"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 23 de abril de 2013

É A VEZ DO BRASIL?

 

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A vaga entrevista de ontem do todo poderoso presidente do BNDES, Luciano Coutinho, ao Estadão é mais uma daquelas oportunidades perdidas de entender melhor qual o projeto de Brasil que o PT tem em mente ou até, se o PT tem qualquer projeto de Brasil em mente.
Mas abre espaço para algumas conjecturas.

Informa o dr. Luciano que a política de eleger “campeãs nacionais” ou, como ele prefere, a política de “promoção de competitividade de grandes empresas de expressão internacional”, “é uma agenda que foi concluída; uma política que tinha méritos mas que já chegou até onde poderia ir”.

O primeiro reparo que me veio à mente diz respeito à ordem dos fatores que, no caso, altera radicalmente o resultado.

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O que ocorreu não foi exatamente que o governo pegou empresas que já tinham “expressão internacional” e lhes deu um empurrãozinho. Na maioria dos casos, escolheu, ninguém sabe por quais critérios objetivos, empresas que não tinham projeção nenhuma, nem nacional, nem internacional, e fez delas monstros devoradores de concorrentes aqui e pelo mundo afora.

E com tanta largueza que seus donos hoje levam uma vida de potentados orientais voando entre seus palácios e yachts espalhados pelo mundo em impressionantes jatos transcontinentais nos quais Don Lula I costuma tomar carona para, graciosamente é claro, “ajudar a vendê-los no exterior”.

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 Foi o caso, por exemplo, dos açougueiros de Goiás hoje transformados no gigante JBS, ficando a sua irmã menor, Marfrig, pelo caminho cheia de problemas para se manter de pé apesar dos bilhões recebidos, ou dos aventureiros do mercado financeiro que, remendando pedaços espalhados por todo o país, gastaram os tubos do nosso dinheiro tentando criar uma gigante dos laticínios ao lado da gigante da carne, a LBR, hoje às portas da falência.

De par com essas, levaram grossos bilhões “parte da siderurgia” (a Gerdau, para ser exato) e representantes de setores como petroquímica, celulose, suco de laranja, cimento (este dos mesmos donos da celulose), telefonia (só a Oi) e produção de softwares (a Totvs), este estratégico para o partido por razões diversas dos demais, e ainda uns tantos outros felizardos.

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Uma variada “cesta” de empresas, enfim, que dificilmente encaixa-se no vago conceito que ele aventou – grupos “limitados (às áreas de) commodities e pseudo commodities” (?) – para justificar essas escolhas.

Ou, melhor dizendo, que encaixa-se perfeitamente, assim como literalmente todo e qualquer setor da economia, desde que levado ao pé da letra o tão inovador quanto ilimitadamente amplo conceito de “pseudo-commodity”.

Onde, sim, tudo se amarra firmemente é no fato de todos os proprietários beneficiados sentarem-se à mesa do Conselho de Gestão da Presidência da República, ao lado do titular da própria, na qual é decidido em ambiente de ampla confraternização quem fica com quanto do bolo generosamente disponibilizado pelo BNDES.

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Se é difícil vislumbrar que objetivo estratégico a projeção internacional desse grupo heterogêneo de empresas busca conquistar para a nacionalidade, é menos difícil vislumbrar porque um partido político que sofre crises de urticária sempre que pensa em deixar o poder aproveitaria as oportunidades ao alcance da mão para criar uma rede de projeção internacional do seu próprio poder econômico virtualmente infiscalizável daqui por diante.

As empresas de que o BNDES tornou-se sócio têm hoje mais filiais do que o governo tem embaixadas, sendo, portanto, capazes de levar e trazer dinheiro para cada buraco do planeta sem que os pobres órgãos nacionais de fiscalização possam sequer sonhar em saber o que está acontecendo.
Vê-se por essas e outras que se não há um projeto de Brasil para o PT certamente ha um projeto de PT para o Brasil.

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A julgar pelo que nos diz o dr. Luciano, esta parte, ao fim de 10 longos anos de investimentos, está satisfatoriamente resolvida e o partido parece disposto a voltar-se, finalmente, para o país que, nesse meio tempo, ficou a ver navios (e caminhões, e aviões, e usuários de transportes públicos, e necessitados de atendimento médico por falta de saneamento básico, e formandos semi-analfabetos, e…) sempre estacionados na fila de espera dos equipamentos de infraestrutura preteridos em função da necessidade atender o urgente interesse nacional em fabricar e vender bifes, laticínios, suco de laranja, aços de boa marca, papelão e cimento pelo mundo afora.

Como otimista empedernido que sou, torcerei para que as declarações do dr. Luciano escondam a decisão do PT de deixar pra lá essa obsessão de ser ele próprio a economia nacional para passar a ser o provedor de condições regulatórias e infra estruturais para que a economia funcione por si só.
Mas até prova mais consistente em contrário, reconheço que até para alguém com tanta boa vontade quanto eu isto soa como pedir demais…

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23 de abril de 2013
vespeiro

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