"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 23 de março de 2013

"A MAIOR FRAUDE"

O tema era imigração para o Brasil no século 21. A receita de macarrão instantâneo, incluída a meio caminho de uma redação no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), não provocou todavia reações de monta entre os encarregados de corrigir a prova.

O texto foi aprovado, conforme revelou o jornal "O Globo". Obteve 560 pontos dos mil possíveis. Outra redação continha trechos do hino de um time de futebol.

O episódio se tornou motivo de piada, acrescentando tons de absurdo ao mais importante instrumento de avaliação dos alunos de ensino médio do Brasil, já combalido por fraudes, escândalos e anulações de provas.

"Motivo de piada" talvez seja uma imprecisão. Tratava-se, desde o início, de piada. O mais provável é que os autores das redações quisessem testar, de forma temerária, o rigor dos examinadores. Naquela típica mistura adolescente de irreverência e tédio, preencheram com o que lhes veio à cabeça o espaço exigido.

Não é esse o menor sintoma da crise do sistema educacional brasileiro. Não se reconhece -e o problema já transparece nas próprias relações entre aluno e professor- a legitimidade do ensino.

O desdém e o vale-tudo predominam. Para cúmulo dos males, as autoridades educacionais adotam uma atitude de paternalismo.

O medo de reprovar, assim como a tentativa de não engrossar estatísticas alarmantes sobre a qualidade do ensino, fecha o círculo vicioso. Não há exagero em observar que o professor leniente, em geral, atrai mais desprezo que afeição de seus alunos.

A leniência se reflete para além do caso das redações chistosas. Vários alunos obtiveram a nota máxima na prova, apesar de graves falhas de ortografia (como "trousse", em lugar de "trouxe"). É no mínimo estranho que nem mesmo uma fração da nota tenha sido descontada.

Prevalece um delírio pedagógico segundo o qual o aluno deve ser protegido de "discriminações" por desconhecer a norma culta. O estudante que recebe nota máxima por um texto crivado de erros não está sendo "protegido" de nada, mas, sim, vítima de uma fraude.

Sabe disso, aliás. Daí o desprezo, a inutilidade que atribui ao ensino recebido. Ou melhor, não recebido.

23 de março de 2013
Editorial da Folha

ALGUNS TRAÇOS DA MENTE REVOLUCIONÁRIA

   
          Artigos - Cultura 
Excerto dos rascunhos inéditos do livro A Mente Revolucionária.

Stalin-Lenin-Kalinin-1919A mente revolucionária é um fenômeno histórico perfeitamente identificável e contínuo, cujos desenvolvimentos ao longo de cinco séculos podem ser rastreados numa infinidade de documentos.
Não é um fenômeno essencialmente político, mas espiritual e psicológico, se bem que seu campo de expressão mais visível e seu instrumento fundamental seja a ação política.

Para facilitar as coisas, uso as expressões “mente revolucionária” e “mentalidade revolucionária” para distinguir entre o fenômeno histórico concreto, com toda a variedade das suas manifestações, e a característica essencial e permanente que permite apreender a sua unidade ao longo do tempo.
 
“Mentalidade revolucionária” é o estado de espírito, permanente ou transitório, no qual um indivíduo ou grupo se crê habilitado a remoldar o conjunto da sociedade – senão a natureza humana em geral – por meio da ação política; e acredita que, como agente ou portador de um futuro melhor, está acima de todo julgamento pela humanidade presente ou passada, só tendo satisfações a prestar ao “tribunal da História”.
Mas o tribunal da História é, por definição, a própria sociedade futura que esse indivíduo ou grupo diz representar no presente; e, como essa sociedade não pode testemunhar ou julgar senão através desse seu mesmo representante, é claro que este se torna assim não apenas o único juiz soberano de seus próprios atos, mas o juiz de toda a humanidade, passada, presente ou futura.
Habilitado a acusar e condenar todas as leis, instituições, crenças, valores, costumes, ações e obras de todas as épocas sem poder ser por sua vez julgado por nenhuma delas, ele está tão acima da humanidade histórica que não é inexato chamá-lo de Super-Homem.
 
Autoglorificação do Super-Homem, a mentalidade revolucionária é totalitária e genocida em si, independentemente dos conteúdos ideológicos de que se preencha em diferentes circunstâncias e ocasiões.
 
Recusando-se a prestar satisfações senão a um futuro hipotético de sua própria invenção e firmemente disposto a destruir pela astúcia ou pela força todo obstáculo que se oponha à remoldagem do mundo à sua própria imagem e semelhança, o revolucionário é o inimigo máximo da espécie humana, perto do qual os tiranos e conquistadores da antigüidade impressionam pela modéstia das suas pretensões e por uma notável parcimônia no emprego dos meios.
 
O advento do revolucionário ao primeiro plano do cenário histórico – fenômeno que começa a perfilar-se por volta do século XV e se manifesta com toda a clareza no fim do século XVIII – inaugura a era do totalitarismo, das guerras mundiais e do genocídio permanente.
Ao longo de dois séculos, os movimentos revolucionários, as guerras empreendidas por eles e o morticínio de populações civis necessário à consolidação do seu poder mataram muito mais gente do que a totalidade dos conflitos bélicos, epidemias, terremotos e catástrofes naturais de qualquer espécie desde o início da história do mundo.
 
O movimento revolucionário é o flagelo maior que já se abateu sobre a espécie humana desde o início dos tempos históricos.
 
A expansão da violência genocida e a imposição de restrições cada vez mais sufocantes à liberdade humana acompanham pari passu a disseminação da mentalidade revolucionária entre faixas cada vez mais amplas da população, pela qual massas inteiras se imbuem do papel de juízes vingadores nomeados pelo tribunal do futuro e concedem a si próprias o direito à prática de crimes imensuravelmente maiores do que todos aqueles que o ideal revolucionário promete extirpar.
 
Mesmo se não levarmos em conta as matanças deliberadas e considerarmos apenas a performance revolucionária desde o ponto de vista econômico, nenhuma outra causa social ou natural criou jamais tanta miséria e provocou tantas mortes por desnutrição quanto os regimes revolucionários da Rússia, da China e de vários países africanos.
 
Qualquer que venha a ser o futuro da espécie humana e quaisquer que sejam as nossas concepções pessoais a respeito, a mentalidade revolucionária tem de ser extirpada radicalmente do repertório das possibilidades sociais e culturais admissíveis antes que, de tanto forçar o nascimento de um mundo supostamente melhor, ela venha a fazer da História humana inteira um gigantesco aborto.
 
Embora as distintas ideologias revolucionárias sejam todas, em maior ou menor medida, ameaçadoras e daninhas, o mal delas não reside tanto no seu conteúdo específico ou nas estratégias de que se servem para realizá-lo, quanto no fato mesmo de serem revolucionárias no sentido aqui definido.
 
O socialismo e o nazismo são revolucionários não porque propõem respectivamente o predomínio de uma classe ou de uma raça, mas porque fazem dessas bandeiras os princípios de uma remodelagem radical não só da ordem política, mas de toda a vida humana. Os malefícios que prenunciam tornam-se universalmente ameaçadores porque não se apresentam como respostas locais a situações momentâneas, mas como mandamentos universais imbuídos da autoridade de refazer o mundo segundo o molde de uma hipotética perfeição futura.
A Ku-Klux-Klan é tão racista quanto o nazismo, mas não é revolucionária porque não tem nenhum projeto de alcance mundial. Por essa razão seria ridículo compará-la, em periculosidade, ao movimento nazista.
 
Por isso mesmo é preciso enfatizar que o sentido aqui atribuído ao termo “revolução” é ao mesmo tempo mais amplo e mais preciso do que a palavra tem em geral na historiografia e nas ciências sociais presentemente existentes.
Muitos processos sócio-políticos usualmente denominados “revoluções” não são “revolucionários” de fato, porque não participam da mentalidade revolucionária, não visam à remodelagem integral da sociedade, da cultura e da espécie humana, mas se destinam unicamente à modificação de situações locais e momentâneas, idealmente para melhor.
 
Não é necessariamente revolucionária, por exemplo, a rebelião política destinada apenas a romper os laços entre um país e outro. Nem é revolucionária a simples derrubada de um regime tirânico com o objetivo de nivelar uma nação às liberdades já desfrutadas pelos povos em torno.
Mesmo que esses empreendimentos empreguem recursos bélicos de larga escala e provoquem modificações espetaculares, não são revoluções, porque nada ambicionam senão à correção de males imediatos ou mesmo o retorno a uma situação anterior perdida.
 
O que caracteriza inconfundivelmente o movimento revolucionário é que sobrepõe a autoridade de um futuro hipotético ao julgamento de toda a espécie humana, presente ou passada. A revolução é, por sua própria natureza, totalitária e universalmente expansiva: não há aspecto da vida humana que ela não pretenda submeter ao seu poder, não há região do globo a que ela não pretenda estender os tentáculos da sua influência.
 
Se, nesse sentido, vários movimentos político-militares de vastas proporções devem ser excluídos do conceito de “revolução”, devem ser incluídos nele, em contrapartida, vários movimentos aparentemente pacíficos e de natureza puramente intelectual e cultural, cuja evolução no tempo os leve a constituir-se em poderes políticos com pretensões de impor universalmente novos padrões de pensamento e conduta por meios burocráticos, judiciais e policiais.
A rebelião húngara de 1956 ou a derrubada do presidente brasileiro João Goulart, nesse sentido, não foram revoluções de maneira alguma. Nem o foi a independência americana, um caso especial que terei de explicar em outro lugar.
Mas sem dúvida são movimentos revolucionários o darwinismo e o conjunto de fenômenos pseudo-religiosos conhecido como Nova Era. Todas essas distinções terão de ser explicadas depois em separado e estão sendo citadas aqui só a título de amostra.

23 de março de 2013
Olavo de Carvalho
Publicado na revisa
Vila Nova.

DESDE O COMITÊ CENTRAL ATÉ A CASA BRANCA: "UM SÓ POVO"


          Internacional - América Latina 
No México e em Nova York, ninguém lhe perguntou por quê durante seu périplo foi variando sua linguagem e dedicou-se a dizer o que cada um de seus anfitriões quiseram ouvir nos distintos países que foi visitando.

A senhora Yoani Sánchez, que diz ter estudado Filologia na Universidade de Havana, e que também segundo sua própria apresentação foi e é professora de espanhol para turistas, além de um sem-fim de coisas mais, transformada em jornalista por obra e graça do Prêmio Ortega y Gasset, jornalista virtual será o caso (já sabemos o que é a imprensa em Cuba), autora de um blog intitulado Generación Y (que deveria se chamar Generación Yo), mais famoso no estrangeiro do que dentro de Cuba, pôde por fim sair da ilha. Levava anos tentando. Após ter voltado a Cuba e depois de ter vivido durante dois anos ou mais na Suíça. Enfim, uma história, que como toda história cubana, é longa e complexa.


Resumindo, a senhora Sánchez, cuja história longa e complexa ela só mostra fragmentadamente, está dando a volta ao mundo desde há algumas semanas. Nesses poucos dias esteve no Brasil, em vários países europeus, no México e em seguida se dirigiu aos Estados Unidos, onde se encontra atualmente. No México, apresentaram-na a várias personalidades, entre elas o escritor Manuel Pereira, cuja história, também longa e complexa, se desvela nesta semana também pela metade na revista Cubaencuentro, em uma entrevista feita por um jovem mexicano que pode-se ler aqui e aqui.
Porém, isso não vem ao caso agora. O certo é que a senhora Sánchez chegou aos Estados Unidos e já no aeroporto nova-iorquino a estavam esperando Coco Fusco (muito conhecida na Cuba dos anos oitenta, como também se conhecia Sandra Lewinson, pró-castrista), assim como Ted Henken e uma figura emérita da Universidade de Columbia cujo nome não se anunciava no vídeo que eu vi. Coco Fusco, solícita, para não dizer bajuladora, foi colocar uma mantinha nas costas da senhora Sánchez mas a senhora Sánchez alegou com um gesto despótico que não, que não necessitava, que ela não sentia frio, que lembrasse que ela vinha diretinho da Europa. Não, ela vinha diretinho do México, porém esta senhora ao que parece tem a memória longa no Twitter e curta na vida real.
Em Nova York, na Universidade de Columbia, foi apresentada a Ted Henken e a jornalista cubano-americana Mirta Ojito, levava, dizem, seis guarda-costas. Também a entrevistaram várias cadeias televisivas e a jornalista cubano-americana, María Elvira Salazar, se desfez em egolatrias suas às quais foi respondida com mais gestos ególatras da entrevistada, que pode-se ver aqui e aqui.
Mentiras e mais mentiras. E nem um só jornalista fez o trabalho que lhe corresponde como jornalista: desvelar a verdade.

Yoani Sánchez disse no Brasil, primeiro país que visitou durante este giro que ainda continua, que ela não tinha medo, para depois não se cansar de repetir em uma ladainha infinita de contradições que tinha medo da volta, o que é natural, mas se se contradissesse só neste tema.
Mais tarde acrescentou que estava contra o “bloqueio” norte-americano por considerá-lo ingerencista, que além disso pedia a libertação dos cinco espiões (que na verdade são 4 porque um já foi liberado e vive comodamente protegido em Miami, com tudo pago pelo contribuintes norte-americano), e nem sequer mencionou os presos políticos nem os jovens pilotos de Hermanos al Rescate, a poucos dias de que se comemorasse o assassinato destes jovens valentes nas mãos dos castristas e delatados por esta mesma rede de espiões, a Red Avispa, que operava em vários domínios da política e da sociedade norte-americana.

A senhora Sánchez chamou de “governo” ao regime tirânico de Havana, não em uma mas em várias ocasiões, e ademais mencionou em diversas oportunidades o “bloqueio” e não o embargo, sutil diferença. Ninguém no Brasil lhe perguntou por que se expressou dessa maneira, tudo foi louvações, elogios e pedestais imerecidos.
Entretanto, em que pese este comportamento tão politicamente correto, uma série de pessoas lhe fizeram mítines de repúdio e a chamaram de mercenária e agente da CIA, o mesmo que sempre disseram dos cubanos exilados.

Mais tarde, no México e em Nova York, ninguém lhe perguntou por quê durante seu périplo foi variando sua linguagem e dedicou-se a dizer o que cada um de seus anfitriões quiseram ouvir nos distintos países que foi visitando, mas sempre mantendo uma linguagem ambígua e dentro das margens que hoje em dia são consideradas autorizadas pelo regime que, após a morte de Hugo Chávez, só procura desesperadamente uma coisa: a quem pegam como bola da vez, quem será o próximo Sugar Daddy que os manterá com vida o resto da vida, e na relação desigual que entabularão com possíveis chulos aos quais se encostar. E certamente que nessa lista está a opção norte-americana como uma das mais suculentas possibilidades. Porque, como profetizou Guillermo Cabrera Infante no passado, já não dirão mais “Yanki go home”, em um viril clamor geral, senão que mendigarão antes “Yanki, come home!” em um gemido entre desesperado e soberbo.

A blogueira Sánchez, que já se define como escritora quando somente reuniu em um de seus livros as vinhetas de seu blog, e em outro livro de lições aos utilizadores de Wordpress de como usá-lo, que também se descreve como uma mágica que usa internet sem internet, não foi jamais interpelada pela imprensa em nenhuma das questões que muitos teríamos querido que se esclarecessem publicamente, sobretudo porque nós sim, pagamos impostos, porque somos contribuintes, e porque vivemos em países onde a primeira coisa que o povo tem direito a exigir é a transparência das figuras públicas políticas. Isso é o que ao menos acontece na França, onde um ministro de Finanças acaba de ser demitido por ter contas secretas na Suíça e em Singapura, e agora mesmo estão requisitando o apartamento da senhora Christine Lagarde, nada mais e nada menos que a presidente do FMI.

A senhora Sánchez, jornalista segundo ela, fez mais política neste giro do que jornalismo. Ela foi o centro da notícia, coisa da qual eticamente um jornalista sempre deveria fugir. Um jornalista verdadeiro deve se manter distante e discreto para poder fazer seu trabalho de jornalista. Porém, pelo que pudemos intuir, e já somos muitos em fazê-lo, a senhora Sánchez pretende ser o que não é, ou o que é e ainda não confessou porque ninguém lhe perguntou.
É jornalista, é escritora sem livros literários, é política, é tudo isso ao mesmo tempo? Já em uma ocasião se confessou poeta. Também se definiu como uma espécie de compêndio ou multi-ofício (conceito castrista onde os há) do século XXI. Que espanto, de tudo o que os seres normais e aspirantes à beleza, à paz, à cultura, à liberdade, à democracia, à poesia, deveríamos fugir de imediato se queremos salvar este mundo transbordante de idiotas ou aproveitadores que querem se converter em pessoas touche à tout!

Porém, o pior não foi a imprensa medíocre que a qualifica, como antes fizeram com Fidel Castro, de boa, calma, bonita, pacífica, educada, maravilhosa, e todos esses epítetos que sempre usam, mas em suas variantes antônimas contra os que com todo o direito que confere a liberdade de expressão, se perguntam: a que vem isto? A que vem esta senhora?

Porque desde que esta senhora saiu de Cuba o que não deixamos de ver porque ela não cessou de ressaltar, é que saiu com uma missão fixa. E essa missão ela disse, repetiu e sublinhou (ninguém inventou) com suas palavras. Pediu a Obama um diálogo com Cuba, pediu o levantamento do embargo ingerencista, eliminar a Base Naval de Guantánamo, por nada o esquecimento! E não mais chegar ao Congresso Norte Americano, no qual a imprensa também se dedicou a mascarar o verdadeiro caráter de sua visita dando a entender que havia sido importantíssima quando na verdade só esteve com quatro políticos cubano-americanos, principalmente com o democrata pró-raulista Joe García, com os republicanos Ileana Ros-Lehtinen e Mario Díaz-Balart, e não sei quem outro ou outra mais. Não falou frente a centenas de pessoas, mas ao mesmo tempo passou, desta vez com vaselina, sua mensagem missionária: o governo norte-americano tem que trabalhar mais “povo a povo”.

Talvez a presença dos republicanos nessa reunião tenha sido o que fez com que baixasse o perfil e se acomodasse um pouco. De qualquer modo, a foto, essa foto, é muito valiosa para sua volta a Cuba. É uma foto que lhe levantará o nível frente aos opositores, frente aos dissidentes e também frente ao “seu governo”.
“Povo a povo”.
Essa frase já resume tudo. É uma frase que lembra um desses lemas castristas ou de velhos hinos castristas revestidos de canções populares, que rezavam dissimuladamente que desde tal ponto do país até o outro ponto da ilha, ou de outro país, ou de outro continente, éramos “um só povo”.
Ou seja, que ela veio nos propor, ela ou quem está detrás dela, o que propõem é que desde o Comitê Central até a Casa Branca, ou até o Congresso Norte-Americano exista “um só povo”. O mesmo leminha de Hugo Chávez: Cubazuela ou Venecuba, um só povo. De povo a povo, bah!

A imprensa ainda não se dignou perguntar à senhora Sánchez o que há por trás dessas palavras e não acredito que o façam. Como tampouco saberemos quais são suas relações com Carlos Saladrigas, o homem de negócios que quer que Cuba se converta em Singapura, e quais são suas relações com o governo de Barack Obama, posto que em vários cabos de WikiLeaks se ventilaram suas visitas e relações, dela e de seu marido, com vários funcionários e políticos norte-americanos.
Porém, sobretudo o que os cubanos queremos saber é por quê ela, em vez de fazer seu trabalho de jornalista, de escritora que diz que é, de filóloga, dado que visitou tantos países com tantas línguas diferentes, em vez de se dedicar ao que lhe compete, em suma, por que é que se vende como a representante única e exclusiva de toda a oposição cubana, por que se vende como a representante dos cubanos em geral, inclusive os do exílio, quando ela não foi eleita por ninguém para tal tarefa, mas ainda mais, queremos saber se ela saiu com uma missão encomendada por seu “governo”, tirania para muitos, e certamente com uma mensagem específica por parte do raulismo.

Um detalhe: desde há ao menos um ano a senhora Sánchez anuncia que fará um jornal em Cuba. Disse que seria o primeiro, o que é falso, porque como podemos comprovar aqui, em Cuba e fora de Cuba existem meios de imprensa que entram e saem da ilha. Todos sabemos que para fazer um jornal grande se necessitam milhões de euros. É isso o que procura Sánchez, ingressar na ilha milhões de euros para converter seu sonho ou o sonho de outros em realidade, e por fim romper o embargo norte-americano, abrindo a brecha no muro ou extraindo um fragmento do edifício - segundo suas palavras - para que se derrube inteiro, não o regime precisamente, senão o embargo? Tampouco ninguém lhe perguntou.

No momento o exílio a receberá na Torre da Liberdade em 1º de abril, porém ela já deu uma mensagem principal em Washington. Em Miami se dedicará ao que melhor sabe fazer: Twittear em meio de um ato público, como fez em Columbia enquanto seus apresentadores se dirigiam a ela, arrecadar dinheiro em um jantar onde se exigirão 100 dólares por pessoa e 1.000 por mesa (ainda não sabemos oficialmente aonde irá parar esse dinheiro, oxalá seja para a oposição), e contentar com sua queixada infatigável, porque nisso sim ela é mestra, em falar pelos cotovelos sem dizer nada que valha a pena a seus aduladores e bajuladores.

Não sei se lá poderá estar, nesse jantar, a mãe de Orlando Zapata Tamayo, a senhora Reina Loina Tamayo. Não acredito que ela possa custear uma jantar a esses preços. E não sei se por fim, lá, por conveniência ou pelo que seja, mencione finalmente que a Dama de Branco Sonia Garro Alfonso está na prisão há um ano sem julgamento, em vez de afirmar como se apressou em afirmar já não sei em que país dos tantos que visitou, que Miguel Díaz-Canel podia ser o Gorbachev cubano. Putz!

Entretanto, ocorre o que sempre ocorreu com os cubanos, que apóiam o primeiro que se vende como messias, sem conhecê-lo e sem se preocupar em averiguar. E depois se lamentam de ter comido o milho. E nem sequer têm memória para lembrar que com Castro a má digestão já lhes dura mais de meio século.

23 de março de 2013
Zoé Valdés
Tradução: Graça Salgueiro

PARA QUÊ EXISTE A ANAJURE? O CASO MARCO FELICIANO

    
          Artigos - Governo do PT 
A defesa das liberdades civis está ou não acima de diferenças doutrinárias?
Agora, o presidente da Anajure, além de chamar de "intolerantes" todos aqueles que se posicionam contra a agenda gay e o aborto, faz com que seus assessores pressionem outros sites de notícias para que críticas à Anajure sejam tiradas do ar. Ao que parece, é isto que, para ele, se atende pelo nome de "defesa das liberdades civis fundamentais."
(N. do E: Leia também o editorial do MSM sobre os posicionamentos da Anajure.)

O Dep. Marco Feliciano está sob fogo pesado dos supremacistas gays, pois ele foi nomeado em 5 de março para presidir a Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara dos Deputados.
 
Eles estão furiosos não só com as posturas dele sobre homossexualismo e aborto, mas também porque a CDH havia sempre sido presidida pelo PT e outros socialistas, que operavam a comissão para aprovar o alocamento de milhões do dinheiro do povo para projetos gayzistas.
 
Sob essa liderança socialista, a CDH também discutia meios de criminalizar a crítica à homossexualidade. O aborto e o sexo homossexual eram preocupações prioritárias deles.
 
Os supremacistas gays estavam satisfeitos de verem suas exigências sendo atendidas por socialistas de linha dura.
 
Então veio Marco Feliciano, um pastor da Assembleia de Deus. Feliciano não tem treinamento teológico e tem dificuldade de expressar suas opiniões em termos filosóficos. Apesar disso, ele tem sido claro sobre valores. Seu histórico pentecostal simples o tem levado a assumir uma posição firme contra o aborto e o homossexualismo.
 
Por isso, ele tem sofrido pressão de todos os lados: supremacistas gays, políticos esquerdistas, grupos pró-aborto, mídia esquerdista e… protestantes esquerdistas.
 
Um imenso grupo desses protestantes, composto também por militantes gays protestantes, está solicitando que o governo e o Congresso removam Feliciano da presidência da CDH. O presidente da Câmara dos Deputados, um protestante, quer oficialmente que Feliciano deixe o cargo. O presidente de seu partido, sob tal pressão, quer também que ele renuncie.
 
Silas Malafaia, renomado televangelista pentecostal, apoia Feliciano
Muitos cristãos pró-família, inclusive católicos, estão apoiando Marco Feliciano.
O Christian Post noticiou ontem: Silas Malafaia e Julio Severo são as principais vozes evangélicas no Brasil pedindo que Feliciano não renuncie. Malafaia é também pastor da Assembleia de Deus e tem uma audiência enorme por meio de seus programas semanais. No artigo do Christian Post, Malafaia disse que os ataques contra Feliciano estão vindo dos esquerdistas.
 
Ele tem falado sem rodeios sobre aborto e homossexualidade. Como Feliciano, ele não tem medo de chamar o aborto de assassinato e a homossexualidade de pecado. Mas diferente de Feliciano, ele é muito mais articulado.
 
Contudo, tanto Malafaia quanto eu compreendemos que este não é o tempo certo para julgarmos Feliciano por sua falta de treinamento teológico e dons filosóficos. Portanto, por causa de sua postura de falar sem rodeios em defesa de valores da família, Feliciano precisa de apoio, não de críticas ou condenação.
 
ANAJURE

Por isso, é de surpreender que a ANAJURE - Associação Nacional de Juristas Evangélicos - tenha emitido uma nota pública, em 20 de março, dizendo que a presença de Feliciano na CDH vai “dividir, ainda mais, a própria igreja evangélica” no Brasil.
 
A ANAJURE é um grupo de juristas evangélicos que nasceu recentemente. Sua alegada missão é defender as liberdades civis fundamentais, principalmente dos cristãos.
 
Mas sua nota púbica, assinada por seu presidente, Uziel Santana, não tem nenhuma defesa tal das liberdades civis fundamentais de Feliciano. Pelo contrário, a nota acusa o pastor da Assembleia de Deus de “fomentar e participar de uma tresloucada ‘guerra santa’ por estar agindo com intolerância para com os intolerantes”.
 
A nota também questiona as motivações pessoais do pastor pentecostal, dizendo: “Tudo isso porque os projetos pessoais estão acima dos valores da Verdade do Evangelho de Cristo”.
 
Conforme informação que obtive, a ANAJURE teve sua primeira renúncia ontem, pois um de seus diretores discordou fortemente da nota contra Feliciano.
 
De uma organização que se autonomeou para defender as liberdades civis fundamentais, nós brasileiros deveríamos esperar tal defesa, independente das diferenças doutrinárias da vítima cristã. Mas esse é um duro teste para a ANAJURE, cujo Conselho Diretivo Nacional é presidido pelo Rev. Augustus Nicodemus Lopes.
 
Um ativista gay numa universidade presbiteriana

 
Lopes é o chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Ele tem vários textos teológicos contra os movimentos pentecostais e neopentecostais. Alguns de seus artigos estão disponíveis no site de sua universidade.
 
Em 28 de fevereiro, sua universidade realizou um debate com o deputado federal Jean Wyllys. Wyllys é um militante gay radical, que trabalha muito na CDH para avançar a agenda gay.
 
Para debater o ativista gay, Lopes convidou um de seus amigos na ANAJURE. Mas os estudantes na universidade presbiteriana vaiaram o representante da ANAJURE, e elogiaram Wyllys.
 
No fim, Lopes negou que tivesse patrocinado o evento, mas o documento oficial da universidade confirma que o debate foi realizado em parceira com a chancelaria da universidade.
 
Esse não é o único caso estranho envolvendo o chanceler Augustus Nicodemus Lopes. Em 2010 ele havia removido do site da universidade um manifesto presbiteriano contra a agenda gay, pois os ativistas gays exigiram isso. Ele cedeu. Mas ele nunca removeu seus vários artigos contra os pentecostais e neopentecostais.
 
Minha exposição da parceria incoerente, e o fato vergonhoso de que um ativista gay recebeu oportunidade de defender suas perversões numa universidade protestante, reverberaram em todo o Brasil. Grandes sites noticiosos evangélicos publicaram ou mencionaram meu artigo.
 
Censura

 
Os sites de notícias evangélicos GospelPrime, GospelMais, Portal Fé em Jesus e outros foram contactados pela ANAJURE, que lhes pediu que removessem meu artigo e, em seu lugar, publicassem artigos da ANAJURE.
 
Um dos editores, que estava sob pressão da ANAJURE, me disse: “Sinceramente, eu ainda não sei para quê existe a tal da ANAJURE”.
 
GospelPrime, GospelMais e outros cederam. Mas o Portal Fé em Jesus repreendeu a ANAJURE por sua agressão contra a liberdade de expressão — nesse caso, minha a liberdade de expressão.
 
O fato é, se a ANAJURE tivesse repreendido Lopes por permitir um ativista gay em sua universidade, não precisaria pedir que grandes sites evangélicos censurassem minhas liberdades civis fundamentais de denunciar a conduta de Lopes.
 
Entretanto, mesmo sob pressões, meu artigo teve uma repercussão significativa no Brasil. A página de Facebook de Silas Malafaia o divulgou para seus 168.000 seguidores.
 
E quanto a ANAJURE e sua missão alegada de defender as liberdades civis fundamentais? Está enfrentando um tempo difícil de colocar em prática no caso de Marco Feliciano, pois seu presidente acha que é necessário julgar o caráter e motivações de Feliciano, mas é incapaz de fazer isso no caso de um de seus próprios diretores.
 
E se você expô-lo por permitir um ativista gay em sua universidade protestante ou por ele ceder a militantes gays que exigiram a remoção de um artigo, no site de sua universidade, de um manifesto cristão contra a agenda gay, a ANAJURE mostra seus músculos para defender a covardia e censurar uma mensagem cristã contra ela.
 
A ANAJURE tem a liberdade de defender e atacar quem quiser.
Ainda que discordando de Marco Feliciano, darei apoio a ele por sua coragem, e oro para que ele não ceda aos covardes que exigem que ele imite a covardia deles.

23 de março de 2013
Julio Severo  

A CULTURA ANTES DA POLÍTICA


          Artigos - Conservadorismo 
Para o conservador, a política é apenas um dos vários instrumentos de exercício do conservadorismo, mas está longe de ser o mais nobre ou o mais eficaz.

Há uma galeria notável de intelectuais que se aventurou na sempre arriscada, mas grandiosa, tarefa de definir o que é o conservadorismo – e me refiro ao pensamento conservador britânico. Desde Richard Hooker, o fundador do Conservadorismo antigo, temos uma lista canônica de cavalheiros conservadores do passado e do presente: Marquês de Halifax, Edmund Burke, Lord Hugh Cecil, Michael Oakeshott, Russell Kirk, John Kekes, Anthony Quinton, Roger Scruton, Kenneth Minogue, Kieron O’Hara.

 
Definir o que é o conservadorismo não é uma tarefa simples para conservadores nem para os filósofos políticos. Porque conservadorismo em si não é uma ideologia, nem uma filosofia e muito menos um programa de aplicação política. Trata-se, contudo, de um espírito, de uma disposição – para usar o termo do filósofo político Michael Oakeshott – que se alicerça ou se manifesta num conjunto de princípios, valores, hábitos, práticas e ideias que emergem da rica experiência da vida em sociedade, dentro da qual se localiza a política.
Qualificar o conservadorismo como um espírito ou como uma disposição é o mais próximo que podemos ter de uma concepção abrangente, mas talvez a imagem mais adequada sobre o que é o conservadorismo seja a do trimmer, extraída da terminologia náutica pelo Marquês de Halifax.
 
O trimmer, ferramenta responsável por manter o equilíbrio da embarcação quando o seu curso é ameaçado, serve perfeitamente ao objetivo de Halifax de realçar o exercício suave do conservadorismo, que, no caso da política, não muda de posição com o advento das modas ideológicas e se caracteriza pela reação às ameaças de alterações radicais ou mudanças que provoquem sofrimento e que rompam aquela ligação de familiaridade que o indivíduo tem com o presente e com aquilo que possui.
 
Para o conservador, a política é apenas um dos vários instrumentos de exercício do conservadorismo, mas está longe de ser o mais nobre ou o mais eficaz. Não é sem razão que o Partido Conservador Inglês nasce da aversão pela política partidária, segundo mostra Roger Scruton no seu precioso The Meaning of Conservatism, que recomendo vivamente.
 
Essas observações são necessárias para tentar obter uma resposta à legítima pergunta: onde estão os políticos conservadores brasileiros?
 
No entanto, acredito que há uma pergunta prévia a ser feita: o que é e onde está o conservadorismo brasileiro? Porque para que uma Margaret Thatcher fosse possível – e ela é apenas uma dentre tantos políticos conservadores britânicos – foi preciso, antes, haver um conservadorismo que conquistasse e influenciasse uma parcela da sociedade.
 
No Brasil, antes de pensar num político conservador é preciso que tenhamos um pensamento conservador que possa influenciar culturalmente a sociedade. Só depois disso é que será possível esperar o surgimento de uma elite política apta a defender princípios e valores conservadores. A batalha, antes de ser política e econômica, é cultural.
 
Se a política conservadora vier antes do conservadorismo poderá acontecer o que um conservador britânico rejeitaria de forma absoluta: a criação artificial de um estímulo conservador pelo exercício centralizado da política partidária. Isso seria uma forma rápida de destruir o que esse mesmo conservador preza: uma sociedade na qual a família, a liberdade, a propriedade e a ordem seriam preservadas porque garantem seus modos de vida, sua tradição e a busca livre pela prosperidade.

23 de março de 2013
Bruno Garschagen
é cientista político pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica de Lisboa e University of Oxford, e podcaster do Instituto Ludwig von Mises.
Publicado na revista Vila Nova.

IDEÓLOGO É A MÃE


          Artigos - Cultura 
Quem pode ser mais patético do que aquele que usa como ofensa o próprio termo que mais apropriadamente o define?

A baixeza de caráter sempre acaba transparecendo na deformidade da linguagem, especialmente sob a forma dos cacoetes de estilo e da impropriedade do vocabulário.

Em artigo recente e muito oportuno, Roberto Romano lembra um desses cacoetes, que se tornou marca registrada da linguagem fascista: o uso de aspas pejorativas como armas de extermínio das reputações.
 
Quando não se sabe o que alegar contra um sujeito, apela-se a esses sinais gráficos na esperança de que, fincados dos dois lados de um qualificativo -- mesmo que seja o simples nome de uma atividade profissional --, valham magicamente como sua total e peremptória negação. Entre aspas, a vitória transfigura-se em derrota, o talento em inépcia, o advogado em rábula, o general em recruta e o santo em charlatão: pelo menos tal é a expectativa dos aspeadores.
Disso deveria saber eu, que cheguei a ser, no dizer de Bruno Tolentino, “o mais aspeado filósofo brasileiro” -- mas por que deveria preocupar-me com um truque bobo que só revela, nos seus praticantes, a mentalidade pueril e um toque de analfabetismo funcional?
Escritores que se prezam empregam as aspas para indicar citações, conotações alusivas ou ambigüidades deliberadas, e evitam dar-lhes sentido pejorativo porque sabem que isso é só para aqueles a quem a natureza avara negou até mesmo o dom de insultar criativamente, tão abundante na linguagem popular do Brasil.
 
Mas outra deformidade típica, endêmica nos jornais e nas cátedras deste país, é o vício de forçar um termo a carregar-se de conotação ofensiva até fazê-lo perder o último vestígio de referência à sua significação própria. O exemplo mais renitente é o uso comunista do adjetivo “fascista”: na ânsia de associar a seus adversários a lembrança sinistra das ditaduras de Hitler e Mussolini, estampam-no com entusiasmo feroz no rosto dos que defendem a liberdade de mercado, a redução do poder do Estado, a independência entre os poderes e as garantias legais da democracia parlamentar – o oposto simétrico de qualquer coisa que mereça, na escala objetiva, o nome de “fascismo”.
 
Não por coincidência, as pessoas que fazem isso são as mesmas que mais freqüentemente apelam ao recurso fascista das aspas pejorativas.
 
Outro exemplo é o uso da palavra “ideólogo” como rótulo depreciativo.
 
“Ideologia” é um sistema de idéias destinadas não a descrever ou analisar a realidade, mas a criar e fortalecer a unidade de um partido, grupo ou movimento político e a orientar, justificando-os e enaltecendo-os, os seus planos para a tomada e manutenção do poder.
 
Basta compreender essa definição para perceber imediatamente que aqueles que tentam rebaixar o meu trabalho rotulando-me “ideólogo” são nada mais que charlatães e difamadores desprovidos do mais mínimo fragmento de credibilidade.
 
Para que essa rotulação tivesse algum valor, seria preciso que os rotuladores pudessem responder às seguintes perguntas: Que partido? Que grupo? Que movimento? Que planos?
Não podem
 
O público a que me dirijo não constitui um grupamento político nem mesmo num sentido remotamente analógico, não tem nenhuma unidade organizacional ou atividade militante e nem sequer encontros ou congressos onde pudesse sonhar com uma vaga tomada do poder num futuro hipotético e inalcançável. E por mais meticulosamente que se examinem os meus escritos e aulas, não se encontrará aí o menor esboço de algum plano nesse sentido.
 
Quanto aos grupos e classes existentes para além das fronteiras desse círculo, é mais que óbvio que não me dirijo a nenhum deles em especial, não os represento no mais mínimo que seja e não tenho sequer por eles um pouco de afeição ou respeito, condição sine qua non para que desejasse orientá-los ou liderá-los politicamente.
Seria eu o ideólogo da burguesia, essa classe que não sonha senão em abrigar-se à sombra do Estado? Dos militares, que se rebaixaram à condição de funcionários públicos, totalmente esquecidos de que seu dever de lealdade é para com o Estado e não para com qualquer partido que o açambarque e prostitua a serviço de seus próprios interesses? Dos estudantes, que só pensam em comunismo, sexo e drogas? Dos pobres e oprimidos, que não lêm uma só linha do que escrevo e só acreditam no Big Brother Brasil?
 
Ricos ou pobres, fardados ou à paisana, meus leitores, ouvintes e alunos são indivíduos isolados, sem a menor ambição ou possibilidade de agir politicamente.
 
Chamar “ideólogo” a quem há anos se dirige a essas pessoas sem lhes acenar nem de longe com algum projeto político é esvaziar a palavra “ideologia” de todo significado substantivo para fazer dela um grotesco arremedo de insulto, um porrete de isopor, uma faca sem cabo nem lâmina que só expõe ao ridículo o seu usuário, especialmente quando este é, ele próprio, o porta-voz notório de um grupo político atuante e constituído. Quem pode ser mais patético do que aquele que usa como ofensa o próprio termo que mais apropriadamente o define?
 
Não por coincidência, os que se entregam a esse exercício de masoquismo inconsciente não estão só na esquerda, como os srs. Caio Navarro de Toledo, Adalberto Monteiro, Altamiro Borges ou a equipe do Vermelho.org, mas também alguns na direita, como o prof. Alexandre Dugin ou os srs. Rodrigo Constantino e Joel Pinheiro.
 
Em vista do exposto, a esses todos a única resposta merecida seria “Ideólogo é a mãe”, se justamente o último dos mencionados não constituísse exceção, de vez que, no seu caso, ideólogo não é a mãe e sim o pai – ideólogo do partido da Marina Silva.

23 de março de 2013

Olavo de Carvalho
 Publicado no Diário do Comércio.

RUÍDOS AMEAÇADORES DA COREIA DO NORTE

    
          Notícias Faltantes - Comunismo 
Quando um país tem poucas coisas além de armas, onde se supõe que sua política vai se apoiar? As ameaças vêm naturalmente.

A manchete do periódico Voice of America estampa: "Coreia do Norte ameaça atacarJapão". Em outra, o título é "EUA aumentará arsenal antibalístico após ameaças da Coreia do Norte". Fomos informados por meio de um aviso do Secretário de Defesa Chuck Hagel sobre a instalação de 14 interceptadores antibalísticos terrestres no Alaska até 2017.
 
Em outro lugar lemos sobre um líder militar norte-coreano ameaçando os Estados Unidos com um ataque nuclear preventivo (veja os links em “Is War Brewing on the Korean Penninsula?”). Também podemos ver um assustador vídeo onde o jovem ditador norte-coreano diz aos oficiais militares: "Jogue todos os inimigos no caldeirão, quebrem suas cinturas e suas traqueias."

Esse sempre foi o estilo retórico do regime norte-coreano. Há pelo menos 15 anos que eles vêm prometendo transformar a Coreia do Sul em um "mar de fogo" enquanto simultaneamente ameaçam os Estados Unidos com a inevitável destruição nuclear.
O governo norte-coreano atraiu muita atenção, e com isso ganhou ajuda para que mudasse seu discurso para um que prometesse paz.
Quanto maiores as ameaças, maiores as colheitas para que a perspectiva de paz seja mantida. Isso na verdade é um velho jogo. Há de se perguntar, porém, se algum dia, um principezinho da Coreia do Norte, inebriado com o poder, levará essa retórica a sério. Qual o limite para que o estilo retórico se transforme em calamidade?

A Coreia do Norte é um país socialista de tipo diferente. Ela se manteve com uma postura linha dura e uma determinação espartana para combater o inimigo capitalista; para isso tem um exército gigantesco e um arsenal massivo de mísseis. E, como todos sabem, uma guerra na península coreana teria repercussões econômicas devastadoras para a Ásia e o Pacífico.
Enquanto a América se preocupa se a Coreia do Norte tem mísseis capazes de acertar as cidades americanas, os japoneses e sul-coreanos já não têm mais dúvidas. Um míssil norte-coreano contendo uma ogiva com agentes biológicos ou mesmo uma nuclear pode atingir Tóquio a qualquer momento.

Qual a origem da militância norte-coreana?

A ideologia norte-coreana de início era um marxismo-leninismo compatível com a União Soviética e China. Em 1972, a ideologia foi oficialmente mudada para algo chamado "A ideologia Juche" que por sua vez foi uma ideologia colocada em moção pela primeira vez em meados dos anos 1950 pelo ditador fundador da Coreia do Norte, Kim Il-Sung. A ideologia propõe força militar e autoconfiança nacional. A Juche tem suas raízes na combinação da ideia "socialismo em um só país" de Stálin com o princípio de "regeneração através dos próprios esforços" de Mao.
Como o homem é mestre de todas as coisas, a Coreia do Norte pode muito bem tomar uma posição independente contra o imperialismo e o capitalismo. Evidentemente essa posição não é verdadeiramente independente, pois a Coreia do Norte sempre recebeu suas armas da China e ocasional suporte econômico ou técnico da Rússia. O regime também usou as ameaças (incluindo a ameaça de construir uma arma nuclear) para conseguir assistência econômica, dinheiro e comida dos Estados Unidos e Coreia do Sul. Talvez estejam erroneamente tentando usar a atual ameaça de guerra nuclear para os mesmos propósitos.

Apesar de possuir uma grande e poderosa máquina militar, a Coreia do Norte é um dos países mais pobres do mundo. Tentando fazer da autocracia e da isolação virtudes, a economia daquele país murchou. Nos anos 1980 o governo levou a cabo um programa para produzir dez milhões de toneladas de grãos por ano. Para o descontentamento deles, produziram-se apenas quatro. (Estima-se que são necessários seis milhões de toneladas para alimentar o povo norte-coreano)

Ainda assim, a Coreia do Norte conseguiu criar um enorme exército com 153 divisões e brigadas, sendo 60 divisões e brigadas de infantaria, 25 brigadas mecanizadas, 13 brigadas de tanques, 25 brigadas de Forças Especiais e 30 brigadas de artilharias.

Quando um país tem poucas coisas além de armas, onde se supõe que sua política vai se apoiar? As ameaças vêm naturalmente. Toda a psicologia da liderança do país é alheia a esforços de paz. Ela é, com efeito, orientada para a guerra. Porém, se a guerra é impraticável no momento, a orientação é o engajamento na ameaça de guerra. Portanto, a coisa mais natural do mundo são os líderes norte-coreanos fazendo terríveis ameaças.
 
Quanto à questão sobre se eles estão ou não blefando, na verdade deve se colocar de modo reverso. Os japoneses, sul-coreanos e americanos estão blefando acerca do comprometimento em resistir o avanço norte-coreano? E, além disso, eles estão dispostos a pagar um preço pela paz? Se assim for, os norte-coreanos logo suspeitarão. E outra coisa é certa: os norte-coreanos atacarão se e quando seus oponentes estiverem fracos. Não deixem que ninguém se engane a esse respeito.

23 de março de 2013
Jeffrey Nyquist
Publicado no Financial Sense.

RUÍDOS AMEAÇADORES DA COREIA DO NORTE

    
          Notícias Faltantes - Comunismo 
Quando um país tem poucas coisas além de armas, onde se supõe que sua política vai se apoiar? As ameaças vêm naturalmente.

A manchete do periódico Voice of America estampa: "Coreia do Norte ameaça atacarJapão". Em outra, o título é "EUA aumentará arsenal antibalístico após ameaças da Coreia do Norte". Fomos informados por meio de um aviso do Secretário de Defesa Chuck Hagel sobre a instalação de 14 interceptadores antibalísticos terrestres no Alaska até 2017.
 
Em outro lugar lemos sobre um líder militar norte-coreano ameaçando os Estados Unidos com um ataque nuclear preventivo (veja os links em “Is War Brewing on the Korean Penninsula?”). Também podemos ver um assustador vídeo onde o jovem ditador norte-coreano diz aos oficiais militares: "Jogue todos os inimigos no caldeirão, quebrem suas cinturas e suas traqueias."

Esse sempre foi o estilo retórico do regime norte-coreano. Há pelo menos 15 anos que eles vêm prometendo transformar a Coreia do Sul em um "mar de fogo" enquanto simultaneamente ameaçam os Estados Unidos com a inevitável destruição nuclear.
O governo norte-coreano atraiu muita atenção, e com isso ganhou ajuda para que mudasse seu discurso para um que prometesse paz.
Quanto maiores as ameaças, maiores as colheitas para que a perspectiva de paz seja mantida. Isso na verdade é um velho jogo. Há de se perguntar, porém, se algum dia, um principezinho da Coreia do Norte, inebriado com o poder, levará essa retórica a sério. Qual o limite para que o estilo retórico se transforme em calamidade?

A Coreia do Norte é um país socialista de tipo diferente. Ela se manteve com uma postura linha dura e uma determinação espartana para combater o inimigo capitalista; para isso tem um exército gigantesco e um arsenal massivo de mísseis. E, como todos sabem, uma guerra na península coreana teria repercussões econômicas devastadoras para a Ásia e o Pacífico.
Enquanto a América se preocupa se a Coreia do Norte tem mísseis capazes de acertar as cidades americanas, os japoneses e sul-coreanos já não têm mais dúvidas. Um míssil norte-coreano contendo uma ogiva com agentes biológicos ou mesmo uma nuclear pode atingir Tóquio a qualquer momento.

Qual a origem da militância norte-coreana?

A ideologia norte-coreana de início era um marxismo-leninismo compatível com a União Soviética e China. Em 1972, a ideologia foi oficialmente mudada para algo chamado "A ideologia Juche" que por sua vez foi uma ideologia colocada em moção pela primeira vez em meados dos anos 1950 pelo ditador fundador da Coreia do Norte, Kim Il-Sung. A ideologia propõe força militar e autoconfiança nacional. A Juche tem suas raízes na combinação da ideia "socialismo em um só país" de Stálin com o princípio de "regeneração através dos próprios esforços" de Mao.
Como o homem é mestre de todas as coisas, a Coreia do Norte pode muito bem tomar uma posição independente contra o imperialismo e o capitalismo. Evidentemente essa posição não é verdadeiramente independente, pois a Coreia do Norte sempre recebeu suas armas da China e ocasional suporte econômico ou técnico da Rússia. O regime também usou as ameaças (incluindo a ameaça de construir uma arma nuclear) para conseguir assistência econômica, dinheiro e comida dos Estados Unidos e Coreia do Sul. Talvez estejam erroneamente tentando usar a atual ameaça de guerra nuclear para os mesmos propósitos.

Apesar de possuir uma grande e poderosa máquina militar, a Coreia do Norte é um dos países mais pobres do mundo. Tentando fazer da autocracia e da isolação virtudes, a economia daquele país murchou. Nos anos 1980 o governo levou a cabo um programa para produzir dez milhões de toneladas de grãos por ano. Para o descontentamento deles, produziram-se apenas quatro. (Estima-se que são necessários seis milhões de toneladas para alimentar o povo norte-coreano)

Ainda assim, a Coreia do Norte conseguiu criar um enorme exército com 153 divisões e brigadas, sendo 60 divisões e brigadas de infantaria, 25 brigadas mecanizadas, 13 brigadas de tanques, 25 brigadas de Forças Especiais e 30 brigadas de artilharias.

Quando um país tem poucas coisas além de armas, onde se supõe que sua política vai se apoiar? As ameaças vêm naturalmente. Toda a psicologia da liderança do país é alheia a esforços de paz. Ela é, com efeito, orientada para a guerra. Porém, se a guerra é impraticável no momento, a orientação é o engajamento na ameaça de guerra. Portanto, a coisa mais natural do mundo são os líderes norte-coreanos fazendo terríveis ameaças.
 
Quanto à questão sobre se eles estão ou não blefando, na verdade deve se colocar de modo reverso. Os japoneses, sul-coreanos e americanos estão blefando acerca do comprometimento em resistir o avanço norte-coreano? E, além disso, eles estão dispostos a pagar um preço pela paz? Se assim for, os norte-coreanos logo suspeitarão. E outra coisa é certa: os norte-coreanos atacarão se e quando seus oponentes estiverem fracos. Não deixem que ninguém se engane a esse respeito.

23 de março de 2013
Jeffrey Nyquist
Publicado no Financial Sense.