"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 18 de abril de 2013

COM QUANTO DINHEIRO MORREU MARGARET THATCHER?


"Margaret Thatcher morreu pobre" – assim terminou Reinaldo Azevedo seu panegírico da ex-primeira-ministra. Não vou entrar no mérito dos elogios: só lembro que estão sendo feitas festas aqui no Reino Unido para comemorar a morte de Thatcher.

Só a casa dela vale RS 25 milhões

Só lembro também que ela chamou Mandela de terrorista e, no depoimento de um antigo ministro do exterior australiano, fez observações a ele "chocantemente racistas" contra indianos, paquistaneses etc etc.

Lembro também que no próprio dia da morte não houve sequer minuto de silêncio no grande derby de Manchester entre o United e o City, por decisão dos clubes.

Lembro que em Liverpool a torcida local cantou para festejar a morte de Thatcher. E que na Escócia multidões saíram às ruas como se fosse o carnaval baiano.

Lembro também que numa enquete do Guardian sobre se devia ser erguida uma estátua a Thatcher em Trafalgar Square 87% das pessoas disseram que não.

E lembro, enfim, que já se instalou um debate furioso aqui em torno do que muitos consideram os gastos absurdos do funeral extravagante que será dado a ela — ainda que lhe tenham sido negadas honras de Estado, como as concedidas a Churchill.

A POBREZA
Mas não são estas lembranças o propósito do meu texto. É a pobreza alardeada por Reinaldo Azevedo. De onde ele tirou esse disparate?

Como tudo é relativo, a pobreza de Thatcher só seria admissível se você cotejasse o legado dela com o de Bill Gates. Ou então Azevedo tem uma fortuna que torna a de Thatcher uma pobreza.

Thatcher deixa aos herdeiros uma propriedade em Belgravia, o bairro mais caro de Londres, calculada em 25 milhões de reais. Ali ela morou até se transferir, no fim da vida, para o hotel Ritz, onde era mais fácil cuidar dela no estágio avançado de demência.

O patrimônio de Thatcher gira em torno de 16 milhões de dólares. É uma cifra razoável para quem chegou à política sem nada: até sua carreira realmente decolar, Thatcher foi sustentada pelo marido, Dennis.

Na família, dinheiro mesmo quem tem é Mark, filho de Thatcher. Em 1984, no auge do poder e influência da mãe, Mark foi acusado pela mídia de ter levado uma comissão de uma empreiteira numa obra de 300 milhões de libras em Omã. Segundo a mídia, Thatcher recomendara a empreiteira ao sultão de Omã.

Mark Thatcher, considerado amplamente entre os britânicos um imprestável, tem hoje uma fortuna avaliada em 100 milhões de dólares.

Reinaldo Azevedo tem que rever suas fontes – ou seu conceito de pobreza.
Ao escrever sua previsível hagiogragia de Thatcher na Veja, Ricardo Setti – que com artigos certeiros, povoados de maiúsculas e exclamações perplexas, vai firmando lugar nas preferências jornalísticas do PIB – perguntou de saída:
que dizer depois do artigo de um craque como Reinaldo Azevedo?

Minha sugestão: corrigir, simplesmente, a besteira.

18 de abril de 2013
Paulo Nogueira
(Diário do Centro do Mundo)

Nenhum comentário:

Postar um comentário