"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 5 de julho de 2013

QUANDO MARX REFUTOU KEYNES E OS ATUAIS MARXISTAS

           
          Artigos - Economia 
Além de creditar à burguesia e aos seus instrumentos de produção — isto é, ao sistema de lucros e prejuízos — a façanha de retirar nações da barbárie e levá-las à civilização, Marx afirma categoricamente que o modo de produção burguês — que nada mais é do que a busca pelo lucro — gera mercadorias a preços baratos.

Marxistas, social-democratas e demais defensores do intervencionismo estatal sempre afirmaram que determinados setores da economia — principalmente saúde, educação e segurança, mas também o setor elétrico e de telecomunicações — não podem ficar por conta do livre mercado e da livre concorrência porque a ganância e a busca pelo lucro não apenas são incompatíveis com tais setores, como também levariam a preços absurdamente caros, o que prejudicaria principalmente os mais pobres.
 
Já os economistas seguidores da Escola Austríaca sempre afirmaram categoricamente que é justamente a busca pelo lucro em um ambiente sem protecionismos, sem privilégios, sem agências reguladoras e sem subsídios o que gera serviços da alta qualidade e preços baixos.
 
E a explicação é simples: como empresários, no geral, não gostam de concorrência, eles sempre se mostram ávidos por fazer lobby e utilizar o poder estatal em seu próprio interesse com o intuito de banir a concorrência e solidificar sua posição de domínio. Eles conseguem isso por meio de tarifas protecionistas, subsídios e agências reguladoras que cartelizam o mercado e impedem a entrada de concorrentes.
 
Já o livre mercado, arranjo em que não há protecionismo, subsídio e agências reguladoras, é um sistema em que são os consumidores que controlam os empresários. No livre mercado, as empresas não têm opção: ou elas servem o consumidor de maneira eficaz ou elas fecham as portas. E servir o consumidor de maneira eficaz significa estar sempre ofertando bens e serviços de qualidade crescente a preços cada vez menores.
 
É justamente o governo — com seus subsídios, privilégios especiais (como tarifas protecionistas e execução de obras públicas com empreiteiras privadas) e restrições à concorrência (por meio de agências reguladoras e exigências burocráticas) — quem promove monopólios e oligopólios, e consequentemente preços altos e serviços de baixa qualidade. Sendo assim, se você quiser serviços de qualidade a preços cada vez menores, você tem de defender o livre mercado.
 
Sabe quem concorda com tudo isso? Ninguém menos que Karl Marx. Não deixa de ser curioso constatar que Marx entendeu perfeitamente essa realidade. Mais ainda: ele foi explícito em demonstrar isso. No quesito "efeitos benéficos da livre concorrência", Marx concorda com os austríacos e discorda de todos os atuais marxistas e demais intervencionistas. Veja o que ele escreveu logo nas páginas iniciais do Manifesto Comunista:
 
A burguesia, pelo rápido melhoramento de todos os instrumentos de produção, pelas comunicações infinitamente facilitadas, arrasta todas as nações, mesmo as mais bárbaras, para a civilização.
Os preços baratos das suas mercadorias são a artilharia pesada com que deita por terra todas as muralhas da China, com que força à capitulação o mais obstinado ódio dos bárbaros ao estrangeiro. Compele todas as nações a apropriarem o modo de produção da burguesia, se não quiserem arruinar-se; compele-as a introduzirem no seu seio a chamada civilização, i. é, a tornarem-se burguesas. Numa palavra, ela cria para si um mundo à sua própria imagem.
 
Em suma: além de creditar à burguesia e aos seus instrumentos de produção — isto é, ao sistema de lucros e prejuízos — a façanha de retirar nações da barbárie e levá-las à civilização, Marx afirma categoricamente que o modo de produção burguês — que nada mais é do que a busca pelo lucro — gera mercadorias a preços baratos.  E não apenas isso: ele afirma que o sistema de lucros e prejuízos compele todas as nações a adotarem este modo de produção, sob pena de se arruinarem por completo caso não o façam.
 
Ou seja, o real problema dos atuais marxistas e demais intervencionistas que se dizem contrários a serviços de saúde, educação, segurança, energia e telecomunicações serem ofertados em um ambiente de livre concorrência, pois seriam caros e inacessíveis para os pobres, é que eles certamente não leram Marx.
Se leram, não entenderam. Marx entendeu perfeitamente que a busca pelo lucro sob um arranjo de livre concorrência leva ao barateamento dos produtos e serviços, e que tal barateamento é "a artilharia pesada com que [o sistema de lucros] ... compele todas as nações a apropriarem o modo de produção da burguesia [e se tornarem civilizadas], se não quiserem arruinar-se."
 
Ao contrário dos marxistas atuais que defendem a estatização de vários serviços sob o argumento de que isso reduziria seus preços, Marx entendeu que é a busca pelo lucro o que realmente derruba os preços, e não a estatização destes serviços.
 
Como se não bastasse, Marx também disparou um petardo contra keynesianos defensores de estímulos fiscais e de políticas de endividamento estatal. Marx zombou o keynesianismo antes mesmo de este sistema ter sido criado — algo possível porque não havia absolutamente nada de original nas ideias de Keynes.
Eis o que escreveu Marx em O Capital, capítulo 24, seção 6, "A Gênese do Capitalista Industrial":
 
A única parte da chamada riqueza nacional que realmente está na posse coletiva dos povos modernos é a sua dívida pública.  Daí ... a doutrina moderna de que um povo se torna tanto mais rico quanto mais profundamente se endividar.  A dívida pública torna-se o credo do capital.  E, com o surgir do endividamento do Estado, vai para o lugar dos pecados contra o Espírito Santo — para os quais não há qualquer perdão — o perjúrio contra a dívida do Estado.
 
Como com o toque da varinha mágica, [a dívida pública] reveste o dinheiro improdutivo de poder procriador e transforma-o assim em capital.  ... [Mas] a moderna política fiscal... traz em si própria o germe da progressão automática. A sobretaxação não é um acidente, mas sim um princípio.
Conclusão

Eis, portanto, as duas crenças que um genuíno seguidor de Karl Marx deve apresentar: a busca pelo lucro em um ambiente de livre mercado gera redução de preços, e políticas fiscais keynesianas, além de serem um método de escravização, fazem com que dinheiro improdutivo seja ilusoriamente visto como capital gerador de riqueza. Mais ainda: segundo Marx, criticar o endividamento do estado passou a ser visto pelos defensores da gastança estatal como um ato equivalente a uma blasfêmia contra o Espírito Santo.
 
Logo, se você é um marxista defensor dos pobres e quer que eles tenham acesso a bens e serviços de qualidade a preços baixos, você tem de defender o livre mercado. Se você defende que o povo tenha poder sobre as empresas, você tem de defender o livre mercado. E se você é contra a escravização do povo pelas elites financeiras, você tem de defender que os gastos do governo sejam restringidos ao máximo. 
 
Agora, se você defende que o governo regule o mercado e gaste demasiadamente, você estará defendendo os interesses das grandes empresas e das elites financeiras, e estará defendendo que elas tenham privilégios sobre os pobres e que elas os oprimam com a abolição da concorrência, com preços altos e com serviços precários.
Palavras de Marx.

05 de julho de 2013
Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

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