"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

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segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

EVA PERÓN TERIA RECEBIDO LOBOTOMIA PARA TRATAR DOR

Pesquisa é uma nota triste na história não só da lobotomia, mas do controle da dor

A maioria de nós se lembra como a lobotomia era retratada em filmes como “Um estranho no ninho”, uma operação horrível utilizada inadequadamente para controlar doentes mentais. Mas em 1950 cirurgiões também a usavam para tratar a severa dor do câncer e outras doenças.

Agora, um pesquisador de Yale descobriu evidências surpreendentes de uma paciente famosa que aparentemente recebeu uma lobotomia para a dor oncológica: Eva Perón, a primeira-dama da Argentina conhecida como Evita. A história é uma nota triste na história não só da lobotomia, mas do controle da dor.

A natureza da doença de Evita foi inicialmente envolta em silêncios. Os médicos diagnosticaram um avançado câncer cervical em agosto de 1951, mas, como era comum na época, a paciente foi informada apenas que tinha um problema no útero. De acordo com os biógrafos Nicholas Frases e Marysa Navarro, o segredo era tão fundamental que um especialista norte-americano, Dr. George Pack, realizou a operação de Evita sem ela e o público nunca saberem. Ele entrou na sala de cirurgia depois que ela estava sob o efeito da anestesia.

Apesar da cirurgia, radioterapia e quimoterapia, Evita piorou gradualmente, morrendo no final de julho 1952, aos 33 anos. Só então foi relevado que ela tinha morrido de câncer cervical, embora os detalhes de seu tratamento, incluindo o envolvimento do Dr. Pack tenham permanecidos ocultos. Em uma biografia de 1972, Erminda Duarte, irmã de Evita alegou que ela tinha sofrido intensa dor e sofrimento.

Quando usada para fins psiquiátricos, a lobotomia foi vista como um enorme avanço. Dr. Egas Moniz, um neurologista português que desenvolveu o procedimento em 1930, foi premiado com o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1949. Cirurgiões realizaram muitos tipos de lobotomias, cortando nervos mais envolvidos, dos lobos frontais e outras partes do cérebro para interromper as conexões supostamente defeituosas que tinham sido desenvolvidas na esquizofrenia ou depressão.

Lobotomia para o controle de doença mental caiu em desuso na década de 1960 por causa do desenvolvimento dos medicamentos antipsicóticos eficazes, da utilização indevida do procedimento e uma inquietação crescente entre os médicos com a confusão e letargia resultadas da operação.

Porém, os primeiros praticantes da lobotomia viram um beneficio potencial: alívio da dor grave e resistente. O neurocirurgião, Dr. Sidney W. Gross escreveu em 1953 que a lobotomia foi um procedimento “valioso e humano” que reduz a dor por embotamento emocional dos pacientes a ela. Mesmo os defensores reconheceram que a lobotomia poderia tornar o paciente “infantil, sem graça, apático, com pouca capacidade para qualquer experiência emocional”. Eles simplesmente acreditavam que tal estado era preferível à dor constante.

Em 2005, o neurocirurgião húngaro George Udvarhelvi, que afirmou ter ajudado a cuidar de Evita na década de 1950 e depois se mudou para a escola de Medicina Johns Hopkins, discutiu publicamente, pela primeira vez, a lobotomia de primeira-dama argentina. Udvarhelvi disse que Evita recebeu o procedimento para a dor intratável do câncer alguns meses antes de sua morte. O neurocirurgião argentino, Daniel E. Nijensohn afirmou que as provas sobre a lobotomia praticada em Evita começam a se acumular.

Em pesquisa recentemente publica online e em breve na revista Neurosurgery, aparecem várias evidências do procedimento. Ele confirmou os detalhes da história de Udvarhelvi e encontrou contemporâneos de Evita que também tinham feito cirurgia para dor. Dr. Nijenshon descobriu ainda informações indicando que o Dr. James L. Poppen, um neurocirurgião da clínica Lahey, em Boston e especialista internacional no uso de lobotomia para dor intratável tinha sido convocado para operar Evita no verão de 1952. Raios-X do crânio de Evita foram encontrados e mostram recordes em áreas onde, normalmente, as lobotomias eram realizadas. Dr. Nijensohn acredita que uma lobotomia foi realizada em maio ou junho de 1952, o que significa que Evita pode já ter tido o procedimento no momento de sua última aparição pública, em uma limusine ao lado de seu marido.

Se Evita teve uma lobotomia, ela estava ciente de que os médicos – com a permissão do seu marido, o presidente Juan Domingo Perón – planejavam fazê-la? Talvez não, dados os esforços para esconder seu diagnóstico em geral. E poderia realmente ter uma lobotomia ajudado a aliviar o sofrimento de Evita? Dr. Nijenshon não tem certeza. Mas muitos pacientes que foram lobotomizados naquela época relataram alívio. De acordo com declaração do Dr. Frank J. Otenasek, um neurocirurgião da Universidade Johns Hopkins, ao jornal The Baltimore Sun, em 1947, depois das operações os pacientes disseram que “não estavam sofrendo ou que a dor não os incomodava mais”

Se verdadeira, uma das ironias da história de Dr. Nijensohn é que já existia outro método para tratar a dor de Evita: o uso agressivo de opiáceos como morfina. No entanto, médicos da época temiam que seus pacientes com câncer se viciassem na droga e viram a lobotomia como uma alternativa adequada.

Hoje, nossa compreensão da dor do câncer certamente mudou. O uso liberal de narcóticos, acompanhado por outros medicamentos para tratar os efeitos colaterais, é visto como apropriado e não indicativo de um comportamento indesejável dos pacientes. De fato, uma das inovações de maior sucesso no tratamento da dor é uma bomba que permite aos pacientes com câncer medicação suficiente para aliviar a dor e se manter alerta. Hoje, o objetivo da medicina é permitir que os doentes tenham um papel ativo sob os seus cuidados, em vez de serem simplesmente atendidos.

Fontes:New York Times - When Lobotomy Was Seen as Advanced
25/12/2011

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