"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

BOMBARDEAR O IRÃ NÃO É A RESPOSTA

Ataques preventivos não acabarão com o sonho dos iranianos de conseguir bombas nucleares, e só servirão para fortalecer o regime dos aiatolás junto à população.

Não se engane quanto à ameaça que o Irã representa com uma bomba nas mãos. O país é inseguro, guiado por uma forte ideologia e se envolve nos assuntos de seus vizinhos. Tanto o Irã quanto seus aliados – incluindo o Hezbollah no Líbano e o Hamas na Faixa de Gaza – podem agir de maneira mais ousada. Esse perigo é sentido especialmente por Israel, cercado de ameaças e especialmente vulnerável a um ataque nuclear por ser um país tão pequeno. O Supremo Líder do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, recentemente se referiu ao “regime sionista” como “um câncer que deve ser extirpado”, e para os judeus tornou-se impossível tratar isso como pura retórica.

Mesmo que o Irã desenvolvesse uma arma nuclear para sua própria proteção, outros na região poderiam sentir que também precisam de armas. A Arábia Saudita anunciou que irá se armar, e o Paquistão está pronto para garantir a bomba saudita em troca do apoio que recebeu dos sauditas a seu próprio programa nuclear. Turquia e Egito, outra potências da região, podem concluir que devem se juntar ao clube nuclear. Por toda parte, países como o Brasil podem sentir que armas nucleares são um instrumento vital para garantir a dominação regional ou temem que seus vizinhos possam pensar dessa forma.

Alguns especialistas defendem a ideia de que Estados com armas nucleares tendem a se comportar de maneira mais responsável. Mas imagine um Oriente Médio com cinco potências nucleares marcadas pela rivalidade e por conflitos sectários. Cada um deles teria os dedos permanentemente nos botões vermelhos, acreditando que o primeiro a apertá-lo sairia vitorioso no final. O regime iraniano ganha legitimidade ao demonizar as potências estrangeiras. O período da Guerra Fria parece uma tanto estável se comparado a esse cenário, e ainda assim, os Estados Unidos e a União Soviética chegaram bem perto do Armagedom em vários momentos.

O sonho do ataque preventivo

Não é surpresa, portanto, que muitos defendam ataques preventivos. Mas ações militares não são a solução para o perigo do Irã nuclear, que poderia retaliar, lançando foguetes contra Israel a partir de Gaza e do Líbano. Células terroristas por todo o planeta poderiam atacar alvos norte-americanos e judaicos, e o Irã poderia usar os preços do petróleo para arruinar a economia mundial. Embora alguns líderes árabes apoiem uma greve, a maioria dos muçulmanos provavelmente não tomará parte nesse tipo de ação, distanciando ainda mais o Ocidente da Primavera Árabe. Os custos de um ataque são gigantescos e até poderiam ser justificados, caso as ações militares parecessem algo que poderia funcionar. Não é o caso.

Atacar o Irã seria muito mais difícil que as investidas israelenses contra os programas de armamentos do Iraque, em 1981 e a Síria, em 2007. Se um ataque como esse fosse fácil, israel já o teria realizado anos trás, quando o programa iraniano era mais vulnerável. Mas as instalações iranianas estão se multiplicando, e elas agora estão mais reforçadas. Os Estados Unidos, donos de um poder militar consideravelmente maior que o dos israelenses, tentam conter Israel, já que, na melhor das hipóteses, um ataque só faria o programa nuclear retroceder em uma década.

E então?

Isso não significa que o mundo simplesmente deveria deixar que o Irã ficasse com a bomba. As receitas do governo, abaladas pelo embrago do petróleo, em breve irão se esvair. As sanções estão funcionando, o sistema financeiro iraniano está isolado, e o valor de sua moeda despencou. Os defensores de um ataque dizem que a ação militar poderia dar um fim ao regime, mas a maior probabilidade é a de que isso empurre aos iranianos para junto de seus líderes. Enquanto isso, as mudanças políticas tomam conta do Oriente Médio e o regime de Teerã perdeu a confiança de seu povo. Eventualmente a resistência popular vai entrar em ação, assim como aconteceu em 2009. Um novo regime promovido pelos iranianos tem mais chances de renunciar à bomba do que um que tenha sido vítima de ataques norte-americanos.

Existe o perigo de que o Irã consiga uma arma nuclear antes que isso aconteça? Sim, mas bombardear o país somente aumentará esse risco. É possível deter o Irã caso o país esteja determinado a conseguir uma bomba? Não para sempre, e bombardeá-los pode deixá-los mais desesperados. Em resumo, o mundo não pode deter a capacidade iraniana de conseguir a bomba, apenas pode tentar mudar sua disposição para consegui-la. E, por enquanto, esse cenário parece mais provável por meio de sanções e diplomacia. Não pela guerra.

Fontes:The Economist - Bombing Iran
24/02/2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário