"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 12 de março de 2012

MAIS UM ESCÂNDALO DE SERVIDORES-FANTASMAS NO SENADO

É um nunca-acabar de denúncias, e não acontece nada...

Reportagem de Chico de Góis e Roberto Maltchik mostra que, mesmo depois da crise de 2009, quando descobriu-se que atos secretos nomeavam parentes e funcionários-fantasmas em seus gabinetes, senadores não perderam o hábito do empreguismo. Pelo contrário. Usam a estrutura da Casa para acomodar profissionais com atividades particulares, mas que recebem dinheiro público. Entre esses funcionários, há até quem responda a processos por mau uso de recursos do contribuinte.

Levantamento realizado pelo O Globo com base no Quadro de Servidores Efetivos e Comissionados demonstra que dos 81 senadores, pelo menos 25 (30%) abrigam em seus escritórios em Brasília ou nos estados desde estudantes que moram fora do Brasil, até médicos e advogados que passam o dia entre clínicas e tribunais. Há também casos de aliados que enfrentam denúncias do Ministério Público ou até mesmo foram cassados por compra de votos.

O presidente do DEM, por exemplo, Agripino Maia (RN), pagava até semana passada mais de R$ 4 mil mensais em seu escritório político no Rio Grande do Norte para uma servidora fantasma. Estudante de Medicina, em vez de trabalhar para o senador em Natal, ela foi fazer um estágio, em agosto de 2011, na Espanha. Gleika de Araújo Maia é sobrinha do deputado João Maia (PR-RN) e do ex-diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, demitido por manter escondidos os atos de nomeações e benefícios de pessoas protegidas pelos senadores. Depois de procurado pelo jornal, o senador demitiu a funcionária.

Já o líder do PMDB, Renan Calheiros (PMDB-AL), após renunciar à Presidência do Senado por causa de acusações de que teria recebido dinheiro de um lobista, mantém velhos conhecidos em seu gabinete. Em 2011, resolveu chamar para trabalhar no escritório regional a fisioterapeuta Patrícia de Moraes Souza Muniz Falcão.

De acordo com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (Cnes), do SUS, ela atua em duas clínicas, uma delas o Instituto Graça Calheiros, por 40 horas semanais. Renan disse não saber.

O peemedebista não abre mão da mulher de seu primo, o empresário Tito Uchôa, sócio do filho do senador, o deputado Renan Calheiros Filho, no Sistema Costa Dourada de Difusão. Vânia Lins Uchôa Lopes teve de deixar um cargo na presidência do Senado, em 2009, acusada de ser funcionária-fantasma. Em 9 de novembro de 2009, ela foi recontratada e até hoje é paga pelo Senado.

No Rio Grande do Norte, o senador Paulo Davim (PV) paga R$ 8,1 mil para a cardiologista Carla Karini de Andrade Costa, sua sócia em uma clínica no estado. Segundo dados do Ministério da Saúde, ela cumpre 50 horas semanais de trabalho no exercício da Medicina. A assessoria de Davim sustenta que 80% dos pronunciamentos do senador na tribuna do plenário versam sobre saúde. E ela seria a consultora técnica.

Além desses casos, nos quais senadores se valem da resolução do Senado criada em 2010 para regulamentar o horário flexível de trabalho, há os parlamentares que não se importam com o passado de seus funcionários de confiança.

O ex-governador do Piauí, senador Wellington Dias (PT-PI), emprega em seu escritório no estado o ex-prefeito de São Pedro do Piauí, Higino Barbosa Filho, cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral em 3 de novembro de 2009 por abuso de poder econômico e captação irregular de votos. Ele responde a três ações por improbidade administrativa.

Wellington alegou que o processo não transitou em julgado — embora Higino tenha sido afastado do mandato por decisão judicial.

O senador Ivo Cassol (PP-RO) patrocina uma ilegalidade. O jornalista Francisco Sued de Brito Pinheiro Filho, nomeado como assistente parlamentar em 1 de dezembro do ano passado, ganhou outro cargo público, na Assembleia Legislativa de Rondônia.

Em 1 de fevereiro deste ano, ele foi nomeado para trabalhar no gabinete da presidência da Assembleia. Embora o acúmulo de função pública seja proibido por lei, Sued continua a receber pelo Senado e pela Assembleia. A assessoria do senador disse, há 10 dias, que Cassol já havia identificado o problema e mandara demitir o funcionário. No entanto, até sexta-feira ele continuava como servidor federal, de acordo com o Quadro de Servidores Efetivos e Comissionados do Senado.

Cassol emprega Carlos Alberto Canosa, seu ex-secretário de Assuntos Estratégicos quando foi governador de Rondônia. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) pediu abertura de investigação contra Canosa por irregularidades em contrato de R$ 15 milhões para publicidade do governo.

Cientista político da Universidade de Brasília, Ricardo Caldas disse que a presença de fantasmas e condenados por desvio de dinheiro público faz parte da cultura política do país, que ainda se pauta pela troca de favores.

— Ou você acredita que o senador não está retribuindo um favor? O sistema tende a acobertar até mesmo delitos de outros políticos. Tudo é tolerado até que vire escândalo. Tudo pode ser feito, se não for divulgado.

11 de março de 2012
tribuna da internet

Nenhum comentário:

Postar um comentário