"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 26 de julho de 2013

A DESNAZIFICAÇÃO DA ALEMANHA: FATO OU FARSA? - 3a. PARTE

           
          Artigos - Cultura 
A Zona de Ocupação Soviética (1).

Ao considerar esta área é preciso lembrar que Alemanha e URSS foram aliadas desde o Tratado de Brest-Litovsky (1918), pelo qual o Império Russo retirava-se da I Guerra Mundial livrando o Império Alemão da frente oriental e permitindo aos bolcheviques lutar a Guerra Civil Russa sem inimigos externos na retaguarda. A aliança começou quando o General Luddendorf autorizou a passagem de Lenin e seus sequazes em trem lacrado pelo território alemão da Suíça para Leningrado.


Apesar da tentativa soviética em 1919 de tomar o poder na Alemanha através da Spartakusbund de Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht, foi assinado o Tratado de Rapallo (1922), uma ratificação pela República de Weimar da aliança com a URSS, reafirmado pela Alemanha Nazista através do Pacto Molotov-Ribbentropp (23 de agosto de 1939), às vésperas da invasão da Polônia pela Wermacht. A aliança durou até a invasão da URSS por Hitler em 22 de junho de 1941. Do último pacto constava um protocolo secreto, imposto por Stalin, no qual as duas potências se comprometiam a dividir entre si a Europa Oriental, iniciando-se pela Polônia.

Este protocolo foi encontrado pelos ingleses nos arquivos nazistas ao fim da II Guerra, e era negado pela URSS até 1989, quando uma comissão nomeada por Gorbachëv reconheceu-o como verdadeiro. A II Guerra foi uma guerra de Stalin, que usou Hitler como ponta de lança para a conquista europeia.

Ribbentropp beija a mão de Stalin assistido por Molotov.
 
O Tratado de Rapallo previa o rearmamento da Alemanha pela URSS, contrariando o Tratado de Versailles, que condenava a Alemanha, na prática, a permanecer desmilitarizada (2), limitando o Exército a 100 mil homens, a Marinha a navios de pequena tonelagem, proscrevendo os submarinos, e a proibição de uma Força Aérea.

A desnazificação em sua zona de ocupação seguiu os princípios da luta contra o capitalismo: eliminaram a camada mais alta da sociedade alemã – os proprietários de terra, industriais, banqueiros e homens de negócios. A maioria foi executada ou deportada para a URSS para trabalhos forçados ou extermínio. Suas terras, bancos e indústrias foram confiscadas e estatizadas.

Porém, todos os adultos que não tinham nenhum interesse na preservação da sociedade capitalista poderiam ser persuadidos a pertencer a uma sociedade comunista, mesmo os antigos nazistas, membros do partido ou até oficiais das SS. Estes podiam escapar das penalidades impostas nas outras zonas de ocupação desde que demonstrassem lealdade e obediência aos novos senhores comunistas. Ora, isto não era muito difícil, dada a identidade anticapitalista dos dois regimes: socialismo e nacional-socialismo eram apenas duas vertentes da mesma ideologia, incluindo o antissemitismo (3).

Quando o governo comunista foi instalado, a abertura aos ex-nazistas foi ainda maior: sua plena cidadania foi restaurada com direito a exercer qualquer profissão. O objetivo foi ligar indissoluvelmente ao Partido Comunista suas atividades no pós-Guerra, o que ocorreu com a maioria dos cidadãos adultos do sexo masculino, excetuando-se os que tivessem cometido crimes de guerra contra a União Soviética, sem nenhuma consideração por outras vítimas, como judeus, ciganos, etc. Outro grupo excluído da desnazificação foram os cientistas e engenheiros que tinham sido os pilares da tecnologia alemã (4), desde que concordassem trabalhar e fazer pesquisa para a URSS, para onde seguiu a maioria para serem melhor controlados.

O ‘pragmatismo’ soviético foi justificado por um alto oficial: ‘Nós, russos, não somos politicamente afetáveis e por isto usamos os cérebros dos nazistas o mais que pudermos’.

26 de julho de 2013

Heitor De Paola

Notas:

[i]
Este é o 50º artigo que escrevo para o Visão Judaica. Agradeço a confiança em mim demonstrada pelos editores e espero continuar fazendo jus a ela.

[ii] Ver detalhes em The Red Army and the Wermacht, how the Soviets militarized Germany, 1922-33, and paved the way for fascism, 1995, estudo de Yuri Dyakov & Tatiana Bushueyva dos arquivos secretos de Moscou abertos por um curto espaço de tempo por Boris Yeltsin.
[iii] Ver Out of the Red Shadows: Anti-Semitism in Stalin’s Russia, Gennady V. Kostyrchenko, 1995
[iv] Com estes, os aliados ocidentais fizeram o mesmo, com a diferença que foram totalmente libertados, vide Werner Von Braun.

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