"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 22 de julho de 2013

NO RIO, LICITAÇÃO DE HELICÓPTERO USADO POR CABRAL TEVE CONCORRENTE ÚNICO

 

Apenas a Synergy, offshore com sede no Panamá, foi considerada habilitada a concorrer no final do processo, realizado em 2011

 
Apenas uma empresa, a offshore Synergy Aerospace Inc, sediada no Panamá (um paraíso fiscal) e com capital social de US$ 10 mil, foi considerada habilitada no final da licitação que terminou com a venda ao Estado do Rio do helicóptero Agusta AW109 Grand New, avaliado em quase US$ 10 milhões e usado pelo governador Sérgio Cabral Filho (PMDB).
A história da compra do aparelho está documentada no processo de licitação, obtido pela reportagem do Estado por meio da Lei de Acesso à Informação.
Apesar de não ter como fornecer certidões negativas de dívidas, nem livros contábeis, exigidos pelo edital - e de cuja apresentação foi eximida, por ser estrangeira, segundo a Lei 8.666/93 - a companhia, do empresário German Efromovich, controlador da antiga OceanAir e hoje Avianca, pôde participar do certame.
A outra concorrente, a Helibras, em nome da francesa Eurocopter, foi desclassificada e desistiu de recorrer. Sozinha na disputa, a Synergy foi vencedora.
O Agusta está no centro de uma polêmica envolvendo Cabral, que até poucos dias embarcava nele na Lagoa Rodrigo de Freitas e voava até o Palácio Guanabara, sede do governo, em Laranjeiras - menos de dez quilômetros depois.
Após reportagem da revista Veja que registrou o embarque de familiares do governador no helicóptero, ele anunciou que não voaria mais para o trabalho, mas continuaria a usá-lo para ir a Mangaratiba, onde tem casa de veraneio.
O uso do transporte é citado por pessoas próximas ao governador, como o presidente do PMDB local, Jorge Picciani, como precaução de segurança, devido a medidas de combate ao crime, como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) nas favelas. "Vocês acham que o Cabral e sua família não correm risco?"
No "projeto básico para aquisição de uma aeronave tipo helicóptero biturbina de pequeno porte VFR/IFR", porém, o item segurança pública não é citado. No documento de 15 de fevereiro de 2011, alega-se que o Rio tem características de relevo próprias, com vias terrestres espremidas entre montanhas e o mar e condições de tráfego difíceis, "sendo muitas vezes impossível de se (sic) prever o tempo dispensado para um determinado trajeto".
E prossegue: "A capacidade de rápido deslocamento permite ao governante manter presença constante nos pontos mais distantes do Estado, bem como ter uma agenda de trabalho mais dinâmica e eficiente."
Segundo o governo, quatro empresas manifestaram interesse no negócio, mas só a Synergy (representante da anglo-italiana AgustaWestland) e a Helibras (em nome da francesa Eurocopter) apresentaram propostas. A TAM (pela americana Bell Helicopter) e a Helicentro (credenciada pela MacDonald Douglas, também dos EUA) terminaram por não disputar.
O preço-base foi reduzido, depois que o valor médio, inicialmente fixado em R$ 18.200.201,04, foi corrigido, após intervenção do Tribunal de Contas do Estado (TCE), por reinterpretação da pesquisa de preços, para R$ 16.038.060,96. Tanto a Synergy como a Helibras, porém, foram inicialmente desclassificadas, em julho de 2011, por problemas de documentação, e recorreram.
"Não existe equivalência no Panamá para as certidões da Fazenda estadual e dívida pública ou certidões da Fazenda municipal (referente ao recolhimento de ISS) e dívida pública para empresas que tenham sido constituídas sob as leis panamenhas com o objetivo de exercer suas atividades comerciais fora do território do Panamá", afirmara a empresa, em documento de 17 de junho.
"Assim, sendo a empresa uma ‘offshore’ constituída sob as leis da República do Panamá especialmente para realizar negócios fora do território panamenho e que, até a presente data, não emprega funcionários, não está obrigada a cumprir com quaisquer encargos sociais ou trabalhistas equivalentes à Seguridade Social (INSS) e ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)."
De acordo com o governo estadual, as duas empresas desclassificadas ganharam, segundo a Lei 8.666/93, oito dias úteis de prazo para apresentar os documentos que faltavam.
"A Helicópteros do Brasil-Helibras formalizou, por ofício, a desistência de participação no processo, alegando não possuir a documentação técnica exigida. Na pesquisa de preços, a empresa chegara a cotar o aparelho a R$ 13.015.968,00.
Já a Synergy/Agusta apresentou a documentação necessária e foi considerada habilitada a entregar sua proposta", explicou por escrito a administração. A empresa panamenha apresentou documento afirmando ter patrimônio líquido disponível equivalente a 10% do valor/preço do objeto da concorrência. Por isso, o valor do capital social da empresa foi considerado irrelevante.
Em 25 de agosto de 2011, a Synergy foi declarada vencedora, com a proposta de US$ 9.732.934,00, equivalente, na época, a R$ 15.233.015,00. O pagamento foi feito em três parcelas.
O dinheiro foi depositado na conta 01-0087148-3, da Synergy, no HSBC Bank Panama S.A., com intermediação do HSBC de Nova York. O negócio foi isento de impostos, porque o Estado do Rio, por lei, tem imunidade tributária.
A Synergy foi procurada peloEstado, mas não quis se pronunciar.
22 de julho de 2013
Wilson Tosta - O Estado de São Paulo
 

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