"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 9 de setembro de 2012

SILVINHO, O GÊNIO DA RAÇA PETISTA

 

Em 2003, Silvio Pereira, secretário de organização do PT, tornou-se um dos homens mais poderosos do país. Centralizou os registros de candidatos a cargos no governo e, depois da posse de Lula, comandou o Grupo de Trabalhos Eleitorais.
Ele foi um dos primeiros petistas a verem em Marcos Valério um gênio das finanças. Quando ia ao Planalto, despachava numa sala próxima à do comissário José Dirceu. Tinha 42 anos e viera de Osasco, onde trabalhara na lanchonete da família, a Cebolinha. Tornou-se uma estrela promissora da nova ordem.

O PT tinha dois propinodutos. Um ficou conhecido como o mensalão, outro, apelidado de “gibi”, remunerava companheiros de cargos que pareciam mal remunerados. Conta a lenda que “Silvinho” jogou no lixo as 150 cadernetas de anotações de seus primeiros tempos de poder.

Em 2005 explodiu o escândalo do mensalão, e ele foi acusado de formar um triunvirato com José Dirceu e Delúbio. Meses depois, apanharam-no com uma Land Rover de R$ 74 mil, presenteada por um empreiteiro. Deixou o cargo e o partido.

Em maio de 2006, deu uma entrevista à repórter Soraya Aggege com a mais detalhada narrativa petista do mensalão. Temia até mesmo ser assassinado. Foi dado por louco. Seus advogados, informavam que ele passava por “visível transtorno de adaptação à realidade”. Era o contrário, o governo é que transtornava a realidade, como se viu no Supremo.

Silvio Pereira foi um homem de sorte. Não teve cargo público nem há registro de que tenha tocado em dinheiro do Banco Rural. Com isso, o Supremo excluiu-o da denúncia por peculato e corrupção ativa. Sobrou-lhe uma acusação de formação de quadrilha, mas ele foi clarividente: fez um acordo com o Ministério Público e aceitou uma pena de 750 horas de serviços comunitários.

Silvinho protegeu o arquivo de sua memória. Fez um curso de gastronomia e, em julho passado, planejava o cardápio do restaurante de sua irmã, ao lado da sua lanchonete, a Tia Lela, próxima à prefeitura de Osasco.
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O provável desfecho do julgamento do mensalão poderá abrir uma nova época nos procedimentos judiciais de Pindorama. Todos os réus apresentaram-se ao Supremo defendendo a própria pele, como se o conjunto da obra tivesse acontecido na Austrália.

O ministro Joaquim Barbosa reconstruiu a trama, e deu-se a encalacrada geral. É possível que futuros réus entendam ser melhor negócio colaborar com as investigações. (“Delação premiada” é uma expressão infame, pois não se trata de delação, muito menos de prêmio.)

Olhado pelo retrovisor, o caso de Silvinho mostra que o melhor serviço que ele poderia prestar à comunidade seria aprofundar sua famosa entrevista.

Em 1990, a juíza americana Kimba Wood sentenciou o bilionário Michael Milken a dez anos de prisão por fraudes no mercado financeiro. Quatro anos antes, ele faturara US$ 550 milhões.

Ao condená-lo a pena tão alta, Wood deu três razões:

1) O senhor não precisava de tanto dinheiro.
2) O senhor permitiu que o apresentassem como um exemplo para a comunidade.
3) O senhor não quis colaborar com a promotoria.

09 de setembro de 2012
Elio Gaspari, O Globo

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