"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

OS ÚLTIMOS DIAS DO ÓPIO

'Narcopolis', de Jeet Thayil, analisa evolução de Mumbai sob a ótica de figuras do submundo das drogas
7/02/2012

A história oficial de Mumbai atribui o crescimento da cidade a seu porto natural e sua indústria têxtil. Mas antes que as fábricas de algodão dominassem a cidade, os mercadores de Mumbai enriqueciam exportando ópio para a China. As principais escolas de arte e arquitetura da cidade, e seu melhor hospital público foram batizados em homenagem a um pioneiro desse comércio, Jamsetjee Jeejeebhoy, que também dá seu nome a uma estrada elevada que cruza a parte antiga de Mumbai.

Nas sombras do viaduto está a Shuklaji Street, a última conexão de Mumbai com o ópio. “Não era exatamente uma rua”, afirma Dom Ullis, o narrador de Narcopolis, o romance de estreia de Jeet Thayil, ambientado no epicentro do crime, povoado por prostitutas, traficantes e ladrões. Dom está lá para tomar parte no caso de amor de Mumbai (ainda chamada de Bombaim pelo autor do livro) com o ópio, no momento em que ele se aproxima de seu fim, 150 anos depois de seu início.

Dom entra e sai do Rashid’s, uma casa de ópio à moda antiga, no qual empregados preparam seu cachimbo e a serenidade prevalece. Lá ele conhece Rumi, um empresário falido que espanca a esposa; Xavier, um velho artista furioso; Dimple, um eunuco que por sua vez lhe conta a história do Sr. Lee, um exilado chinês. E, é claro, o próprio Rashid, dono do estabelecimento, que observa – e resiste em vão – seu mundo de usuários de ópio se tornar obsoleto com a chegada da heroína de baixa qualidade. Mumbai se esquece do ópio enquanto aqueles que o utilizavam morrem ou arruínam seus cérebros.

Um ex-viciado, Thayil tem experiências pessoais com o mundo que descreve. Mas ele também é um poeta, e trata suas palavras com carinho. Seus esforços estão lá para serem vistos, e ele resiste à tentação de se inserir na narrativa. Dom Ullis é uma figura frequentemente ausente que não entrega nada ao leitor. A única maneira de acompanhar a cronologia do livro é por meio dos diálogos. Novos carros, refrigerantes e coffee shops indicam a passagem do tempo e a evolução econômica da Índia. Referência brutais aos muçulmanos indicam que parte da ação se passa depois de 1993, quando a cidade foi palco de violentos conflitos religiosos. E as menções ao ecstasy e o MDMA, indicam que a saga de Narcopolis chega à Mumbai do século XXI.

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