por participantes dentro dos locais de prova. Cerca de 9.500 estudantes foram convocados a realizar uma nova prova e o exame se tornou alvo de uma intensa batalha judicial.

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