"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 15 de março de 2012

OS AMARGOS FRUTOS DA "OSTPOLITIK" VATICANA

Notícias Faltantes - Perseguição Anticristã

Desde a Ilha-cárcere de Cuba, 750 opositores advertem: a viagem papal pode ser usada pelo castro-comunismo.

A entidade “Cubanos Desterrados” (CubDest), de Miami, adere à lúcida carta que 750 opositores e dissidentes cubanos acabam de enviar à S.S. Bento XVI, a respeito de sua visita à ilha-cárcere de Cuba de 26 a 28 de março próximo.

1. Perseguição religiosa na Cuba de hoje

No histórico documento, esses pacíficos e valentes opositores da tirania comunista manifestam que sem sobra de dúvidas estariam “muito contentes de recebê-lo em nossa Pátria, se a mensagem de fé, amor e esperança que possa nos trazer, servisse também para deter a repressão pela qual estão passando os que querem estar presentes na Igreja” [1].

O grupo de opositores justifica sua preocupação pelo fato de que, mesmo depois de se haver anunciado a visita papal, continua a perseguição policial e psicológica contra os fiéis católicos, e eles narram em sua carta vários fatos recentes. Compreende-se inteiramente essa preocupação se considera-se que o regime comunista não cessou a repressão, sequer com uma maquiagem cosmética, ante o anúncio da visita papal. E justifica-se o receio que os assinantes da carta manifestam a Bento XVI na continuação:

“Sua presença na Ilha seria como enviar uma mensagem aos repressores de que podem continuar fazendo o que queiram que a Igreja vai permitir, já que apesar de se saber de sua visita desde alguns meses, isto não serviu de óbice para que se incrementem - desde o poder - as detenções e a punição com violência às atuações religiosas, políticas e sociais. Que a Divina Trindade ilumine sua mente para que lhe permita tomar uma correta determinação! Amém!” [2].

2. Núncio em Havana nega audiência a opositores

Nesse sentido, causou profunda tristeza entre os fiéis católicos da ilha e do desterro a revelação efetuada pela ex-presa política Martha Beatriz Roque, respeitada e respeitável figura da oposição na ilha-cárcere, uma das inspiradoras da carta a Bento XVI, de que durante um mês solicitaram uma audiência com o Núncio Apostólico da Santa Sé em Cuba, monsenhor Bruno Musaro, para lhe entregar a carta, porém não obtiveram nenhuma resposta.

No momento em que as portas das prisões se abrem para receber novas levas de presos políticos, as portas da Nunciatura Apostólica se fecham hermeticamente a esses membros do rebanho cristão que não queriam outra coisa, senão fazer chegar uma súplica ao Pastor dos Pastores. O episódio da portada na cara poderá passar à História dos atribulados fiéis cubanos como um dos mais amargos dessa interminável via crucis de mais de meio século.

Os assinantes da carta não tiveram então outro recurso à disposição, senão enviar a mensagem por e-mail a seu alto destinatário e, posteriormente, a diversos meios de comunicação.

Constata o jornalista Juan O. Tamayo, de El Nuevo Herald, de Miami, que essa respeitosa mas firme carta constituiu “a mais recente expressão por parte desses dissidentes cubanos, aos quais preocupa que a visita do Papa só sirva para legitimar o governo de Raúl Castro e pouco ou nada fará para melhorar a situação dos direitos humanos”. E o episódio da Nunciatura Apostólica que acaba de ser narrado não faz senão aumentar a dramaticidade dessas preocupações.

3. “Ostpolitik” vaticana: um pacto com o diabo?

Por sua parte, o jornalista Victor Gaetan, correspondente internacional de National Catholic Register, escreve que em sua visita a Cuba Bento XVI poderá dar continuidade à estratégia da diplomacia vaticana de “evitar diligentemente qualquer confrontação política com o regime de Castro, ao tempo em que colabora com Havana para combater o embargo norte-americano e apóia as reformas econômicas anunciadas pelo governo”.

Segundo o referido jornalista, o esquema que se está aplicando em Cuba é o da chamada “ostpolitik” impulsionada pelo Vaticano nos tempos da Guerra Fria, com relação aos regimes comunistas do Leste Europeu.

Não obstante, tal como constata Gaetan, assim como na Europa a “ostpolitik” não deixou de trazer problemas de credibilidade à Igreja, também pode estar trazendo-lhes agora a trazê-los em uma Cuba pós-castrista. Nesse sentido, adverte o jornalista católico:

“O risco que a Igreja corre no contexto de um futuro pós-Castro, é o de ser severamente censurada por ter feito um pacto com o diabo” [3].

4. De uma “Igreja de mártires” a uma de “traidores”?

Esse risco foi claramente percebido pelo então arcebispo de Santiago de Cuba, monsenhor Pedro Meurice, que durante o colaboracionista Encontro Nacional Eclesial Cubano, realizado em 1986, constatou cruamente o conceito que tantos fiéis católicos da ilha haviam passado a ter de seus Pastores: “Consideravam-nos uma Igreja de mártires e agora alguns dizem que somos uma Igreja de traidores” (cf. La Voz Catolica, Arquidioceses de Miami, 14 de março de 1986, p. 15).

5. Mártires vivos da fé e “ostpolitik” vaticana

Sobre a “ostpolitik” vaticana, mártires vivos da fé, como os cardeais Mindszenty, Stepinac e Slipyj, mostraram na ocasião, de maneira respeitosa, porém firme, suas objeções a essa estratégia de aproximação diplomática e diálogo com os regimes comunistas.

Há alguns anos, o lançamento em Roma das memórias do falecido cardeal Casaroli (“Il martirio della pazienza”, Einaudi Editore), que foi secretário de Estado da Santa Sé e impulsor da chamada “ostpolitik” vaticana, fez reviver polêmicas em torno deste delicado tema. Uma das vozes mais críticas foi a do cardeal esloveno Ján Korec, nomeado cardeal em 1991 e um dos mais importantes testemunhos vivos da “ostpolitik” na Checoslováquia. Em entrevista ao jornal “Il Giornale”, o purpurado a qualificou como uma “catástrofe” para a Igreja desse país, pois “liquidou” com a atividade dos católicos que resistiam ao comunismo em troca de “promessas vagas e incertas dos comunistas”. Do lado comunista tudo não passou de uma “farsa”, a qual “continua hoje na China, Coréia do Norte, Cuba, Vietnã”, acrescenta o cardeal Korec.

Sobre a alegada eficácia de tal política para conseguir a liberdade das nações comunistas, o Cardeal Korec perguntou: “Por que então a China continua sendo a mesma China, o Vietnã continua o mesmo Vietnã e Cuba, sobretudo, continua sendo a mesma Cuba?” (“I martiri dell’Est - L’Ostpolitik di Casaroli danneggiò i cattolici - Intervista con il cardinale slovacco Korec”, Il Giornale, Itália, 18 de julho de 2000).

Doze anos depois, as palavras do Cardeal Korec continuam com uma crucial atualidade.

6. Não se pode transigir com o comunismo

Também a respeito da “ostpolitik” vaticana para Cuba e das relações do Episcopado cubano com o regime comunista, a entidade “Cubanos Desterrados” editou ou contribuiu difundindo inúmeros documentos, inclusive livros. Entre esses documentos, permitimo-nos citar: “Respetuosa y filial súplica de los refugiados de Miami al Padre Común de la Cristiandad”, 1987, por ocasião da visita de S.S. João Paulo II a Miami; “¿Hasta cuándo las Américas tolerarán al dictador Castro? Dos décadas de progresivo acercamiento comuno-católico en la isla-presidio del Caribe”, Miami-Nova York, 1990; “Cuba comunista, 1997: vergüenza de nuestro tiempo y de nuestro continente - Dramáticos aspectos de la isla-cárcel en vísperas de la visita papal”, Miami, 1997; “Cuba comunista después de la visita papal - Temas candentes de la actualidad religiosa y política de la isla-cárcel”, da Comisión de Estudios Por la Libertad de Cuba, Miami, 1998; um livro no qual se analisam respeitosamente as alocuções papais na perspectiva da “ostpolitik” vaticana.

7. Acordo com o regime comunista: para a Igreja, esperança ou auto-demolição?

Nos pronunciamentos da entidade “Cubanos Desterrados” sobre a dolorosa colaboração eclesiástica com o comunismo cubano, a entidade teve como obras de referência numerosos escritos do intelectual brasileiro Plínio Corrêa de Oliveira, que dedicou sua vida à denúncia da infiltração esquerdista nos meios de comunicação católicos. O pensamento do referido autor teve uma influência decisiva nos exilados cubanos, entre outros motivos, pelo fato de que o “Diario las Américas”, de Miami, publicou durante décadas incontáveis artigos de sua autoria. Em especial, cabe ressaltar o estudo “Acordo com o regime comunista: para a Igreja, esperança ou autodemolição?” (1963). Na referida obra, o professor Corrêa de Oliveira desenvolve a tese de que “a Igreja não pode aceitar uma liberdade que implique em calar sobre os erros do regime comunista, criando no povo a impressão de que Ela não os condena”. Ao longo da História, explica o mencionado autor, não existe um exemplo de pressão mais completa em seu conteúdo doutrinal, mais sutil e polimórfica em seus métodos, mais brutal em suas horas de ação violenta, que a exercida pelos regimes comunistas que estão sob seu jugo. Por isso, diante de um Estado totalmente anticristão, não existe outro meio de evitar esta influência senão instruindo os fiéis sobre tudo o que esse regime tem de mau e perverso, destacando a necessidade da propriedade privada, respaldada por dois Mandamentos da Lei de Deus: o 7º e o 10º.

Por ocasião da publicação deste estudo, Plínio Corrêa de Oliveira recebeu carta laudatória da Congregação de Seminários e Universidades, na qual se referia à sua pessoa como “merecidamente célebre por sua ciência filosófica, histórica e sociológica”, e ao conteúdo do estudo como um “eco fidelíssimo” dos ensinamentos papais.

8. Reconciliação entre o bem e o mal?

A Srª Sylvia G. Iriondo, uma das figuras mais destacadas do desterro cubano nos Estados Unidos, acaba de publicar no Diario las Américas, de Miami, uma contundente análise sobre a peregrinação de católicos exilados a Cuba, organizada pela Arquidiocese de Miami, por ocasião da viagem de Bento XVI a Cuba.

A Srª Iriondo revela que a lista de candidatos foi entregue ao regime de Havana para ser analisada pelos censores cubanos, e suprimiu-se ou vetaram os nomes de potenciais peregrinos que tivessem manifestado a menor crítica ao comunismo cubano. O qual é um indício de como o governo comunista continua atuando com brutalidade, inclusive nos bastidores, para tentar manter um controle ostensivo ou camuflado dos mais mínimos detalhes durante a visita papal.

Comenta também a Srª Iriondo: “O nome dado, ‘peregrinação de reconciliação’, constitui por si só uma distorção da triste realidade cubana, cujo problema não reside na ‘reconciliação’ entre cubanos do exílio e da ilha - que somos um só povo -, senão que emana da imperiosa necessidade do estabelecimento de um Estado de Direito, com justiça e liberdade, que temos o dever de defender e o compromisso de conseguir”.

9. Autoridades eclesiásticas: “silêncio cúmplice”

A Srª Iriondo conclui dizendo:

“Em troca de algumas concessões que ratificam precisamente a natureza totalitária do regime, antepuseram interesses acima de princípios sagrados. Resulta incompatível com os valores cristãos da religião pela qual morreram tantos mártires cubanos executado no paredão de fuzilamento exclamando ‘Viva Cristo Rei’, a forma na qual autoridades eclesiásticas se pronunciaram ou deixaram se de pronunciar na ilha, preferindo o silêncio cúmplice à proclamação da verdade” [4].

10. Súplica à Virgem da Caridade do Cobre

Desde o exílio, a entidade “Cubanos Desterrados”, ao tempo em que afirma sua incondicional obediência à Igreja e ao Papado nos termos estipulados pelo Código de Direito Canônico, defende como inteiramente lícito o direito e o dever dos fiéis católicos cubanos, da ilha e do desterro, de se opor respeitosamente às orientações da diplomacia vaticana e do episcopado cubano, que já levam décadas de aplicação em Cuba, na medida em que discordem da linha tradicionalmente adotada pela Igreja com respeito ao comunismo, e na medida em que seus amargos frutos revelaram ser, parafraseando o cardeal Korec, citado acima, uma “catástrofe” para a vida da Igreja cubana e da sociedade cubana em geral.

Por fim, “Cubanos Desterrados” eleva aos céus uma súplica à Virgem da Caridade do Cobre, Padroeira de Cuba, para que não permita que o regime comunista manipule a visita papal, para que fortaleça na fé os cubanos que sofrem na ilha, e para que chegue logo o dia da libertação de nossa querida pátria.

Escrito por CubDest
14 Março 2012
Miami, 05 de março de 2012.
Sergio F. de Paz, Diretor

Notas

[1] Juan O. Tamayo, Disidentes advierten al Papa sobre visita a Cuba, http://www.elnuevoherald.com/2012/03/02/1141787/disidentes-advierten-al-papa-sobre.html#storylink=cpy.

[2] Carta Aberta ao Papa Bento XVI, http://media.elnuevoherald.com/smedia/2012/03/01/16/52/1mWFwo.So.84.pdf.

[3] Victor Gaetan, How the Catholic Church is Preparing for a Post-Castro Cuba,

http://www.foreignaffairs.com/articles/137303/victor-gaetan/how-the-catholic-church-is-preparing-for-a-post-castro-cuba?page=show.

[4] Silvia G. Iriondo, “¿Ir a tanta vergüenza? Otros pueden. ¡¡Nosotros no podemos!!”- José Martí,

http://www.diariolasamericas.com/noticia/136232/46/ir-a-tanta-verguenza-otros-pueden-nosotros-no-podemos-jose-marti

Tradução: Graça Salgueiro

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