"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 16 de julho de 2013

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              Artigos - Cultura       
 
Uma notícia interessante apareceu no Newsmax por meio da seguinte manchete: Bilionários descartam ações, economistas sabem porquê. Resumidamente dizendo, o artigo declara que Warren Buffet e outros bilionários não têm confiança no futuro das companhias americanas "que não estão propensas a mudanças" por causa das recentes amostras de "desempenho frustrante".
O resto da matéria é uma propaganda de um economista que fez previsões acerca de uma grande correção no mercado. Tais previsões, evidentemente, são efemeridades. Como alguém pode ter a pretensão de prever o futuro?
 
O economista político Max Weber é conhecido em boa parte por seu A ética protestante e o espírito do capitalismo, onde ele argumenta que a ética puritana influenciou o desenvolvimento da sociedade de mercado. Weber quis ser científico quando se tratava de economia e no modo com que as pessoas lidam com a incerteza.
Para esse fim, Weber escreveu Economia e Sociedade, onde ele dividiu a ação social em quatro tipos: (1) instrumentalmente racional; (2) racional em relação aos valores; (3) afetiva ou (4) tradicional (ou de “hábitos arraigados”). Desses quatro tipos de ação, podemos presumir que a previsão de mercado se encaixa em uma das duas primeiras.
 
A ciência, para Weber e vários outros cientistas, trata-se de previsão. Se você quiser entender a ação humana na economia, você precisa de algum tipo de tipologia compreensiva para vislumbrar os fatores em jogo.
Na economia não se pode explicar tudo que acontece em termos de um indivíduo buscando racionalmente vantagem pecuniária.
Um grande negócio depende de fatores irracionais que raramente são discutidos. Tais fatores são desesperadamente entrelaçados com outros – como no caso da ação produzida pelo puritanismo na economia de mercado dos séculos passados.
 
Weber esteve particularmente interessado no papel que a religião desempenha na atividade econômica. E se Weber estivesse vivo hoje, ele ficaria fascinado ao ver que essas crenças irracionais de origem não-religiosa estão tendo um profundo efeito na economia atual.
Com efeito, essas crenças irracionais estão tão fortemente presentes, que não podemos sequer discuti-las sem entrar em controvérsias. Deve-se ou acreditar ou ser um inimigo da crença. Em ambos os casos não existe discussão racional.
Porquanto os verdadeiros crentes são, verdadeiros crentes e em todos os lugares é possível achar um e constatar sua influência. Eles tiranizam nosso pensamento e trazem junto profundas mudanças sociais e econômicas na sociedade.
 
Talvez o que mais fascina em Economia e Sociedade é a seção intitulada “A Dominação Carismática e sua Transformação”. Não devemos subestimar esse fator eminentemente irracional e misterioso na economia e na história política, pois é durante uma grande crise que uma liderança carismática tipicamente vem à tona. Weber explica assim: “Todas as necessidades extraordinárias (...) que transcendem a espera da rotina econômica diária, sempre foi satisfeita (...) por uma base carismática.
Quanto mais voltamos na história, mais predominante é essa realidade”. Em outras palavras, o verdadeiro líder carismático aparece em tempos de angústia e não em tempos de paz e prosperidade. Ele aparece no começo do fim das coisas.
Ele pode ser descrito como Cristo se descreve no Livro do Apocalipse: “Eu sou o Alfa e o Omega, o princípio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de vir, o Todo-Poderoso.”
 
O líder “natural”, aquele que é carismático, aparece como se a Providência tivesse evocado ele. Ele fala como se tivesse uma autoridade advinda de uma fonte superior. Tais líderes, escreveu Weber, “não eram pessoas que ocupavam um cargo público, nem que exerciam determinada "profissão" especializada e remunerada, no sentido atual da palavra, mas portadores de dons físicos e espirituais específicos, considerados sobrenaturais”.
O líder carismático parece estar abrindo caminho para algo que provém de uma origem “superior”. Quando o líder carismático fala, as pessoas ficam mesmerizadas ou fascinadas com seu inspirado fervor. Elas podem até sentir que estão ouvindo a Palavra de Deus.
 
Não devemos ficar presos, diz Weber, a uma noção estritamente religiosa de carisma. Em um mundo cada vez mais secular, onde a política tomou o lugar da religião, o líder “carismático” pode ser um orador com um magnetismo que hipnotiza as massas enquanto elas parecem flutuar dentro e fora de uma espécie de êxtase religioso.
Deixando de lado as fraudes e atos de circo, Weber sugere que tal liderança é real e tem um impacto profundo onde quer que apareça. Na sociedade complexa de hoje pode haver líderes carismáticos em muitas esferas da vida, mesmo em corporações.
Considere os gênios de inspiração semidivina Thomas Edson e Nikola Tesla. Ambos se dedicaram a um projeto que transformou a economia mundial. É o caso de perguntarmo-nos: De que lugar veio essa extraordinária inspiração?
 
É interessante notar que a palavra “genius” vem do latim genius, genii, que faz referência à divindade tutelar de cada pessoa, família ou lugar. Alguém acredita seriamente que inspiração criativa é algo racional? Ou será que é algo místico? E não é a economia, em grande parte, guiada pela inspiração criativa?
Com efeito, não sabemos qual invenção ou descoberta científica pode derrubar todas as nossas expectativas econômicas (sejam elas otimistas ou pessimistas). Considere as consequências econômicas do computador e do smartphone por onde você lê este artigo.
Trinta anso atrás, esses produtos (da forma que estão) não existiam. O que existirá daqui a 30 anos? Talvez possa existir inimaginável e maciça prosperidade.
 
Por outro lado, pode haver apenas escombros e destruição. Nessa conjuntura, não podemos simplesmente visualizar o futuro com certeza, pois muitas possibilidades estão abertas a nós. Dadas as forças criativas e carismáticas à solta na economia global, não há futuro certo, nem um padrão discernível ou seque um passado para poder comparar com os dias atuais.
 
O carisma, diz Weber, é uma força revolucionária tanto na sociedade quanto na economia. É assim, pois o líder carismático cria uma nova desobrigação ao instituir uma nova lei ou ao instigar um novo modelo de vida “em favor da glorificação exclusiva do autêntico espírito profético e heroico”.
Deste modo, as pessoas são inspiradas pelas histórias de Tesla ou Edison, ou mesmo pelas histórias dos bilionários que fizeram sua fortuna por meio de um tipo de pensamento que simplesmente impressionam quando confrontados com o senso comum. E sim, até mesmo os bilionários podem ser líderes carismáticos.
 
Talvez a maioria das pessoas – que por sua vez não têm inspiração – precisam seguir alguém. O problema tanto para investidores quanto para seguidores é o discernimento. Qual profeta financeiro tem o dom da graça? Qual tem genuíno carisma e genuína inspiração? E estamos corretos em pensar que pessoas extraordinárias possuem um entendimento extraordinário das coisas (o que faz com que elas consigam grandes feitos)? E se o carisma é real, como afirma Weber, é algo que se possui permanentemente ou é temporário?
Certamente não podemos negar que Joana D’Arc era um exemplo de liderança carismática, embora as “vozes” tenham-na abandonado antes de ela ser queimada como bruxa. Então, mesmo se pudermos reconhecer um líder financeiro genuinamente inspirado, como podemos nos certificar de que ele não perdeu subitamente sua graça da mesma maneira que Joana D’Arc?
 
O manancial da criatividade humana vem da alma, que por sua vez deve se permanecer como misteriosa. Talvez seja verdade que a ciência não seja melhor em prever a ação humana que o xamanismo. E assim ficamos a seguir a nossa própria análise da economia ou a de outra pessoa.
Mas quem, de fato, segue a própria análise? Em última análise, mesmo as nossas inspirações podem vir de fora de nós (isto é, se nossas inspirações forem genuínas).

16 de julho de 2013
Jeffrey Nyquist
Publicado no Financial Sense.
Tradução: Leonildo Trombela Júnior

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