"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quarta-feira, 31 de julho de 2013

EM 60 ANOS DE PODER, SARNEY NÃO CRIA UM SISTEMA DE SAÚDE QUE CONFIE

Sarney, de alta hospitalar, segue para SP para consulta. Em quase 60 anos de poder no Maranhão, sua dinastia e seus protegidos não conseguiram criar um sistema de saúde em que eles próprios confiem



O senador José Sarney: o hospital no Maranhão só serviu para a emergência (Foto: Uesley Marcelino / Reuters)

Amigas e amigos do blog, leiam por favor o que publica hoje o site de VEJA:
“O senador José Sarney (PMDB-AP), de 83 anos, recebeu alta médica às 7h desta quarta-feira. Ele estava internado desde a madrugada de domingo no UDI Hospital, em São Luis (MA), para o tratamento de um princípio de pneumonia.
 
Segundo a Agência Senado, Sarney está a caminho de São Paulo, onde deverá ter uma consulta com o infectologista David Uip, de quem é paciente. Acompanham o senador na viagem sua esposa, dona Marli, e do deputado Sarney Filho (PV-MA).
 
Em maio deste ano, Sarney havia sido internado no Instituto de Cardiologia do Distrito Federal (ICDF), em Brasília, após sentir um desconforto no peito. Os exames apresentaram resultados normais e ele foi liberado.”

Agora, volto eu.

Tenho criticado com frequência a atuação e as posturas do senador José Sarney, embora reconheça, também, pontos positivos de seu trabalho. É dele, por exemplo, a Proposta de Emenda Constitucional que acabava com a pouca vergonha dos suplentes de senador parentes ou cônjuges dos senadores — pais, irmãos, mulheres, filhos etc –, que, apesar de ter obtido o voto da grande maioria dos senadores, terminou não passando no Senado por falta de 3 votos para atingir os três quintos dos membros da Casa exigidos pela Constituição.


Com arritmia cardíaca e outros problemas, e acompanhado pelos filhos Sarney Filho e Roseana, Sarney deixa o hospital UDI de São Luís, em outubro de 2010, para exames e tratamento no Hospital Sírio-Libanês de São Paulo (Foto: Dida Sampaio / AE)

Também reconheço, por justiça, que Sarney, apesar dos erros de sua Presidência (1985-1999), com habilidade e tolerância contribuiu de maneira importante para o restabelecimento da democracia no país, depois de 21 anos de ditadura militar.
 
Isso, porém, não elide o fato de que Sarney, seus protegidos ou sua filha vêm governando o Maranhão desde que ele próprio foi eleito governador, em 1965 — e o Estado continua com muitos dos piores indicadores de qualidade de vida do país.


Roseana Sarney, abatida após cirurgia de aneurisma cerebral realizada no Hospital Israelita Albert Einstein -- em São Paulo, como ocorreu com a maioria das 20 operações que realizara até então (Foto: AE)
 
Respeitando o senador como pessoa — que, além do mais, é de trato agradável e cordial –, e desejando que sua saúde se restabeleça, não posso deixar de recordar que tanto o senador como sua filha, a pela terceira vez governadora Roseana Sarney, recorreram inúmeras vezes ao Hospital Sírio-Libanês de São Paulo, inclusive para vários diferentes procedimentos e cirurgias.
 
Consultar médicos e recorrer a hospitais de São Paulo, prática usual para os poderosos de Brasília, transformaram-se há muito tempo em rotina para os Sarney — o que constitui uma poderosa ironia: no Maranhão em que Sarney e os seus mandam há tanto tempo, não foram capazes de instalar uma infraestrutura de saúde suficientemente competente para que, nela, eles próprios confiem.

31 de julho de 2013
Ricardo Setti - Veja

NOTA AO PE DO TEXTO

"De trato agradável e cordial..." Acredito que todos os ditadores, até mesmo os mais cruéis, tenham a farsa do trato fácil, quando lhes convém. Sarney perambulou pela política brasileira, nos vários estágios do poder: das Ditaduras aos momentos "democráticos" que o país viveu. Um tremenda capacidade camaleônica, que o fez perdurar na política por 60 anos. Quando olho o 'tijolaço' impresso da sua biografia, fico pensando com os meus botões: "será que alguém conseguiria ler tamanha 'obra'? E que louvações estarão lá dentro, mascarando o homem que por tanto tempo transformou o Maranhão na propriedade privada da famiglia Sarney?
Haverá alguma verdade que realmente tenha contribuído para a democracia que interessa ao povo brasileiro, ou as suas contribuições foram para a "democracia" dos interesses que regem a sua vida política? Uma obra encomendada para os pósteros, que será desmentida pela História?
Não consigo entender que se preste loas a grande farsa política chamada José de Ribamar...
Enriqueceu, e como de praxe em Pindorama, ninguém pergunta como.
Mantém o mando do coronelismo remanescente e as confabulações em que dita as regras; acredito que seja o dono - após tantos anos de peregrinação pelos bastidores das casas do Congresso, de um dos maiores arquivos privados da vida 'política' brasileira, capaz de estremecer as instituições. Habilidoso, com uma incrível capacidade de sobreviver até mesmo na 'selva' mais inóspita, passou e passa, para alegria dos que o aplaudem, com a incrível virtude da isenção. Nada é capaz de provocar-lhe a indignação. E se tal acontece, deve ser no silêncio dos mosteiros. Sem espetáculo que mexa no sorriso petrificado que as celebridades sempre carregam, e que não se oculta no seu bigode caricatural, distribui sorrisos matreiros eivados de sibilinos pensamentos...
Admiro-me com essa competência, sem dúvida! Sessenta anos incólume! Fantástico!!!
Mas no Brasil da comadrice, basta ameaçar morrer, para que se coloque uma aura de santo, ou de quase santo, e se invoque até mesmo, se for o caso, os tempos de coroinha do cidadão...
Assim também não tenho a habilidade de dissociar o homem do político. Ouvi durante minha vida, aquele tipo de consideração sobre tiranos, ou personalidades controversas, de que "no fundo são boas pessoas...". Brincava, respondendo: "é. Bem lá fundo, mas muito no fundo é possível encontrar coisa nenhuma".
m.americo

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