"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 30 de outubro de 2012

TRÊS TEXTOS SOBRE ALGUMAS FALÁCIAS

REDUTO DE LULA, NORTE-NORDESTE FORTALECE OPOSIÇÃO

O mito Luiz Inácio Lula da Silva, que em 2006 foi reeleito com 60,8% dos votos de seus conterrâneos nordestinos, e em 2010 ajudou a presidente Dilma Rousseff a fazer 70,5% dos votos na região, nestas eleições não teve forças para impedir que o Nordeste se transformasse no novo bunker do bloco PSDB/DEM. Juntas, as duas legendas levaram sete das 15 maiores cidades da região. Entre elas quatro capitais: Salvador, Aracaju, Maceió e Teresina. O mesmo fenômeno se repetiu no Norte, onde Lula teve 65,5% dos votos em 2006, e Dilma obteve 57,4% em 2010. Nas eleições de domingo, a oposição passou a controlar três capitais, com a vitória do PSDB em Manaus e Belém, e do PSOL em Macapá.
 
Além disso, o PSB, que já fala em alianças com os tucanos, consolidou-se nas duas regiões, com vitórias sobre o PT em Fortaleza e Recife, e em Porto Velho.
 
“O declínio do prestígio de Lula no Nordeste nestas eleições é um fato novo, relevante, que deve ser analisado. Ele foi a Salvador duas vezes. Em Fortaleza, foi uma vez. Gravou para o candidato do PT em Recife e não conseguiu virar as situações negativas. O que parece é que as pessoas se cansaram dessa coisa de mito, de deus. É um exagero dizer que ele foi o grande derrotado, porque ganhou São Paulo. Mas há um declínio de Lula, quer ele queira, quer não”, avaliou o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), que apoiou a candidatura de Geraldo Júlio, do PSB de Eduardo Campos.
 
Bolsa Família deixa de ser recurso eleitoral

Fora São Paulo, Lula centrou fogo no Nordeste, em comícios, carreatas e gravações para seus candidatos. Para a oposição, as derrotas de Lula se devem ao fato de grande fatia do eleitorado, beneficiada pelo o Bolsa Família, considerar o benefício uma política pública consolidada: “Lula perdeu força nessa eleição porque se exauriu um pouco essa coisa da Bolsa Família como fidelização do eleitorado”, avalia o diretor da CEF Geddel Vieira Lima (PMDB), que apoiou ACM Neto, do DEM, em Salvador.
Em Salvador, Lula usou o discurso do Bolsa Família e chamou ACM Neto de mentiroso:

“É uma mentira sórdida dizer que o avô dele (Antônio Carlos Magalhães) criou o Bolsa Família”, disse Lula no palanque de Nélson Pelegrino. Animado com a conquista de Aracaju e Salvador, o presidente do Democratas, senador Agripino Maia (DEM-RN) afirma: “Lula era uma fortaleza inexpugnável em Pernambuco, sua terra natal, uma potência no Nordeste.
O exemplo mais emblemático do fim desse mito é Salvador. Ele desembarcou lá com Dilma, era Bolsa Família de ponta a ponta. Tinham obrigação de eleger o candidato deles lá. O pobre do Bolsa Família aprendeu a votar e votou em quem quis. O messianismo de Lula morreu”, disse Agripino.
 
No PSDB, o senador Aécio Neves (MG) ressalta o fortalecimento da oposição no Norte e Nordeste, onde estava praticamente aniquilada. E minimiza a liderança da dupla Lula/Dilma. “Com exceção de São Paulo, onde estiveram no palanque de Haddad, com um discurso muito raivoso, Dilma e Lula perderam todas. Não tem mais esse negócio de Lula ser o dono da cocada preta não! Voltamos para o jogo com muita força no Norte e Nordeste”, disse Aécio Neves.
(…)
 
30 de outubro de 2012
Por Maria Lima e Guilherme Voitch, no Globo
in Reinaldo Azevedo

OS PUXA-SACOS ESTÃO ERRADOS! NÃO FOI A INFLUÊNCIA DE LULA EM SP QUE ELEGEU HADDAD 

Ontem, uma senhora de inteligência aparentemente avantajada cantava as glórias de Lula na televisão! Nunca antes na história destepaiz teria havido um vitorioso como ele! Ele seria o grande responsável pela eleição de Fernando Haddad em São Paulo; ele teria demonstrado a grandeza de sua influência em São Paulo, ele, ele, ele… O que posso dizer? Trata-se de uma opinião contra os fatos!
 
Sim, Lula tirou Fernando Haddad do bolso do colete, afastou Marta e o fez candidato. Como Haddad está eleito, a consequência vira a causa, e se pode apontar a genialidade de Lula. Vá lá… Mas terá mesmo o eleitorado paulistano votado no candidato petista porque o Apedeuta mandou? Vou fazer uma provocação: Lula foi derrotado (vou citar as cidades às quais ele especialmente se dedicou) em Manaus, Salvador, Recife, Belo Horizonte, Campinas, Diadema, Porto Alegre, Taubaté e, se querem saber, também em São Paulo!
 
O tamanho da influência do ex-presidente na cidade está na votação que Haddad obteve no primeiro turno. Não foi a influência positiva de Lula que o elegeu; foi a influência negativa de Kassab que deixou de eleger Serra. Fosse Lula assim tão poderoso também na capital paulista, seu candidato teria disparado, COMO JURAVAM TODOS OS ANALISTAS ISENTOS, PARTIDÁRIOS DE HADDAD, logo no primeiro turno. Não fosse a forte campanha de desconstrução da imagem de Celso Russomanno e a mobilização da máquina federal — como nunca antes… —, o rapaz não teria passado nem para o segundo turno, como todo mundo sabe.
 
O tamanho da influência de Lula em São Paulo, se querem saber, é MENOR — vejam como sou herético — do que o tamanho da influência do próprio PT na cidade e no estado, onde costuma ter um terço dos votos. Haddad ficou com 28,98% dos votos válidos.
 
Esse negócio de que Lula faz e acontece já é parte de uma estratégia eleitoral que está em curso — da qual também falarei oportunamente (vejam quantas pautas!): a disputa pelo governo de São Paulo. É claro que, no atual arranjo, Alexandre Padilha, ministro da Saúde, sai com alguma vantagem na disputa interna petista. Seria, para usar a metáfora do apedeuta, o novo “poste” com que ele pretende “iluminar o país”. O ministro, anotem aí, já é o pré-candidato predileto dos mesmos setores da imprensa que aderiram à candidatura Haddad.
 
Ocorre que Alckmin tem um governo aprovado pela maioria. A rejeição a seu nome é bem menos do que o eleitorado que tradicionalmente vota no PT. Por isso é preciso começar a demonizá-lo desde já. E a área escolhida é a segurança pública (também escreverei sobre isso; não vai faltar assunto, e não lhes vão faltar textos, hehe).
 
A tarefa número um da imprensa “pogreçista” agora é elevar a rejeição ao governador, tentando destruir a sua gestão, como destruída foi a de Kassab. Uma diferença positiva, no entanto, é que, até onde se sabe, Alckmin não está empenhado em ser base de apoio do PT…
 
30 de outubro de 2012
Por Reinaldo Azevedo

GENEALOGIA DE UMA DERROTA E DESRESPEITO À INTELIGÊNCIA

É claro que o tucano José Serra sofreu uma derrota importante na disputa pela Prefeitura de São Paulo. E ela precisa ser pensada.
Desde o começo

Sempre achei — e há textos a respeito — a sua candidatura uma operação de altíssimo risco. Como a memória, até agora, graças a Deus, nunca me falhou, sei bem o que escrevi no dia 19 de janeiro deste ano. Leiam (em azul):

Na verdade, nunca achei que [Serra] cometeria a sandice de sê-lo [candidato à Prefeitura]. É evidente que [Serra] dispõe de todos os predicados para o cargo e fez uma excelente gestão quando prefeito – tanto é assim que se elegeu, pela primeira vez na história, governador no primeiro turno, em 2006. “Sandice” por quê? Porque seus adversários passariam a campanha cantando o samba de uma nota só: “Se for prefeito, vai renunciar para se candidatar à Presidência…” Ocupar-se-iam menos em dizer por que eles próprios deveriam estar na Prefeitura do que em dizer por que o outro não deveria. E estariam, ainda que com más intenções, vocalizando o sentimento de boa parte dos paulistanos, que acham que seu lugar é a Presidência. Uma pesquisa bem-feita e honesta revelaria esse dado, estou certo.”
Eis aí o que eu pensava e, obviamente, penso ainda. No mesmo texto, eu notava duas outras coisas:

1 – O jeito Kassab de negociar:

Negociando com os tucanos de um modo muito peculiar, o prefeito se encontrou com Lula e propôs uma aliança: indicaria o candidato a vice na chapa de Fernando Haddad. E ainda teria anunciado que levaria consigo uma penca de vereadores. Uma guinada e tanto na carreira do prefeito, não é?, que se elegeu com os votos dos não-petistas em São Paulo. Uma parte do PT reagiu mal, mas Lula mandou estudar a proposta, e o comando do Diretório Estadual diz que é preciso ver a possibilidade sem preconceitos. Imaginem só: Haddad candidato com o apoio de Kassab, restar-lhe-ia fazer oposição aos, bem…, aos tucanos do governo do Estado, suponho.”
 
2 – O risco PT

O cenário confuso de agora sugere, para muita gente, uma chance real de o PT vencer a eleição na cidade, o que não seria bom para ninguém – inclusive para o futuro presidenciável do PSDB, seja ele Serra, Aécio ou J. Pinto Fernandes…
 
De volta a outubro de 2012

Eu tenho compromisso com o que escrevo, ora! Posso ser surpreendido por decisões erradas ou insensatas deste ou daquele, mas o que interessa, para os leitores, é a natureza do jogo — e é isso que eles vêm buscar aqui. Por isso, passaremos dos 4 milhões de visitas neste mês. Adiante.
 
A decisão de Serra de se candidatar, dado o alinhamento, então, dos astros políticos, era arriscada e, em si, errada. Como se nota, não estou dizendo isso agora, não é? Não faço análise de ocasião. Mas Gilberto Kassab não lhe deixou outra saída. Emparedou-o com a decisão de apoiar Fernando Haddad à Prefeitura — a menos que o candidato fosse… o próprio Serra em razão da lealdade pessoal e coisa e tal… Para não ver fraturado o bloco que vinha governando a cidade o estado, lá foi o tucano para a operação arriscada, que chamei de “sandice” no dia 19 de janeiro. A questão é saber se havia alternativa. Não havia. O prefeito não aceitava nenhum outro nome do PSDB.
 
Então vejam que fantástico acontecimento se deu: os petistas, com o auxílio da imprensa amiga, ressuscitaram aquela cretina questão da renúncia (que só fazia sentido porque dela, supostamente, teria originado o poder de Kassab, o que é falso) e a juntaram com a rejeição ao prefeito.
E passaram a atribuir a Serra um papel impossível: ele seria a um só tempo “guru” do prefeito — jornalistas usaram a palavra como informação referencial, como se fosse um dado da natureza — e continuador do pupilo; criador e criatura ao mesmo tempo… Lula impôs Fernando Haddad na base do dedaço, e esses mesmos iluministas saudaram: “Viva a novidade!”.
 
A armadilha

Muito bem! A decisão de Kassab de apoiar o PT a menos que Serra fosse o candidato empurrou o tucano para a disputa, que foi perdida justamente por causa do… fator Kassab! Aquele que levou Serra a se candidatar está na raiz de sua derrota. Tudo consumado, no dia, seguinte, já está negociando com…, Fernando Haddad, o vitorioso. Kassab encontrou um lugar na política que é o do “ganha ou ganha”.
 
Agora o futuro

Ontem, li e ouvi muitas manifestações as mais desrespeitosas sobre o futuro de Serra. Desrespeito menos à pessoa do político do que à inteligência de leitores e telespectadores. Muitos decidiram lhe dedicar um réquiem, como dedicaram a Arthur Virgílio há dois anos, quando foi derrotado na disputa por uma vaga ao Senado. Acaba de se eleger prefeito de Manaus com uma votação consagradora.
 
Não sei qual será o futuro político de Serra. Sei que ele continua a ser uma das cabeças mais lúcidas do país — afirmei isso no debate na VEJA.com e reitero agora — e que a propalada “renovação da política”, que teria sido revelada agora pelas urnas, é uma dessas soberbas tolices que só interessam às raposas que não renovam nada. Ainda escreverei a respeito.
 
O PSDB levará em conta o quadro que tem ou cairá na cascata da “renovação”? Considerando o histórico, a resposta pode não ser a mais lúcida. Ontem, não faltaram manifestações estúpidas. Há quem esteja vendo com bons olhos, sinal de enraizamento nacional do partido, a vitória em Manaus, Teresina, Maceió e Belém… Duas capitais na Região Norte, duas na Nordeste e nenhuma na Sudeste… Então tá!
 
Confrontando, como sói acontecer, o consenso, vejo menos renovação do que reiteração de certos arcaísmos no resultado das urnas. Terei a chance de expor os meus motivos. Afinal, se é para ler o que todo mundo anda dizendo por aí — o jornalismo brasileiro inventou o pool noticioso e o pool de opinião!!! —, por que entrar aqui, não é? Se todos têm a dizer a mesma coisa, por que haver tantos?
 
30 de outubro de 2012
Por Reinaldo Azevedo

Nenhum comentário:

Postar um comentário