"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A LINHA RETA NÃO SONHA

 

A antiga e inapropriada discussão entre futebol-arte e futebol de resultados será ainda mais frequente até a Copa, por causa do fim do sonho de trazer Guardiola, símbolo do futebol bem jogado e bonito, e do retorno de Felipão à seleção, representante do futebol de resultados, embora, como todo bom técnico, tenha sucessos e fracassos.



Após a Copa de 1966, vencida pelos ingleses, só se falava, no Brasil, do fim do jogo moleque, inventivo e imprevisível das seleções de 1958 e 1962 e do novo futebol dos europeus, de resultado, força, disciplina tática, velocidade e objetividade.

Apenas quatro anos depois, após a Copa de 1970, o grande cineasta italiano Pasolini disse que a poesia brasileira tinha vencido a prosa italiana. Chico Buarque escreveu que os europeus eram os donos do campo, e os brasileiros, da bola.
Hoje, não somos mais os donos do campo nem da bola. Não aprendemos a utilizar os espaços e damos a bola com facilidade ao adversário.

Entre 1974 e 1994, o Brasil não ganhou a Copa do Mundo, porque havia seleções melhores. A de 1982 foi exceção. Encantou, mas não venceu. José Miguel Wisnik, em seu excepcional livro “Veneno remédio”, escreveu sobre esse período:
“Predominava a ideia de que era preciso adotar um jogo eminentemente coletivo, tecnicamente resp
onsável, compactamente defensivo, fisicamente forte e que abrisse mão de devaneios individualistas”.

De 1994 até hoje, nas vitórias e nas derrotas, continuaram as discussões sobre futebol-arte e de resultados.

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PROSA E POESIA

As maiores equipes de todos os tempos, com vários estilos, sempre atuaram, primeiro, para vencer. A seleção de 1970 jogava um futebol de prosa e de poesia. Unem o pragmatismo criativo e o jogo coletivo com o talento individual e as fantasias. “A linha reta não sonha” (Oscar Niemeyer).

Quando as grandes equipes perdem não é porque não são competitivas. Dezenas de detalhes, que, muitas vezes, duram uma fração de segundos, mudam a história de um jogo. “A vida é um sopro” (Oscar Niemeyer).

A arte necessita da técnica. Já a técnica sem a arte tende ao tecnicismo e à ineficiência. O que não se pode é confundir firula, habilidade sem técnica, com arte.

Infelizmente, um grande número de pessoas envolvidas profissionalmente com o futebol apenas se preocupa com o resultado, com os estereótipos, com o imediatismo e com as manchetes bombásticas.

A discussão entre futebol-arte e de resultados transcende o futebol. Faz parte das eternas dúvidas humanas entre a razão e a imaginação, o desejo e a ética, o real e o simbólico, e tantas outras dualidades.
Quando vejo o Barcelona jogar, um time que une o individual com o coletivo, a fantasia com o resultado, atenuam-se minhas dúvidas futebolísticas e minhas angústias existenciais.

10 de dezembro de 2012
Tostão (O Tempo)

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