"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

CONSUMA-SE A FARSA CHAVISTA

 

O chavismo confirmou o que se temia: um golpe de Estado para manter Hugo Chávez no poder, com ele em situação incerta, provavelmente gravíssima, num hospital em Cuba.

O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) venezuelano, aparelhado pelo caudilho, decidiu que a posse para um novo mandato, que deveria ter acontecido ontem, é mesmo “mero formalismo”, e poderá ser feita no futuro.

Embora se saiba que só um milagre permitirá a Chávez voltar a Caracas para a “formalidade”.

Criou-se uma situação esdrúxula. Chávez não governa por estar incapacitado. Nicolás Maduro, vice-presidente e indicado pelo caudilho como seu substituto, hoje não tem mandato: o vice na Venezuela é nomeado pelo presidente, como um ministro; Maduro não foi eleito nem reconduzido ao cargo.

A Constituição determina que, na ausência do presidente eleito, assuma o presidente da Assembleia Nacional (congresso), Diosdado Cabello. Mas isto não acontecerá.

A farsa chavista é prorrogar o mandato de Chávez — embutida nele a continuação de Maduro na vice-presidência —, fazendo letra morta da Constituição. Regimes autoritários que tentam manter uma aparência democrática, como o da Venezuela, mostram nessas horas sua verdadeira face.

A ditadura militar brasileira, que mantinha certos ritos “democráticos”, como o rodízio de generais no poder, também teve vários momentos reveladores, como quando Costa e Silva caiu doente; seu substituto constitucional era o vice-presidente, o civil Pedro Aleixo.

Mas, como ele não era “confiável”, tinha, inclusive, sido contrário à edição ao AI-5, que dava poderes extraordinários ao presidente da República e suspendia várias garantias constitucionais, os militares não permitiram sua posse e criaram uma junta para governar o país. O regime militar mostrava sua face.

É o que fizeram os dirigentes chavistas: um “politburo” composto por Maduro, o presidente do congresso, Diosdado Cabello, próceres do PSUV (o partido chavista) e comandantes militares fiéis ao movimento bolivariano. São eles que vão “governar” no mandato estendido de Chávez, em afronta aberta à lei maior do país.

Não é só o chavismo que mostra sua essência. Ao expressar confiança no desenvolvimento da democracia venezuelana, no dizer de Maduro, e ao felicitar-lhe pela decisão favorável da Justiça desse país, a presidente Dilma Rousseff deixa claro que o Brasil usa dois pesos e duas medidas: o impeachment do presidente Fernando Lugo, do Paraguai, foi considerado um golpe pelo Brasil — e por Mercosul e Unasul — e resultou na suspensão do Paraguai dos dois organismos, por conta da cláusula democrática que consta de seus estatutos.

Já o escancarado golpe em Caracas recebe apoio. O Brasil acaba de se nivelar por baixo no continente. Outra vez.

11 de janeiro de 2013
 Editorial de O Globo

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