
Um dia fizeram uma cabana num terreno baldio. Ainda havia terrenos baldios. A cabana era o mundo secreto deles, da turma. Ganhou um nome: Clube da Sacanagem. Ninguém precisava saber o que acontecia lá dentro. Os cigarros roubados de casa. As revistinhas. Mas a primeira coisa que o menino fez dentro da cabana foi comer melancia com leite e não morrer.
Com o tempo, os perigos mudavam. Desatenção na escola, falta de estudo, notas baixas: fracasso, nenhum futuro, ruína. Sexo sem camisinha: doença, gravidez indesejada, ruína. Amizades perigosas: drogas, dependência, nenhum futuro, ruína, morte.
— E banho depois da comida?
A ironia não era entendida.
— Pode.
O grande amor deixava olhar, mas estabelecera um ponto nas suas coxas do qual era proibido passar. Como o Paralelo 38, que dividia as duas Coreias. E ela era rigorosa. No caso de transgressão, soavam os alarmes e havia o perigo até de intervenção americana.

Mas bom, bom mesmo, era o orgulho de um pião bem lançado, o prazer de abrir um envelope e dar com a figurinha rara que faltava no álbum, o volume voluptuoso de uma bola de gude daquelas boas entre os dedos, o cheiro de terra úmida, o cheiro de caderno novo, o cheiro inesquecível de Vick-Vaporub. Mas, melhor do que tudo, melhor do que acordar com febre e não precisar ir à aula, melhor até do que fazer xixi em piscina, era passe de calcanhar que dava certo.
É ou não é?
Nenhum comentário:
Postar um comentário