Seguindo a atual preferência popular na televisão, foi um show de realidade, muito melhor do que qualquer Big Brother. O repórter do Fantástico se passa por gestor de saúde e detona quatro quadrilhas disfarçadas de empresas fornecedoras de hospitais públicos que subornavam funcionários, fraudavam licitações e inflavam preços para roubar o contribuinte.
A mise-en-scène é moderna, mas os métodos são antigos e se espalham como um câncer nas administrações, só mudam os nomes dos malfeitores e dos partidos no poder, que não por acaso são sempre beneficiários de generosas contribuições das quadrilhas. Vai ser assim enquanto pessoas jurídicas – que não votam – puderem participar de campanhas eleitorais.
Os ramos de atividade são clássicos da gatunagem: coleta de lixo (esse pessoal ama o lixo, como negócio e metáfora), quentinhas de presídios (são os melhores clientes, não reclamam nunca), aluguel e manutenção de carros (em um ano recuperam o preço do veículo).
Roubar de hospitais, de crianças doentes, é repugnante, mas nada mais surpreende num país que já viu desbaratadas quadrilhas de funcionários, políticos e empresários que roubavam sangue, remédios para câncer e merenda escolar. Roubam de crianças, presos e doentes, e, num eufemismo delubiano, chamam de “ética do mercado”. No Brasil maravilha da propaganda oficial, é um show de realidade: com o país mais rico, rouba-se mais.
Mas este não é só mais um dos incontáveis episódios de suborno de gestores e roubo de dinheiro público, é um arquétipo documentado, um padrão que deveria ser estudado como um modelo, porque se reproduz de forma sistêmica em todo o Brasil, com a administração pública dominada – como nunca na história desse País – pelos interesses dos políticos e dos partidos.
Como é incontestável que a maior parte dos nossos representantes federais, estaduais e municipais é de baixo nível ético, como esperar que os ruins façam boas indicações? Você confiaria em alguém indicado por Sarney, Renan ou Jucá?
O castigo extra para os quadrilheiros cariocas vai ser comer a gororoba de preso que eles superfaturavam.
Nelson Motta
Fonte: O Estado de S. Paulo, 23/03/2012
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
segunda-feira, 26 de março de 2012
PAÍS PERDE PIADISTA
Havia em Dom Pedrito uma pequena biblioteca no prédio da Prefeitura. Pequena, mas bem nutrida. Lá, degustamos Cervantes e Platão, Balzac e Maupassant, Diderot e Descartes, para desespero dos padres oblatos que nos lecionavam.
A Biblioteca dos Séculos, coleção editada pela Globo, de Porto Alegre, era nossa festa.
Adolescentes, provavelmente não chegamos a entender muito bem estes e outros autores. Mas deles ficou algo importante: havia muitas maneiras de se ver o mundo, quase todas divergentes, todas com maior ou menor parcela de razão.
Naquela biblioteca, quando guri, tomei contato com o que entendo por humor. Não lembro quem chegou primeiro, se Voltaire, com Zadig, ou Cervantes, com o Quixote.
"Dichosa edad y siglo dichoso aquel donde saldrán a luz las famosas hazañas mías, dignas de entallarse em bronces, esculpirse en mármoles y pintarse en tablas, para memoria en lo futuro. Oh tú, sabio encantador, quienquiera que seas, a quien ha de tocar ser cronista desta peregrina historia! Ruegote que no te olvides de mi buen Rocinante, compañero eterno mío em todos mis caminos y carreras".
Considero Cervantes antes de tudo um humorista. Este trecho, a meu ver, dá o diapasão de toda sua obra. Ali está o personagem e aquilo a que vem: desfazer tortos, para glória na eternidade. Esta divertida ironia em relação a si mesmo é o que mais me fascina no Quixote.
Swift veio um pouco depois, nos dias de universidade. Eu tinha uma vaga idéia de Liliput e das viagens de Gulliver, mas considerava que era literatura infantil. Foi quando um bom amigo alertou-me: nada disso, tchê, Swift é gênio. Isso de literatura infantil é decorrência das adaptações que editores fazem para adolescentes. Mergulhei na obra e até hoje o azedo dublinense é um dos meus autores de cabeceira.
Humor é algo muito britânico. Os ingleses deram ainda outras contribuições ao gênero, como Sterne e Thackeray. Fora estes, curti muito o americano Ambrose Bierce e o austríaco Karl Kraus. Dos italianos, fui leitor atento de Papini e Pitigrilli. Entre nós, gosto muito de Nelson Rodrigues (o cronista, particularmente) e de outro pouco conhecido autor, o Campos de Carvalho. Quem não leu A Lua vem da Ásia, A Vaca de Nariz Sutil, O Púcaro Búlgaro, A Chuva Imóvel, perdeu os melhores momentos da literatura nacional.
Nesta altura, já deve existir leitor me perguntando porque não cito o Machado. De fato, o carioquinha não deixa de ter seus momentos de humor. Em “A Sereníssima República”, conto de 1882, tido pelos machadistas como uma “vigorosa sátira política ao sistema eleitoral brasileiro”, o cônego Vargas comenta:
“[...] faleceu o primeiro magistrado, e três cidadãos apresentaram-se candidatos ao posto, mas só dois importantes, Hazeroth e Magog, os próprios chefes do partido retilíneo e do partido curvilíneo.
Devo explicar-vos estas denominações. Como eles são principalmente geômetras, é a geometria que os divide em política. Uns entendem que a aranha deve fazer as teias com fios retos, é o partido retilíneo; outros pensam, ao contrário, que as teias devem ser trabalhadas com fios curvos, - é o partido curvilíneo. Há ainda um terceiro partido, misto e central, com este postulado: - as teias devem ser urdidas de fios retos e fios curvos; é o partido reto-curvilíneo; e finalmente, uma quarta divisão política, o partido anti-reto-curvilíneo, que fez tabula rasa de todos os princípios litigantes, e propõe o uso de umas teias urdidas de ar, obra transparente e leve, em que não há linhas de espécie alguma”.
Verdade que, um século e meio antes, Swift escrevia:
“Embora o nosso Estado pareça florescente aos olhos do estrangeiro, o que é certo é que temos dois grandes males a debelar: de dentro, uma poderosa facção; de fora, a invasão de que estamos ameaçados por um formidável inimigo. Com respeito ao primeiro, preciso é que saiba que há setenta luas existem dois partidos contrários neste império, sob os nomes de Tramecksan e Slamecksan, termos derivados de altos e baixos tacões dos seus sapatos, pelos quais se distinguem. Não falta quem seja de opinião, é fato, que os tacões altos são mais conformes à nossa antiga constituição; apesar disso Sua Majestade resolveu servir-se apenas dos tacões baixos na administração do governo e em todos os cargos de Sua Majestade imperial são, pelo menos, mais baixos um drurr do que os de qualquer outra pessoa da corte. (O drurr é aproximadamente a décima quarta parte de uma polegada). O ódio dos dois partidos — continuou Keldersal — estão em tal grau, que não comem, não bebem juntos, nem se falam. Temos quase que a certeza de que os Tramecksans ou tacões altos são em maior número do que nós; a autoridade, porém, está na nossa mão. Contudo, andamos suspeitosos de que sua alteza imperial, o presuntivo herdeiro da coroa, tem alguma inclinação para os tacões altos; pelo menos tivemos ocasião de ver que um dos tacões é mais alto do que outro, o que o faz coxear um pouco”.
Paráfrase, dirão machadianos e machadistas. Para mim, paráfrase é eufemismo. Mas não é disto que pretendia falar. E sim do humorismo, gênero literário com o qual se preocuparam os grandes criadores de todos os séculos, desde Luciano de Samosata ao deão de Saint Patrick.
A imprensa – e particularmente a televisiva – tem o extraordinário condão de empobrecer as palavras. Aconteceu, por exemplo, com herói.
Palavra que antes designava o autor de feitos notáveis, geralmente fora do alcance de suas forças, passou a significar simplesmente qualquer profissional que cumpre sua obrigação.
Se antes heróis eram Alexandre, Napoleão, Churchill, Fernão de Magalhães ou Vasco da Gama, Hernán Cortez ou Pizarro, Amundsen ou Cook, herói hoje é o bombeiro que salva alguém de um incêndio ou um salva-vidas que retira alguém das águas.
No Brasil, andam tão escassos que até animais são promovidos a heróis. Quem não lembra da Catita, a cadelinha que defendeu uma criança atacada por dois pitbulls? "Heroína!" - berraram as manchetes. O episódio foi emblemático. Catita, mãe de vários cachorrinhos, arriscava a vida em defesa de um filhote alheio.
O velho mito da Madonna, desta vez em versão canina, tão utilizado pelos jornalistas para comover leitores. Mais ainda: Catita era uma cadela plebéia, vira-lata latina e nativa.
Os agressores eram cães de elite, alienígenas e com sotaque anglo-saxão. A finada luta de classes ressuscitava e se manifestava mesmo entre caninos. Em falta de heróis, vai cadela mesmo.
Outra palavra que a televisão desvalorizou brutalmente foi humorismo. Humor, gênero de longa tradição literária, virou sinônimo de piada barata. De preferência, ao alcance da mente de uma criança.
Semana passada, por exemplo, a imprensa toda celebrou a morte de um “humorista”. Em verdade, o defunto não passava de um piadista vulgar.
26 de março de 2012
janer cristaldo
A Biblioteca dos Séculos, coleção editada pela Globo, de Porto Alegre, era nossa festa.
Adolescentes, provavelmente não chegamos a entender muito bem estes e outros autores. Mas deles ficou algo importante: havia muitas maneiras de se ver o mundo, quase todas divergentes, todas com maior ou menor parcela de razão.
Naquela biblioteca, quando guri, tomei contato com o que entendo por humor. Não lembro quem chegou primeiro, se Voltaire, com Zadig, ou Cervantes, com o Quixote.
"Dichosa edad y siglo dichoso aquel donde saldrán a luz las famosas hazañas mías, dignas de entallarse em bronces, esculpirse en mármoles y pintarse en tablas, para memoria en lo futuro. Oh tú, sabio encantador, quienquiera que seas, a quien ha de tocar ser cronista desta peregrina historia! Ruegote que no te olvides de mi buen Rocinante, compañero eterno mío em todos mis caminos y carreras".
Considero Cervantes antes de tudo um humorista. Este trecho, a meu ver, dá o diapasão de toda sua obra. Ali está o personagem e aquilo a que vem: desfazer tortos, para glória na eternidade. Esta divertida ironia em relação a si mesmo é o que mais me fascina no Quixote.
Swift veio um pouco depois, nos dias de universidade. Eu tinha uma vaga idéia de Liliput e das viagens de Gulliver, mas considerava que era literatura infantil. Foi quando um bom amigo alertou-me: nada disso, tchê, Swift é gênio. Isso de literatura infantil é decorrência das adaptações que editores fazem para adolescentes. Mergulhei na obra e até hoje o azedo dublinense é um dos meus autores de cabeceira.
Humor é algo muito britânico. Os ingleses deram ainda outras contribuições ao gênero, como Sterne e Thackeray. Fora estes, curti muito o americano Ambrose Bierce e o austríaco Karl Kraus. Dos italianos, fui leitor atento de Papini e Pitigrilli. Entre nós, gosto muito de Nelson Rodrigues (o cronista, particularmente) e de outro pouco conhecido autor, o Campos de Carvalho. Quem não leu A Lua vem da Ásia, A Vaca de Nariz Sutil, O Púcaro Búlgaro, A Chuva Imóvel, perdeu os melhores momentos da literatura nacional.
Nesta altura, já deve existir leitor me perguntando porque não cito o Machado. De fato, o carioquinha não deixa de ter seus momentos de humor. Em “A Sereníssima República”, conto de 1882, tido pelos machadistas como uma “vigorosa sátira política ao sistema eleitoral brasileiro”, o cônego Vargas comenta:
“[...] faleceu o primeiro magistrado, e três cidadãos apresentaram-se candidatos ao posto, mas só dois importantes, Hazeroth e Magog, os próprios chefes do partido retilíneo e do partido curvilíneo.
Devo explicar-vos estas denominações. Como eles são principalmente geômetras, é a geometria que os divide em política. Uns entendem que a aranha deve fazer as teias com fios retos, é o partido retilíneo; outros pensam, ao contrário, que as teias devem ser trabalhadas com fios curvos, - é o partido curvilíneo. Há ainda um terceiro partido, misto e central, com este postulado: - as teias devem ser urdidas de fios retos e fios curvos; é o partido reto-curvilíneo; e finalmente, uma quarta divisão política, o partido anti-reto-curvilíneo, que fez tabula rasa de todos os princípios litigantes, e propõe o uso de umas teias urdidas de ar, obra transparente e leve, em que não há linhas de espécie alguma”.
Verdade que, um século e meio antes, Swift escrevia:
“Embora o nosso Estado pareça florescente aos olhos do estrangeiro, o que é certo é que temos dois grandes males a debelar: de dentro, uma poderosa facção; de fora, a invasão de que estamos ameaçados por um formidável inimigo. Com respeito ao primeiro, preciso é que saiba que há setenta luas existem dois partidos contrários neste império, sob os nomes de Tramecksan e Slamecksan, termos derivados de altos e baixos tacões dos seus sapatos, pelos quais se distinguem. Não falta quem seja de opinião, é fato, que os tacões altos são mais conformes à nossa antiga constituição; apesar disso Sua Majestade resolveu servir-se apenas dos tacões baixos na administração do governo e em todos os cargos de Sua Majestade imperial são, pelo menos, mais baixos um drurr do que os de qualquer outra pessoa da corte. (O drurr é aproximadamente a décima quarta parte de uma polegada). O ódio dos dois partidos — continuou Keldersal — estão em tal grau, que não comem, não bebem juntos, nem se falam. Temos quase que a certeza de que os Tramecksans ou tacões altos são em maior número do que nós; a autoridade, porém, está na nossa mão. Contudo, andamos suspeitosos de que sua alteza imperial, o presuntivo herdeiro da coroa, tem alguma inclinação para os tacões altos; pelo menos tivemos ocasião de ver que um dos tacões é mais alto do que outro, o que o faz coxear um pouco”.
Paráfrase, dirão machadianos e machadistas. Para mim, paráfrase é eufemismo. Mas não é disto que pretendia falar. E sim do humorismo, gênero literário com o qual se preocuparam os grandes criadores de todos os séculos, desde Luciano de Samosata ao deão de Saint Patrick.
A imprensa – e particularmente a televisiva – tem o extraordinário condão de empobrecer as palavras. Aconteceu, por exemplo, com herói.
Palavra que antes designava o autor de feitos notáveis, geralmente fora do alcance de suas forças, passou a significar simplesmente qualquer profissional que cumpre sua obrigação.
Se antes heróis eram Alexandre, Napoleão, Churchill, Fernão de Magalhães ou Vasco da Gama, Hernán Cortez ou Pizarro, Amundsen ou Cook, herói hoje é o bombeiro que salva alguém de um incêndio ou um salva-vidas que retira alguém das águas.
No Brasil, andam tão escassos que até animais são promovidos a heróis. Quem não lembra da Catita, a cadelinha que defendeu uma criança atacada por dois pitbulls? "Heroína!" - berraram as manchetes. O episódio foi emblemático. Catita, mãe de vários cachorrinhos, arriscava a vida em defesa de um filhote alheio.
O velho mito da Madonna, desta vez em versão canina, tão utilizado pelos jornalistas para comover leitores. Mais ainda: Catita era uma cadela plebéia, vira-lata latina e nativa.
Os agressores eram cães de elite, alienígenas e com sotaque anglo-saxão. A finada luta de classes ressuscitava e se manifestava mesmo entre caninos. Em falta de heróis, vai cadela mesmo.
Outra palavra que a televisão desvalorizou brutalmente foi humorismo. Humor, gênero de longa tradição literária, virou sinônimo de piada barata. De preferência, ao alcance da mente de uma criança.
Semana passada, por exemplo, a imprensa toda celebrou a morte de um “humorista”. Em verdade, o defunto não passava de um piadista vulgar.
26 de março de 2012
janer cristaldo
COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA DÁ 10 DIAS PARA PETRALHA EXPLICAR CONSULTORIA
Após receber informações, comissão vai avaliar se abre investigação.
Ministro negou suspeitas de ‘quebra de decoro’, apuradas pela comissão.
A Comissão de Ética Pública da Presidência da República decidiu nesta segunda-feira pedir informações ao ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, sobre suas atividades de consultoria. Ele terá dez dias para enviar as informações, segundo o presidente da comissão, Sepúlveda Pertence.
Seis ministros votaram, três pelo pedido de informações e três pelo arquivamento – ao todo, a comissão tem sete ministros, mas um estava ausente. Sepúlveda Pertence deu voto de minerva para pedir informações. Somente após receber as informações o a comissão vai decidir se abre ou não uma investigação a respeito das denúncias contra o ministro.
No começo de dezembro, reportagens do jornal "O Globo" informaram sobre serviços de consultoria que Pimentel prestou a empresas, uma delas contratada pela Prefeitura de Belo Horizonte. O ministro negou as irregularidades e disse que os serviços foram prestados entre 2009 e 2010, quando já não era prefeito da capital mineira nem ministro do governo federal.
Representação enviada à Comissão de Ética pediu abertura de processo administrativo para apurar as denúncias por causa "da possível prática de ato atentatório contra os princípios éticos que norteiam as atividades dos órgãos superiores da Presidência da República e a quebra de decoro".
Segundo Sepúlveda Pertence, Roberto Caldas, que havia pedido vista na reunião de 12 de março, votou pelo arquivamento alegando que fatos anteriores à posse de Pimentel como ministro não podem ser analisados pela comissão.
Pertence, no entanto, ponderou que “situações excepcionalíssimas” podem, sim, “comprometer a autoridade e exigir providência da Comissão de Ética pelo menos naquele papel de conselheiro da Presidência da República que a comissão tem”.
“Sem fazer nenhum juízo de mérito por ora sobre as acusações correntes ao ministro do Desenvolvimento, resolvemos dar-lhe a oportunidade de se manifestar para que então possamos ajuizar se existe essa situação excepcional em que se justificaria a abertura de um processo de ética, embora os fatos veiculados sejam todos eles anteriores a sua posse no ministério”, declarou.
Relator
Na reunião do dia 12 de março, o relator do caso, conselheiro Fábio Coutinho, votou pela abertura de procedimento com pedido de informações a Pimentel. A votação, no entanto, acabou adiada.
Naquela reunião, Sepúlveda Pertence disse achar "importante” que Fernando Pimentel preste informações sobre as acusações divulgadas pela imprensa.
A Comissão de Ética Pública é um órgão consultivo da Presidência e não tem poder para punir servidores ou autoridades públicas. No máximo, ele recomenda a exoneração de quem investiga. Pode ainda ainda aplicar uma "advertência ética" à autoridade, que não tem efeito prático, mas representa uma mancha no currículo.
26 de março de 2012
Portal G1
Ministro negou suspeitas de ‘quebra de decoro’, apuradas pela comissão.
A Comissão de Ética Pública da Presidência da República decidiu nesta segunda-feira pedir informações ao ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, sobre suas atividades de consultoria. Ele terá dez dias para enviar as informações, segundo o presidente da comissão, Sepúlveda Pertence.
Seis ministros votaram, três pelo pedido de informações e três pelo arquivamento – ao todo, a comissão tem sete ministros, mas um estava ausente. Sepúlveda Pertence deu voto de minerva para pedir informações. Somente após receber as informações o a comissão vai decidir se abre ou não uma investigação a respeito das denúncias contra o ministro.
No começo de dezembro, reportagens do jornal "O Globo" informaram sobre serviços de consultoria que Pimentel prestou a empresas, uma delas contratada pela Prefeitura de Belo Horizonte. O ministro negou as irregularidades e disse que os serviços foram prestados entre 2009 e 2010, quando já não era prefeito da capital mineira nem ministro do governo federal.
Representação enviada à Comissão de Ética pediu abertura de processo administrativo para apurar as denúncias por causa "da possível prática de ato atentatório contra os princípios éticos que norteiam as atividades dos órgãos superiores da Presidência da República e a quebra de decoro".
Segundo Sepúlveda Pertence, Roberto Caldas, que havia pedido vista na reunião de 12 de março, votou pelo arquivamento alegando que fatos anteriores à posse de Pimentel como ministro não podem ser analisados pela comissão.
Pertence, no entanto, ponderou que “situações excepcionalíssimas” podem, sim, “comprometer a autoridade e exigir providência da Comissão de Ética pelo menos naquele papel de conselheiro da Presidência da República que a comissão tem”.
“Sem fazer nenhum juízo de mérito por ora sobre as acusações correntes ao ministro do Desenvolvimento, resolvemos dar-lhe a oportunidade de se manifestar para que então possamos ajuizar se existe essa situação excepcional em que se justificaria a abertura de um processo de ética, embora os fatos veiculados sejam todos eles anteriores a sua posse no ministério”, declarou.
Relator
Na reunião do dia 12 de março, o relator do caso, conselheiro Fábio Coutinho, votou pela abertura de procedimento com pedido de informações a Pimentel. A votação, no entanto, acabou adiada.
Naquela reunião, Sepúlveda Pertence disse achar "importante” que Fernando Pimentel preste informações sobre as acusações divulgadas pela imprensa.
A Comissão de Ética Pública é um órgão consultivo da Presidência e não tem poder para punir servidores ou autoridades públicas. No máximo, ele recomenda a exoneração de quem investiga. Pode ainda ainda aplicar uma "advertência ética" à autoridade, que não tem efeito prático, mas representa uma mancha no currículo.
26 de março de 2012
Portal G1
"DESTRUAM TODAS AS IGREJAS"
Notícias Faltantes - Perseguição Anticristã
Imaginem se Pat Robertson [1] clamasse pela demolição de todas as mesquitas na América. Isso seria destaque em todos os jornais. Estaria nos noticiários de cada canal de televisão. Haveria uma demanda para que os cristãos o denunciassem, e eles o fariam – nos termos mais duros. O Presidente dos Estados Unidos e outros líderes mundiais também se pronunciariam. E com razão.
Então, por que é que quando Abdulaziz ibn Abdullah Al al-Sheikh, o Grão-Mufti [2] do Reino da Arábia Saudita, declara que é “necessário destruir todas as igrejas na Península Arábica”, a grande mídia não vê nisso como digno de ser noticiado? E ninguém, até onde eu saiba, notou que ele disse isso para membros de um grupo terrorista.
Eis os fatos: alguns membros do parlamento kuwaitiano têm procurado demolir igrejas, ou pelo menos proibir a construção de novas, dentro do país. Assim, levantou-se a questão: o que a Sharia, a lei islâmica, diz a respeito disso?
Uma delegação do Kuwait pediu conselhos ao Grão-Mufti saudita. Ele respondeu que o Kuwait faz parte da Península Arábica – e qualquer igreja dentro da Península Arábica deve, realmente, ser destruída porque a alternativa seria aprová-las. O Grão-Mufti explicou: “O Profeta (que a Paz esteja com ele) nos ordenou: ‘Duas religiões não podem coexistir na Península Arábica’. Assim, construir [igrejas], em primeiro lugar, não é permitido porque esta Península deve ficar livre [de outras religiões].” Na Arábia Saudita, evidentemente, templos não-islâmicos foram banidos há muito tempo e não-muçulmanos são proibidos de pisarem seus pés em Meca e Medina.
E tem mais: os espectadores kuwaitianos eram da Sociedade de Reavivamento da Herança Islâmica (Revival of Islamic Heritage Society – RIHS). Pode soar bastante inocente, mas algumas pesquisas feitas por Steve Miller, pesquisador da Foundation for Defense of Democracies, revelaram que, dez anos atrás, grupos da RIHS no Afeganistão e no Paquistão foram designados pela ONU como associados a – e provedores de fundos e armas para – “Al-Qaeda, Osama bin Laden ou o Talibã.”
O governo norte-americano foi mais longe, denunciando que a sede da RIHS no Kuwait por “fornecer apoio financeiro e material para a Al-Qaeda e suas aliadas, incluindo o Lashkar e-Tayyiba [3]” que teve “envolvimento no ataque a múltiplos trens em Mumbai, em julho de 2006, e no ataque contra o parlamento indiano em dezembro de 2001.” Tais atividades levaram escritórios da RIHS a serem “fechados ou ocupados pelos governos da Albânia, Azerbaijão, Bangladesh, Bósnia-Herzegovina, Camboja e Rússia.”
Isto deve ser enfatizado: Al al-Sheikh não é o equivalente árabe para algum pastor desconhecido da Flórida. Ele é a maior autoridade religiosa da Arábia Saudita, onde não há separação entre mesquita e Estado, e a religião estatal é a ultra-ortodoxa/fundamentalista leitura do Islã conhecida como Wahhabismo [4]. Ele também é membro da principal família religiosa do país.
Em outras palavras, seus pronunciamentos representam a posição oficial da Arábia Saudita – um país que, segundo nos dizem há tempos, mudou de curso após o dia 11 de setembro de 2001 e é agora nosso firme aliado na área do antiterrorismo.
Nada disso teria sido esclarecido se não fosse por Raymond Ibrahim, Shillman Fellow no David Horowitz Freedom Center e pesquisador associado do Middle East Forum. Ele foi o primeiro a chamar atenção para as declarações do Grão-Mufti baseado em três sites em língua árabe: Mideast Christian News, Linga Christian Service e Asrare, também um folhetim cristão. Ocorreu-me então que, talvez, essas fontes tivessem compreendido mal ou exagerado as declarações. Então, pedi a Miller, que lê árabe, que fizesse uma pesquisa mais profunda. Ligações para o escritório do Departamento de Estado e a embaixada da Arábia Saudita foram infrutíferas, mas ele encontrou as declarações do Mufti em um bem conceituado jornal kuwaitiano, Al-Anba, em 11 de março.
Tudo isso ajuda a compor o quadro da mais importância notícia que a grande mídia insiste em ignorar: a expansão e a intensificação da perseguição de cristãos em países de maioria muçulmana (um assunto sobre o qual já escrevi antes, aqui por exemplo, bem como Ibrahim, mais recentemente, aqui). Igrejas foram alvo de incêndio e/ou bombas no Egito, Iraque, Nigéria, Paquistão, Indonésia e nas Filipinas. As antigas comunidades cristãs de Gaza e da Cisjordânia estão minguando. No Paquistão, Asia Bibi, uma mulher cristã, foi condenada à pena de morte por supostamente “insultar” o Islã. No Irã, Youcef Nadarkhani está no corredor da morte pelo “crime” de escolher o Cristianismo ao invés do Islã.
Na semana passada, como informou Nina Shea, a Comissão dos Estados Unidos sobre Direitos Humanos Internacionais (Uscirf) emitiu seu 14º relatório anual identificando os piores países opressores do mundo. Dos 16 países, 12 são de maioria muçulmana.
Por que os jornalistas que cobrem o Departamento de Estado e a Casa Branca não estão questionando oficiais da administração se estão preocupados com o fato de a maior autoridade religiosa da Arábia Saudita ter se encontrado com aliados da Al-Qaeda e lhes ter dito que, sim, igrejas cristãs devem ser destruídas? Por que os jornalistas que cobrem as Nações Unidas decidiram que essas questões não são de interesse da chamada comunidade internacional? E quanto aos centros para “entendimento Islâmico-Cristão” que foram estabelecidos – com dinheiro saudita – em universidades como Harvard e Georgetown: acaso supõem que não há nada aqui para tentar entender – nenhuma necessidade de investigação acadêmica sobre a perspectiva saudita/wahhabista no incêndio de igrejas e nas relações com grupos terroristas?
Meu palpite é de que tudo dito acima os persuadiu de que há aqui questões mais sérias para se preocupar, como a epidemia mundial da “islamofobia” e a necessidade de impor penas severas aos seus responsáveis. Eu entendo. De verdade.
26 de março de 2012
Escrito por Clifford D. May
Notas:
[1] Pat Robertson é um advogado e famoso tele-evangelista norte-americano.
[2] O Grão-Mufti é a maior autoridade religiosa em um país islâmico de tendência sunita. Nos países xiitas, seu equivalente é o Aiatolá.
[3] Lashkar e-Tayyiba (“Exército de Deus”) é um grupo terrorista islâmico indo-paquistanês, um dos maiores em atividade na região.
[4] O Wahhabismo foi um movimento religioso fundado pelo teólogo islâmico Muhammad ibn Abd al-Wahhab (1703 – 1792) e tinha por objetivo purificar o Islã de quaisquer inovações e influências externas. Foi através da adesão e da divulgação das idéias wahhabistas que a família Al-Saud unificou o Levante e instaurou a atual monarquia saudita.
Clifford D. May é presidente da Foundation for Defense of Democracies.
Tradução: Felipe Melo
Imaginem se Pat Robertson [1] clamasse pela demolição de todas as mesquitas na América. Isso seria destaque em todos os jornais. Estaria nos noticiários de cada canal de televisão. Haveria uma demanda para que os cristãos o denunciassem, e eles o fariam – nos termos mais duros. O Presidente dos Estados Unidos e outros líderes mundiais também se pronunciariam. E com razão.
Então, por que é que quando Abdulaziz ibn Abdullah Al al-Sheikh, o Grão-Mufti [2] do Reino da Arábia Saudita, declara que é “necessário destruir todas as igrejas na Península Arábica”, a grande mídia não vê nisso como digno de ser noticiado? E ninguém, até onde eu saiba, notou que ele disse isso para membros de um grupo terrorista.
Eis os fatos: alguns membros do parlamento kuwaitiano têm procurado demolir igrejas, ou pelo menos proibir a construção de novas, dentro do país. Assim, levantou-se a questão: o que a Sharia, a lei islâmica, diz a respeito disso?
Uma delegação do Kuwait pediu conselhos ao Grão-Mufti saudita. Ele respondeu que o Kuwait faz parte da Península Arábica – e qualquer igreja dentro da Península Arábica deve, realmente, ser destruída porque a alternativa seria aprová-las. O Grão-Mufti explicou: “O Profeta (que a Paz esteja com ele) nos ordenou: ‘Duas religiões não podem coexistir na Península Arábica’. Assim, construir [igrejas], em primeiro lugar, não é permitido porque esta Península deve ficar livre [de outras religiões].” Na Arábia Saudita, evidentemente, templos não-islâmicos foram banidos há muito tempo e não-muçulmanos são proibidos de pisarem seus pés em Meca e Medina.
E tem mais: os espectadores kuwaitianos eram da Sociedade de Reavivamento da Herança Islâmica (Revival of Islamic Heritage Society – RIHS). Pode soar bastante inocente, mas algumas pesquisas feitas por Steve Miller, pesquisador da Foundation for Defense of Democracies, revelaram que, dez anos atrás, grupos da RIHS no Afeganistão e no Paquistão foram designados pela ONU como associados a – e provedores de fundos e armas para – “Al-Qaeda, Osama bin Laden ou o Talibã.”
O governo norte-americano foi mais longe, denunciando que a sede da RIHS no Kuwait por “fornecer apoio financeiro e material para a Al-Qaeda e suas aliadas, incluindo o Lashkar e-Tayyiba [3]” que teve “envolvimento no ataque a múltiplos trens em Mumbai, em julho de 2006, e no ataque contra o parlamento indiano em dezembro de 2001.” Tais atividades levaram escritórios da RIHS a serem “fechados ou ocupados pelos governos da Albânia, Azerbaijão, Bangladesh, Bósnia-Herzegovina, Camboja e Rússia.”
Isto deve ser enfatizado: Al al-Sheikh não é o equivalente árabe para algum pastor desconhecido da Flórida. Ele é a maior autoridade religiosa da Arábia Saudita, onde não há separação entre mesquita e Estado, e a religião estatal é a ultra-ortodoxa/fundamentalista leitura do Islã conhecida como Wahhabismo [4]. Ele também é membro da principal família religiosa do país.
Em outras palavras, seus pronunciamentos representam a posição oficial da Arábia Saudita – um país que, segundo nos dizem há tempos, mudou de curso após o dia 11 de setembro de 2001 e é agora nosso firme aliado na área do antiterrorismo.
Nada disso teria sido esclarecido se não fosse por Raymond Ibrahim, Shillman Fellow no David Horowitz Freedom Center e pesquisador associado do Middle East Forum. Ele foi o primeiro a chamar atenção para as declarações do Grão-Mufti baseado em três sites em língua árabe: Mideast Christian News, Linga Christian Service e Asrare, também um folhetim cristão. Ocorreu-me então que, talvez, essas fontes tivessem compreendido mal ou exagerado as declarações. Então, pedi a Miller, que lê árabe, que fizesse uma pesquisa mais profunda. Ligações para o escritório do Departamento de Estado e a embaixada da Arábia Saudita foram infrutíferas, mas ele encontrou as declarações do Mufti em um bem conceituado jornal kuwaitiano, Al-Anba, em 11 de março.
Tudo isso ajuda a compor o quadro da mais importância notícia que a grande mídia insiste em ignorar: a expansão e a intensificação da perseguição de cristãos em países de maioria muçulmana (um assunto sobre o qual já escrevi antes, aqui por exemplo, bem como Ibrahim, mais recentemente, aqui). Igrejas foram alvo de incêndio e/ou bombas no Egito, Iraque, Nigéria, Paquistão, Indonésia e nas Filipinas. As antigas comunidades cristãs de Gaza e da Cisjordânia estão minguando. No Paquistão, Asia Bibi, uma mulher cristã, foi condenada à pena de morte por supostamente “insultar” o Islã. No Irã, Youcef Nadarkhani está no corredor da morte pelo “crime” de escolher o Cristianismo ao invés do Islã.
Na semana passada, como informou Nina Shea, a Comissão dos Estados Unidos sobre Direitos Humanos Internacionais (Uscirf) emitiu seu 14º relatório anual identificando os piores países opressores do mundo. Dos 16 países, 12 são de maioria muçulmana.
Por que os jornalistas que cobrem o Departamento de Estado e a Casa Branca não estão questionando oficiais da administração se estão preocupados com o fato de a maior autoridade religiosa da Arábia Saudita ter se encontrado com aliados da Al-Qaeda e lhes ter dito que, sim, igrejas cristãs devem ser destruídas? Por que os jornalistas que cobrem as Nações Unidas decidiram que essas questões não são de interesse da chamada comunidade internacional? E quanto aos centros para “entendimento Islâmico-Cristão” que foram estabelecidos – com dinheiro saudita – em universidades como Harvard e Georgetown: acaso supõem que não há nada aqui para tentar entender – nenhuma necessidade de investigação acadêmica sobre a perspectiva saudita/wahhabista no incêndio de igrejas e nas relações com grupos terroristas?
Meu palpite é de que tudo dito acima os persuadiu de que há aqui questões mais sérias para se preocupar, como a epidemia mundial da “islamofobia” e a necessidade de impor penas severas aos seus responsáveis. Eu entendo. De verdade.
26 de março de 2012
Escrito por Clifford D. May
Notas:
[1] Pat Robertson é um advogado e famoso tele-evangelista norte-americano.
[2] O Grão-Mufti é a maior autoridade religiosa em um país islâmico de tendência sunita. Nos países xiitas, seu equivalente é o Aiatolá.
[3] Lashkar e-Tayyiba (“Exército de Deus”) é um grupo terrorista islâmico indo-paquistanês, um dos maiores em atividade na região.
[4] O Wahhabismo foi um movimento religioso fundado pelo teólogo islâmico Muhammad ibn Abd al-Wahhab (1703 – 1792) e tinha por objetivo purificar o Islã de quaisquer inovações e influências externas. Foi através da adesão e da divulgação das idéias wahhabistas que a família Al-Saud unificou o Levante e instaurou a atual monarquia saudita.
Clifford D. May é presidente da Foundation for Defense of Democracies.
Tradução: Felipe Melo
A "MAIORIA APERTADA" DE 52%
Dirceu, “o chefe de quadrilha” fala, e a imprensa, como é mesmo?, repercute… Ou: A “maioria apertada” de 52%…
José Dirceu, o chefe de quadrilha (segundo a Procuradoria Geral da República), escreveu um post em seu blog criticando as prévias no PSDB e atacando José Serra. O “chefe de quadrilha” deve achar que processo legítimo e democrático é o que se deu no PT: Lula chegou lá, deu um “un coup de pied aux fesses” de Marta Suplicy e passou talquinho em Fernando Haddad.
Muito bem! A Folha Online fez um texto a respeito. Isso é sempre curioso. Quase ninguém lê o blog do “chefe de quadrilha”. Ele se faz conhecido porque a imprensa “repercute”, como se diz por aí, o que escrevem por lá. Dirceu, um próspero “consultor de empresas privadas”, tem uma equipe para cuidar da página. Mas isso é o de menos.
O que interessa no texto da Folha é outra coisa. Está escrito lá:
“Para ele [Dirceu], a vitória apertada de Serra nas primárias, com 52% dos votos, é uma prova de que o PSDB está dividido. Ele ainda acusou o tucano de partir para o confronto com o PT”.
Heeeinnn? Vitória apertada com 52%? Eram três candidatos. A vitória seria definida por maioria simples. Bastavam 33% dos votos mais um. Serra obteve 52,1% do total — 19,1 pontos acima do segundo colocado, José Aníbal, que ficou com 33%. Entenderam como são as coisas? O PT define que a vitória “foi apertada”, e a imprensa assume a mentira com dado de realidade.
Dirceu está descontente com Serra porque o tucano criticou o PT — “partiu para o confronto”, segundo o texto. Entendi. Onde já se viu um oposicionista criticar o partido do governo? Em boas democracias do mundo, como Cuba, Coréia do Norte, China, Equador ou Venezuela, isso é considerado crime.
Pedro Tobias, presidente do PSDB estadual, responde a Dirceu:
“José Serra saiu da Prefeitura de São Paulo para ser conduzido, pela maioria dos paulistas, ao Governo do Estado de São Paulo, enquanto o deputado José Dirceu saiu do governo do PT cassado pelo Congresso Nacional e tendo de responder a um processo por formação de quadrilha no Supremo Tribunal Federal.”
26 de março de 2012
Reinaldo Azevedo
José Dirceu, o chefe de quadrilha (segundo a Procuradoria Geral da República), escreveu um post em seu blog criticando as prévias no PSDB e atacando José Serra. O “chefe de quadrilha” deve achar que processo legítimo e democrático é o que se deu no PT: Lula chegou lá, deu um “un coup de pied aux fesses” de Marta Suplicy e passou talquinho em Fernando Haddad.
Muito bem! A Folha Online fez um texto a respeito. Isso é sempre curioso. Quase ninguém lê o blog do “chefe de quadrilha”. Ele se faz conhecido porque a imprensa “repercute”, como se diz por aí, o que escrevem por lá. Dirceu, um próspero “consultor de empresas privadas”, tem uma equipe para cuidar da página. Mas isso é o de menos.
O que interessa no texto da Folha é outra coisa. Está escrito lá:
“Para ele [Dirceu], a vitória apertada de Serra nas primárias, com 52% dos votos, é uma prova de que o PSDB está dividido. Ele ainda acusou o tucano de partir para o confronto com o PT”.
Heeeinnn? Vitória apertada com 52%? Eram três candidatos. A vitória seria definida por maioria simples. Bastavam 33% dos votos mais um. Serra obteve 52,1% do total — 19,1 pontos acima do segundo colocado, José Aníbal, que ficou com 33%. Entenderam como são as coisas? O PT define que a vitória “foi apertada”, e a imprensa assume a mentira com dado de realidade.
Dirceu está descontente com Serra porque o tucano criticou o PT — “partiu para o confronto”, segundo o texto. Entendi. Onde já se viu um oposicionista criticar o partido do governo? Em boas democracias do mundo, como Cuba, Coréia do Norte, China, Equador ou Venezuela, isso é considerado crime.
Pedro Tobias, presidente do PSDB estadual, responde a Dirceu:
“José Serra saiu da Prefeitura de São Paulo para ser conduzido, pela maioria dos paulistas, ao Governo do Estado de São Paulo, enquanto o deputado José Dirceu saiu do governo do PT cassado pelo Congresso Nacional e tendo de responder a um processo por formação de quadrilha no Supremo Tribunal Federal.”
26 de março de 2012
Reinaldo Azevedo
ASSUNTO PROIBIDO
Projetos para pôr fim ao 14º e ao 15º são engavetados pelo Congresso
Em fevereiro do ano passado, no primeiro dia de mandato, o deputado Reguffe (PDT-DF) apresentou um projeto de decreto legislativo para que os dois salários extras sejam extintos.
Três dias depois, a então senadora e atual chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann (PT-PR), apresentou no Senado uma proposta semelhante, que acabaria com o privilégio nas duas Casas.
Desde então, os dois projetos estão engavetados e não avançaram por total falta de interesse dos congressistas.
“Isso é uma coisa tão simples e óbvia que não deveria nem ser discutida. Um trabalhador normal só recebe os 12 salários e o 13º”, critica Reguffe.
26 de março de 2012
CORREIO BRAZILIENSE
Depois que virou ministra da casa civil, nem toca mais no assunto.
Em fevereiro do ano passado, no primeiro dia de mandato, o deputado Reguffe (PDT-DF) apresentou um projeto de decreto legislativo para que os dois salários extras sejam extintos.
Três dias depois, a então senadora e atual chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann (PT-PR), apresentou no Senado uma proposta semelhante, que acabaria com o privilégio nas duas Casas.
Desde então, os dois projetos estão engavetados e não avançaram por total falta de interesse dos congressistas.
“Isso é uma coisa tão simples e óbvia que não deveria nem ser discutida. Um trabalhador normal só recebe os 12 salários e o 13º”, critica Reguffe.
26 de março de 2012
CORREIO BRAZILIENSE
Depois que virou ministra da casa civil, nem toca mais no assunto.
NEM COM AS BOCAS DE ALUGUEL DA GRANDE IMPRENSA O "INTERVENTOR" DECOLA EM SÃO PAULO
Reinaldo Azevedo escreveu um post que diz tudo sobre o que na verdade ocorre na política paulista, onde Lula pretendia empurrar goela abaixo dos paulistanos um "interventor".
Reinaldo é um dos últimos jornalistas que está na grande imprensa (site da revista Veja), que resiste heroicamente. A maioria dos coleguinhas que atua nos veículos de mídia nacional são todos áulicos do PT, quando não militantes mesmo, com carteirinha e tudo o mais.
O texto do Reinaldo é mais que perfeito. Vai ao ponto e transcrevo na íntegra. Seu blog é leitura obrigatória diária para quem quer saber a verdade dos fatos.
Leiam:
O jornalismo pautado pelo PT deveria se perguntar por que Lula deu um murro na mesa e decidiu que o candidato à Prefeitura de São Paulo seria Fernando Haddad — E SEM PRÉVIAS. O PSDB, fato inegável, realizou as suas na cidade. O resultado foi compatível com um processo que de fato existiu, que não se limitou a cumprir uma formalidade.
Serra é, assim, o legítimo pré-candidato do PSDB à Prefeitura — candidato oficial tão logo se realize a convenção. Desafio um dos “cientistas políticos” tornados bocas de aluguel do PT a demonstrar que não. E faço a pergunta: “E Haddad? É o candidato legítimo do PT”?
Por que o partido não realiza uma prévia entre ele e Marta Suplicy pra gente ver no que dá? Mas quê… A direção do partido abortou o processo porque ele perderia feio. Se existe hoje um candidato imposto, que referenda os piores hábitos da política, é Haddad. As bocas de aluguel silenciam a respeito porque, afinal, são pagas para pensar outra coisa — é o “negócio” como ciência.
Para o bem e para o mal, o PSDB não tem um “coroné” como Lula. É para o mal porque a ausência de um líder unificador traz contratempos, é evidente. O partido demora, muitas vezes, a reagir e permite certa canibalização interna.
Mas é “para o bem” porque o partido sobreviverá à saída de cena deste ao daquele ao longo da história, como sobreviveu.
Sérgio Motta e Mário Covas se foram, e a legenda está aí. Na ausência de Lula, como está demonstrado, o PT se esfarela — e, curiosamente, o governo também. Rezar para que o Apedeuta se recupere plenamente, para os petistas, é mais do que um voto da decência humana, como é o meu. Também é uma questão se sobrevivência política.
Vamos, petistas, coragem! Vamos, “analistas”, coragem! Que o PT renuncie à prática velha do dedaço e realize prévias entre Haddad e Marta Suplicy — e sem interferência da máquina federal (assim como Geraldo Alckmin não interferiu na disputa tucana).
Que o PT escolha o legítimo representante do partido (ou “legítima”), a exemplo do que fez o PSDB. Fazer digressões desairosas sobre a eleição interna do PSDB — ignorando como se deu a “nomeação” do candidato do PT e chamando isso de “análise isenta” — é coisa de vigarista intelectual.
26 de março de 2012
aluizio amorim
Reinaldo é um dos últimos jornalistas que está na grande imprensa (site da revista Veja), que resiste heroicamente. A maioria dos coleguinhas que atua nos veículos de mídia nacional são todos áulicos do PT, quando não militantes mesmo, com carteirinha e tudo o mais.
O texto do Reinaldo é mais que perfeito. Vai ao ponto e transcrevo na íntegra. Seu blog é leitura obrigatória diária para quem quer saber a verdade dos fatos.
Leiam:
O jornalismo pautado pelo PT deveria se perguntar por que Lula deu um murro na mesa e decidiu que o candidato à Prefeitura de São Paulo seria Fernando Haddad — E SEM PRÉVIAS. O PSDB, fato inegável, realizou as suas na cidade. O resultado foi compatível com um processo que de fato existiu, que não se limitou a cumprir uma formalidade.
Serra é, assim, o legítimo pré-candidato do PSDB à Prefeitura — candidato oficial tão logo se realize a convenção. Desafio um dos “cientistas políticos” tornados bocas de aluguel do PT a demonstrar que não. E faço a pergunta: “E Haddad? É o candidato legítimo do PT”?
Por que o partido não realiza uma prévia entre ele e Marta Suplicy pra gente ver no que dá? Mas quê… A direção do partido abortou o processo porque ele perderia feio. Se existe hoje um candidato imposto, que referenda os piores hábitos da política, é Haddad. As bocas de aluguel silenciam a respeito porque, afinal, são pagas para pensar outra coisa — é o “negócio” como ciência.
Para o bem e para o mal, o PSDB não tem um “coroné” como Lula. É para o mal porque a ausência de um líder unificador traz contratempos, é evidente. O partido demora, muitas vezes, a reagir e permite certa canibalização interna.
Mas é “para o bem” porque o partido sobreviverá à saída de cena deste ao daquele ao longo da história, como sobreviveu.
Sérgio Motta e Mário Covas se foram, e a legenda está aí. Na ausência de Lula, como está demonstrado, o PT se esfarela — e, curiosamente, o governo também. Rezar para que o Apedeuta se recupere plenamente, para os petistas, é mais do que um voto da decência humana, como é o meu. Também é uma questão se sobrevivência política.
Vamos, petistas, coragem! Vamos, “analistas”, coragem! Que o PT renuncie à prática velha do dedaço e realize prévias entre Haddad e Marta Suplicy — e sem interferência da máquina federal (assim como Geraldo Alckmin não interferiu na disputa tucana).
Que o PT escolha o legítimo representante do partido (ou “legítima”), a exemplo do que fez o PSDB. Fazer digressões desairosas sobre a eleição interna do PSDB — ignorando como se deu a “nomeação” do candidato do PT e chamando isso de “análise isenta” — é coisa de vigarista intelectual.
26 de março de 2012
aluizio amorim
UM ESPIÃO NA ESPLANADA
LIVRE ACESSO
Como auditor da Receita, Pedro Anceles participou de projetos na Fazenda e na Casa Civil. Ao mesmo tempo, ele prestava assessoria a empresas.
Na história da espionagem são raros os episódios em que um agente duplo é flagrado em plena atividade e sua identidade é revelada ao público. São tão raros que seus nomes ficam conhecidos. É o caso do britânico Kim Philby, que fugiu para Moscou em 1963, depois de anos passando informações secretas à União Soviética. Ou de Aldrich Ames, o analista da CIA (a Agência Central de Inteligência americana) condenado em 1994, também por espionar para soviéticos, depois para os russos. Em tempos recentes, o exemplo mais chocante foi Robert Hanssen, o ex-funcionário do FBI (a polícia federal americana) que, durante 22 anos, passou informações confidenciais à União Soviética e à Rússia.
No Brasil, qualquer comparação com Philby, Ames ou Hanssen seria um exagero. Mas também é possível encontrar agentes duplos no Estado brasileiro. A atuação desses “espiões” costuma ser de outra natureza. Eles vendem informações estratégicas de órgãos públicos ou usam sua influência em benefício da iniciativa privada – e, com isso, fazem dinheiro. Duas semanas atrás, ÉPOCA revelou um desses casos. Trata-se do ex-auditor fiscal Pedro dos Santos Anceles, defenestrado em novembro passado pelo ministro Guido Mantega, da Fazenda, por improbidade administrativa. Foram várias as irregularidades cometidas por Anceles e descobertas pela Corregedoria da Receita Federal. Entre outras práticas, ele faltava ao trabalho para prestar consultoria à iniciativa privada e simulava palestras para repassar a seus clientes conhecimentos que deveriam ficar restritos ao Fisco. De acordo com novos documentos obtidos por ÉPOCA, Anceles não agiu somente no Fisco. Sua atuação se estendeu pela Casa Civil, da então ministra Dilma Rousseff, pelo gabinete do ministro Mantega e até por um grupo de trabalho criado por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Anceles participou da elaboração de diversas medidas provisórias e projetos de lei, além de normas fiscais. As novas revelações fazem parte do inquérito em que a Corregedoria da Receita investigou o caso de Anceles, a que ÉPOCA teve acesso com exclusividade. De acordo com os documentos, Anceles teve liberdade para atuar, no período em que estava na esfera de comando do atual secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto.
A principal testemunha de defesa de Anceles na investigação foi ninguém menos que o próprio Barreto, de quem Anceles se disse “amigo” próximo e que ele classificou como “uma pessoa bem acessível”. Quando Anceles praticou a maior parte das irregularidades, entre 2006 e 2008, Barreto era seu superior hierárquico direto, como secretário adjunto da Receita. Quando prestou depoimento, em março de 2010, Barreto presidia o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão do Ministério da Fazenda. Ele voltou ao Fisco em janeiro de 2011, no posto máximo do órgão.
No depoimento que prestou à Corregedoria, Barreto usou diversas expressões elogiosas para defender Anceles perante os investigadores. “A postura profissional e ética do sr. Pedro, enquanto funcionário e colaborador, tinha alto reconhecimento dentro da organização da Receita Federal”, afirmou Barreto. Entre 2003 e 2008, Anceles estava lotado na Delegacia de Julgamento da Receita em Santa Maria, Rio Grande do Sul. À comissão de inquérito, Barreto disse que, durante o período em que supervisionou as Delegacias de Julgamento, de 2002 a 2008, “diria que a DRJ de Santa Maria (comandada por Anceles) sempre foi muito produtiva e atuante, sendo os julgamentos lá realizados de alta qualidade”.
O depoimento de Barreto não traz apenas louvores a seu antigo subordinado. Ele põe em dúvida algumas afirmações do próprio Barreto sobre o caso Anceles. Na edição 720, do último dia 5, ÉPOCA revelou que Anceles operou dentro do Fisco para influenciar na redação de uma medida provisória que mudou a tributação sobre o café, beneficiando, entre outros grupos, cooperativas do setor. Barreto negou que Anceles tivesse participado das discussões sobre a MP. À Corregedoria, porém, ele disse que era justamente na área de tributação de cooperativas e temas relacionados à atividade rural em que Anceles mais atuava. Eis o que afirmou Barreto, segundo o inquérito: “Perguntado sobre em que áreas o servidor Pedro Anceles atuava (...), respondeu que em várias áreas, mas principalmente na área de cooperativismo e tributação de cooperativas e de atividade rural de pessoa física. Que o sr. Pedro Anceles também era muito consultado informalmente pela Cosit (Coordenação-Geral de Tributação) devido ao respeito profissional que possuía”. A Cosit, citada por Barreto, é o “cérebro” da Receita, por onde passam todas as mudanças na legislação fiscal do país.
Muitas das palestras que Anceles ministrava a empresas privadas ocorreram durante o horário de expediente na Receita. À Corregedoria, ele disse que não considerava suas ausências como falta ao serviço, pois, “embora informal, comunicava via telefone a sua compensação”. Na opinião da Corregedoria, essa “compensação” constituía apenas uma farsa, uma vez que Anceles não poderia assinar nenhum documento nas férias, período em que dizia trabalhar no lugar das faltas. A comunicação das ausências era, segundo o inquérito, feita a Barreto. Em seu depoimento em defesa de Anceles, Barreto disse saber “que (Anceles) ministrava palestras, algumas no interesse da administração” e afirmou que “se o sr. Pedro exercia estas atividades naquele período, não prejudicava as atividades de delegado”.
Um episódio revela como Barreto estava errado. Nessas atividades paralelas, Anceles foi, nas palavras da Corregedoria, “desleal” com a Receita. Ele recebeu R$ 20 mil da empresa CVI Refrigerantes Ltda. para comparecer ao evento “Serviço de análise e interpretação da legislação do PIS e da Cofins”, realizado em Santa Maria, nos sábados do mês de abril de 2007. Anceles não tinha autorização para participar do evento. Os slides de sua apresentação revelam que ele estava lá para “aclarar” e apresentar ao contribuinte os “atalhos” e as “ferramentas” para uma “melhor” estratégia de “cálculo dos tributos”. Tradução: para ensinar a pagar menos impostos. A função de um auditor fiscal é justamente a oposta: lutar contra a elisão fiscal, contra a sonegação – e garantir que os contribuintes recolham devidamente seus impostos. Por intermédio de sua assessoria, Barreto afirmou a ÉPOCA “que não sabia das atividades paralelas” de Anceles quando prestou seu depoimento à Corregedoria. “Não houve qualquer proteção ao ex-servidor”, disse. Ele afirmou ainda que “desconhece a eventual utilização inadequada de qualquer informação” do Fisco por Anceles.
Quando chefiava a Delegacia de Santa Maria, no período em que era subordinado direto de Barreto, Anceles viajou pelo menos dez vezes para Brasília para integrar grupos de trabalho encarregados de elaborar legislação tributária. Anceles participou da elaboração de dois projetos de lei enviados pela Presidência da República ao Congresso Nacional em 2008, que ainda estão em discussão na Casa e propõem, basicamente, isenção tributária a cooperativas. De acordo com o depoimento de Barreto, Anceles “atuava ajudando a Cosit na elaboração de atos normativos infralegais e de projetos de leis e medidas provisórias”.
ESPIONAGEM
O ex-auditor Pedro Anceles (no alto) e o secretário da Receita, Carlos Barreto.
Anceles foi elogiado por Barreto mesmo após a descoberta de várias ações
irregulares
(Foto: Abr e Carlos Silva/Esp. CB/D.A Press)
Outros dois auditores, também ouvidos pela Corregedoria a pedido de Anceles, foram além. O responsável por formular pareceres da Cosit, Nelson Pessuto, contou que trabalhou em duas ocasiões com Anceles em Brasília. Na primeira, na elaboração de uma Instrução Normativa que dispõe sobre cooperativas. No segundo caso, em 2008, num grupo de trabalho coordenado pelo próprio Barreto e, segundo Pessuto, criado a pedido do então presidente Lula para elaborar projetos de lei para a Casa Civil sobre tributação de cooperativas. Pessuto, de acordo com o inquérito, afirmou que “o grupo de trabalho, no qual o sr. Pedro (Anceles) era um integrante, foi convocado oficialmente pelo ministro Mantega para uma reunião sobre o assunto numa sala de reuniões anexa ao gabinete do ministro. Que o sr. Pedro foi designado para falar em nome da Fazenda, pois era pessoa altamente preparada sobre o assunto”. O outro depoente, o atual subsecretário de Tributação, Sandro de Vargas Serpa, disse que esse grupo passou a trabalhar para a Casa Civil e que o “sr. Pedro continuou colaborando nos trabalhos”. Naquele ano de 2008, a então ministra-chefe da Casa Civil era a hoje presidente Dilma Rousseff.
Procurada por ÉPOCA, a Presidência da República informou que funcionários “de todos os ministérios e de órgãos do governo participam, com frequência, de inúmeras reuniões temáticas de suas áreas com assessores da Casa Civil”. O Ministério da Fazenda afirmou que “é rotineira a participação de funcionários da Receita Federal em grupos de trabalho de nível técnico que envolvam discussões sobre tributação”. Em relação a Anceles, a Fazenda disse que “uma vez constatados e averiguados pela Receita problemas por parte do então servidor, o mesmo foi demitido, o que mostra que não houve qualquer conivência (do secretário Barreto)”. Barreto afirmou por meio de sua assessoria que é usual funcionários da Receita Federal participarem de reuniões de trabalho sobre matérias tributárias. “Tais reuniões teriam ocorrido antes de comprovadas as irregularidades que culminaram na demissão”, disse Barreto. Ele informou ainda que teria de “fazer um levantamento para saber quem convocou (Anceles para participar de reuniões em Brasília) e quem autorizou as despesas”. As reuniões mencionadas por Barreto podem ter ocorrido antes de comprovadas as irregularidades, mas as suspeitas de atividades subterrâneas já recaíam sobre Anceles desde 2007 e eram conhecidas pela cúpula do Fisco.
O Ministério Público Federal e a Polícia Federal no Rio Grande do Sul também mapeavam os passos de Anceles. Suas atividades paralelas vieram à tona quando a PF deflagrou, em novembro de 2007, a Operação Rodin, contra um esquema de desvio de R$ 44 milhões no Detran gaúcho. Ao fazer apreensões de documentos em empresas envolvidas no rombo, a PF descobriu numa delas um recibo de pagamento de R$ 40 mil de uma empresa de auditoria e consultoria tributária, a Rio Del Sur, para Anceles. A Rio Del Sur também tinha negócios na área de telefonia, tendo contratado os serviços de Anceles para prestar consultoria tributária no setor de telecomunicações. Anceles disse que devolveu os R$ 40 mil recebidos em abril de 2006 porque acabou não prestando o serviço. A devolução, no entanto, só ocorreu exatos dois anos depois de recebido o dinheiro e quatro meses após a operação da PF.
A Receita também participou da Operação Rodin e tinha informações detalhadas sobre os alvos da ação policial. Um contingente de 46 auditores e analistas do Fisco ajudaram 252 policiais nas buscas e apreensões de documentos e computadores. A partir da ação da PF, o Ministério Público Federal (MPF) passou a acompanhar as andanças de Anceles pelo mundo da consultoria privada. O trabalho da Corregedoria da Receita começou a partir de uma denúncia encaminhada pela Controladoria-Geral da União. As duas frentes correram em paralelo até os procuradores da República tomarem um susto com a decisão inicial da Corregedoria do Fisco sobre o caso. Mesmo diante das evidências das irregularidades cometidas por Anceles, a comissão de inquérito da Corregedoria propôs, num primeiro momento, apenas uma suspensão de 90 dias como punição. Em correspondência sigilosa enviada à Corregedoria em agosto do ano passado, os procuradores da República em Santa Maria afirmaram que o caso era de demissão sumária. “O servidor se ausentava habitualmente durante o horário de expediente, sem autorização e sem sofrer desconto em sua remuneração, o que demonstra prejuízo ao serviço público e à administração”, disse a Procuradoria. Tal afirmação contradiz a versão de Barreto de que o trabalho paralelo de Anceles não afetava seu desempenho.
Com base nessa correspondência e no trabalho da Corregedoria, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional elaborou um parecer propondo ao ministro Mantega que demitisse Anceles. Em novembro passado, Mantega assinou portaria com a exclusão de Anceles dos quadros do Fisco. Anceles entrou com uma ação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para anular sua demissão. O STJ negou o pedido de liminar duas semanas atrás, mas o julgamento continua. O advogado Maurizio Colomba afirmou que Anceles não cometeu falhas ou ilegalidades, como tráfico de influência ou repassar a contribuintes informações sigilosas. Segundo Colomba, o MPF interveio indevidamente na investigação da Corregedoria, ao pedir a demissão de Anceles, sem ter competência para isso.
Numa das páginas do trabalho da Corregedoria, os membros da comissão de inquérito chamam Anceles de “anfíbio”, termo usado para designar auditores fiscais que ora trabalham para o Fisco, ora defendem interesses da iniciativa privada contra a Receita. Anfíbio ou agente duplo como Philby, Ames ou Hanssen, Anceles acabou desmascarado e caiu em desgraça. Pena que a descoberta de casos como esses continue rara.
Os tentáculos do auditor espião
Então delegado de julgamento e auditor da Receita Federal, Pedro Anceles tinha acesso a informações sigilosas e serviu ao mesmo tempo ao público e ao privado entre 2006 e 2008. Ele ajudava na formulação de políticas tributárias e assessorava empresários
26 de março de 2012
LEONARDO SOUZA E HUDSON CORRÊA
Revista Época
Como auditor da Receita, Pedro Anceles participou de projetos na Fazenda e na Casa Civil. Ao mesmo tempo, ele prestava assessoria a empresas.
Na história da espionagem são raros os episódios em que um agente duplo é flagrado em plena atividade e sua identidade é revelada ao público. São tão raros que seus nomes ficam conhecidos. É o caso do britânico Kim Philby, que fugiu para Moscou em 1963, depois de anos passando informações secretas à União Soviética. Ou de Aldrich Ames, o analista da CIA (a Agência Central de Inteligência americana) condenado em 1994, também por espionar para soviéticos, depois para os russos. Em tempos recentes, o exemplo mais chocante foi Robert Hanssen, o ex-funcionário do FBI (a polícia federal americana) que, durante 22 anos, passou informações confidenciais à União Soviética e à Rússia.
No Brasil, qualquer comparação com Philby, Ames ou Hanssen seria um exagero. Mas também é possível encontrar agentes duplos no Estado brasileiro. A atuação desses “espiões” costuma ser de outra natureza. Eles vendem informações estratégicas de órgãos públicos ou usam sua influência em benefício da iniciativa privada – e, com isso, fazem dinheiro. Duas semanas atrás, ÉPOCA revelou um desses casos. Trata-se do ex-auditor fiscal Pedro dos Santos Anceles, defenestrado em novembro passado pelo ministro Guido Mantega, da Fazenda, por improbidade administrativa. Foram várias as irregularidades cometidas por Anceles e descobertas pela Corregedoria da Receita Federal. Entre outras práticas, ele faltava ao trabalho para prestar consultoria à iniciativa privada e simulava palestras para repassar a seus clientes conhecimentos que deveriam ficar restritos ao Fisco. De acordo com novos documentos obtidos por ÉPOCA, Anceles não agiu somente no Fisco. Sua atuação se estendeu pela Casa Civil, da então ministra Dilma Rousseff, pelo gabinete do ministro Mantega e até por um grupo de trabalho criado por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Anceles participou da elaboração de diversas medidas provisórias e projetos de lei, além de normas fiscais. As novas revelações fazem parte do inquérito em que a Corregedoria da Receita investigou o caso de Anceles, a que ÉPOCA teve acesso com exclusividade. De acordo com os documentos, Anceles teve liberdade para atuar, no período em que estava na esfera de comando do atual secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto.
A principal testemunha de defesa de Anceles na investigação foi ninguém menos que o próprio Barreto, de quem Anceles se disse “amigo” próximo e que ele classificou como “uma pessoa bem acessível”. Quando Anceles praticou a maior parte das irregularidades, entre 2006 e 2008, Barreto era seu superior hierárquico direto, como secretário adjunto da Receita. Quando prestou depoimento, em março de 2010, Barreto presidia o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão do Ministério da Fazenda. Ele voltou ao Fisco em janeiro de 2011, no posto máximo do órgão.
No depoimento que prestou à Corregedoria, Barreto usou diversas expressões elogiosas para defender Anceles perante os investigadores. “A postura profissional e ética do sr. Pedro, enquanto funcionário e colaborador, tinha alto reconhecimento dentro da organização da Receita Federal”, afirmou Barreto. Entre 2003 e 2008, Anceles estava lotado na Delegacia de Julgamento da Receita em Santa Maria, Rio Grande do Sul. À comissão de inquérito, Barreto disse que, durante o período em que supervisionou as Delegacias de Julgamento, de 2002 a 2008, “diria que a DRJ de Santa Maria (comandada por Anceles) sempre foi muito produtiva e atuante, sendo os julgamentos lá realizados de alta qualidade”.
O depoimento de Barreto não traz apenas louvores a seu antigo subordinado. Ele põe em dúvida algumas afirmações do próprio Barreto sobre o caso Anceles. Na edição 720, do último dia 5, ÉPOCA revelou que Anceles operou dentro do Fisco para influenciar na redação de uma medida provisória que mudou a tributação sobre o café, beneficiando, entre outros grupos, cooperativas do setor. Barreto negou que Anceles tivesse participado das discussões sobre a MP. À Corregedoria, porém, ele disse que era justamente na área de tributação de cooperativas e temas relacionados à atividade rural em que Anceles mais atuava. Eis o que afirmou Barreto, segundo o inquérito: “Perguntado sobre em que áreas o servidor Pedro Anceles atuava (...), respondeu que em várias áreas, mas principalmente na área de cooperativismo e tributação de cooperativas e de atividade rural de pessoa física. Que o sr. Pedro Anceles também era muito consultado informalmente pela Cosit (Coordenação-Geral de Tributação) devido ao respeito profissional que possuía”. A Cosit, citada por Barreto, é o “cérebro” da Receita, por onde passam todas as mudanças na legislação fiscal do país.
Muitas das palestras que Anceles ministrava a empresas privadas ocorreram durante o horário de expediente na Receita. À Corregedoria, ele disse que não considerava suas ausências como falta ao serviço, pois, “embora informal, comunicava via telefone a sua compensação”. Na opinião da Corregedoria, essa “compensação” constituía apenas uma farsa, uma vez que Anceles não poderia assinar nenhum documento nas férias, período em que dizia trabalhar no lugar das faltas. A comunicação das ausências era, segundo o inquérito, feita a Barreto. Em seu depoimento em defesa de Anceles, Barreto disse saber “que (Anceles) ministrava palestras, algumas no interesse da administração” e afirmou que “se o sr. Pedro exercia estas atividades naquele período, não prejudicava as atividades de delegado”.
Um episódio revela como Barreto estava errado. Nessas atividades paralelas, Anceles foi, nas palavras da Corregedoria, “desleal” com a Receita. Ele recebeu R$ 20 mil da empresa CVI Refrigerantes Ltda. para comparecer ao evento “Serviço de análise e interpretação da legislação do PIS e da Cofins”, realizado em Santa Maria, nos sábados do mês de abril de 2007. Anceles não tinha autorização para participar do evento. Os slides de sua apresentação revelam que ele estava lá para “aclarar” e apresentar ao contribuinte os “atalhos” e as “ferramentas” para uma “melhor” estratégia de “cálculo dos tributos”. Tradução: para ensinar a pagar menos impostos. A função de um auditor fiscal é justamente a oposta: lutar contra a elisão fiscal, contra a sonegação – e garantir que os contribuintes recolham devidamente seus impostos. Por intermédio de sua assessoria, Barreto afirmou a ÉPOCA “que não sabia das atividades paralelas” de Anceles quando prestou seu depoimento à Corregedoria. “Não houve qualquer proteção ao ex-servidor”, disse. Ele afirmou ainda que “desconhece a eventual utilização inadequada de qualquer informação” do Fisco por Anceles.
Quando chefiava a Delegacia de Santa Maria, no período em que era subordinado direto de Barreto, Anceles viajou pelo menos dez vezes para Brasília para integrar grupos de trabalho encarregados de elaborar legislação tributária. Anceles participou da elaboração de dois projetos de lei enviados pela Presidência da República ao Congresso Nacional em 2008, que ainda estão em discussão na Casa e propõem, basicamente, isenção tributária a cooperativas. De acordo com o depoimento de Barreto, Anceles “atuava ajudando a Cosit na elaboração de atos normativos infralegais e de projetos de leis e medidas provisórias”.
ESPIONAGEM
O ex-auditor Pedro Anceles (no alto) e o secretário da Receita, Carlos Barreto.
Anceles foi elogiado por Barreto mesmo após a descoberta de várias ações
irregulares
(Foto: Abr e Carlos Silva/Esp. CB/D.A Press)
Outros dois auditores, também ouvidos pela Corregedoria a pedido de Anceles, foram além. O responsável por formular pareceres da Cosit, Nelson Pessuto, contou que trabalhou em duas ocasiões com Anceles em Brasília. Na primeira, na elaboração de uma Instrução Normativa que dispõe sobre cooperativas. No segundo caso, em 2008, num grupo de trabalho coordenado pelo próprio Barreto e, segundo Pessuto, criado a pedido do então presidente Lula para elaborar projetos de lei para a Casa Civil sobre tributação de cooperativas. Pessuto, de acordo com o inquérito, afirmou que “o grupo de trabalho, no qual o sr. Pedro (Anceles) era um integrante, foi convocado oficialmente pelo ministro Mantega para uma reunião sobre o assunto numa sala de reuniões anexa ao gabinete do ministro. Que o sr. Pedro foi designado para falar em nome da Fazenda, pois era pessoa altamente preparada sobre o assunto”. O outro depoente, o atual subsecretário de Tributação, Sandro de Vargas Serpa, disse que esse grupo passou a trabalhar para a Casa Civil e que o “sr. Pedro continuou colaborando nos trabalhos”. Naquele ano de 2008, a então ministra-chefe da Casa Civil era a hoje presidente Dilma Rousseff.
Procurada por ÉPOCA, a Presidência da República informou que funcionários “de todos os ministérios e de órgãos do governo participam, com frequência, de inúmeras reuniões temáticas de suas áreas com assessores da Casa Civil”. O Ministério da Fazenda afirmou que “é rotineira a participação de funcionários da Receita Federal em grupos de trabalho de nível técnico que envolvam discussões sobre tributação”. Em relação a Anceles, a Fazenda disse que “uma vez constatados e averiguados pela Receita problemas por parte do então servidor, o mesmo foi demitido, o que mostra que não houve qualquer conivência (do secretário Barreto)”. Barreto afirmou por meio de sua assessoria que é usual funcionários da Receita Federal participarem de reuniões de trabalho sobre matérias tributárias. “Tais reuniões teriam ocorrido antes de comprovadas as irregularidades que culminaram na demissão”, disse Barreto. Ele informou ainda que teria de “fazer um levantamento para saber quem convocou (Anceles para participar de reuniões em Brasília) e quem autorizou as despesas”. As reuniões mencionadas por Barreto podem ter ocorrido antes de comprovadas as irregularidades, mas as suspeitas de atividades subterrâneas já recaíam sobre Anceles desde 2007 e eram conhecidas pela cúpula do Fisco.
O Ministério Público Federal e a Polícia Federal no Rio Grande do Sul também mapeavam os passos de Anceles. Suas atividades paralelas vieram à tona quando a PF deflagrou, em novembro de 2007, a Operação Rodin, contra um esquema de desvio de R$ 44 milhões no Detran gaúcho. Ao fazer apreensões de documentos em empresas envolvidas no rombo, a PF descobriu numa delas um recibo de pagamento de R$ 40 mil de uma empresa de auditoria e consultoria tributária, a Rio Del Sur, para Anceles. A Rio Del Sur também tinha negócios na área de telefonia, tendo contratado os serviços de Anceles para prestar consultoria tributária no setor de telecomunicações. Anceles disse que devolveu os R$ 40 mil recebidos em abril de 2006 porque acabou não prestando o serviço. A devolução, no entanto, só ocorreu exatos dois anos depois de recebido o dinheiro e quatro meses após a operação da PF.
A Receita também participou da Operação Rodin e tinha informações detalhadas sobre os alvos da ação policial. Um contingente de 46 auditores e analistas do Fisco ajudaram 252 policiais nas buscas e apreensões de documentos e computadores. A partir da ação da PF, o Ministério Público Federal (MPF) passou a acompanhar as andanças de Anceles pelo mundo da consultoria privada. O trabalho da Corregedoria da Receita começou a partir de uma denúncia encaminhada pela Controladoria-Geral da União. As duas frentes correram em paralelo até os procuradores da República tomarem um susto com a decisão inicial da Corregedoria do Fisco sobre o caso. Mesmo diante das evidências das irregularidades cometidas por Anceles, a comissão de inquérito da Corregedoria propôs, num primeiro momento, apenas uma suspensão de 90 dias como punição. Em correspondência sigilosa enviada à Corregedoria em agosto do ano passado, os procuradores da República em Santa Maria afirmaram que o caso era de demissão sumária. “O servidor se ausentava habitualmente durante o horário de expediente, sem autorização e sem sofrer desconto em sua remuneração, o que demonstra prejuízo ao serviço público e à administração”, disse a Procuradoria. Tal afirmação contradiz a versão de Barreto de que o trabalho paralelo de Anceles não afetava seu desempenho.
Com base nessa correspondência e no trabalho da Corregedoria, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional elaborou um parecer propondo ao ministro Mantega que demitisse Anceles. Em novembro passado, Mantega assinou portaria com a exclusão de Anceles dos quadros do Fisco. Anceles entrou com uma ação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para anular sua demissão. O STJ negou o pedido de liminar duas semanas atrás, mas o julgamento continua. O advogado Maurizio Colomba afirmou que Anceles não cometeu falhas ou ilegalidades, como tráfico de influência ou repassar a contribuintes informações sigilosas. Segundo Colomba, o MPF interveio indevidamente na investigação da Corregedoria, ao pedir a demissão de Anceles, sem ter competência para isso.
Numa das páginas do trabalho da Corregedoria, os membros da comissão de inquérito chamam Anceles de “anfíbio”, termo usado para designar auditores fiscais que ora trabalham para o Fisco, ora defendem interesses da iniciativa privada contra a Receita. Anfíbio ou agente duplo como Philby, Ames ou Hanssen, Anceles acabou desmascarado e caiu em desgraça. Pena que a descoberta de casos como esses continue rara.
Os tentáculos do auditor espião
Então delegado de julgamento e auditor da Receita Federal, Pedro Anceles tinha acesso a informações sigilosas e serviu ao mesmo tempo ao público e ao privado entre 2006 e 2008. Ele ajudava na formulação de políticas tributárias e assessorava empresários
26 de março de 2012
LEONARDO SOUZA E HUDSON CORRÊA
Revista Época
KROKODIL: A MANIFESTAÇÃO FÍSICA DO MAL E SEUS ANTECEDENTES - PARTE 2
Artigos - Cultura
As políticas de “redução de danos”, cujo objetivo é orientar o usuário para o “uso responsável de drogas”, é amplamente defendida pelas Nações Unidas ao mesmo tempo em que o órgão luta para combater a intolerância religiosa forçando a legitimidade de seitas e cultos alternativos.
Mais tarde, Austin Osman Spare, discípulo de Crowley, ficou conhecido por seus escritos esotéricos nos quais prescrevia rituais da chamada magia sexual. O sexo, segundo Spare, concentra imensa força energética justamente por representar os instintos mais primitivos de busca pelo prazer. Tanto que Spare e seu mestre utilizavam as drogas como meios de alcançar estes supostos estágios superiores de consciência, e defendiam o uso de substâncias para vários tipos de tratamento psíquico e cura espiritual.
Segundo Spare,
“para se poder apreciar adequadamente a idéia da Nova Sexualidade, é necessário que a mente se dissolva no Kia e que não haja stress na consciência (i.e., pensamento), pois os pensamentos modificam a consciência e criam a ilusão absurda de que o indivíduo ‘possui’ a consciência”. [1]
A partir da década de 1960, o psicólogo Timothy Leary ficou famoso por afirmar os benefícios espirituais e terapêuticos do LSD, considerando a droga psicotrópica como um elemento essencial para o progresso humano. Mesmo após sua expulsão de Harvard, depois de fazer experimentos de drogas com uma turma de jovens, Leary se tornou um dos mais influentes intelectuais do século, um verdadeiro ícone da contracultura. Leary era membro do Esalen Institute, o maior difusor dos movimentos Nova Era no mundo. Era também ligado à KGB e se dizia um continuador de Crowley.
Leary criou oito categorias para as drogas, os chamados “Oito Circuitos de Consciência”, nos quais as drogas variavam conforme o nível de afinidade cognitiva ou social sobre o qual ela agia. Trata-se de “graus evolutivos” que se dirigem a uma superioridade conforme avança-se os circuitos. O ópio e seus derivados, por exemplo, pertencem ao primeiro circuito, o chamado “sopro de consciência”. A maconha fica no circuito cinco e o chá do Santo Daime (ayahuasca) está no nível mais alto (oito) de “transcendência”, depois do LSD (nível sete).
No livro A experiência psicodélica: manual baseado no livro tibetano dos mortos (1964), Leary destaca a importância de drogas como o LSD como chave de abertura da consciência, comparando seus efeitos com as proezas psíquicas das antigas religiões tibetanas. Junto a escritores como Fritjof Capra e outros contemporâneos, Leary defendia a adoção da psicologia oriental para a transformação e experimentação da consciência afim de ultrapassar novas fronteiras. O objetivo das experiências com LSD era a perda do ego, coisa necessária para alcançar a verdadeira transcendência.
“As reações físicas devem ser reconhecidas como sinais indicativos da transcendência. Evite tratá-las como sintomas de doença, aceite-as, una-se a elas, aproveite-as [...]. O flashback do ego-jogo é acompanhado por uma preocupação com a identidade. ‘Quem sou eu agora? Estou morto (a) ou não-morto (a)? O que está a acontecer?’ Você não consegue determinar. Vê o que o cerca e a seus como costumava fazer antes. Há uma sensitividade penetrante. Mas você está em outro nível. A compreensão do seu ego não é mais tão segura quanto antes”. [2]
Leary morreu em 1996. O livro A experiência psicodélica... foi escrito juntamente com os colegas de Harvard, Ralph Metzner e Richard Alpert. Metzer é hoje co-fundador e presidente da Green Earth Foundation, organização não governamental de fomento da educação e integração do homem com a natureza. É professor emérito da California Institute of Integral Studies e, junto de outros 10 pesquisadores, produziu um documentário Entheogen: o despertar do interior divino (2006) sobre o redescobrimento da magia e do xamanismo no mundo moderno unido-os a ideais ecológicos, outra agenda inspirada pelo esoterismo[1] neo-pagão.
Todos os grupos gnósticos trabalham com a idéia da busca pessoal pela transcendência, algo recorrente em todas as religiões. Ocorre que no espaço esotérico, especialmente nos que caracterizam a chamada Loja Negra ou Caminho da Mão Esquerda, esta busca se faz por meio de instrumentos exteriores ao homem, o que pode ser tanto a chamada magia sexual de Spare, como pelo uso de drogas psicotrópicas e alucinantes como mecanismos de elevação da consciência. Uma parte significativa destas pseudo-doutrinas esotéricas de loja negra ganhou o mundo da cultura ocidental em suas formas exotéricas e deu origem à cultura da Nova Era.
Dentre estes elementos exteriores que servem de instrumentos à elevação da alma, está, logicamente, o corpo. O papa Bento XVI sinalizou na encíclica Deus Caritas Est à questão do dito materialismo moderno e a sua adoração ao corpo, a evidente erotização no âmbito da cultura. Ao descrever o entendimento da palavra amor, delimitando entre as suas duas acepções, Eros e Ágape nas culturas gregas pagãs, aponta que a divinização do sexo ou o materialismo que atribuímos ao mundo de hoje, não se tratam tanto de uma idolatria do corpo ou à matéria, mas do rebaixamento do corpo ao papel de mero instrumento, do qual se fará uso na busca do prazer e até de uma transcendência. O erotismo atual “para o homem, não constitui propriamente uma grande afirmação do seu corpo. Pelo contrário, agora considera o corpo e a sexualidade como a parte meramente material de si mesmo a usar e explorar com proveito”. Neste caso, tudo vale para o prazer da transcendência, já que o corpo é uma parte inferior e rudimentar do homem, tal como todas as implicações do uso da matéria. Trata-se de uma sugestão muito cabível: a de que as drogas e o erotismo dos dias atuais não têm, como muitos pensam, relação com o materialismo e sim com especulações místicas anti-materialistas.
Ahmed Youssef, muçulmano brasileiro que vive hoje na China, diz que a partir da experiência mística faz-se a confusão, quando o indivíduo confunde Deus com ele mesmo. E as drogas reafirmam o mérito do indivíduo, já que a “experiência mística” passa a ser controlada por ele. Guenon reafirma a confusão quando trata do espiritismo, ao afirmar que muitas das manifestações de cunho místico são reais, mas representam um relacionamento com resíduos psíquicos inerentes à corporalidade e não à espiritualidade como é interpretada (metenpsicosis). Crowley dava grande importância a estes “resíduos” e os considerava “criaturas geradas artificialmente”, e então cita os estudos de Paracelso. A criação de organismos já existentes em planos sutís, como Crowley descreve, representava para ele o grande relacionamento com a Serpente.
O controverso psicólogo da contracultura Timothy Leary, seguidor de Aleister Crowley (e aí temos uma amostra de cumplicidade mais do que evidente), exerce ainda uma influência notória sobre toda a cúpula do globalismo tecnocrata ocidental. Seria um exagero afirmarmos que parte dos intelectuais dirigentes das Nações Unidas está envolvida em planos que foram iniciados por Crowley, a “Grande Besta”? Crowley, Spare e Leary (só para citar estes poucos autores), tiveram conhecidos adeptos no meio artístico, sabe-se. Fica a pergunta: e onde mais? O fato é que muitos de seus seguidores estão hoje engajados na causa ambiental ou em seitas de grande poder político e continuam a defender o uso de drogas para encontrar um tipo de transcendência mística. As políticas de “redução de danos”, cujo objetivo é orientar o usuário para o “uso responsável de drogas”, é amplamente defendida pelas Nações Unidas ao mesmo tempo em que o órgão luta para combater a intolerância religiosa forçando a legitimidade de seitas e cultos alternativos, em detrimento das grandes religiões vistas como intolerantes e fundamentalistas (como denuncia o livro False Dawn, de Lee Penn, ainda sem tradução para o português).
Drogas de uso declaradamente místico como a Ayhauasca (Santo Daime) são liberados no Brasil enquanto proibidas na maioria dos países do mundo. Tendo em vista o crescimento do comércio de drogas no país, motivado por conluios com o governo brasileiro, vemos aí bons elementos para crer que os fundamentos satanistas de Crowley foram motivadores de um movimento que conta hoje com todos os instrumentos disponíveis para crescer.
Não há dúvidas de que desde o sonho de Coleridge, até as teorizações de Leary, há um elemento e uma sequência de sugestões que provém não só de pessoas altamente temíveis, mas necessariamente de manifestações malignas objetivas legadas por meios subjetivos e utilizando-se de fraquezas humanas como o hedonismo na busca do prazer, inflando-as e por meio de um suporte teórico bastante sofisticado. Nenhuma fraqueza humana (desejamos acreditar) teria o poder de teorizar-se em um sistema que multiplicasse o desejo tão agudo do próprio mal ao ponto do resultado que vemos nas imagens dos efeitos do krokodil e tantas outras. Se em Fátima foi dito que a Rússia espalharia seus erros pelo mundo, talvez não se estivesse referindo somente ao comunismo que matou 100 milhões de pessoas no século XX, mas também a este terrível aspecto da morte que vemos nas imagens e que traz em sua essência a própria manifestação física do mal.
Observem que Crowley, ao intitular-se a Grande Besta, iniciava um processo de destruição do homem mediante o hedonismo. Leary, por sua vez, ao prometer uma elevação da consciência, também pregava o fim do ego e a negação da própria consciência. Do mesmo modo, prometendo o prazer e o sentir-se vivo, as drogas terminam destruindo o corpo. Por fim, é fácil perceber que as vítimas dessa droga assemelham-se a cadáveres. Certamente eles já invejam os mortos, mas foram terrivelmente enganados pela morte.
Nota:
[1] Esoterismo (com “s”): trata-se de práticas místicas de cunho iniciático, ou seja, que demanda cerimônia de iniciação e segredo ou ocultismo. Já o termo 'exoterismo' é o conjunto de práticas místicas difundidas abertamente a todos (ex – para fora), uma simplificação do esoterismo.
Referências:
http://www.unadfi.org/
A postura da morte e a nova sexualidade – Austin Osman Spare
O livro do prazer – Austin Osman Spare
Renascer da Magia – Kenneth Grant
A experiência psicodélica: manual baseado no livro tibetano dos mortos – Timothy Leary, RalphMetzner, Richard Alpert.
The Diary of a Drug Fiend – A. Crowley
Como vencer a guerra cultural – Peter Kreeft
False Dawn – Lee Penn
O Erro Espírita - René Guenon
Leia também a primeira parte do artigo: Krokodil: a manifestação física do mal e seus antecedentes – Parte 1
26 de março de 2012
Cristian Derosa é jornalista.
As políticas de “redução de danos”, cujo objetivo é orientar o usuário para o “uso responsável de drogas”, é amplamente defendida pelas Nações Unidas ao mesmo tempo em que o órgão luta para combater a intolerância religiosa forçando a legitimidade de seitas e cultos alternativos.
Mais tarde, Austin Osman Spare, discípulo de Crowley, ficou conhecido por seus escritos esotéricos nos quais prescrevia rituais da chamada magia sexual. O sexo, segundo Spare, concentra imensa força energética justamente por representar os instintos mais primitivos de busca pelo prazer. Tanto que Spare e seu mestre utilizavam as drogas como meios de alcançar estes supostos estágios superiores de consciência, e defendiam o uso de substâncias para vários tipos de tratamento psíquico e cura espiritual.
Segundo Spare,
“para se poder apreciar adequadamente a idéia da Nova Sexualidade, é necessário que a mente se dissolva no Kia e que não haja stress na consciência (i.e., pensamento), pois os pensamentos modificam a consciência e criam a ilusão absurda de que o indivíduo ‘possui’ a consciência”. [1]
A partir da década de 1960, o psicólogo Timothy Leary ficou famoso por afirmar os benefícios espirituais e terapêuticos do LSD, considerando a droga psicotrópica como um elemento essencial para o progresso humano. Mesmo após sua expulsão de Harvard, depois de fazer experimentos de drogas com uma turma de jovens, Leary se tornou um dos mais influentes intelectuais do século, um verdadeiro ícone da contracultura. Leary era membro do Esalen Institute, o maior difusor dos movimentos Nova Era no mundo. Era também ligado à KGB e se dizia um continuador de Crowley.
Leary criou oito categorias para as drogas, os chamados “Oito Circuitos de Consciência”, nos quais as drogas variavam conforme o nível de afinidade cognitiva ou social sobre o qual ela agia. Trata-se de “graus evolutivos” que se dirigem a uma superioridade conforme avança-se os circuitos. O ópio e seus derivados, por exemplo, pertencem ao primeiro circuito, o chamado “sopro de consciência”. A maconha fica no circuito cinco e o chá do Santo Daime (ayahuasca) está no nível mais alto (oito) de “transcendência”, depois do LSD (nível sete).
No livro A experiência psicodélica: manual baseado no livro tibetano dos mortos (1964), Leary destaca a importância de drogas como o LSD como chave de abertura da consciência, comparando seus efeitos com as proezas psíquicas das antigas religiões tibetanas. Junto a escritores como Fritjof Capra e outros contemporâneos, Leary defendia a adoção da psicologia oriental para a transformação e experimentação da consciência afim de ultrapassar novas fronteiras. O objetivo das experiências com LSD era a perda do ego, coisa necessária para alcançar a verdadeira transcendência.
“As reações físicas devem ser reconhecidas como sinais indicativos da transcendência. Evite tratá-las como sintomas de doença, aceite-as, una-se a elas, aproveite-as [...]. O flashback do ego-jogo é acompanhado por uma preocupação com a identidade. ‘Quem sou eu agora? Estou morto (a) ou não-morto (a)? O que está a acontecer?’ Você não consegue determinar. Vê o que o cerca e a seus como costumava fazer antes. Há uma sensitividade penetrante. Mas você está em outro nível. A compreensão do seu ego não é mais tão segura quanto antes”. [2]
Leary morreu em 1996. O livro A experiência psicodélica... foi escrito juntamente com os colegas de Harvard, Ralph Metzner e Richard Alpert. Metzer é hoje co-fundador e presidente da Green Earth Foundation, organização não governamental de fomento da educação e integração do homem com a natureza. É professor emérito da California Institute of Integral Studies e, junto de outros 10 pesquisadores, produziu um documentário Entheogen: o despertar do interior divino (2006) sobre o redescobrimento da magia e do xamanismo no mundo moderno unido-os a ideais ecológicos, outra agenda inspirada pelo esoterismo[1] neo-pagão.
Todos os grupos gnósticos trabalham com a idéia da busca pessoal pela transcendência, algo recorrente em todas as religiões. Ocorre que no espaço esotérico, especialmente nos que caracterizam a chamada Loja Negra ou Caminho da Mão Esquerda, esta busca se faz por meio de instrumentos exteriores ao homem, o que pode ser tanto a chamada magia sexual de Spare, como pelo uso de drogas psicotrópicas e alucinantes como mecanismos de elevação da consciência. Uma parte significativa destas pseudo-doutrinas esotéricas de loja negra ganhou o mundo da cultura ocidental em suas formas exotéricas e deu origem à cultura da Nova Era.
Dentre estes elementos exteriores que servem de instrumentos à elevação da alma, está, logicamente, o corpo. O papa Bento XVI sinalizou na encíclica Deus Caritas Est à questão do dito materialismo moderno e a sua adoração ao corpo, a evidente erotização no âmbito da cultura. Ao descrever o entendimento da palavra amor, delimitando entre as suas duas acepções, Eros e Ágape nas culturas gregas pagãs, aponta que a divinização do sexo ou o materialismo que atribuímos ao mundo de hoje, não se tratam tanto de uma idolatria do corpo ou à matéria, mas do rebaixamento do corpo ao papel de mero instrumento, do qual se fará uso na busca do prazer e até de uma transcendência. O erotismo atual “para o homem, não constitui propriamente uma grande afirmação do seu corpo. Pelo contrário, agora considera o corpo e a sexualidade como a parte meramente material de si mesmo a usar e explorar com proveito”. Neste caso, tudo vale para o prazer da transcendência, já que o corpo é uma parte inferior e rudimentar do homem, tal como todas as implicações do uso da matéria. Trata-se de uma sugestão muito cabível: a de que as drogas e o erotismo dos dias atuais não têm, como muitos pensam, relação com o materialismo e sim com especulações místicas anti-materialistas.
Ahmed Youssef, muçulmano brasileiro que vive hoje na China, diz que a partir da experiência mística faz-se a confusão, quando o indivíduo confunde Deus com ele mesmo. E as drogas reafirmam o mérito do indivíduo, já que a “experiência mística” passa a ser controlada por ele. Guenon reafirma a confusão quando trata do espiritismo, ao afirmar que muitas das manifestações de cunho místico são reais, mas representam um relacionamento com resíduos psíquicos inerentes à corporalidade e não à espiritualidade como é interpretada (metenpsicosis). Crowley dava grande importância a estes “resíduos” e os considerava “criaturas geradas artificialmente”, e então cita os estudos de Paracelso. A criação de organismos já existentes em planos sutís, como Crowley descreve, representava para ele o grande relacionamento com a Serpente.
O controverso psicólogo da contracultura Timothy Leary, seguidor de Aleister Crowley (e aí temos uma amostra de cumplicidade mais do que evidente), exerce ainda uma influência notória sobre toda a cúpula do globalismo tecnocrata ocidental. Seria um exagero afirmarmos que parte dos intelectuais dirigentes das Nações Unidas está envolvida em planos que foram iniciados por Crowley, a “Grande Besta”? Crowley, Spare e Leary (só para citar estes poucos autores), tiveram conhecidos adeptos no meio artístico, sabe-se. Fica a pergunta: e onde mais? O fato é que muitos de seus seguidores estão hoje engajados na causa ambiental ou em seitas de grande poder político e continuam a defender o uso de drogas para encontrar um tipo de transcendência mística. As políticas de “redução de danos”, cujo objetivo é orientar o usuário para o “uso responsável de drogas”, é amplamente defendida pelas Nações Unidas ao mesmo tempo em que o órgão luta para combater a intolerância religiosa forçando a legitimidade de seitas e cultos alternativos, em detrimento das grandes religiões vistas como intolerantes e fundamentalistas (como denuncia o livro False Dawn, de Lee Penn, ainda sem tradução para o português).
Drogas de uso declaradamente místico como a Ayhauasca (Santo Daime) são liberados no Brasil enquanto proibidas na maioria dos países do mundo. Tendo em vista o crescimento do comércio de drogas no país, motivado por conluios com o governo brasileiro, vemos aí bons elementos para crer que os fundamentos satanistas de Crowley foram motivadores de um movimento que conta hoje com todos os instrumentos disponíveis para crescer.
Não há dúvidas de que desde o sonho de Coleridge, até as teorizações de Leary, há um elemento e uma sequência de sugestões que provém não só de pessoas altamente temíveis, mas necessariamente de manifestações malignas objetivas legadas por meios subjetivos e utilizando-se de fraquezas humanas como o hedonismo na busca do prazer, inflando-as e por meio de um suporte teórico bastante sofisticado. Nenhuma fraqueza humana (desejamos acreditar) teria o poder de teorizar-se em um sistema que multiplicasse o desejo tão agudo do próprio mal ao ponto do resultado que vemos nas imagens dos efeitos do krokodil e tantas outras. Se em Fátima foi dito que a Rússia espalharia seus erros pelo mundo, talvez não se estivesse referindo somente ao comunismo que matou 100 milhões de pessoas no século XX, mas também a este terrível aspecto da morte que vemos nas imagens e que traz em sua essência a própria manifestação física do mal.
Observem que Crowley, ao intitular-se a Grande Besta, iniciava um processo de destruição do homem mediante o hedonismo. Leary, por sua vez, ao prometer uma elevação da consciência, também pregava o fim do ego e a negação da própria consciência. Do mesmo modo, prometendo o prazer e o sentir-se vivo, as drogas terminam destruindo o corpo. Por fim, é fácil perceber que as vítimas dessa droga assemelham-se a cadáveres. Certamente eles já invejam os mortos, mas foram terrivelmente enganados pela morte.
Nota:
[1] Esoterismo (com “s”): trata-se de práticas místicas de cunho iniciático, ou seja, que demanda cerimônia de iniciação e segredo ou ocultismo. Já o termo 'exoterismo' é o conjunto de práticas místicas difundidas abertamente a todos (ex – para fora), uma simplificação do esoterismo.
Referências:
http://www.unadfi.org/
A postura da morte e a nova sexualidade – Austin Osman Spare
O livro do prazer – Austin Osman Spare
Renascer da Magia – Kenneth Grant
A experiência psicodélica: manual baseado no livro tibetano dos mortos – Timothy Leary, RalphMetzner, Richard Alpert.
The Diary of a Drug Fiend – A. Crowley
Como vencer a guerra cultural – Peter Kreeft
False Dawn – Lee Penn
O Erro Espírita - René Guenon
Leia também a primeira parte do artigo: Krokodil: a manifestação física do mal e seus antecedentes – Parte 1
26 de março de 2012
Cristian Derosa é jornalista.
ESSE LEÃO É DE MORTE! MESMO EXTINTA, CPMF RENDE R$ 1,7 BILHÃO AO GOVERNO
Mais de quatro anos após a decisão do Congresso Nacional de acabar com a CPMF - o famoso imposto do cheque - o governo continua reforçando seu caixa com este tributo.
Dados da Receita Federal mostram que, desde janeiro de 2008, quando a contribuição deixou de ser cobrada, a arrecadação federal conta praticamente todos os meses com recursos da CPMF, cobrada de empresas ou pessoas físicas.
Dessa forma, a equipe econômica já conseguiu reforçar o caixa do Tesouro com nada menos que R$1,750 bilhão entre janeiro de 2008 e fevereiro de 2012.
Esse valor é suficiente, por exemplo, para o governo arcar com um ano da desoneração da folha de pagamento dos setores que já foram beneficiados pela medida (confecções, calçados, software e call centers), cujo custo estimado é de R$1,5 bilhão por ano.
A arrecadação residual da CPMF equivale, em outro exemplo, ao que o governo deixará de arrecadar com a redução do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 3% para 2,5% para o crédito das pessoas físicas, cujo custo anual foi estimado em R$1,6 bilhão.
Segundo técnicos da Receita, a arrecadação desse residual da CPMF ocorre devido a ações administrativas e judiciais que foram sendo encerradas ao longo dos últimos cinco anos. Os valores que vêm sendo arrecadados incluem não apenas o tributo devido e não pago à época, mas também acréscimos de juros e multas.
Para o especialista em contas públicas Raul Velloso, esse comportamento mostra o excesso e o tamanho da burocracia que ainda existe no país:
- Disputa judicial no Brasil é algo demorado e causa essas distorções. Isso se chama morosidade brasileira. Do total recolhido entre 2008 e 2012, R$408 milhões, por exemplo, foram decorrentes de multas e juros acumulados sobre o não recolhimento da CPMF.
Outros R$97 milhões vieram de contribuintes que aderiram a parcelamentos tributários especiais e que estão pagando a dívida por etapas. Além disso, R$38 milhões vieram de valores que já estavam inscritos na dívida ativa da União.
Imposto extinto se mantém por 5 anos
De acordo com o Fisco, a extinção total de um tributo costuma levar, em média, cinco anos. Isso significa que o recolhimento residual da CPMF tende a ficar cada vez menor e desaparecer da lista das contribuições que são arrecadadas em breve. Mas isso não ocorrerá ainda em 2012.
Para se ter uma ideia do ritmo dessa arrecadação, em janeiro último, R$8 milhões da extinta CPMF ingressaram nos cofres do governo.
O economista Felipe Salto, da consultoria Tendências, destaca que, mesmo com o fim da contribuição - criada com o argumento de que financiaria a Saúde Pública - o governo não teve qualquer problema em fechar suas contas nesses cinco anos.
Quando estava no meio da disputa com os parlamentares para evitar a extinção da CPMF - cuja arrecadação anual beirava R$40 bilhões em 2007 - a equipe econômica alegava que o fim do tributo seria um golpe para a Saúde e também prejudicaria a política fiscal. A alíquota do tributo era de 0,38%, que incidia sobre qualquer operação financeira realizada.
Quando a CPMF acabou, a Receita decidiu fazer uma série de ajustes tributários para compensar as perdas. O IOF, por exemplo, foi elevado para o crédito e passou a ser cobrado sobre novas movimentações.
Isso fez com que o recolhimento desse imposto saltasse de R$7,8 bilhões em 2007 para R$20,3 bilhões em 2008. Já a arrecadação total do governo subiu, em 2008, nada menos que R$82,9 bilhões e vem batendo recordes desde então.
- O diagnóstico de que o governo precisava da CPMF para fazer o superávit primário e fechar suas contas estava errado - diz Salto. - A contribuição não era crucial para as contas públicas.
O mesmo governo que lucra até hoje com a cobrança da CPMF também continuou pagando o tributo mesmo depois de sua extinção. Reportagem do GLOBO publicada em julho de 2009 mostrou que, um ano e meio depois de ser extinta, a contribuição continuava sendo incorporada aos custos de contratos do governo com a iniciativa privada.
Em pelo menos 20 auditorias realizadas em 2008 e 2009, o Tribunal de Contas da União (TCU) constatou que empresas e órgãos do governo repassavam o valor do tributo para os fornecedores, que o embolsavam como lucro.
Em apenas um dos contratos auditados em 2008, o TCU constatou o pagamento indevido, por empresa do governo, de R$3,38 milhões relativos ao tributo.
Volta de tributo é considerada
O TCU determinou o expurgo dos valores cobrados indevidamente, o que foi feito de imediato por algumas empresas.
Outras ainda tentaram negociar prazos para corrigir a situação. Na ocasião, a Controladoria Geral da União (CGU) reafirmou que é responsabilidade dos gestores dos contratos revisar os pagamentos em caso de criação, alteração ou extinção de tributos, conforme o artigo 65 da Lei de Licitações (8.666).
Para a CGU, os gestores dos órgãos contratantes têm base legal suficiente para obter a revisão dos contratos, e deveriam fazer isso em todos os casos suspeitos.
Quase cinco depois de extinto, a volta do tributo sobre movimentações financeiras é sempre lembrada pelo governo federal e governadores como a saída mais fácil para aumentar os recursos públicos para a Saúde.
No início do atual governo, a presidente Dilma Rousseff chegou a incentivar governadores aliados a defenderem a volta da CPMF no Congresso, mas a negativa reação dos próprios políticos e, principalmente, da opinião pública inibe a formalização de proposta nesse sentido.
26 de março de 2012
Martha Beck O Globo
Dados da Receita Federal mostram que, desde janeiro de 2008, quando a contribuição deixou de ser cobrada, a arrecadação federal conta praticamente todos os meses com recursos da CPMF, cobrada de empresas ou pessoas físicas.
Dessa forma, a equipe econômica já conseguiu reforçar o caixa do Tesouro com nada menos que R$1,750 bilhão entre janeiro de 2008 e fevereiro de 2012.
Esse valor é suficiente, por exemplo, para o governo arcar com um ano da desoneração da folha de pagamento dos setores que já foram beneficiados pela medida (confecções, calçados, software e call centers), cujo custo estimado é de R$1,5 bilhão por ano.
A arrecadação residual da CPMF equivale, em outro exemplo, ao que o governo deixará de arrecadar com a redução do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 3% para 2,5% para o crédito das pessoas físicas, cujo custo anual foi estimado em R$1,6 bilhão.
Segundo técnicos da Receita, a arrecadação desse residual da CPMF ocorre devido a ações administrativas e judiciais que foram sendo encerradas ao longo dos últimos cinco anos. Os valores que vêm sendo arrecadados incluem não apenas o tributo devido e não pago à época, mas também acréscimos de juros e multas.
Para o especialista em contas públicas Raul Velloso, esse comportamento mostra o excesso e o tamanho da burocracia que ainda existe no país:
- Disputa judicial no Brasil é algo demorado e causa essas distorções. Isso se chama morosidade brasileira. Do total recolhido entre 2008 e 2012, R$408 milhões, por exemplo, foram decorrentes de multas e juros acumulados sobre o não recolhimento da CPMF.
Outros R$97 milhões vieram de contribuintes que aderiram a parcelamentos tributários especiais e que estão pagando a dívida por etapas. Além disso, R$38 milhões vieram de valores que já estavam inscritos na dívida ativa da União.
Imposto extinto se mantém por 5 anos
De acordo com o Fisco, a extinção total de um tributo costuma levar, em média, cinco anos. Isso significa que o recolhimento residual da CPMF tende a ficar cada vez menor e desaparecer da lista das contribuições que são arrecadadas em breve. Mas isso não ocorrerá ainda em 2012.
Para se ter uma ideia do ritmo dessa arrecadação, em janeiro último, R$8 milhões da extinta CPMF ingressaram nos cofres do governo.
O economista Felipe Salto, da consultoria Tendências, destaca que, mesmo com o fim da contribuição - criada com o argumento de que financiaria a Saúde Pública - o governo não teve qualquer problema em fechar suas contas nesses cinco anos.
Quando estava no meio da disputa com os parlamentares para evitar a extinção da CPMF - cuja arrecadação anual beirava R$40 bilhões em 2007 - a equipe econômica alegava que o fim do tributo seria um golpe para a Saúde e também prejudicaria a política fiscal. A alíquota do tributo era de 0,38%, que incidia sobre qualquer operação financeira realizada.
Quando a CPMF acabou, a Receita decidiu fazer uma série de ajustes tributários para compensar as perdas. O IOF, por exemplo, foi elevado para o crédito e passou a ser cobrado sobre novas movimentações.
Isso fez com que o recolhimento desse imposto saltasse de R$7,8 bilhões em 2007 para R$20,3 bilhões em 2008. Já a arrecadação total do governo subiu, em 2008, nada menos que R$82,9 bilhões e vem batendo recordes desde então.
- O diagnóstico de que o governo precisava da CPMF para fazer o superávit primário e fechar suas contas estava errado - diz Salto. - A contribuição não era crucial para as contas públicas.
O mesmo governo que lucra até hoje com a cobrança da CPMF também continuou pagando o tributo mesmo depois de sua extinção. Reportagem do GLOBO publicada em julho de 2009 mostrou que, um ano e meio depois de ser extinta, a contribuição continuava sendo incorporada aos custos de contratos do governo com a iniciativa privada.
Em pelo menos 20 auditorias realizadas em 2008 e 2009, o Tribunal de Contas da União (TCU) constatou que empresas e órgãos do governo repassavam o valor do tributo para os fornecedores, que o embolsavam como lucro.
Em apenas um dos contratos auditados em 2008, o TCU constatou o pagamento indevido, por empresa do governo, de R$3,38 milhões relativos ao tributo.
Volta de tributo é considerada
O TCU determinou o expurgo dos valores cobrados indevidamente, o que foi feito de imediato por algumas empresas.
Outras ainda tentaram negociar prazos para corrigir a situação. Na ocasião, a Controladoria Geral da União (CGU) reafirmou que é responsabilidade dos gestores dos contratos revisar os pagamentos em caso de criação, alteração ou extinção de tributos, conforme o artigo 65 da Lei de Licitações (8.666).
Para a CGU, os gestores dos órgãos contratantes têm base legal suficiente para obter a revisão dos contratos, e deveriam fazer isso em todos os casos suspeitos.
Quase cinco depois de extinto, a volta do tributo sobre movimentações financeiras é sempre lembrada pelo governo federal e governadores como a saída mais fácil para aumentar os recursos públicos para a Saúde.
No início do atual governo, a presidente Dilma Rousseff chegou a incentivar governadores aliados a defenderem a volta da CPMF no Congresso, mas a negativa reação dos próprios políticos e, principalmente, da opinião pública inibe a formalização de proposta nesse sentido.
26 de março de 2012
Martha Beck O Globo
AMIGOS DO REI; INIMIGOS DO POVO
O Orçamento Geral da União (OGU) permite aferir, a qualquer tempo, como um governo está empregando o dinheiro do contribuinte.
Mas possibilita mais:
a partir de sua análise, também se pode verificar o equilíbrio no repasse de verbas aos entes federados. Neste quesito, a prática petista tem revelado que o que conta é ser amigo do rei.
A execução orçamentária do ano passado e o planejamento para este ano mostram como o PT distorce o uso dos recursos públicos. Seja em termos de transferências às prefeituras, seja no reparte entre ministérios, aos petistas se reserva tudo e mais um pouco. Ao resto, sobram migalhas.
Em duas reportagens neste fim de semana, a Folha de S.Paulo dissecou o desequilíbrio. O mais gritante é o que acontece na divisão de verbas federais do OGU entre prefeituras. O privilégio a governantes petistas é evidente.
Ontem, o jornal examinou os repasses aos 81 maiores municípios do país - com mais de 200 mil eleitores. Entre os dez que mais receberam dinheiro da União desde o início do governo Dilma Rousseff, nada menos de seis são governados pelo PT e, claro, nenhum pela oposição.
A melhor forma de medir o desequilíbrio é ponderar o valor repassado pelo número de eleitores - que, por sua vez, guarda correlação estreita com o da população total. Nesta conta, São Bernardo do Campo (surpresa!) aparece no topo da lista, com R$ 93 per capita, junto com Porto Velho (RO). Ambas são governadas por petistas.
Cidades administradas pela oposição predominam no grupo das que foram mais mal tratadas pela gestão Dilma. Sorocaba, um reduto tucano, e Barueri não viram um centavo do OGU desde janeiro de 2011. Neste período, cada eleitor de São Paulo recebeu mero R$ 0,62 do governo de Dilma.
Será que a capital não tem problemas tão ou mais graves e prementes que os da vizinha do ABC? Em números absolutos, os 8,5 milhões de eleitores de São Paulo receberam um décimo (R$ 5,1 milhões) do que foi enviado aos 564 mil de São Bernardo (R$ 52,5 milhões).
Por que tamanha diferença de tratamento?
A distribuição dos recursos entre os partidos confirma as distorções. Municípios governados pelo PT ficaram com 41% de tudo o que foi repassado por meio de convênios diretos da União às prefeituras das 81 maiores cidades. O segundo da lista é o PMDB, com praticamente metade disso (22%). O PSDB teve 4,5%.
Numa outra análise, os petistas também despontam como os queridinhos dos gestores do OGU. No sábado, a Folha examinou como o corte orçamentário de R$ 55 bilhões anunciado em fevereiro atingiu as pastas da Esplanada.
A conclusão (surpresa!) é que os ministérios petistas quase não foram atingidos.
As 14 pastas ocupadas por petistas ou por gente classificada como sendo da "cota pessoal" da presidente perderam apenas 10% da verba inicialmente prevista para ser gasta neste ano. Na ponta de cima, ministérios como Esporte (ocupado pelo PCdoB) e Turismo (do PMDB) deram adeus a 70% dos recursos do OGU para 2011.
Na média, as pastas entregues por Dilma a PMDB, PSB, PR, PP, PDT, PC do B e PRB tiveram cortada 24% da verba prevista para este ano. Outra evidência do desequilíbrio de tratamento:
enquanto os ministérios petistas terão R$ 162 bilhões à disposição (78% do total), aos demais foram destinados R$ 45,6 bilhões.
Diante de indícios tão contundentes, não espanta que a base parlamentar esteja em estado de conflagração. O PT ressuscitou com ímpeto a nefasta prática do "toma lá, dá cá", mas na hora de dar deixou seus aliados à míngua.
O partido de Dilma, Lula e José Dirceu governa na base da compra de apoio, mas na hora de pagar dá cano.
Mas o pior mesmo é tratar o dinheiro do contribuinte como se fosse um recurso privado. Prioridades orçamentárias deveriam se basear nas necessidades da população e não na coloração partidária de quem é amigo do rei.
Da forma como governam, os administradores petistas agem como inimigos do povo.
26 de março de 2012
Fonte: Instituto Teotônio Vilela
Mas possibilita mais:
a partir de sua análise, também se pode verificar o equilíbrio no repasse de verbas aos entes federados. Neste quesito, a prática petista tem revelado que o que conta é ser amigo do rei.
A execução orçamentária do ano passado e o planejamento para este ano mostram como o PT distorce o uso dos recursos públicos. Seja em termos de transferências às prefeituras, seja no reparte entre ministérios, aos petistas se reserva tudo e mais um pouco. Ao resto, sobram migalhas.
Em duas reportagens neste fim de semana, a Folha de S.Paulo dissecou o desequilíbrio. O mais gritante é o que acontece na divisão de verbas federais do OGU entre prefeituras. O privilégio a governantes petistas é evidente.
Ontem, o jornal examinou os repasses aos 81 maiores municípios do país - com mais de 200 mil eleitores. Entre os dez que mais receberam dinheiro da União desde o início do governo Dilma Rousseff, nada menos de seis são governados pelo PT e, claro, nenhum pela oposição.
A melhor forma de medir o desequilíbrio é ponderar o valor repassado pelo número de eleitores - que, por sua vez, guarda correlação estreita com o da população total. Nesta conta, São Bernardo do Campo (surpresa!) aparece no topo da lista, com R$ 93 per capita, junto com Porto Velho (RO). Ambas são governadas por petistas.
Cidades administradas pela oposição predominam no grupo das que foram mais mal tratadas pela gestão Dilma. Sorocaba, um reduto tucano, e Barueri não viram um centavo do OGU desde janeiro de 2011. Neste período, cada eleitor de São Paulo recebeu mero R$ 0,62 do governo de Dilma.
Será que a capital não tem problemas tão ou mais graves e prementes que os da vizinha do ABC? Em números absolutos, os 8,5 milhões de eleitores de São Paulo receberam um décimo (R$ 5,1 milhões) do que foi enviado aos 564 mil de São Bernardo (R$ 52,5 milhões).
Por que tamanha diferença de tratamento?
A distribuição dos recursos entre os partidos confirma as distorções. Municípios governados pelo PT ficaram com 41% de tudo o que foi repassado por meio de convênios diretos da União às prefeituras das 81 maiores cidades. O segundo da lista é o PMDB, com praticamente metade disso (22%). O PSDB teve 4,5%.
Numa outra análise, os petistas também despontam como os queridinhos dos gestores do OGU. No sábado, a Folha examinou como o corte orçamentário de R$ 55 bilhões anunciado em fevereiro atingiu as pastas da Esplanada.
A conclusão (surpresa!) é que os ministérios petistas quase não foram atingidos.
As 14 pastas ocupadas por petistas ou por gente classificada como sendo da "cota pessoal" da presidente perderam apenas 10% da verba inicialmente prevista para ser gasta neste ano. Na ponta de cima, ministérios como Esporte (ocupado pelo PCdoB) e Turismo (do PMDB) deram adeus a 70% dos recursos do OGU para 2011.
Na média, as pastas entregues por Dilma a PMDB, PSB, PR, PP, PDT, PC do B e PRB tiveram cortada 24% da verba prevista para este ano. Outra evidência do desequilíbrio de tratamento:
enquanto os ministérios petistas terão R$ 162 bilhões à disposição (78% do total), aos demais foram destinados R$ 45,6 bilhões.
Diante de indícios tão contundentes, não espanta que a base parlamentar esteja em estado de conflagração. O PT ressuscitou com ímpeto a nefasta prática do "toma lá, dá cá", mas na hora de dar deixou seus aliados à míngua.
O partido de Dilma, Lula e José Dirceu governa na base da compra de apoio, mas na hora de pagar dá cano.
Mas o pior mesmo é tratar o dinheiro do contribuinte como se fosse um recurso privado. Prioridades orçamentárias deveriam se basear nas necessidades da população e não na coloração partidária de quem é amigo do rei.
Da forma como governam, os administradores petistas agem como inimigos do povo.
26 de março de 2012
Fonte: Instituto Teotônio Vilela
ACREDITE SE QUISER
A CUT resolveu defender os trabalhadores (mas é para enfraquecer as outras centrais)
Parece brincadeira, mas é verdade. De repente, a CUT decidiu acordar do sono letárgico em que estava mergulhada desde o início do governo Lula e dará largada nos próximos dias a uma campanha de ampla visibilidade contra o imposto sindical, o que promete provocar a discórdia entre as demais centrais –em sua maioria favoráveis à cobrança.
Vejam só o poderio financeiro da maior central sindical do país. Pretende vai gastar R$ 1,5 milhão em comerciais de TV e rádio e em anúncios de outdoors e jornais contra o imposto. Num avanço sobre as concorrentes, a CUT também prepara um plebiscito para ouvir trabalhadores de todos os sindicatos e saber quantos são contra a cobrança. É claro que a imensa maioria é contra descontar um dia de trabalho para engordar os cofres do governo e dos sindicatos. O plebiscito não tem nem graça.
Mas o objetivo maior da CUT não é agradar os trabalhadores, mas conquistar aliados na base das rivais.”Queremos envolver os trabalhadores e não só falar de nós, sindicalistas, para nós mesmos”, alega o presidente da CUT, Artur Henrique.
Segundo o Ministério do Trabalho, em 2011 foi recolhido dos trabalhadores R$ 1,6 bilhão com o imposto. Pouco mais de R$ 115 milhões foram repassados às centrais. O resto, dividido entre sindicatos, federações e confederações e o Ministério do Trabalho.
A proposta da CUT é trocar o imposto por uma contribuição voluntária, com valor votado em assembleia. A bandeira é antiga e remonta à fundação da central, mas encontra obstáculos até entre os seus sindicatos.
“A CUT deveria consultar antes a sua própria base para saber se é contrária ao imposto”, diz Ricardo Patah, presidente da UGT, a 3ª maior central,, atrás de CUT e Força Sindical.
A Força também é contra o fim do imposto e conseguiu defender a arrecadação enquanto Carlos Lupi –do mesmo PDT do deputado Paulo Pereira da Silva, da Força– era ministro.
Traduzindo: a CUT se arrisca a atirar as outras centrais nos braços da oposição.
26 de março de 2012
Carlos Newton
Parece brincadeira, mas é verdade. De repente, a CUT decidiu acordar do sono letárgico em que estava mergulhada desde o início do governo Lula e dará largada nos próximos dias a uma campanha de ampla visibilidade contra o imposto sindical, o que promete provocar a discórdia entre as demais centrais –em sua maioria favoráveis à cobrança.
Vejam só o poderio financeiro da maior central sindical do país. Pretende vai gastar R$ 1,5 milhão em comerciais de TV e rádio e em anúncios de outdoors e jornais contra o imposto. Num avanço sobre as concorrentes, a CUT também prepara um plebiscito para ouvir trabalhadores de todos os sindicatos e saber quantos são contra a cobrança. É claro que a imensa maioria é contra descontar um dia de trabalho para engordar os cofres do governo e dos sindicatos. O plebiscito não tem nem graça.
Mas o objetivo maior da CUT não é agradar os trabalhadores, mas conquistar aliados na base das rivais.”Queremos envolver os trabalhadores e não só falar de nós, sindicalistas, para nós mesmos”, alega o presidente da CUT, Artur Henrique.
Segundo o Ministério do Trabalho, em 2011 foi recolhido dos trabalhadores R$ 1,6 bilhão com o imposto. Pouco mais de R$ 115 milhões foram repassados às centrais. O resto, dividido entre sindicatos, federações e confederações e o Ministério do Trabalho.
A proposta da CUT é trocar o imposto por uma contribuição voluntária, com valor votado em assembleia. A bandeira é antiga e remonta à fundação da central, mas encontra obstáculos até entre os seus sindicatos.
“A CUT deveria consultar antes a sua própria base para saber se é contrária ao imposto”, diz Ricardo Patah, presidente da UGT, a 3ª maior central,, atrás de CUT e Força Sindical.
A Força também é contra o fim do imposto e conseguiu defender a arrecadação enquanto Carlos Lupi –do mesmo PDT do deputado Paulo Pereira da Silva, da Força– era ministro.
Traduzindo: a CUT se arrisca a atirar as outras centrais nos braços da oposição.
26 de março de 2012
Carlos Newton
INGESTÃO DE ÁLCOOL REDUZ A CONSCIÊNCIA DO PERIGO PARA PEDESTRES E CICLISTAS
O ciclista Wanderson Pereira, vítima fatal do acidente que envolveu recentemente Thor Batista, filho do empresário Eike Batista, tinha em sua corrente sanguínea, conforme detectado em exame post mortem, a dosagem de 15,5 decigramas de álcool por litro de sangue.
Tal concentração de álcool, comparada ao caso de motorista de veículo automotor, é quase oito vezes acima da dosagem tolerada, onde a tolerância é de até 2 decigramas de álcool por litro de sangue, sendo tal regra estabelecida pelo Decreto Federal 6488/08 que regulamentou a Lei Seca (Lei 11.705/08).
Para a configuração do crime de direção alcoolizada, a redação do Artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, prevê a concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue, o equivalente, matematicamente, a 3 mg/l de álcool por litro de ar expelido dos pulmões, no caso do teste do bafômetro. Ou seja, além da infração administrativa, o ciclista Wanderson Pereira, se estivesse na condução de veículo automotor, poderia também ser autuado por crime de direção alcoolizada.
Conforme estudos científicos de alcoologia, a concentração entre 10 e 20 decigramas de álcool, encontrada no organismo humano, provoca descoordenação motora e desorientação espacial, além de comprometimento na fala, andar trópego e agressividade ou passividade. O legista aposentado e psiquiatra forense Talvane de Moraes, ao ser consultado sobre o acidente de Thor Batista, disse que a reação à bebida alcoólica depende de alguns fatores, desde a massa corporal até a alimentação. Ressaltou, porém, que 15,5 é uma taxa bastante elevada que em geral configura estado de embriaguez.
Para o Doutor José Mauro Braz Lima, médico e professor da UFRJ, em sua obra científica “Alcoologia- uma visão sistêmica dos problemas relacionados ao uso do álcool”, a presença de álcool na corrente sanguínea exige maior tempo para avaliar as situações de risco no trânsito, mesmo as mais corriqueiras, tornando-se difícil sair de situações que dependam de reações rápidas e precisas, tendo-se a percepção de um menor número de fatos que se desenvolvem na via.
No caso da direção veicular, o estudioso informa que o risco de acidentes pode aumentar em até 20 vezes em razão da quantidade de 15,5 de álcool por litro de sangue, conforme a detectada no organismo do ciclista Wanderson Pereira.
Ressalte-se que Thor Batista, em depoimento em Delegacia Policial, afirmou que logo depois de atropelamento encontrou uma lata de cerveja sobre o parabrisa de seu carro, sustentando que a lata estava em poder da vítima.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal a cada dois dias uma pessoa morreu por atropelamento ou vítima de colisão com bicicleta (387 no total), na área de competência das oito rodovias federais que cortam o Estado do Rio de Janeiro, no período compreendido entre o inicio do ano de 2010 e 22 de março deste ano.
O uso de bebida alcoólica no trânsito continua, pois, a ceifar preciosas vidas e as estatísticas, apesar do advento da Lei Seca, são de números de uma violenta e infindável guerra.Prossegue a violência no trânsito, num permanente cenário de vítimas ensanguentadas, veículos retorcidos, dor e sofrimento. Até quando? Certamente até quando todos, devidamente educados, entenderem que trânsito é meio de vida, não de tragédias e perdas humanas. Educar para o trânsito é educar para a vida. Entenda-se.
26 de março de 2012
Milton Corrêa da Costa
Tal concentração de álcool, comparada ao caso de motorista de veículo automotor, é quase oito vezes acima da dosagem tolerada, onde a tolerância é de até 2 decigramas de álcool por litro de sangue, sendo tal regra estabelecida pelo Decreto Federal 6488/08 que regulamentou a Lei Seca (Lei 11.705/08).
Para a configuração do crime de direção alcoolizada, a redação do Artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, prevê a concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue, o equivalente, matematicamente, a 3 mg/l de álcool por litro de ar expelido dos pulmões, no caso do teste do bafômetro. Ou seja, além da infração administrativa, o ciclista Wanderson Pereira, se estivesse na condução de veículo automotor, poderia também ser autuado por crime de direção alcoolizada.
Conforme estudos científicos de alcoologia, a concentração entre 10 e 20 decigramas de álcool, encontrada no organismo humano, provoca descoordenação motora e desorientação espacial, além de comprometimento na fala, andar trópego e agressividade ou passividade. O legista aposentado e psiquiatra forense Talvane de Moraes, ao ser consultado sobre o acidente de Thor Batista, disse que a reação à bebida alcoólica depende de alguns fatores, desde a massa corporal até a alimentação. Ressaltou, porém, que 15,5 é uma taxa bastante elevada que em geral configura estado de embriaguez.
Para o Doutor José Mauro Braz Lima, médico e professor da UFRJ, em sua obra científica “Alcoologia- uma visão sistêmica dos problemas relacionados ao uso do álcool”, a presença de álcool na corrente sanguínea exige maior tempo para avaliar as situações de risco no trânsito, mesmo as mais corriqueiras, tornando-se difícil sair de situações que dependam de reações rápidas e precisas, tendo-se a percepção de um menor número de fatos que se desenvolvem na via.
No caso da direção veicular, o estudioso informa que o risco de acidentes pode aumentar em até 20 vezes em razão da quantidade de 15,5 de álcool por litro de sangue, conforme a detectada no organismo do ciclista Wanderson Pereira.
Ressalte-se que Thor Batista, em depoimento em Delegacia Policial, afirmou que logo depois de atropelamento encontrou uma lata de cerveja sobre o parabrisa de seu carro, sustentando que a lata estava em poder da vítima.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal a cada dois dias uma pessoa morreu por atropelamento ou vítima de colisão com bicicleta (387 no total), na área de competência das oito rodovias federais que cortam o Estado do Rio de Janeiro, no período compreendido entre o inicio do ano de 2010 e 22 de março deste ano.
O uso de bebida alcoólica no trânsito continua, pois, a ceifar preciosas vidas e as estatísticas, apesar do advento da Lei Seca, são de números de uma violenta e infindável guerra.Prossegue a violência no trânsito, num permanente cenário de vítimas ensanguentadas, veículos retorcidos, dor e sofrimento. Até quando? Certamente até quando todos, devidamente educados, entenderem que trânsito é meio de vida, não de tragédias e perdas humanas. Educar para o trânsito é educar para a vida. Entenda-se.
26 de março de 2012
Milton Corrêa da Costa
ESTADO DE DIREITO E SEGURANÇA
Liberdade e regulação
O debate sobre a regulação dos meios de comunicação torna-se cada vez mais necessário, tendo em vista que o Brasil convive com uma situação de fato dissociada da legislação vigente do setor. Para se ter uma ideia da defasagem basta constatar que leis atuais, que datam dos anos 70 do século passado, foram feitas para um mundo que desconhecia computador, internet e todas as novas mídias que depois se desenvolveram. As empresas de comunicação acompanharam essa evolução, criando novas realidades não contempladas na lei ou exigindo a sua modificação por um evidente descompasso do legal em relação ao real. Renovar é preciso.
No governo anterior, porém, esse debate foi indevidamente identificado com uma regulação de conteúdo, com interferência direta na liberdade de imprensa. Seu projeto era, nesse sentido, intervencionista, tendo o apoio de setores partidários e de movimentos sociais que clamavam - e clamam - por um "controle social da mídia" ou por uma "democratização dos meios de comunicação". Assim colocada, a questão terminou sendo confundida com um tipo de censura, tendo como mote controlar a livre-iniciativa e a liberdade do setor. O viés ideológico contra certos grupos econômicos foi muito manifesto, produzindo, de parte deles, uma legítima reação contra qualquer tipo de regulação.
A presidente Dilma Rousseff utilizou uma expressão muito apropriada para expressar sua posição. Disse que o único controle possível é o controle remoto, que o indivíduo, diante de seu aparelho de TV, utiliza para mudar de canal. Vale a liberdade de escolha. O ministro Paulo Bernardo está seguindo, muito seriamente, essa linha de ação, afastando-se, precisamente, de qualquer viés ideológico, abordando a questão de maneira eminentemente técnica. Isso significa uma orientação pela mudança, atenta à modernização regulatória necessária para o setor, e o abandono dos preconceitos ideológicos.
Para que tal reforma do marco regulatório se torne possível é, no entanto, preciso que se distinga a regulação formal - ou seja, a reforma do marco regulatório - da regulação de conteúdo, que seria uma forma de cerceamento da liberdade de imprensa. O novo governo está dando mostras de fazer essa distinção. Logo, os diferentes agentes econômicos e políticos envolvidos nesse processo deveriam partir desse reconhecimento, fortalecendo a mudança de posição em curso. O elogiável deve ser elogiado, o criticável deve ser criticado, sem nenhum tipo de parti-pris político.
Embora tenha sido pouco noticiado, o atual ministro das Comunicações fez importantes mudanças na legislação até então vigente sobre TV por assinatura, em função das profundas transformações do mundo digital. Observe-se que a legislação que rege a televisão aberta se distingue da fechada, que envolve a telecomunicação, enquanto a primeira se situa na radiodifusão. Tais alterações, apesar de sua pouca repercussão pública, foram fruto de intensas negociações, feitas num ambiente de diálogo. Há, contudo, ainda muito por fazer, sobretudo considerando a necessária mudança do marco regulatório em geral.
Segundo a legislação atual, por exemplo, a propriedade cruzada é proibida, não podendo uma mesma empresa manter jornais, rádios e televisão numa mesma cidade. Algumas empresas nãos seguem o que a lei estabelece. Pode-se, todavia, colocar a questão de se deve aplicar-se estritamente a lei ou modificá-la em razão da interconexão dos diferentes meios de comunicação. Não se trata, contudo, de uma questão simples, pois qualquer mudança no marco regulatório deveria seguir os princípios da concorrência e da pluralidade de opiniões e posições.
Outro aspecto que deveria ser posto em questão é o controle de meios de comunicação por políticos, que agiriam segundo seus interesses eleitorais. O tema das outorgas de emissoras ou retransmissoras de rádio e TV entra aqui em pauta e, aí, sim, dentro de um espírito de fortalecimento da cena democrática, independentemente de quaisquer apadrinhamentos. Nesse sentido, alguns princípios norteadores de tal discussão deveriam ser precisamente estabelecidos, tendo como condição evitar qualquer confusão com controle do conteúdo ou cerceamento da liberdade de imprensa.
O fortalecimento da pluralidade na comunicação é uma condição mesma de Estados democráticos, cuja regulação deveria ter em vista esse objetivo maior. Critérios e condições deveriam ter em vista esse "bem" estruturante da democracia. A concorrência entre distintas empresas é certamente imprescindível, pois quem ganha com isso é o cidadão consumidor, que pode escolher entre distintas alternativas que a ele se apresentam. Quanto maior for a concentração, menor a concorrência. Eis um debate que deveria ser levado em conta sem nenhum viés ideológico. Isso pressupõe que a livre-iniciativa reja o setor, com empresas concorrendo entre si e com empresas públicas e comunitárias, em espírito concorrencial, tendo como finalidade o interesse de todos os cidadãos.
Dever-se-ia, igualmente, tratar dos canais religiosos, sem preconceito algum, pois são legítimas suas formas de manifestação, independentemente das igrejas envolvidas, católica ou evangélicas. Na situação atual, há provavelmente equilíbrio entre elas.
Nada disso, porém, é possível se não for realizado um amplo debate público que leve em conta os diferentes atores e sensibilidades. A divulgação de propostas de modificação do marco regulatório é aqui central, cada um tendo direito de apresentar suas ideias. Se nada for feito, teremos, apenas, a conservação do status quo. O ministro Paulo Bernardo já deu mostras de ter distensionado o ambiente, num espírito de abertura e discussão.
Oportunidades desse tipo não podem ser desaproveitadas, em nome da democracia brasileira.
26/03/2012
Denis Lerrer Rosenfield
O Estado de S.Paulo
O debate sobre a regulação dos meios de comunicação torna-se cada vez mais necessário, tendo em vista que o Brasil convive com uma situação de fato dissociada da legislação vigente do setor. Para se ter uma ideia da defasagem basta constatar que leis atuais, que datam dos anos 70 do século passado, foram feitas para um mundo que desconhecia computador, internet e todas as novas mídias que depois se desenvolveram. As empresas de comunicação acompanharam essa evolução, criando novas realidades não contempladas na lei ou exigindo a sua modificação por um evidente descompasso do legal em relação ao real. Renovar é preciso.
No governo anterior, porém, esse debate foi indevidamente identificado com uma regulação de conteúdo, com interferência direta na liberdade de imprensa. Seu projeto era, nesse sentido, intervencionista, tendo o apoio de setores partidários e de movimentos sociais que clamavam - e clamam - por um "controle social da mídia" ou por uma "democratização dos meios de comunicação". Assim colocada, a questão terminou sendo confundida com um tipo de censura, tendo como mote controlar a livre-iniciativa e a liberdade do setor. O viés ideológico contra certos grupos econômicos foi muito manifesto, produzindo, de parte deles, uma legítima reação contra qualquer tipo de regulação.
A presidente Dilma Rousseff utilizou uma expressão muito apropriada para expressar sua posição. Disse que o único controle possível é o controle remoto, que o indivíduo, diante de seu aparelho de TV, utiliza para mudar de canal. Vale a liberdade de escolha. O ministro Paulo Bernardo está seguindo, muito seriamente, essa linha de ação, afastando-se, precisamente, de qualquer viés ideológico, abordando a questão de maneira eminentemente técnica. Isso significa uma orientação pela mudança, atenta à modernização regulatória necessária para o setor, e o abandono dos preconceitos ideológicos.
Para que tal reforma do marco regulatório se torne possível é, no entanto, preciso que se distinga a regulação formal - ou seja, a reforma do marco regulatório - da regulação de conteúdo, que seria uma forma de cerceamento da liberdade de imprensa. O novo governo está dando mostras de fazer essa distinção. Logo, os diferentes agentes econômicos e políticos envolvidos nesse processo deveriam partir desse reconhecimento, fortalecendo a mudança de posição em curso. O elogiável deve ser elogiado, o criticável deve ser criticado, sem nenhum tipo de parti-pris político.
Embora tenha sido pouco noticiado, o atual ministro das Comunicações fez importantes mudanças na legislação até então vigente sobre TV por assinatura, em função das profundas transformações do mundo digital. Observe-se que a legislação que rege a televisão aberta se distingue da fechada, que envolve a telecomunicação, enquanto a primeira se situa na radiodifusão. Tais alterações, apesar de sua pouca repercussão pública, foram fruto de intensas negociações, feitas num ambiente de diálogo. Há, contudo, ainda muito por fazer, sobretudo considerando a necessária mudança do marco regulatório em geral.
Segundo a legislação atual, por exemplo, a propriedade cruzada é proibida, não podendo uma mesma empresa manter jornais, rádios e televisão numa mesma cidade. Algumas empresas nãos seguem o que a lei estabelece. Pode-se, todavia, colocar a questão de se deve aplicar-se estritamente a lei ou modificá-la em razão da interconexão dos diferentes meios de comunicação. Não se trata, contudo, de uma questão simples, pois qualquer mudança no marco regulatório deveria seguir os princípios da concorrência e da pluralidade de opiniões e posições.
Outro aspecto que deveria ser posto em questão é o controle de meios de comunicação por políticos, que agiriam segundo seus interesses eleitorais. O tema das outorgas de emissoras ou retransmissoras de rádio e TV entra aqui em pauta e, aí, sim, dentro de um espírito de fortalecimento da cena democrática, independentemente de quaisquer apadrinhamentos. Nesse sentido, alguns princípios norteadores de tal discussão deveriam ser precisamente estabelecidos, tendo como condição evitar qualquer confusão com controle do conteúdo ou cerceamento da liberdade de imprensa.
O fortalecimento da pluralidade na comunicação é uma condição mesma de Estados democráticos, cuja regulação deveria ter em vista esse objetivo maior. Critérios e condições deveriam ter em vista esse "bem" estruturante da democracia. A concorrência entre distintas empresas é certamente imprescindível, pois quem ganha com isso é o cidadão consumidor, que pode escolher entre distintas alternativas que a ele se apresentam. Quanto maior for a concentração, menor a concorrência. Eis um debate que deveria ser levado em conta sem nenhum viés ideológico. Isso pressupõe que a livre-iniciativa reja o setor, com empresas concorrendo entre si e com empresas públicas e comunitárias, em espírito concorrencial, tendo como finalidade o interesse de todos os cidadãos.
Dever-se-ia, igualmente, tratar dos canais religiosos, sem preconceito algum, pois são legítimas suas formas de manifestação, independentemente das igrejas envolvidas, católica ou evangélicas. Na situação atual, há provavelmente equilíbrio entre elas.
Nada disso, porém, é possível se não for realizado um amplo debate público que leve em conta os diferentes atores e sensibilidades. A divulgação de propostas de modificação do marco regulatório é aqui central, cada um tendo direito de apresentar suas ideias. Se nada for feito, teremos, apenas, a conservação do status quo. O ministro Paulo Bernardo já deu mostras de ter distensionado o ambiente, num espírito de abertura e discussão.
Oportunidades desse tipo não podem ser desaproveitadas, em nome da democracia brasileira.
26/03/2012
Denis Lerrer Rosenfield
O Estado de S.Paulo
PAPA BENTO XVI DEFENDE DIREITOS HUMANOS EM CUBA
Diante de Raúl Castro, papa defende os direitos humanos em Cuba e fala dos presos políticos e dos exilados
O papa Bento 16 é um líder religioso de coragem — sempre foi, diga-se, desde quando se colocou como o bastião da doutrina no Vaticano, contendo a fúria daqueles que pretendiam transformar a Igreja Católica numa dessas agências da ONU… Refiro-me, obviamente, à coragem teológica — não condescende com o laicismo; afinal, ele representa a Igreja Católica — e também à coragem política: não condescende com a violência de estado, qualquer que seja ela. Abaixo, há uma síntese do que vai no Globo Online, com base no noticiário das agências internacionais. Volto depois.
*
O Papa Bento 16 chegou a Cuba afirmando carregar consigo as “justas aspirações” de todos os cubanos, inclusive dos presos e dos que estão fora da ilha, tocando indiretamente no tema dos direitos humanos. Milhares de pessoas receberam o Pontífice e cerca de 200 mil são esperados para uma missa a ser celebrada por ele.
“Levo no meu coração as justas aspirações e legítimos desejos de todos os cubanos, onde quer que se encontrem, seus sofrimentos e alegrias, suas preocupações e desejos mais nobres e de modo especial dos jovens e velhos, dos adolescentes e crianças, dos enfermos e trabalhadores, dos presos e de seus familiares, assim como dos pobres e necessitados”, afirmou o Pontífice, diante do presidente Raúl Castro.
O Papa descreveu o atual momento de Cuba como um período em que o país “olha para o amanhã e para ele se esforça por renovar e ampliar seus horizontes”, fazendo referência em seguida a José Martí, mártir da independência cubana.
Bento 16 também descreveu “um momento de especial dificuldade econômica” em que vivem muitas partes do mundo hoje em dia. Comentou que muitos concordam ser essa situação decorrente de uma crise de tipo espiritual e imoral que deixa o homem “desprotegido frente à ambição e ao egoísmo que não têm em conta o bem autêntico das pessoas e famílias”.
Desde a visita de João Paulo 2º à ilha, em 1998, a Igreja Católica vem se tornando um dos principais interlocutores do governo cubano, e muitos esperam que a visita sirva para ampliar o papel mediador do Vaticano em assuntos sensíveis como presos e dissidentes políticos. Outra expectativa é que a visita de Bento XVI ajude a ampliar participação da Igreja na vida da ilha por meio de programas sociais e educativos. “Um dos frutos importantes daquela visita foi a inauguração de uma nova etapa nas relações entre a Igreja e o Estado cubano. Mas ainda há muitos aspectos em que se pode e deve avançar”, disse o Pontífice hoje.
Em seu discurso, Raúl Castro de certa forma respondeu às críticas de falta de democracia em Cuba e fez referência indireta às reformas que vem implementando desde que assumiu o poder em 2008. “A nação seguiu invariavelmente mudando tudo o que deve ser mudado conforme as altas aspirações do povo cubano e com a livre participação desses nas decisões transcendentais de nossa sociedade, incluindo as econômicas e sociais”, afirmou Raúl.
(…)
Voltei
O papa, como vocês sabem, não é de nada! Bacana é a Maria do Rosário! Fosse a nossa valente ministra a discursar em Cuba, ela atacaria o embargo americano. O papa, como vocês sabem, não é de nada. Bacana é Lula. Fosse ele a discursar, compararia os presos políticos a bandidos brasileiros. O papa, como vocês sabem, não é de nada. Bacana é Dilma. Fosse ela a discursar, diria que, em matéria de direitos humanos, ninguém tem lições a dar a Cuba — afinal, grave mesmo é haver terroristas presos em Guantánamo…
26 de março de 2012
Reinaldo Azevedo
O papa Bento 16 é um líder religioso de coragem — sempre foi, diga-se, desde quando se colocou como o bastião da doutrina no Vaticano, contendo a fúria daqueles que pretendiam transformar a Igreja Católica numa dessas agências da ONU… Refiro-me, obviamente, à coragem teológica — não condescende com o laicismo; afinal, ele representa a Igreja Católica — e também à coragem política: não condescende com a violência de estado, qualquer que seja ela. Abaixo, há uma síntese do que vai no Globo Online, com base no noticiário das agências internacionais. Volto depois.
*
O Papa Bento 16 chegou a Cuba afirmando carregar consigo as “justas aspirações” de todos os cubanos, inclusive dos presos e dos que estão fora da ilha, tocando indiretamente no tema dos direitos humanos. Milhares de pessoas receberam o Pontífice e cerca de 200 mil são esperados para uma missa a ser celebrada por ele.
“Levo no meu coração as justas aspirações e legítimos desejos de todos os cubanos, onde quer que se encontrem, seus sofrimentos e alegrias, suas preocupações e desejos mais nobres e de modo especial dos jovens e velhos, dos adolescentes e crianças, dos enfermos e trabalhadores, dos presos e de seus familiares, assim como dos pobres e necessitados”, afirmou o Pontífice, diante do presidente Raúl Castro.
O Papa descreveu o atual momento de Cuba como um período em que o país “olha para o amanhã e para ele se esforça por renovar e ampliar seus horizontes”, fazendo referência em seguida a José Martí, mártir da independência cubana.
Bento 16 também descreveu “um momento de especial dificuldade econômica” em que vivem muitas partes do mundo hoje em dia. Comentou que muitos concordam ser essa situação decorrente de uma crise de tipo espiritual e imoral que deixa o homem “desprotegido frente à ambição e ao egoísmo que não têm em conta o bem autêntico das pessoas e famílias”.
Desde a visita de João Paulo 2º à ilha, em 1998, a Igreja Católica vem se tornando um dos principais interlocutores do governo cubano, e muitos esperam que a visita sirva para ampliar o papel mediador do Vaticano em assuntos sensíveis como presos e dissidentes políticos. Outra expectativa é que a visita de Bento XVI ajude a ampliar participação da Igreja na vida da ilha por meio de programas sociais e educativos. “Um dos frutos importantes daquela visita foi a inauguração de uma nova etapa nas relações entre a Igreja e o Estado cubano. Mas ainda há muitos aspectos em que se pode e deve avançar”, disse o Pontífice hoje.
Em seu discurso, Raúl Castro de certa forma respondeu às críticas de falta de democracia em Cuba e fez referência indireta às reformas que vem implementando desde que assumiu o poder em 2008. “A nação seguiu invariavelmente mudando tudo o que deve ser mudado conforme as altas aspirações do povo cubano e com a livre participação desses nas decisões transcendentais de nossa sociedade, incluindo as econômicas e sociais”, afirmou Raúl.
(…)
Voltei
O papa, como vocês sabem, não é de nada! Bacana é a Maria do Rosário! Fosse a nossa valente ministra a discursar em Cuba, ela atacaria o embargo americano. O papa, como vocês sabem, não é de nada. Bacana é Lula. Fosse ele a discursar, compararia os presos políticos a bandidos brasileiros. O papa, como vocês sabem, não é de nada. Bacana é Dilma. Fosse ela a discursar, diria que, em matéria de direitos humanos, ninguém tem lições a dar a Cuba — afinal, grave mesmo é haver terroristas presos em Guantánamo…
26 de março de 2012
Reinaldo Azevedo
NAZISMO TUPINIQUIM: DILMA E OS 27 INTOCÁVEIS
Desde quando aqueles vinte e sete industriais representam o setor industrial brasileiro, ou quiçá, a economia nacional?
Na semana passada os jornais anunciaram uma reunião convocada pelo governo com 27 dos maiores industriais do país, para discutirem juntos o problema do arrefecimento do crescimento do setor. Nesta semana, a notícia alardeada como alvissareira é a de que o governo está implementando um rol de cerca de quarenta medidas de cunho notoriamente protecionista.
Como um prólogo, lembro que muito antes da mídia tradicional falar em crise – na verdade, enquanto festejava os bons números, quer tivessem sido verdadeiros, os que foram adquiridos no vácuo de um grande período de prosperidade mundial, ou os falsos, que o governo maquiava e distribuía sem contestação – este articulista já avisava que a coisa não era bem assim.
Com honestidade, jamais criei previsões com data marcada, porque os que assim agem não passam de prestidigitadores. Apenas alertei para o fato de que o governo tem gastado muito, e gastado mal, mesmo contando com uma carga tributária bastante alta; que o governo, apesar de contar com quase 40% do PIB em mãos na forma de tributos, tem entregado a infraestrutura às baratas; que tem feito uso desmedido da expansão monetária, do incentivo ao consumo e à distribuição do crédito farto; e que tem sufocado as micro, pequenas e médias empresas por meio de uma burocracia e um fiscalismo cada vez mais exigentes. Percebam que até o momento nem sequer cogito da brutal e institucionalizada corrupção com que o PT tem sangrado a nação.
Todos os que têm compreensão desses fatos à luz da Escola Austríaca de Economia, como eu, já previam um quadro futuro de crise que aconteceria justamente quando o ápice do atual ciclo econômico tivesse sido alcançado e a economia doravante passasse a sofrer a ressaca do sistema de papel-moeda de curso forçado e do sistema de reservas bancárias fracionárias. Ninguém tinha uma bola de cristal para dizer onde e quando, mas a fórmula era certa de que uma severa crise haveria de ocorrer.
No terceiro mandato do PT, “acho” que não dá mais para colar a tese da “herança maldita”. Como eu já me pronunciei em artigos anteriores, até achei oportuna a segunda vitória de Lula e posteriormente da Dilma, porque há um defeito crônico nas democracias que é a alternância entre os governantes populistas e os sucessores que se veem diante da necessidade de efetuar ajustes de austeridade.
O caso é que quase sempre os primeiros levam a melhor – gastam a rodo, ficam com a fama de papais e mamães da nação - e os que assumem o estado quebrado arcam com a pecha de malvados, neoliberais e o diabo, até que tendo razoavelmente arrumado a casa, sejam substituídos pelos novos populistas, renovando assim este ciclo nada virtuoso. Lula tem realmente uma estrela das grandes, porque a crise não o alcançou, mas o mesmo já não se pode garantir quanto ao mandato de sua gerentona Dilma Roussef.
Aqui estamos portanto, naquele tempo em que as promessas do “espetáculo do crescimento” já não passam de folhas secas mascadas pelo vento. E aqui estamos a contemplar a “presidenta” Dilma Roussef a reunir-se com os 27 maiores industriais do país para para lhes ordenar que invistam no país! Francamente, desconheço se o próprio Hitler chegou a tanto!
Sim, meus amigos, porque o Brasil vive sob uma estrutura nazista. Não estou fazendo metáforas nem usando de figuras de linguagem. A estrutura social nazista é aquela em que os meios de produção permanecem formalmente sob a propriedade dos seus donos, mas toda a produção, comercialização, propaganda, distribuição e o trabalho são regulados pelo estado nos mínimos detalhes. Ah, sem esquecer que lhe cabe a melhor fatia dos bolo também.
Vivêssemos em uma democracia onde prevalecesse o princípio de igualdade de todos perante a lei, uma tal reunião dos 27 maiores industriais, independentemente de qual fosse a pauta, já configuraria um escândalo nacional. Nos Estados Unidos, pelo menos nos seus primórdios, era assim mesmo que acontecia. O estado existia para o bem de todos, e portanto as leis eram dirigidas a todos.
Desde quando aqueles vinte e sete industriais representam o setor industrial brasileiro, ou quiçá, a economia nacional?
Entre os presentes, destacam-se as montadoras de veículos, estas que há muito se acham a razão de ser das economias; a Natura, patrocinadora de Marina Silva e mancomunada com movimentos sociais; os empresários do aço e do cimento, que não largam do osso do protecionismo para praticarem preços abusivos contra o povo; e por aí vai...
A verdade é que a reunião compôs justamente o retrato do nazismo tupiniquim: o governo conta somente com estes, seus intocáveis, que ou fazem parte da cesta básica da exportação ou compõem uma certa linha de fornecimentos no mercado interno dos quais os brasileiros não têm como buscar alternativas.
Se o “Seu” João, fabricante de panelas, ou “Dona” Maria, dona de uma confecção, vão sobreviver, eles que se virem!
As medidas protecionistas baixadas em velocidade relâmpago provam a próspera simbiose governo-grandes empresas. Não há nada em seus dispositivos que favoreça indistintamente micros, pequenos e médios industriais, e muito menos há para os consumidores brasileiros, que pouco a pouco vão se vendo compelidos a pagar mais e mais caro por produtos industrializados.
A solução para o resgate da competitividade não só da industria brasileira, mas como também de todos os setores, está na desoneração fiscal ampla e não-seletiva, bem como na simplificação da burocracia – e aqui não falo somente da dificuldade de preencher papéis para o governo, mas também de cumprir com uma plêiade de exigências as mais absurdas, de todo tipo de órgãos que têm legislado sem freios por meio de atos administrativos.
Outros ajustes que necessitam ser feitos consistem na recuperação e ampliação da infraestrutura (que pode inclusive, ser levada adiante justamente por meio da propriedade privada), na segurança pública, e na contenção dos gastos estatais, da expensão da moeda e do crédito.
Vocês acham todavia, que o governo vai querer fazer isto só pelos seus lindos olhos?
Klauber Cristofen Pires
26 de março de 2012
Na semana passada os jornais anunciaram uma reunião convocada pelo governo com 27 dos maiores industriais do país, para discutirem juntos o problema do arrefecimento do crescimento do setor. Nesta semana, a notícia alardeada como alvissareira é a de que o governo está implementando um rol de cerca de quarenta medidas de cunho notoriamente protecionista.
Como um prólogo, lembro que muito antes da mídia tradicional falar em crise – na verdade, enquanto festejava os bons números, quer tivessem sido verdadeiros, os que foram adquiridos no vácuo de um grande período de prosperidade mundial, ou os falsos, que o governo maquiava e distribuía sem contestação – este articulista já avisava que a coisa não era bem assim.
Com honestidade, jamais criei previsões com data marcada, porque os que assim agem não passam de prestidigitadores. Apenas alertei para o fato de que o governo tem gastado muito, e gastado mal, mesmo contando com uma carga tributária bastante alta; que o governo, apesar de contar com quase 40% do PIB em mãos na forma de tributos, tem entregado a infraestrutura às baratas; que tem feito uso desmedido da expansão monetária, do incentivo ao consumo e à distribuição do crédito farto; e que tem sufocado as micro, pequenas e médias empresas por meio de uma burocracia e um fiscalismo cada vez mais exigentes. Percebam que até o momento nem sequer cogito da brutal e institucionalizada corrupção com que o PT tem sangrado a nação.
Todos os que têm compreensão desses fatos à luz da Escola Austríaca de Economia, como eu, já previam um quadro futuro de crise que aconteceria justamente quando o ápice do atual ciclo econômico tivesse sido alcançado e a economia doravante passasse a sofrer a ressaca do sistema de papel-moeda de curso forçado e do sistema de reservas bancárias fracionárias. Ninguém tinha uma bola de cristal para dizer onde e quando, mas a fórmula era certa de que uma severa crise haveria de ocorrer.
No terceiro mandato do PT, “acho” que não dá mais para colar a tese da “herança maldita”. Como eu já me pronunciei em artigos anteriores, até achei oportuna a segunda vitória de Lula e posteriormente da Dilma, porque há um defeito crônico nas democracias que é a alternância entre os governantes populistas e os sucessores que se veem diante da necessidade de efetuar ajustes de austeridade.
O caso é que quase sempre os primeiros levam a melhor – gastam a rodo, ficam com a fama de papais e mamães da nação - e os que assumem o estado quebrado arcam com a pecha de malvados, neoliberais e o diabo, até que tendo razoavelmente arrumado a casa, sejam substituídos pelos novos populistas, renovando assim este ciclo nada virtuoso. Lula tem realmente uma estrela das grandes, porque a crise não o alcançou, mas o mesmo já não se pode garantir quanto ao mandato de sua gerentona Dilma Roussef.
Aqui estamos portanto, naquele tempo em que as promessas do “espetáculo do crescimento” já não passam de folhas secas mascadas pelo vento. E aqui estamos a contemplar a “presidenta” Dilma Roussef a reunir-se com os 27 maiores industriais do país para para lhes ordenar que invistam no país! Francamente, desconheço se o próprio Hitler chegou a tanto!
Sim, meus amigos, porque o Brasil vive sob uma estrutura nazista. Não estou fazendo metáforas nem usando de figuras de linguagem. A estrutura social nazista é aquela em que os meios de produção permanecem formalmente sob a propriedade dos seus donos, mas toda a produção, comercialização, propaganda, distribuição e o trabalho são regulados pelo estado nos mínimos detalhes. Ah, sem esquecer que lhe cabe a melhor fatia dos bolo também.
Vivêssemos em uma democracia onde prevalecesse o princípio de igualdade de todos perante a lei, uma tal reunião dos 27 maiores industriais, independentemente de qual fosse a pauta, já configuraria um escândalo nacional. Nos Estados Unidos, pelo menos nos seus primórdios, era assim mesmo que acontecia. O estado existia para o bem de todos, e portanto as leis eram dirigidas a todos.
Desde quando aqueles vinte e sete industriais representam o setor industrial brasileiro, ou quiçá, a economia nacional?
Entre os presentes, destacam-se as montadoras de veículos, estas que há muito se acham a razão de ser das economias; a Natura, patrocinadora de Marina Silva e mancomunada com movimentos sociais; os empresários do aço e do cimento, que não largam do osso do protecionismo para praticarem preços abusivos contra o povo; e por aí vai...
A verdade é que a reunião compôs justamente o retrato do nazismo tupiniquim: o governo conta somente com estes, seus intocáveis, que ou fazem parte da cesta básica da exportação ou compõem uma certa linha de fornecimentos no mercado interno dos quais os brasileiros não têm como buscar alternativas.
Se o “Seu” João, fabricante de panelas, ou “Dona” Maria, dona de uma confecção, vão sobreviver, eles que se virem!
As medidas protecionistas baixadas em velocidade relâmpago provam a próspera simbiose governo-grandes empresas. Não há nada em seus dispositivos que favoreça indistintamente micros, pequenos e médios industriais, e muito menos há para os consumidores brasileiros, que pouco a pouco vão se vendo compelidos a pagar mais e mais caro por produtos industrializados.
A solução para o resgate da competitividade não só da industria brasileira, mas como também de todos os setores, está na desoneração fiscal ampla e não-seletiva, bem como na simplificação da burocracia – e aqui não falo somente da dificuldade de preencher papéis para o governo, mas também de cumprir com uma plêiade de exigências as mais absurdas, de todo tipo de órgãos que têm legislado sem freios por meio de atos administrativos.
Outros ajustes que necessitam ser feitos consistem na recuperação e ampliação da infraestrutura (que pode inclusive, ser levada adiante justamente por meio da propriedade privada), na segurança pública, e na contenção dos gastos estatais, da expensão da moeda e do crédito.
Vocês acham todavia, que o governo vai querer fazer isto só pelos seus lindos olhos?
Klauber Cristofen Pires
26 de março de 2012
EIKE BATISTA, UM SUPERPAI?
O comportamento do pai de Thor nos leva a refletir sobre o que é a paternidade em nossa época
Na noite de sábado, 17/3, Thor Batista, 20 anos, atropelou Wanderson Pereira dos Santos, 30 anos, na rodovia Washington Luís, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. Wanderson morreu na hora. De imediato, Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, passou a defender o filho de todas as maneiras – e também no microblog twitter. Com tanta veemência que o humorista Tutty Vasques comentou em sua coluna no Estadão, de 21/3:
“Não satisfeito com o lugar de destaque que ocupa na mídia como o homem mais rico do Brasil, o insaciável Eike Batista tem se esforçado um bocado para virar capa de revista como o Pai do Ano em 2012”.
A observação é aguda, como costuma ser o humor de qualidade. E é algo que vale a pena pensar: ao defender o filho com os melhores advogados, com assessores de imprensa e com seu próprio discurso público, Eike Batista é mesmo um superpai?
O que se espera hoje de um pai, afinal?
Ainda que a maioria tenha acompanhado o noticiário, é importante recordar os principais capítulos e seus protagonistas, antes de seguirmos adiante. Assim como é importante fazer algumas perguntas óbvias sobre a investigação.
Thor é o mais próximo de um príncipe herdeiro que o Brasil atual pode ter: filho do homem mais rico do Brasil e da eterna musa do Carnaval. Como disse Eike Batista (@eikebatista) no twitter: “A mídia e todos vão já já perceber que o Rio tem um Príncipe Harry! O Thor”. Wanderson era ajudante de caminhoneiro e filho de criação de Maria Vicentina Pereira. Thor foi batizado com o nome de um deus nórdico. Ninguém se preocupou em perguntar qual é a origem do nome de Wanderson na mitologia familiar, mas com certeza existe uma história, sempre existe. Thor dirigia um Mercedes SLR McLaren, o mesmo que costumava ser exibido como obra de arte na sala da mansão de sua família. Wanderson, uma bicicleta. Na BR-040, Thor e Wanderson encontraram-se não apenas como dois brasileiros, mas como dois Brasis que raramente se encontrariam de outro modo.
A vontade de condenar Thor, em um país tão desigual como o nosso, sempre pródigo em presentear os mais ricos com a impunidade, é imediata. É necessário, porém, resistir a ela. Ninguém pode ser condenado sem julgamento, sob hipótese alguma. Da mesma forma, pelos mesmos critérios e também pela sobriedade que a morte de uma pessoa exige, Eike Batista deveria ter resistido a condenar Wanderson.
Em suas afirmações na imprensa e no twitter, o pai de Thor apressou-se em culpar o morto pela própria morte. E afirmou que Wanderson poderia ter matado não só a si mesmo, como também seu filho e o amigo que o acompanhava – o que é altamente improvável. Segundo pesquisa citada pela jornalista Maria Paola de Salvo, no Blog do Sakamoto, apenas 0,3% dos motoristas envolvidos em atropelamento com vítima fatal morrem.
Enquanto as investigações não forem concluídas, nenhum de nós – e muito menos Eike – tem o direito de condenar alguém. Até agora, ninguém – nem mesmo Eike – pode afirmar se a morte de Wanderson foi fatalidade ou homicídio. Até agora, ninguém – nem mesmo Eike – pode declarar se a morte de Wanderson é responsabilidade exclusiva da vítima, é responsabilidade exclusiva de Thor ou é responsabilidade de ambos.
Infelizmente para todos, já pairam dúvidas sobre as investigações. É difícil entender, por exemplo, por que um carro envolvido em uma morte está na casa de Thor, o investigado – e não nas dependências da polícia. Depois da perícia feita no local, o carro foi liberado. As demais diligências seriam feitas na mansão do Jardim Botânico. “No dia seguinte, meu advogado me informou que havia sido feita a perícia do carro no local do acidente, e que o carro teria sido liberado pela PRF para que pudéssemos trazê-lo para casa, garantindo deixá-lo intacto”, afirmou Thor.
Segundo o próprio Thor relata na conta no twitter que criou para dar sua versão dos fatos, ele primeiro foi para casa, onde seria atendido pelo médico da família, e só depois, por iniciativa própria, foi a um posto da Polícia Rodoviária Federal próximo ao local do acidente para se submeter ao bafômetro e demais procedimentos exigidos em um caso de atropelamento com vítima fatal. O exame deu negativo para a presença de álcool, ao contrário do resultado de Wanderson, que revelou um índice elevado de álcool no sangue.
Se Thor não fugiu do local – o que não é um ato louvável, como seu pai quer convencer a opinião pública que é, mas uma obrigação –, por que a polícia não fez o que devia fazer, na hora em que devia fazer, por sua própria iniciativa? A conta de Thor no twitter é esta: @Thor631. Nela, é narrada sua versão da cronologia dos fatos. Pensado para defendê-lo e escrito com método, o relato revela mais do que gostaria.
É uma pena que as partes nebulosas darão, mais uma vez, algum grau de legitimidade às dúvidas sobre a lisura do inquérito policial, mesmo depois da sua conclusão – ou de seu arquivamento. Para o futuro em aberto de Thor, pelo futuro interrompido de Wanderson e para o Brasil, um país partido pela impunidade dos poderosos, seria fundamental que a polícia e o Estado demonstrassem total correção e transparência ao investigar uma morte que envolve o filho do homem mais rico da nação.
A condenação prévia de Thor nas redes sociais e nas conversas de bar deve-se não apenas à raiva que parte da população teria dos ricos e poderosos, ou à tendência de se colocar ao lado dos mais fracos, mas também à percepção legítima de que os atos criminosos dos ricos e poderosos permanecem impunes.
A pressa em acusar e condenar Thor não demonstra apenas histeria ou irresponsabilidade das “massas”, ou mesmo “inveja”, como chegou a ser dito, mas a ansiedade de fazer uma justiça que temem, com todas as razões históricas e objetivas para isso, que não seja feita por quem tem o dever constitucional de fazê-la. Seria, nesse sentido, uma espécie de antecipação e compensação pela justiça que não acreditam que aconteça. E aqui me limito a analisar o fenômeno – e não a defendê-lo.
Quem é Thor, o filho de Eike Batista? Seu perfil é fascinante e quase obrigatório para compreender o Brasil atual. Basta procurar no Google para encontrar pelo menos uma matéria exemplar sobre sua vida, seus hábitos e seus pensamentos. Aqui, vou me deter apenas em quem é Thor como motorista. Em seu prontuário no Detran constam 51 pontos e 11 multas, parte delas causada por excesso de velocidade. Thor deveria ter perdido a carteira de habilitação por isso, mas não a perdeu. Se a tivesse perdido, como determina a lei, talvez não estivesse dirigindo na noite daquele sábado, e Wanderson possivelmente não estaria morto. Thor ama carros, velocidade e potência. Como declarou em uma entrevista anterior ao acidente, ele já teve um Aston Martin: “Trouxe de São Paulo e fiz 280 quilômetros por hora na Dutra”.
Segundo o colunista Ancelmo Gois, do jornal O Globo, em 27 de maio de 2011, a bordo de um Audi placa EBX 0001, Thor atropelou um homem de 86 anos, também em uma bicicleta, na Barra da Tijuca, no Rio. Thor prestou socorro, e sua família pagou todas as despesas médicas. A vítima fraturou o acetábulo (parte da bacia onde a cabeça do fêmur se encaixa) e teve de colocar duas placas e cinco parafusos, além de se submeter à fisioterapia, à hidroterapia e a sessões com psicólogo para superar o trauma. Em entrevista à coluna de Ancelmo Gois, um dos filhos da vítima afirmou não ter registrado queixa nem pedido indenização: “Estávamos preocupados em salvar nosso pai, que também não queria confusão”.
No dia seguinte à publicação, a vítima, José Griner, hoje com 87 anos, manifestou-se através de uma nota na qual afirma que nem ele nem Thor tiveram culpa: “Houve uma colisão que envolveu a lateral do carro dele e a roda dianteira da minha bicicleta”. Disse mais: “Ele agiu com lisura e deu suporte à minha recuperação”. Que tudo isso nos faz pensar na excelência do “gerenciamento de crise”, faz. Mas o que podemos afirmar é que, em menos de um ano, Thor exibe uma estatística incomum como motorista: atropelou dois ciclistas. Um sobreviveu, o outro não.
Qual é o papel de um pai em um momento crucial como este? Não há resposta fácil para isso, mas há muitas perguntas que podem ser feitas. E essas perguntas são pertinentes porque a defesa imediata e veemente que Eike Batista fez publicamente do filho ilustram bem o que hoje se acredita ser o papel de um pai.
Um pai – ou um superpai – seria aquele que defende o filho contra tudo e contra todos, tenha ele ou não razão – e mesmo que ele já tenha 20 anos e seja moral e legalmente responsável por seus atos. Um pai – ou um superpai – afirma a inocência do filho e usa todos os recursos para convencer a opinião pública dela, mesmo que ele não possa garanti-la, já que ninguém ainda pode. Um pai – ou um superpai – usará todos os meios de que dispõe para impedir que o filho seja punido, mesmo se for provado que ele merece a punição.
Pelo comportamento público de Eike Batista, me parece que ele acredita com sinceridade que esta é a função de um bom pai – ou mesmo de um superpai, já que, pelo que tem demonstrado em sua trajetória de vida, ele não aceitaria nada menos do que ser um supertudo. No twitter, ele assim definiu seu desempenho: “Vou defender como um Leão! Tenho certeza que todo Pai que ama seu Filho faria o mesmo!”. É interessante observar as palavras escolhidas por ele para colocar em maiúsculas.
O cotidiano mostra que Eike Batista está longe de estar sozinho em sua crença sobre a educação de um filho – e a postura de um pai. Tenho certeza de que muitos leitores aqui compartilham da visão de Eike sobre a paternidade e acham sua defesa e suas ações dignas dos maiores elogios – e fariam o mesmo pelos seus filhos se tivessem a infelicidade de se encontrar em situação semelhante. Esses mesmos leitores afirmariam que isso é prova de amor verdadeiro – que só um superpai pode dar.
Será?
Tenho dúvidas. E me arrisco a discordar não só como mãe, mas como cidadã que tem de conviver com os filhos desses pais em todas as esferas da sociedade. Já havia me surpreendido com a atitude da mãe do menino que, em fevereiro, atropelou e matou com um jet ski Grazielly Lames, de 3 anos, que construía castelos de areia na praia de Bertioga, no litoral paulista. Segundo o advogado da família, o adolescente de 13 anos correu para a casa em que estavam hospedados em busca de orientação da mãe. Em vez de voltar e prestar socorro, junto com o filho menor de idade, dando o exemplo do que uma pessoa decente deve fazer, a mãe preferiu fugir com o garoto. A tese da defesa é a de que o adolescente não dirigia o jet ski, “apenas” o ligara. Ou seja, o menino não teria nenhuma responsabilidade e, se tudo der certo do ponto de vista do que os pais desse menino entendem por dar certo, seu filho não será punido pelo fim da vida de uma criança.
Os casos guardam diferenças. Mas também semelhanças. Tanto para a mãe do adolescente do jet ski, quanto para o pai de Thor, a proteção de filhos que podem ser responsáveis pelo fim de uma vida parece ser uma preocupação acima de todas as outras. Ambos já decretaram previamente a inocência dos respectivos filhos antes que ela fosse provada. Pode ser que a inocência seja mesmo provada, em um ou em ambos os casos, mas nenhum deles poderia tê-la garantido antes de a investigação ser concluída.
Vivemos numa época em que se acredita que, ao dar limite para um filho, estamos comprometendo seu projeto de felicidade. E o que é entendido como felicidade? Ter tudo, ter gozo ilimitado. Qualquer imprevisto nesse percurso deve ser apagado, custe o que custar, para não virar trauma – e, assim, comprometer o futuro do filho, que deve passar pela vida sem ser marcado pela vida. Deve fazer marca na história, mas não ser marcado por ela. Neste cálculo, não são admitidos erros, covardias, irresponsabilidades, deslizes, excessos.... máculas.
Na biografia futura de Thor Batista, que, como seu pai já disse, espera-se que supere a sua em feitos, as máculas devem ser apagadas. Se existirem máculas, é necessário “ligar o dispositivo de administração de crise” – e eliminá-las da linha do tempo. Se alguém errou, foi sempre o outro. Para ter certeza disso não é preciso nem apurar os fatos: o filho de um superpai é automática e previamente inocente. E não acho que essa mentalidade pertence apenas aos mais ricos, apenas que eles têm recursos para garantir essa inocência – e os mais pobres, raramente.
É legítimo fazer algumas perguntas – que podem ser propostas tanto para Eike Batista como para nós mesmos. Se seu filho já atropelou uma pessoa, será que o melhor é emprestar a ele um dos carros mais velozes do mundo? Se seu filho tem 11 multas e 51 pontos na carteira de habilitação, será que você deveria permitir que ele dirigisse o seu carro, mesmo que o Detran não tenha cumprido seu dever e suspendido a licença? Se seu filho atropelou alguém e essa pessoa morreu, não seria o caso de silenciar até que os fatos fossem esclarecidos, ainda que fosse por respeito à enormidade do que é a morte de um ser humano? O que cada um de nós faria nessa situação? E por quê?
Acho que é uma situação muito dura para qualquer pai – ou mãe. É duro dizer a um filho que ele errou. Em qualquer escala – e muito mais em uma escala dessa envergadura. É duríssimo. Mas é necessário. Não é fácil ser pai ou mãe exatamente porque a educação se dá nas escolhas difíceis. Educar é, em grande parte, ensinar aos filhos que eles são responsáveis pelos seus atos, dos mais simples aos mais complexos – e devem responder por eles. Mesmo que tudo o que gostaríamos, como pais amorosos, fosse voltar no tempo e apagar o passado.
Penso que um pai ou uma mãe deve se colocar ao lado do filho não para absolvê-lo, mas para apoiá-lo enquanto ele assume as consequências dos seus atos. Você errou, vai responder por seus erros, e eu vou estar ao seu lado. Ou: não sabemos se você errou, então vamos aguardar a apuração dos fatos. Se for concluído que você não errou, ótimo, mas mesmo assim uma pessoa morreu e é preciso lidar com essa tragédia. Ou: se for concluído que você errou, você vai responder pelos seus erros como a lei determina e um cidadão decente deve fazer, e eu vou ajudá-lo a seguir em frente apesar e a partir disso, aprendendo com a tragédia e não a esquecendo.
A revolta da opinião pública levou a muitas ironias – entre elas, as com o nome de Thor, o deus nórdico do trovão. Eike Batista seria uma versão contemporânea de Odin, o pai de Thor na mitologia, já que em nossa época é o dinheiro que concede algo próximo a uma divindade terrena. Nesse sentido, é curioso lembrar que nas histórias em quadrinhos inspiradas na mitologia nórdica, Odin expulsou Thor de Asgard. Thor, então um jovem arrogante e impulsivo, em uma de suas aventuras adolescentes invadira o reino dos gigantes de gelo, rompendo o tratado selado por Odin. A honra do pai e sua autoridade entre os deuses dependiam de punir exemplarmente o filho, que com suas ações havia prejudicado a todos e comprometido a segurança de Asgard.
Thor foi enviado para a Terra – um exílio que significava punição e aprendizado. Ao expulsar Thor, Odin disse a ele: “Tu és o filho favorito de Odin! Além de valente e nobre, tua alma é imaculada! Mas ainda assim és incompleto! Não tens humildade! Para consegui-la deverás conhecer a fraqueza… sentir dor! E para isso necessitas deixar o Reino Dourado e despir-te de tua aparência divina! A Terra, lá aprenderás que ninguém pode ser verdadeiramente forte se, em realidade, não for humilde! Por um tempo não mais serás o Deus do Trovão! A tua memória também tirarei! Agora, vai! Uma nova vida te espera!". Thor transformou-se então em um mortal chamado Donald Blake, médico talentoso mas manco. Até que aprendesse o dom da humildade e estivesse apto a cumprir seu destino.
Por que vale a pena lembrar esse episódio? Porque este é o Thor de Stan Lee, o grande criador da Marvel Comics. E Stan Lee é um homem nascido em 1922, que criou o seu deus do trovão no início da década de 60. Ao tecer o enredo, Lee revela a mentalidade da sua época. E nos mostra como a paternidade – e o que se compreendia como amor e como obrigação de um pai – já foi diferente. Nos lembra, portanto, que a construção da paternidade é cultural. E, portanto, mutante.
Acredito valer a pena pensar sobre o que é ser pai hoje. E que tipo de consequências essa ideia de paternidade, tão bem ilustrada na relação de Eike Batista com seu Thor da vida real, acarreta para a sociedade como um todo. Este episódio nos leva a várias vertentes de reflexão – e uma das mais interessantes é a nossa relação com os limites na educação de um filho.
Tenho muito cuidado em tocar em assuntos que envolvem tanta dor. Acho que testemunhar a morte de um ser humano – sendo ou não responsável por ela – é uma experiência devastadora, que deixa marcas profundas, para além da punição legal. Mesmo atropelar um homem de 80 anos e machucá-lo deve ser terrível. Não sei como é estar na pele de Thor. Tentei descobrir pelo twitter como ele se sentia em sua humanidade.
Primeiro, percebi que Thor estava mais preocupado em garantir sua inocência, provar a culpa do morto e nos convencer da correção de seus atos, assegurando também o apoio material à família da vítima. Depois, na sexta-feira, 23/3, descobri que já tinha mudado de assunto. Thor estava dando a fãs no twitter o que chamou de “dica de endocrinologia do dia”: “Eu recomendo o uso da cabergolina (Dostinex) para baixar a prolactina. Comece com 0,25 mg por semana, por 4 semanas, e dose no sangue”, é um dos tuites. Na sexta-feira, copiei toda a página, como material de pesquisa para esta coluna. Pouco antes de publicá-la, voltei a entrar na sua conta de twitter e constatei que o post reproduzido acima havia sido apagado. Os demais permanecem lá.
Depois de prescrever uma receita que só um médico poderia, sugerindo inclusive a dose, para seus milhares de seguidores, imagino que alguém o tenha alertado que a postagem era irresponsável e indevida. Thor então escreveu: “Meus comentários sobre endocrinologia são inúteis. Não sou médico, não posso recomendar nada. Apenas gosto de botar para fora conhecimento”.
Em todo o episódio – trágico de várias maneiras, e de algumas outras que ainda vamos testemunhar – me chamou a atenção – positivamente – o silêncio de Luma de Oliveira, a mãe de Thor. Justamente ela, a celebridade, a ex-modelo, a musa do Carnaval, aquela que tudo expôs de si mesma. Procurada por repórteres, Luma pouco falou. Disse ao jornal O Globo, na sexta-feira 23/3: “Este não é o momento de dar entrevista. É o momento de sentimentos, de solidariedade”. Posso estar sendo ingênua, e a sobriedade de Luma seja apenas mais um cálculo, mas penso que a mãe de Thor estava sendo sincera.
Thor afirmou no twitter: “A frase que mais admiro é ‘The truth sets you free’. Author: Jesus”. Imagino que a original tenha sido pronunciada em aramaico, mas a tradução da frase postada por Thor seria: “A verdade vos liberta”. É possível. Mas talvez pai e filho um dia descubram, ainda que em seus pesadelos noturnos, naqueles que não se pode controlar mesmo sendo um superpai ou um superfilho, que a verdade é uma criatura complexa e que pode levar a territórios imprevisíveis. Ela pode libertar, sim – mas dificilmente sem dor. E dificilmente sem um profundo e corajoso olhar para dentro.
26 de março de 2012
Eliane Brum
Na noite de sábado, 17/3, Thor Batista, 20 anos, atropelou Wanderson Pereira dos Santos, 30 anos, na rodovia Washington Luís, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. Wanderson morreu na hora. De imediato, Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, passou a defender o filho de todas as maneiras – e também no microblog twitter. Com tanta veemência que o humorista Tutty Vasques comentou em sua coluna no Estadão, de 21/3:
“Não satisfeito com o lugar de destaque que ocupa na mídia como o homem mais rico do Brasil, o insaciável Eike Batista tem se esforçado um bocado para virar capa de revista como o Pai do Ano em 2012”.
A observação é aguda, como costuma ser o humor de qualidade. E é algo que vale a pena pensar: ao defender o filho com os melhores advogados, com assessores de imprensa e com seu próprio discurso público, Eike Batista é mesmo um superpai?
O que se espera hoje de um pai, afinal?
Ainda que a maioria tenha acompanhado o noticiário, é importante recordar os principais capítulos e seus protagonistas, antes de seguirmos adiante. Assim como é importante fazer algumas perguntas óbvias sobre a investigação.
Thor é o mais próximo de um príncipe herdeiro que o Brasil atual pode ter: filho do homem mais rico do Brasil e da eterna musa do Carnaval. Como disse Eike Batista (@eikebatista) no twitter: “A mídia e todos vão já já perceber que o Rio tem um Príncipe Harry! O Thor”. Wanderson era ajudante de caminhoneiro e filho de criação de Maria Vicentina Pereira. Thor foi batizado com o nome de um deus nórdico. Ninguém se preocupou em perguntar qual é a origem do nome de Wanderson na mitologia familiar, mas com certeza existe uma história, sempre existe. Thor dirigia um Mercedes SLR McLaren, o mesmo que costumava ser exibido como obra de arte na sala da mansão de sua família. Wanderson, uma bicicleta. Na BR-040, Thor e Wanderson encontraram-se não apenas como dois brasileiros, mas como dois Brasis que raramente se encontrariam de outro modo.
A vontade de condenar Thor, em um país tão desigual como o nosso, sempre pródigo em presentear os mais ricos com a impunidade, é imediata. É necessário, porém, resistir a ela. Ninguém pode ser condenado sem julgamento, sob hipótese alguma. Da mesma forma, pelos mesmos critérios e também pela sobriedade que a morte de uma pessoa exige, Eike Batista deveria ter resistido a condenar Wanderson.
Em suas afirmações na imprensa e no twitter, o pai de Thor apressou-se em culpar o morto pela própria morte. E afirmou que Wanderson poderia ter matado não só a si mesmo, como também seu filho e o amigo que o acompanhava – o que é altamente improvável. Segundo pesquisa citada pela jornalista Maria Paola de Salvo, no Blog do Sakamoto, apenas 0,3% dos motoristas envolvidos em atropelamento com vítima fatal morrem.
Enquanto as investigações não forem concluídas, nenhum de nós – e muito menos Eike – tem o direito de condenar alguém. Até agora, ninguém – nem mesmo Eike – pode afirmar se a morte de Wanderson foi fatalidade ou homicídio. Até agora, ninguém – nem mesmo Eike – pode declarar se a morte de Wanderson é responsabilidade exclusiva da vítima, é responsabilidade exclusiva de Thor ou é responsabilidade de ambos.
Infelizmente para todos, já pairam dúvidas sobre as investigações. É difícil entender, por exemplo, por que um carro envolvido em uma morte está na casa de Thor, o investigado – e não nas dependências da polícia. Depois da perícia feita no local, o carro foi liberado. As demais diligências seriam feitas na mansão do Jardim Botânico. “No dia seguinte, meu advogado me informou que havia sido feita a perícia do carro no local do acidente, e que o carro teria sido liberado pela PRF para que pudéssemos trazê-lo para casa, garantindo deixá-lo intacto”, afirmou Thor.
Segundo o próprio Thor relata na conta no twitter que criou para dar sua versão dos fatos, ele primeiro foi para casa, onde seria atendido pelo médico da família, e só depois, por iniciativa própria, foi a um posto da Polícia Rodoviária Federal próximo ao local do acidente para se submeter ao bafômetro e demais procedimentos exigidos em um caso de atropelamento com vítima fatal. O exame deu negativo para a presença de álcool, ao contrário do resultado de Wanderson, que revelou um índice elevado de álcool no sangue.
Se Thor não fugiu do local – o que não é um ato louvável, como seu pai quer convencer a opinião pública que é, mas uma obrigação –, por que a polícia não fez o que devia fazer, na hora em que devia fazer, por sua própria iniciativa? A conta de Thor no twitter é esta: @Thor631. Nela, é narrada sua versão da cronologia dos fatos. Pensado para defendê-lo e escrito com método, o relato revela mais do que gostaria.
É uma pena que as partes nebulosas darão, mais uma vez, algum grau de legitimidade às dúvidas sobre a lisura do inquérito policial, mesmo depois da sua conclusão – ou de seu arquivamento. Para o futuro em aberto de Thor, pelo futuro interrompido de Wanderson e para o Brasil, um país partido pela impunidade dos poderosos, seria fundamental que a polícia e o Estado demonstrassem total correção e transparência ao investigar uma morte que envolve o filho do homem mais rico da nação.
A condenação prévia de Thor nas redes sociais e nas conversas de bar deve-se não apenas à raiva que parte da população teria dos ricos e poderosos, ou à tendência de se colocar ao lado dos mais fracos, mas também à percepção legítima de que os atos criminosos dos ricos e poderosos permanecem impunes.
A pressa em acusar e condenar Thor não demonstra apenas histeria ou irresponsabilidade das “massas”, ou mesmo “inveja”, como chegou a ser dito, mas a ansiedade de fazer uma justiça que temem, com todas as razões históricas e objetivas para isso, que não seja feita por quem tem o dever constitucional de fazê-la. Seria, nesse sentido, uma espécie de antecipação e compensação pela justiça que não acreditam que aconteça. E aqui me limito a analisar o fenômeno – e não a defendê-lo.
Quem é Thor, o filho de Eike Batista? Seu perfil é fascinante e quase obrigatório para compreender o Brasil atual. Basta procurar no Google para encontrar pelo menos uma matéria exemplar sobre sua vida, seus hábitos e seus pensamentos. Aqui, vou me deter apenas em quem é Thor como motorista. Em seu prontuário no Detran constam 51 pontos e 11 multas, parte delas causada por excesso de velocidade. Thor deveria ter perdido a carteira de habilitação por isso, mas não a perdeu. Se a tivesse perdido, como determina a lei, talvez não estivesse dirigindo na noite daquele sábado, e Wanderson possivelmente não estaria morto. Thor ama carros, velocidade e potência. Como declarou em uma entrevista anterior ao acidente, ele já teve um Aston Martin: “Trouxe de São Paulo e fiz 280 quilômetros por hora na Dutra”.
Segundo o colunista Ancelmo Gois, do jornal O Globo, em 27 de maio de 2011, a bordo de um Audi placa EBX 0001, Thor atropelou um homem de 86 anos, também em uma bicicleta, na Barra da Tijuca, no Rio. Thor prestou socorro, e sua família pagou todas as despesas médicas. A vítima fraturou o acetábulo (parte da bacia onde a cabeça do fêmur se encaixa) e teve de colocar duas placas e cinco parafusos, além de se submeter à fisioterapia, à hidroterapia e a sessões com psicólogo para superar o trauma. Em entrevista à coluna de Ancelmo Gois, um dos filhos da vítima afirmou não ter registrado queixa nem pedido indenização: “Estávamos preocupados em salvar nosso pai, que também não queria confusão”.
No dia seguinte à publicação, a vítima, José Griner, hoje com 87 anos, manifestou-se através de uma nota na qual afirma que nem ele nem Thor tiveram culpa: “Houve uma colisão que envolveu a lateral do carro dele e a roda dianteira da minha bicicleta”. Disse mais: “Ele agiu com lisura e deu suporte à minha recuperação”. Que tudo isso nos faz pensar na excelência do “gerenciamento de crise”, faz. Mas o que podemos afirmar é que, em menos de um ano, Thor exibe uma estatística incomum como motorista: atropelou dois ciclistas. Um sobreviveu, o outro não.
Qual é o papel de um pai em um momento crucial como este? Não há resposta fácil para isso, mas há muitas perguntas que podem ser feitas. E essas perguntas são pertinentes porque a defesa imediata e veemente que Eike Batista fez publicamente do filho ilustram bem o que hoje se acredita ser o papel de um pai.
Um pai – ou um superpai – seria aquele que defende o filho contra tudo e contra todos, tenha ele ou não razão – e mesmo que ele já tenha 20 anos e seja moral e legalmente responsável por seus atos. Um pai – ou um superpai – afirma a inocência do filho e usa todos os recursos para convencer a opinião pública dela, mesmo que ele não possa garanti-la, já que ninguém ainda pode. Um pai – ou um superpai – usará todos os meios de que dispõe para impedir que o filho seja punido, mesmo se for provado que ele merece a punição.
Pelo comportamento público de Eike Batista, me parece que ele acredita com sinceridade que esta é a função de um bom pai – ou mesmo de um superpai, já que, pelo que tem demonstrado em sua trajetória de vida, ele não aceitaria nada menos do que ser um supertudo. No twitter, ele assim definiu seu desempenho: “Vou defender como um Leão! Tenho certeza que todo Pai que ama seu Filho faria o mesmo!”. É interessante observar as palavras escolhidas por ele para colocar em maiúsculas.
O cotidiano mostra que Eike Batista está longe de estar sozinho em sua crença sobre a educação de um filho – e a postura de um pai. Tenho certeza de que muitos leitores aqui compartilham da visão de Eike sobre a paternidade e acham sua defesa e suas ações dignas dos maiores elogios – e fariam o mesmo pelos seus filhos se tivessem a infelicidade de se encontrar em situação semelhante. Esses mesmos leitores afirmariam que isso é prova de amor verdadeiro – que só um superpai pode dar.
Será?
Tenho dúvidas. E me arrisco a discordar não só como mãe, mas como cidadã que tem de conviver com os filhos desses pais em todas as esferas da sociedade. Já havia me surpreendido com a atitude da mãe do menino que, em fevereiro, atropelou e matou com um jet ski Grazielly Lames, de 3 anos, que construía castelos de areia na praia de Bertioga, no litoral paulista. Segundo o advogado da família, o adolescente de 13 anos correu para a casa em que estavam hospedados em busca de orientação da mãe. Em vez de voltar e prestar socorro, junto com o filho menor de idade, dando o exemplo do que uma pessoa decente deve fazer, a mãe preferiu fugir com o garoto. A tese da defesa é a de que o adolescente não dirigia o jet ski, “apenas” o ligara. Ou seja, o menino não teria nenhuma responsabilidade e, se tudo der certo do ponto de vista do que os pais desse menino entendem por dar certo, seu filho não será punido pelo fim da vida de uma criança.
Os casos guardam diferenças. Mas também semelhanças. Tanto para a mãe do adolescente do jet ski, quanto para o pai de Thor, a proteção de filhos que podem ser responsáveis pelo fim de uma vida parece ser uma preocupação acima de todas as outras. Ambos já decretaram previamente a inocência dos respectivos filhos antes que ela fosse provada. Pode ser que a inocência seja mesmo provada, em um ou em ambos os casos, mas nenhum deles poderia tê-la garantido antes de a investigação ser concluída.
Vivemos numa época em que se acredita que, ao dar limite para um filho, estamos comprometendo seu projeto de felicidade. E o que é entendido como felicidade? Ter tudo, ter gozo ilimitado. Qualquer imprevisto nesse percurso deve ser apagado, custe o que custar, para não virar trauma – e, assim, comprometer o futuro do filho, que deve passar pela vida sem ser marcado pela vida. Deve fazer marca na história, mas não ser marcado por ela. Neste cálculo, não são admitidos erros, covardias, irresponsabilidades, deslizes, excessos.... máculas.
Na biografia futura de Thor Batista, que, como seu pai já disse, espera-se que supere a sua em feitos, as máculas devem ser apagadas. Se existirem máculas, é necessário “ligar o dispositivo de administração de crise” – e eliminá-las da linha do tempo. Se alguém errou, foi sempre o outro. Para ter certeza disso não é preciso nem apurar os fatos: o filho de um superpai é automática e previamente inocente. E não acho que essa mentalidade pertence apenas aos mais ricos, apenas que eles têm recursos para garantir essa inocência – e os mais pobres, raramente.
É legítimo fazer algumas perguntas – que podem ser propostas tanto para Eike Batista como para nós mesmos. Se seu filho já atropelou uma pessoa, será que o melhor é emprestar a ele um dos carros mais velozes do mundo? Se seu filho tem 11 multas e 51 pontos na carteira de habilitação, será que você deveria permitir que ele dirigisse o seu carro, mesmo que o Detran não tenha cumprido seu dever e suspendido a licença? Se seu filho atropelou alguém e essa pessoa morreu, não seria o caso de silenciar até que os fatos fossem esclarecidos, ainda que fosse por respeito à enormidade do que é a morte de um ser humano? O que cada um de nós faria nessa situação? E por quê?
Acho que é uma situação muito dura para qualquer pai – ou mãe. É duro dizer a um filho que ele errou. Em qualquer escala – e muito mais em uma escala dessa envergadura. É duríssimo. Mas é necessário. Não é fácil ser pai ou mãe exatamente porque a educação se dá nas escolhas difíceis. Educar é, em grande parte, ensinar aos filhos que eles são responsáveis pelos seus atos, dos mais simples aos mais complexos – e devem responder por eles. Mesmo que tudo o que gostaríamos, como pais amorosos, fosse voltar no tempo e apagar o passado.
Penso que um pai ou uma mãe deve se colocar ao lado do filho não para absolvê-lo, mas para apoiá-lo enquanto ele assume as consequências dos seus atos. Você errou, vai responder por seus erros, e eu vou estar ao seu lado. Ou: não sabemos se você errou, então vamos aguardar a apuração dos fatos. Se for concluído que você não errou, ótimo, mas mesmo assim uma pessoa morreu e é preciso lidar com essa tragédia. Ou: se for concluído que você errou, você vai responder pelos seus erros como a lei determina e um cidadão decente deve fazer, e eu vou ajudá-lo a seguir em frente apesar e a partir disso, aprendendo com a tragédia e não a esquecendo.
A revolta da opinião pública levou a muitas ironias – entre elas, as com o nome de Thor, o deus nórdico do trovão. Eike Batista seria uma versão contemporânea de Odin, o pai de Thor na mitologia, já que em nossa época é o dinheiro que concede algo próximo a uma divindade terrena. Nesse sentido, é curioso lembrar que nas histórias em quadrinhos inspiradas na mitologia nórdica, Odin expulsou Thor de Asgard. Thor, então um jovem arrogante e impulsivo, em uma de suas aventuras adolescentes invadira o reino dos gigantes de gelo, rompendo o tratado selado por Odin. A honra do pai e sua autoridade entre os deuses dependiam de punir exemplarmente o filho, que com suas ações havia prejudicado a todos e comprometido a segurança de Asgard.
Thor foi enviado para a Terra – um exílio que significava punição e aprendizado. Ao expulsar Thor, Odin disse a ele: “Tu és o filho favorito de Odin! Além de valente e nobre, tua alma é imaculada! Mas ainda assim és incompleto! Não tens humildade! Para consegui-la deverás conhecer a fraqueza… sentir dor! E para isso necessitas deixar o Reino Dourado e despir-te de tua aparência divina! A Terra, lá aprenderás que ninguém pode ser verdadeiramente forte se, em realidade, não for humilde! Por um tempo não mais serás o Deus do Trovão! A tua memória também tirarei! Agora, vai! Uma nova vida te espera!". Thor transformou-se então em um mortal chamado Donald Blake, médico talentoso mas manco. Até que aprendesse o dom da humildade e estivesse apto a cumprir seu destino.
Por que vale a pena lembrar esse episódio? Porque este é o Thor de Stan Lee, o grande criador da Marvel Comics. E Stan Lee é um homem nascido em 1922, que criou o seu deus do trovão no início da década de 60. Ao tecer o enredo, Lee revela a mentalidade da sua época. E nos mostra como a paternidade – e o que se compreendia como amor e como obrigação de um pai – já foi diferente. Nos lembra, portanto, que a construção da paternidade é cultural. E, portanto, mutante.
Acredito valer a pena pensar sobre o que é ser pai hoje. E que tipo de consequências essa ideia de paternidade, tão bem ilustrada na relação de Eike Batista com seu Thor da vida real, acarreta para a sociedade como um todo. Este episódio nos leva a várias vertentes de reflexão – e uma das mais interessantes é a nossa relação com os limites na educação de um filho.
Tenho muito cuidado em tocar em assuntos que envolvem tanta dor. Acho que testemunhar a morte de um ser humano – sendo ou não responsável por ela – é uma experiência devastadora, que deixa marcas profundas, para além da punição legal. Mesmo atropelar um homem de 80 anos e machucá-lo deve ser terrível. Não sei como é estar na pele de Thor. Tentei descobrir pelo twitter como ele se sentia em sua humanidade.
Primeiro, percebi que Thor estava mais preocupado em garantir sua inocência, provar a culpa do morto e nos convencer da correção de seus atos, assegurando também o apoio material à família da vítima. Depois, na sexta-feira, 23/3, descobri que já tinha mudado de assunto. Thor estava dando a fãs no twitter o que chamou de “dica de endocrinologia do dia”: “Eu recomendo o uso da cabergolina (Dostinex) para baixar a prolactina. Comece com 0,25 mg por semana, por 4 semanas, e dose no sangue”, é um dos tuites. Na sexta-feira, copiei toda a página, como material de pesquisa para esta coluna. Pouco antes de publicá-la, voltei a entrar na sua conta de twitter e constatei que o post reproduzido acima havia sido apagado. Os demais permanecem lá.
Depois de prescrever uma receita que só um médico poderia, sugerindo inclusive a dose, para seus milhares de seguidores, imagino que alguém o tenha alertado que a postagem era irresponsável e indevida. Thor então escreveu: “Meus comentários sobre endocrinologia são inúteis. Não sou médico, não posso recomendar nada. Apenas gosto de botar para fora conhecimento”.
Em todo o episódio – trágico de várias maneiras, e de algumas outras que ainda vamos testemunhar – me chamou a atenção – positivamente – o silêncio de Luma de Oliveira, a mãe de Thor. Justamente ela, a celebridade, a ex-modelo, a musa do Carnaval, aquela que tudo expôs de si mesma. Procurada por repórteres, Luma pouco falou. Disse ao jornal O Globo, na sexta-feira 23/3: “Este não é o momento de dar entrevista. É o momento de sentimentos, de solidariedade”. Posso estar sendo ingênua, e a sobriedade de Luma seja apenas mais um cálculo, mas penso que a mãe de Thor estava sendo sincera.
Thor afirmou no twitter: “A frase que mais admiro é ‘The truth sets you free’. Author: Jesus”. Imagino que a original tenha sido pronunciada em aramaico, mas a tradução da frase postada por Thor seria: “A verdade vos liberta”. É possível. Mas talvez pai e filho um dia descubram, ainda que em seus pesadelos noturnos, naqueles que não se pode controlar mesmo sendo um superpai ou um superfilho, que a verdade é uma criatura complexa e que pode levar a territórios imprevisíveis. Ela pode libertar, sim – mas dificilmente sem dor. E dificilmente sem um profundo e corajoso olhar para dentro.
26 de março de 2012
Eliane Brum
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