"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 20 de julho de 2013

EIKE BATISTA: ERA UMA VEZ UM TODO-PODEROSO

O bilionário assiste ao derretimento das ações de sua petroleira OGX. O mercado, que antes apostava em seu grupo, perdeu a confiança no empresário X


ENRASCADO O empresário Eike Batista.  As más notícias sobre campos  de petróleo derrubaram as ações da OGX (Foto: Chris Goodney/Bloomberg via Getty Images)



O brasileiro não perdoa. Faz piada até das tragédias. O empresário Eike Batista não escapou. Virou inspiração para uma sortida gama de trocadilhos com seu nome, como “ai que confusão” (Eike se pronuncia aique). Piadistas de plantão dizem que ele já foi às ruas defender a redução da tarifa de ônibus. A crise, sob a ótica do humor, transformaria Eike em “gente como a gente”. No mundo real, o caso é sério. Eike não precisa de centavos, mas de bilhões de reais.


Dia após dia, ficam mais evidentes os sinais de que esgarçaram os laços de confiança do mercado nas empresas do grupo X, de Eike Batista. A crise de credibilidade ficou estampada nas ações do conglomerado, sobretudo da petrolífera OGX. Elas chegaram a valer menos de R$ 0,40 na semana passada – em 2010, alcançaram R$ 23,27. Na segunda-feira, dia 1º, mais notícias desalentadoras atingiram os papéis da companhia. O único campo de petróleo em produção da empresa, o Tubarão Azul, poderá parar de produzir em 2014. Segundo a OGX, os empecilhos na produção de Tubarão Azul a obrigaram a reinterpretar as informações disponíveis sobre outras três áreas, todas na Bacia de Campos, o pedaço de mar mais produtivo do país.


Um reservatório de petróleo não é algo simples de compreender. Seu perfil é definido por uma série de peças para fazer sentido. O retrato que surgiu desse quebra-cabeça, diante dos engenheiros da OGX, é um reservatório de petróleo descontínuo. Segundo a OGX, não há tecnologia capaz de tornar os campos de Tubarão Tigre, Tubarão Gato e Tubarão Areia uma realidade. Essa revisão de expectativas gerou um descontentamento geral. Em março, a OGX informara que, na mais conservadora das projeções, havia 521 milhões de barris de óleo para explorar nos três campos citados. A Agência Nacional do Petróleo (ANP), reguladora do setor, informa que a declaração de comercialidade é uma decisão empresarial. Os critérios variam – algumas empresas aceitam assumir o risco de uma produção menor, outras não. A agência cobra prazos. Se descumpri-los, a empresa é multada. Se voltar atrás, perde o investimento, como Eike. E como fica o acionista minoritário? Cabe à Comissão de Valores Mobiliários investigar se houve má-fé.


No meio do imbróglio, Eike segue empobrecendo. A desconfiança do mercado fez com que a agência de classificação de risco Standard & Poor’s reduzisse a nota da OGX de “B” para “CCC”. Em bom português, “mais um passo rumo ao calote”. Ao justificar a nota, na semana passada, a S&P’s resumiu o drama de Eike: a dependência de condições favoráveis para honrar suas dívidas.


Na lista dos compromissos, Eike precisa pagar US$ 499 milhões à OSX, estaleiro do grupo cuja encomenda de cinco plataformas foi cancelada. Precisará pagar ainda, até 30 de julho, R$ 1,076 bilhão para a ANP pelas áreas de exploração compradas no último leilão. O valor inclui as garantias do programa exploratório mínimo com que a OGX se comprometeu. Esse novo portfólio, junto de outras áreas a explorar, como o campo de Tubarão Martelo, é a esperança de continuidade do negócio. O desafio de Eike é convencer, de novo, investidores a apostar nele – e não será fácil. Na quinta-feira, dia 4, o mercado deu nova demonstração de não confiar no ex-todo-poderoso Eike. O bilionário deixou o comando da MPX, de energia, notícia que levou à valorização das ações de todo o grupo. Como ÉPOCA antecipou em recente reportagem de capa, o plano proposto pelo banco que assessora Eike, o BTG, é vender a MPX e a MMX (de mineração).
 
Eike Batista é a maior vítima de si mesmo. Como controlador, terá de injetar até US$ 1 bilhão na OGX
Apesar da dor de cabeça dos bancos credores, principalmente os públicos (a holding EBX deve mais de R$ 6 bilhões ao BNDES e à Caixa Econômica Federal), Eike é a maior vítima de si mesmo. Como acionista controlador da OGX, assinou um contrato pelo qual se compromete a comprar novas ações da companhia a R$ 6,30, para injetar até US$ 1 bilhão – segundo os bancos Bank of America e Deutsche, as ações não valem hoje nem R$ 1. Eike tornou-se o X da crise de credibilidade que contagiou os papéis de outras empresas ao longo da semana passada, recheada de más notícias para o Brasil, como baixa produção industrial e expectativas mais pessimistas sobre a economia. A Bolsa de Valores de São Paulo sofreu seu maior tombo desde 2011.


Eike já foi símbolo de empreendedorismo dos bons ventos da era Lula. Os bons ventos pararam de soprar, e Eike juntou-se ao próprio governo brasileiro em seu momento de perda de credibilidade internacional. O barco de Eike começou a afundar com rapidez alarmante, e ele busca saídas. Sem alarde, a OGX declarou à ANP que uma área explorada com a empresa malaia Petronas é viável. É um começo. Só falta o mercado acreditar.
 
20 de julho de 2013
ISABEL CLEMENTE - Época
 

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