"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

DO SANATÓRIO GERAL

Magro Velho em ação

“Não houve desabastecimento, não haverá agora e esperamos que jamais haja desabastecimento de energia nesse País. A reunião que agora fizemos reiterou a tranquilidade de que o País possui estoque de energia firme, segura e em condições de atender a todas as nossas necessidades”.


Edison Lobão, ministro de Minas e Energia, nesta quarta-feira, revelando em dilmês vigário que aprendeu a despejar falatórios intermináveis sobre o apagão sem chamar uma única vez de apagão a criatura que Lula pariu, Dilma Rousseff amamenta e hoje tem como babá o maranhense que os comparsas do bando do Sarney preferem chamar de “Magro Velho”.

10 de janeiro de 2013
Augusto Nunes

"SEM FANTASIA"


Rosemary Póvoa de Noronha deve comparecer em breve à Justiça, em São Paulo. Será uma tremenda oportunidade para que a população saiba quem é a moça, o que fez de verdade, quais suas credenciais; porque os meios de comunicação, mesmo sabendo do potencial de fofoca do caso, o que costuma mobilizá-los, não conseguiram mostrar muita coisa de novo.

O que apareceu, no fundo, foi a apuração da Polícia Federal (isso vale também para as notícias a respeito da influência de Rose em indicações para o Governo Federal). Os meios de comunicação mergulharam na parte de fofoca, alguns chegando perto de dizer o que tentavam, outros ficando um pouco mais longe; em outras palavras, cansaram de divulgar insinuações.
Ninguém teve informações precisas para dizer, com todas as letras, a fonte real, a seu ver, da força demonstrada por Rose Noronha. Pode ter sido uma questão de gentileza, de tentar evitar a exposição da vida pessoal do ex-presidente Lula; mas, nesse caso, ficar nas insinuações não alivia nada. Expuseram sua vida pessoal do mesmo jeito, mas não tiveram a coragem – ou a informação suficiente – para colocar as cartas na mesa.

O problema, imagina este colunista, está na própria natureza humana. Se, ficando num bar simpático, bebericando e tomando uns petisquinhos, aguardando ser chamado por autoridades amigas que lhe fornecerão informações oficiais, dá para escrever a reportagem, por que andar neste calor infernal, gastar a sola dos sapatos, procurar vizinhos e amigos, verificar até que ponto o padrão de vida que Rose leva é compatível com seus salários? Só para ter informações exclusivas para quem, em última análise, paga seu salário? Trabalhar cansa!

O papel aceita tudo

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tem duas sortes na vida:

1 – Dispõe, como colega de Ministério, do ministro Guido Mantega, que capricha tanto nas manipulações que a imprensa só presta atenção nele;

2 – Lida com uma imprensa tão boazinha que não se incomoda com as batatadas de Sua Excelência ─ e José Eduardo Cardozo, sem dúvida, está caprichando.

Cardozo teve a audácia de dizer que a queda de assassínios em Alagoas fez com que os índices do Estado ficassem iguais aos da Suíça. A coisa é tão absurda que até a nossa imprensa, tão amiga dos governos, tão chegada a transcrever o que ouve sem verificar as informações, deveria ter feito alguma investigação, por mais cansativo que isso seja. Mas só um jornalista, Cláudio Humberto, que publica diariamente o blog www.claudiohumberto.com.br, resolveu ir buscar os números.

Vamos a eles: na Suíça, há 52 assassínios por ano, ou 0,7 por 100 mil habitantes. Em Alagoas, a média é de 64,5 assassínios por 100 mil habitantes.

Cláudio Humberto só comete uma falha em sua nota: diz que Cardozo deve pensar que na Suíça há 52 mil assassínios por ano. Negativo: as palavras “José Eduardo Cardozo” e “pensar” não devem ser usadas na mesma frase.

A banalização da morte

Chacina em São Paulo, com sete mortos e dois feridos, no dia 4. Como os jornais dão a notícia: “primeira chacina do ano”. Parte-se do princípio (provavelmente correto) de que muitas outras se seguirão, dada a caótica situação da segurança pública no Estado. Mas não se pode esquecer que:

1 ─ A imprensa quase inteira apoiou a desastrosa gestão da segurança pública no Governo Alckmin, que incluiu o desmonte da Polícia Civil a pretexto de “eliminar a banda podre” e deu à Polícia Militar poderes de investigação que não lhe cabem ─ até mesmo um setor de gravação de telefonemas alheios.

2 ─ A imprensa deixou o Governo Alckmin proclamar a imensa besteira de que o PCC, cabeça do crime organizado, já não mais existia e, portanto, não tinha como comandar de dentro da cadeia os bandidos que estão fora. E foi preciso que os bandidos matassem dezenas de PMs para que o Governo acordasse e substituísse o secretário da Segurança ─ o maior defensor da tese de que o crime organizado já não tinha mais como ameaçar a população.

Quem visita um presídio sabe que até os presentes levados aos presidiários são listados pelo PCC; o PCC também ensina como entrar com determinado tipo de produto que, se localizado pelas autoridades, acredite se quiser, será apreendido. Repórter pode visitar presídios, se tiver vontade. Não visita porque não está na pauta, porque nem sempre rende matéria, porque é mais importante contar como foi o réveillon de Duda Mendonça.

10 de janeiro de 2013
CARLOS BRICKMANN

J.R.GUZZO: UMA PERTURBADORA DESCRIÇÃO DA FACE ESCURA DO LULOPETISMO

O artigo de J. R. Guzzo publicado na edição impressa de VEJA sob o título Joseph K. merece ser reproduzido em todos os espaços jornalísticos que defendem o Estado Democrático de Direito. Confiram:


Os leitores de O Processo, criação da mente tumultuada, enigmática e genial de Franz Kafka, conhecem bem a história de Joseph K. ─ ótimo rapaz, diretor de banco e cidadão que jamais tinha violado lei alguma em toda a sua vida.

No dia em que completa 30 anos, Joseph K. recebe a visita de dois agentes que ele supõe serem da polícia, mas que não se identificam nem lhe mostram nenhum documento oficial. Estão a serviço de um departamento do governo, mas não revelam qual.

Anunciam que ele deve responder a um processo, mas não informam qual é a acusação. Joseph K. fica intimado, apenas, a comparecer a um determinado endereço alguns dias depois, mas não sabe a que horas nem qual autoridade terá de procurar no local.

Quando chega lá, encontra um pardieiro e, no sótão do prédio, o que parece ser o tribunal ─ mas ao ir embora continua sem saber qual o delito a que deve responder, quem vai julgá-lo e que lei autoriza o procedimento imposto a ele. Tudo o que consegue descobrir é que deve aguardar as instruções de um “Comitê de Questões”, de cuja existência jamais tivera conhecimento.

As coisas não melhoram quando Joseph K. vai se aconselhar com um tio, que lhe recomenda não “subestimar” a gravidade da situação e o encaminha a um advogado. Não adianta nada. O advogado diz que aceita fazer a sua defesa, mas não poderá apresentá-la ao magistrado, pois não sabe, nem nunca saberá, qual é a acusação ─ e, de qualquer forma, tudo seria inútil, pois em casos assim o fato de ser suspeito significa, automaticamente, ser culpado.

Na verdade, informam a ele, nunca houve em toda a história do tribunal secreto que vai julgá-lo um único caso de absolvição. Um ano depois, na véspera de seu 31º aniversário, Joseph K. é preso, em seu apartamento, por dois agentes do “Comitê”, levado a uma pedreira remota e executado ─ sem nunca ter tido a menor ideia do que fizera de errado.

Quase 100 anos depois de escrita, a narrativa de Kafka continua sendo um dos textos mais possantes que a literatura mundial jamais produziu sobre a negação absoluta da justiça ─ e a impotência do ser humano diante de forças que não entende, que podem tudo e contra as quais ele não pode nada.
A desgraça de Joseph K. é algo que não faz nexo num mundo racional.
Mas a moral da fábula de Kafka, como sempre acontece nas fábulas, não tem nada de absurdo.

Ao contrário, é um aviso muito claro do que pode acontecer em conflitos em que um dos lados dispensa a si próprio de qualquer obrigação lógica ─ como pretende ter toda a razão, julga-se com direito a tudo.
Não precisa explicar nada, nunca. Não tem de provar nenhuma das alegações que faz. Basta denunciar suspeitos e declarar que são culpados.

Há no Brasil de hoje um clima por trás do qual, quando se olha um pouco melhor, é possível perceber algo muito parecido com a história de Joseph K.
Trata-se do esforço permanente, por parte das forças que comandam o governo, para indiciar todos os que discordam delas num processo em que os julgadores não aceitam nenhum argumento de defesa, ignoram quaisquer fatos que os acusados possam apresentar em seu favor e só assinam sentenças de condenação.
O ex-presidente Lula, os marechais de campo do PT e sua máquina de propaganda funcionam como o “Comitê de Questões” imaginado por Kafka. Os que têm opiniões diferentes, sobretudo quando podem expressá-las em público, ou divulgam fatos incômodos para seus interesses, ficam no papel de Joseph K.

O tribunal secreto de Lula encerrou 2012 com as turbinas a toda. Enrolado, cada vez mais, em histórias tão feias quanto marcadas pela pequenez, o líder supremo do PT não disse até agora uma única palavra para explicar o que quer que fosse, nem citou nenhum fato capaz de atenuar as suspeitas.

Como sempre, pegou o microfone e passou a gritar insultos contra inimigos que ninguém vê. Jamais menciona seus nomes. Não diz que crimes cometeram. Não informa quais as acusações concretas a que devem responder.

Limitou-se, desta vez, a falar em “vagabundos” que estão em salas “com ar condicionado”. Quem seriam? Há um vasto número de brasileiros nessa situação, quase sempre fazendo trabalho duro, indispensável e remunerado modestamente ─ nas UTIs hospitalares, torres de controle de aeroportos, usinas de energia elétrica, processadoras de alimentos e por aí afora.

Vagabundos? Talvez. Se não há nomes, todos são suspeitos da acusação ─ especialmente infeliz quando feita por alguém que não trabalha desde os 29 anos de idade. E daí? Joseph K. não tem direito a nenhuma explicação.

10 de janeiro de 2013
 

IMAGEM DO DIA

 
Criança síria brinca em campo de refugiados na fronteira entre Turquia e Síria, próximo à cidade de Azaz
Criança síria brinca em campo de refugiados na fronteira entre Turquia e Síria, próximo à cidade de Azaz - Elias Edouard/AFP
 
10 de janeiro de 2013

LÁ VEM JOSÉ DIRCEU, O CONDENADO PITORESCO

 
Como José Dirceu é pitoresco, né?
Roberto Gurgel concedeu uma entrevista à Folha em que diz o seguinte sobre a culpa de José Dirceu no mensalão:

 “Não é prova direta. Em nenhum momento nós apresentamos ele passando recibo sobre uma determinada quantia ou uma ordem escrita dele para que tal pagamento fosse feito ao partido ‘X’ com a finalidade de angariar apoio do governo. Nós apresentamos uma prova que evidenciava que ele estava, sim, no topo dessa organização criminosa”.
 
Bem, bem, bem… Li a declaração e antevi: “Lá vem Dirceu a afirmar que Gurgel confessa não haver provas contra ele…”. Não deu outra! A cascata já está em seu blog.
 
Trata-se, obviamente, de uma mentira, de conversa mole. Ao contrário do que diz Dirceu, Gurgel está dizendo que o chefe da quadrilha foi condenado com base na lei.
 
No fim do ano passado, escrevi um artigo na VEJA explicando, no detalhe, por que Dirceu foi condenado. Dirceu repete a mentira, e eu me obrigo a repetir a verdade. Segue o texto.


 *
Antes uma realidade quase intangível, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi parar na sala de estar dos brasileiros em 2012. No ano em que Carminha e Nina, da novela Avenida Brasil, embaralharam as noções corriqueiras de Bem e de Mal, os ministros se tornaram porta-vozes dos anseios de milhões de brasileiros justamente por terem sabido o que era o Bem e o que era o Mal. Cumpre notar que os juízes do STF não acharam o direito nas ruas, no alarido dos bares ou nos debates das redações.
 
Decidiram segundo a Constituição, as leis e a jurisprudência da Corte. Personagens como José Dirceu, José Genoíno e João Paulo Cunha se dizem vítimas de um tribunal de exceção e conclamam seus eventuais seguidores a julgar os juízes. Queriam ser tratados como sujeitos excepcionais.
A questão é mais ampla do que se percebe à primeira vista.
 
A luta dos homens por igualdade perante a lei produziu tudo o que sabemos de bom e de útil nas sociedades; já o discurso da igualdade ao arrepio da lei só gerou morte e barbárie. Os atores políticos que tomam o mundo mais justo e tolerante anseiam por um horizonte institucional que universalize direitos para que emerjam as particularidades.
Nas democracias, porque são iguais, os homens podem, então, ser diferentes. Nas ditaduras, em nome da igualdade, os poderosos esmagam as individualidades. Nas tiranias, porque são diferentes, os homens são, então, obrigados a ser iguais.
Uma possibilidade acena para a pluralidade das sociedades liberais, e a outra, para os regimes de força, que encontraram no comunismo e no fascismo sua face mais definida.
 
O petismo no poder é fruto do regime democrático, sim, mas o poder no petismo é herdeiro intelectual do ódio à democracia e da crença de que um partido conduz e vigia a sociedade, não o contrário.
Na legenda, não são poucos os convictos de que certos homens, em razão de sua ideologia, de seus compromissos ou de seus feitos, se situam acima das leis. Eis o substrato das acusações infundadas de que os ministros do STF desprezaram a jurisprudência da Corte para condená-los.
Trata-se de uma mentira influente até mesmo entre aqueles que, de boa fé, saúdam a “mudança” do tribunal.
 
Doses de ignorância específica e de má fé se juntaram em pencas de textos sustentando, por exemplo, que, “sem o ato de ofício”, seria impossível punir um corrupto. Fato! O truque estava no que se entendia por isso.
Os atos de ofício designam o conjunto de competências e atribuições de uma autoridade, com ou sem documento assinado. O Artigo 317 do Código Penal — uma lei de 1940 — assim define a corrupção passiva: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.
Ora, como poderia assinar um documento quem ainda nem tomou posse? O voto de um congressista é um de seus atos de ofício. Se recebeu vantagens indevidas em razão dele, praticou corrupção passiva. Pouco importa se traiu até o corruptor.
 
A questão é igualmente vital quando se trata da corrupção ativa, um dos crimes pelos quais foi condenado José Dirceu, definida no Artigo 333 do Código Penal pela mesma lei de 1940: “Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício”. Nos dois casos, se o ato for efetivamente praticado, o que se tem é a elevação da pena.
 
Dirceu e seus sequazes, no entanto, sustentam que inexistem provas e que ele está sendo condenado com base numa interpretação falaciosa da chamada “Teoria do Domínio do Fato”, que busca responsabilizar criminalmente o mandante, aquele que, embora no domínio do fato criminoso, não deixa rastro.
É evidente que não pode ser aplicada sem provas. E não foi. Há não uma, mas muitas delas contra Dirceu. Parlamentares disseram em juízo que os acordos com Delúbio Soares tinham de ser referendados pelo então ministro; ficaram evidentes suas relações com os bancos BMG e Rural, como atestam depoimentos da banqueira Kátia Rabello; foi ele um dos articuladores da reunião, em Lisboa, entre Marcos Valério, um representante do PTB e dirigentes da Portugal Telecom etc.
O Artigo 239 do Código de Processo Penal trata das provas indiciárias: “Considera-se indício a circunstância conhecida e provada que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”.
 
Não é uma inovação para perseguir Dirceu. A lei é de 1941. Em uma de suas intervenções, o então ministro Ayres Britto esclareceu:
 
“(…) os fatos referidos pelo Procurador-Geral da República (…) se encontram provados em suas linhas gerais. Eles aconteceram por modo entrelaçado com a maior parte dos réus, conforme atestam depoimentos, inquirições, cheques, laudos, vistorias, inspeções, e-mails, mandados de busca e apreensão, entre outros meios de prova. Prova direta, válida e robustamente produzida em Juízo, sob as garantias do contraditório e da ampla defesa. Prova indireta ou indiciária ou circunstancial, colhida em inquéritos policiais e processos administrativos, porém conectadas com as primeiras em sua materialidade e lógica elementar(…)”.
 
A última falácia dizia respeito à cassação dos mandatos dos deputados condenados com trânsito em julgado. Corria-se o risco, como se escandalizou o ministro Gilmar Mendes, de o Brasil ter um deputado encarcerado. Da combinação dos Artigos 15 e 55 da Constituição com o Artigo 92 do Código Penal, decidiu o STF que parlamentares condenados em última instância por crimes contra a administração pública estão automaticamente cassados. Inovação? Feitiçaria? Juízo excepcional? Não! Apenas a aplicação dos códigos que regem o país.
 
A gritaria que se seguiu à decisão chega a ser ridícula. Eis a redação do Artigo 92 do Código Penal, que cassa o mandato dos deputados mensaleiros, segundo autoriza a Constituição:
São também efeitos da condenação
 
1 – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:
 
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública:
 
b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.
 
É trecho da Lei n° 9268, de 1996, aprovada pela Câmara e pelo Senado. O Congresso, pois, já decidiu que deputados e senadores condenados em processos criminais, com trânsito em julgado, têm seus respectivos mandatos cassados, nas condicões discriminadas acima. Para os crimes de pequeno potencial ofensivo, a palavra final é das duas Casas. O STF harmonizou os dispositivos constitucionais e deu eficácia à lei. Julgamento havido em 1995 tratava de caso muito distinto e, como se nota, se deu antes da lei de 1996.
 
Coube ao decano, Celso de Mello, o voto de desempate, alinhando-se com o relator e agora presidente da Casa, Joaquim Barbosa, que resistiu a todas as patrulhas e intimidações de 2007 a esta data:
“Não se revela possível que, em plena vigência do estado democrático de direito, autoridades qualificadas pela alta posição institucional que ostentam na estrutura de poder dessa República possam descumprir pura e simplesmente uma decisão irrecorrível do STF.”
 
O ministro estava dizendo, por outras palavras, que, nas democracias de direito, é a igualdade perante a lei que permite aos homens exercer as suas particularidades; é só nas tiranias que as particularidades de alguns igualam todos os outros na carência de direitos.
Uma fala oportuna, no momento em que certos “intelectuais” de esquerda e deslumbrados do miolo mole resolveram defender uma variante dita “progressista” do “rouba, mas faz”, na suposição de que o desvio ético seria um preço a pagar pelo avanço social.
É espantoso. É o “rouba porque faz”. Só há um jeito de isso ser considerado aceitável: além dos cofres, eles precisam ser bem-sucedidos em roubar também as instituições.
Em nome do povo — isto é, das leis —, o Supremo lhes disse “não”.
 
10 de janeiro de 2013
Por Reinaldo Azevedo

A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM

 

Nos últimos tempos, macaqueando uma matéria da The Economist que apontou o ressurgimento do intervencionismo estatal no Brasil, alguns passaram a acusar o governo Dilma de adotar posturas voluntaristas e autoritárias no campo econômico. 
A revista publicou na edição de 21 de janeiro de 2012 uma matéria especial com o título “The visible hand”, onde informa que a crise do capitalismo liberal ocidental coincidiu com a ascensão de uma poderosa forma de capitalismo de Estado nos mercados emergentes.
 
No caso do Brasil a matéria cita que o País vive uma fase de intervencionismo insensato e cita exemplos da Petrobras e da Vale.
 
Não me surpreende o nível das observações, já que a crítica econômica anda rasteira por conta de um evidenciado partidarismo. Melhor: a mais contundente oposição ao governo tem sido feita pela imprensa. Assim sendo, o discurso crítico é um discurso de oposição e não de reflexão.
Tendo acusado de rasteiro o discurso da oposição econômica, cabe agora explicar por quê. Não é difícil. Vamos lá.
 
Comecemos pela constatação de que a crítica parte da imprensa e não de partidos e políticos, pelo simples fato de que a maioria esmagadora dos políticos brasileiros adora, justamente, o voluntarismo, o intervencionismo, a estatização.
 
Todos esses aspectos repercutem e ampliam o poder do governo e de políticos sobre a política e a sociedade. São mecanismos de poder, quer dizer, de exercício e perpetuação de poder. Não houve neoliberalismo relevante no Brasil, salvo lampejos na era FHC que culminaram com a quebra do país em 1998.
 
O político brasileiro – seja do DEM, do PSOL ou de qualquer outro partido – acredita no poder do Estado para resolver problemas. Os seus e/ou os do povo.
Não interessa para a imprensa fazer distinções no meio político porque ela quer, no limite, derrotar o governo. Para tal, precisa de todos os partidos e políticos, que também são voluntaristas, intervencionistas e estatizantes.
 
Acusar o mundo político não interessa. Interessa, sim, pespegar a pecha de estatizante, voluntarista e intervencionista em Dilma e Lula. Não se iludam, é uma luta política.
 
O intervencionismo estatal e voluntarista tem raízes antigas na política nacional. Não é de hoje que o Estado é o principal agente das transformações. A sociedade, sempre “acoelhada” e subserviente, trata de conviver com um Estado que cresce de forma galopante para atender às necessidades do crescimento estatal!
 
Não há no horizonte próximo nenhuma chance de as coisas serem diferentes por aqui. Nenhuma força política com reais possibilidades de poder avançaria em um modelo verdadeiramente neoliberal. Ou que, apenas, reduzisse de modo significativo o “gap” entre os poderes do Estado e os da sociedade.
Para tal, interesses poderosos teriam de ser contrariados de forma expressiva.
 
Por exemplo, as agências reguladoras precisariam ser controladas por técnicos e submetidas à controladoria externa e independente. Os juízes do STF teriam de ser escolhidos, em lista tríplice, em votação aberta no Congresso.
O funcionamento da mídia mereceria ser revisto de forma ampla e dramática. O financiamento de campanhas eleitorais e partidárias necessitaria ser conduzido, apenas e exclusivamente, pela cidadania.
Quem quer fazer política que vá para a rua passar a sacolinha!
Voltando ao ponto: o que importa discutir é se o modelo pode ser mais eficiente e transparente. Criticar o intervencionismo sendo, no coração, um intervencionista é fazer farisaísmo.
 
No momento de nossa história não podemos prescindir do papel protagonista do Estado. O que deve ser perseguido é o seu melhor funcionamento.

10 de janeiro de 2013
Murillo de Aragão é cientista político

VENEZUELA - JUÍZA AFASTADA DO SUPREMO: "NÃO HÁ GESTÃO LEGÍTIMA NO PAÍS".

 

Blanca Rosa Mármol de León avalia que a Corte se tornou um braço armado do chavismo. Para ela, o mandato do vice-presidente acaba nesta quinta-feira, e ele não tem legitimidade para comandar o país

Após 38 anos dedicados ao Direito, o que a levou a ocupar por 12 anos um dos 32 postos do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela, Blanca Rosa Mármol de León foi afastada em 31 de dezembro, segundo ela e outros especialistas.

Ela era uma das poucas juízas que votavam de forma independente do chavismo. Na entrevista abaixo, ela afirma que a Venezuela fica a partir de desta quinta-feira “sem governo legítimo” e detalha a série de rupturas constitucionais vigentes no país. Segundo a ex-magistrada, o “Tribunal Supremo de Justiça virou um braço armado do Executivo”.

Antes de tudo, por que o afastamento da senhora foi inconstitucional?


Meu período de 12 anos de Supremo venceria em dezembro, estava certo eu me aposentar, assim como outros sete juízes, três deles que votavam de forma independente como eu. O problema é que a gente tinha suplentes, cujos mandatos também venciam, para que a Assembleia Nacional (responsável na Venezuela pela nomeação da Corte Suprema) designasse, assim, novos juízes.

Com o fim do nosso mandato, simplesmente mandaram a gente embora e puseram os suplentes lá. E adivinha?! Todos os suplentes são chavistas! Nenhum substituto foi designado. Isso porque a Assembleia Nacional jamais permitiria a nomeação de magistrados chavistas, porque a situação não tem dois terços dos assentos, portanto, não detém maioria absoluta.
Por isso ninguém levou a votação à pauta. Ou seja: o TSJ virou um braço armado do Executivo, o Legislativo foi desrespeitado.
A atual situação é que ninguém vai contestar mais nenhuma decisão que fira a Constituição. Todos os juízes agora fazem o que o chavismo manda.

As interpretações dos juízes da Sala Constitucional lidas ontem pela presidente do TSJ são prova disso? O TSJ poderia ter adiado a posse de Chavez até que ele voltasse para a Venezuela?

Claro que não. Pela Constituição, o presidente a partir de hoje teria que ser o presidente da Assembleia (Diosdado Cabello). Presidente em exercício, ou para esperar pela volta de Chávez (no caso de ausência temporária), ou para convocar novas eleições (no caso de ausência permanente).
Isso de manter o status quo com Nicolás Maduro à frente do governo é uma ruptura institucional e constitucional gravíssima, prova que as instituições da Venezuela ruíram. Juízes sérios e isentos jamais poderiam ter dado esta interpretação à Carta. Podemos dizer hoje: não há mais governo legítimo aqui.

A comissão médica para avaliar o estado de saúde do presidente também não foi e pelo visto nem será nomeada...

Mais um desrespeito à Constituição e ao povo venezuelano. Todas as entidades jurídicas internacionais concordam que a população tem o direito, como eleitora, de saber a quantas anda a saúde de um chefe de Estado. A saúde do presidente é uma questão de segurança nacional. Especulações contribuem para a instabilidade. Uma junta independente precisava avaliar se Chávez tem condições ou não de voltar.

Ao contrário do Brasil, o vice-presidente da Venezuela não faz parte da chapa eleita pelo povo, ele foi nomeado pelo presidente. O mandato de Nicolás Maduro, além de acabar hoje, é menos legítimo por isso?

O mandato dele acaba e, a partir de hoje, perde totalmente a legitimidade. O cargo de Maduro precisaria ser oficialmente renovado por Chávez, a partir da data da nova posse, assim como os cargos dos ministros. Maduro fala constantemente em nome de Chávez, mas quem prova isso? Diosdado Cabello leu uma carta de Maduro, supostamente a pedido de Chávez, mas a carta estava assinada? Não. A pergunta é: quem está nos governando?

10 de janeiro de 2013
O Globo

CHÁVEZ GOVERNA DE DENTRO DA UTI

 

 A situação mais curiosa desse pastelão em que se transformou a sucessão presidencial da Venezuela é a do vice Nicolas Maduro, que a partir de hoje deixa de ter um cargo oficial, embora seja o sucessor escolhido pelo caudilho Chávez para substituí-lo em caso de necessidade.
Acontece que, na Venezuela de Chávez, o vice é nomeado pelo presidente e pode ser substituído a qualquer hora, como se fosse um ministro. Não aparece na chapa eleitoral e na prática é mais um subordinado do presidente.
Deve ser para evitar um acesso de ambição do companheiro escolhido.
Como Chávez teve sua posse adiada, não poderá assinar a formalização de Maduro como vice, e teremos assim um governo em que ninguém detém o poder realmente: o presidente da Câmara, Cabello, não assumirá a Presidência, e Maduro não é formalmente o vice-presidente.

Em toda ditadura acontecem casos como esse, e uma hora a realidade trata de revelar os traços ditatoriais do governo que mantém a aparência democrática, como na Venezuela.
No Brasil tivemos dois casos semelhantes.

Quando o general Arthur da Costa e Silva teve uma isquemia, deveria ter sido substituído por Pedro Aleixo, que havia sido nomeado vice para manter a aparência de democracia no país. Na hora da definição, quem assumiu mesmo o governo foi uma junta formada pelos ministros militares.

No caso de Tancredo Neves, que baixou ao hospital na véspera da posse, quem deveria ter assumido era o presidente da Câmara, Ulysses Guimarães, mas, em vez dele, assumiu a Presidência o vice-presidente José Sarney. Pelo menos Sarney aparecia na chapa eleita indiretamente.

Perguntado por Pedro Simon sobre as razões que o fizeram aceitar decisão tão discutível, Ulysses foi irônico: “Se o maior jurisconsulto do país disse que era o Sarney, quem sou eu para contestar?”
Ulysses referia-se não a Leitão de Abreu, chefe do Gabinete Civil, mas ao ministro do Exército, Leônidas Pires Gonçalves, que foi quem interpretou a Constituição a favor de Sarney, que, além do mais, era seu amigo.

Situações assim revelam o caráter de um governo e também daqueles que o apoiam. No Brasil, no caso de Costa e Silva, tratava-se da manutenção do poder com os militares. No de Tancredo, da transição para a democracia, e qualquer passo em falso poderia interromper a passagem do poder militar para o civil.

O próprio Tancredo temia que, se não pudesse tomar posse, o processo de transição fosse interrompido e, por isso, recusou-se a se internar antes.

A interpretação em favor de Sarney foi a saída mais viável, já que era tido como certo que os militares não aceitariam a posse de Ulysses.

O próprio Sarney, que presidira o PDS, o partido do regime militar, até pouco tempo antes, tinha a objeção de muitos militares por ter rompido com o governo e viabilizado a candidatura Tancredo. Tanto que o general-presidente João Figueiredo recusou-se a passar a faixa presidencial a ele.

Na patacoada que se desenvolve na Venezuela, o governo brasileiro avalizou uma reinterpretação criativa da Constituição e se alinhou aos que endossam uma farsa que transforma a figura de Chávez em fantasma onipresente, que governará como presidente eleito de um leito do setor de terapia intensiva de um hospital em Cuba.

Nem mesmo em território nacional o presidente eleito estará hoje, dia 10, quando começa um novo mandato presidencial para o qual foi eleito.

O princípio da “continuidade administrativa” é a base legal da decisão, referendada pela Corte Suprema da Venezuela, que considerou que a posse é mera formalidade que pode ser preenchida a qualquer momento daqui para frente.

Temos então a seguinte situação na Venezuela: um presidente que não aparece em público nem fala desde dezembro, mas que enviou um pedido para não estar presente à sua própria posse; um vice-presidente que não foi nomeado para o cargo; e um presidente da Câmara que é o único a ter cargo oficial, mas que não exercerá a presidência devido a acordo político interno.

Na prática, o que aconteceu foi a prorrogação dos mandatos de Chávez e Maduro que se encerrariam hoje, mas ninguém teve a coragem de assumir.

10 de janeiro de 2013
Merval Pereira, O Globo

O MAU DESEMPENHO DO GOVERNO DILMA

 

Começa com expectativa parecida com a de janeiro de 2012. Pelo consenso fora do governo, o Brasil crescerá um pouco mais, com pouco menos inflação do que no ano passado.
No quesito crescimento, espera-se até um bom salto. Mas ilusório. O salto só será largo, se ocorrer de fato, porque se parte de um resultado muito ruim, a expansão em torno de 1% do PIB de 2012.
Comparados com isso, tornam-se bastante positivos os 3,3% esperados para 2013, conforme consta do último Relatório de Mercado, resumo dos cenários do setor privado (bancos, consultorias e faculdades), publicado toda segunda-feira pelo Banco Central.

Em janeiro de 2012, também se esperava uma expansão dos mesmos 3,3%, mas nesse caso vindo dos 2,7% de 2011. Contava-se, pois, com modesta aceleração.

Já para a inflação, esperava-se uma queda mais acentuada, de 6,5% (o resultado final de 2011, no teto da margem de tolerância) para 5,3%, número então considerado mais comportado.

Tudo somado e subtraído, no ano passado o pessoal estava mais otimista com a inflação; neste ano, com a volta do crescimento. E todos, governistas e não governistas, já dão de barato que inflação de 4,5%, a antiga meta, ficou para nunca mais. Quer dizer, nunca mais no período Dilma.

Mas há uma diferença notável nos dias de hoje em relação ao começo do ano passado: o pessimismo está disseminado. Percebe-se um sentimento entre a descrença e o ceticismo em relação às metas e planos do governo. A presidente perdeu o benefício do início do mandato.

Um ano atrás, a maioria culpava o mundo tanto pelo baixo crescimento quanto pela inflação mais elevada. A maioria ainda depositava confiança nas promessas oficiais.

Hoje, tirante os militantes, essa confiança se foi. Mesmo os analistas ainda alinhados com o governo ou aqueles que, por razões diversas, têm medo do governo — um grupo expressivo — recheiam de ressalvas seus cenários mais positivos.

Se o governo controlar seus gastos sem truques.... se avançar nas privatizações de infraestrutura.... se intervier menos no setor privado.... se cuidar da inflação... se mudar o modelo de consumo para investimento... então o Brasil cresce 3%, com sorte uns 3,5%.
É muito “se” e pouca fé.

Faz sentido. Olhem o retrospecto. O governo roubou descaradamente nas contas públicas para fechar o superávit primário. A dívida líquida é função desse superávit, de modo que, se este é roubado, aquela também está falsificada. Ela subiu, não caiu. Os investimentos caíram, as privatizações continuam atrasadas. O protecionismo argentino derruba as exportações industriais brasileiras e a presidente, a nossa, não dá um pio. Ninguém acredita quando o BC diz que busca a meta de 4,5% de inflação.
Por que 2013 seria diferente de 2012?

Acrescentem aqui as preocupações recentes com energia. Sem entrar no problema, notem o ambiente: o governo jura que não faltará energia, que o preço da tarifa cairá pelo menos 16% e que não há qualquer emergência.

Mesmo assim, relatórios internos de empresas registram a preocupação com o fornecimento. E, de novo, mesmo os analistas que descartam qualquer risco de racionamento notam que a tarifa não poderá cair o tanto anunciado pelo governo.

Logo, a inflação será maior que a prevista. E acrescentam que, se o país crescer os 4% e tanto desejados pelo governo, aumenta o risco de faltar e/ou encarecer a energia.
A presidente queixa-se do pessimismo e até identifica grupos que considera responsáveis por esse ambiente. Tem sido injusta.

Não há ninguém boicotando seu governo, nem a oposição. Aliás, qual? Há analistas e críticos mais severos, mas a maioria se divide em quatro categorias: os que, legitimamente, torcem para o governo; os respeitosos, que sempre encadeiam elogios antes de fazer uma crítica; os puxa-sacos que têm algum benefício a defender; e os que têm medo de serem atingidos por algum raio governamental.
Obviamente, nenhum é responsável pelo mau desempenho do governo. A presidente deveria buscar culpados ao seu lado.

10 de janeiro de 2013
Carlos Alberto Sardenberg, O Globo

METADE DA COMIDA PRODUZIDA PELO MUNDO VAI PARA O LIXO

 

Cerca de metade da comida produzida no mundo todos os anos vai para o lixo. Um estudo divulgado nesta quinta-feira revela que 30 a 50% dos alimentos disponíveis não são consumidos, o que se traduz no desperdício de 1,2 mil milhões a dois mil milhões de toneladas de comida. E o problema tende a agravar-se.

O documento intitulado Global Food; Waste not, Want not (Alimentos Globais; Não desperdice, Não queira), elaborado pelo Institution of Mechanical Engineers, uma organização do Reino Unido que representa engenheiros industriais, aponta motivos para o desperdício: condições desadequadas de armazenamento e transporte, adopção de prazos de validade demasiado apertados, ou promoções que encorajam os consumidores a comprar em excesso.


Outro problema é a preferência dos supermercados por alimentos “perfeitos” em termos de formato, cor e tamanho. O estudo refere que 30% das frutas e legumes plantados no Reino Unido não chegam a ser colhidos, por causa da aparência.

Os números apurados pela instituição estão em linha com os dados da FAO (Food and Agriculture Organization, das Nações Unidas), segundo os quais os países industrializados deitam fora um terço da comida disponível, todos os anos. Isto equivale a 1,3 mil milhões de toneladas, segundo a FAO, suficientes para alimentar as 868 milhões de pessoas que todos os dias vão dormir com fome.

Só em Portugal, é desperdiçado um milhão de toneladas de alimentos por ano (17% do que é produzido pelo país), de acordo com as conclusões do PERDA - Projecto de Estudo e Reflexão sobre Desperdício Alimentar, apresentadas em Dezembro.

O estudo agora divulgado lembra que as previsões da ONU apontam para um aumento da população mundial até 2075, de três mil milhões de pessoas. Nesse ano, haverá 9,5 mil milhões de bocas para alimentar.

“A quantidade de comida desperdiçada no mundo é assombrosa. Esta comida poderia ser usada para alimentar a crescente população mundial, além dos que estão a passar fome”, sublinha em comunicado o director do departamento de Energia e Ambiente da organização, Tim Fox.

O desperdício de alimentos envolve também o gasto desnecessário dos recursos usados na sua produção, como a água, os terrenos, a energia. O documento conclui que cerca de 550 mil milhões de metros cúbicos de água são usados anualmente na produção de alimentos que vão para o lixo.

E as previsões não são animadoras: o consumo de água no mundo chegará aos 13.000 mil milhões de metros cúbicos por ano em 2050, devido ao crescimento da procura de alimentos - sobretudo de carne, que exige mais água do que os vegetais no processo de produção. Este valor representa até 3,5 vezes o total de água consumido actualmente.

Por isso, os autores do documento recomendam que sejam tomadas medidas urgentes para inverter este cenário.

10 de janeiro de 2013
Público, Portugal

O MERCOSUL É AMEAÇADO POR UM NEFASTO PRECEDENTE

O governo brasileiro defende que a posse de Chávez — prevista constitucionalmente para 10 de janeiro — seja adiada por até 6 meses, sob o argumento de que “não há um processo de descontinuidade se ele não tomar posse formalmente”, já que foi reeleito.
Estabelece o artigo 231 da Constituição venezuelana: “O candidato eleito tomará posse do cargo de presidente da República em 10 de janeiro do primeiro ano de seu período constitucional, mediante juramento na Assembleia Nacional. Se, por qualquer motivo inesperado, o presidente da República não puder tomar posse na Assembleia Nacional, o fará no Supremo Tribunal de Justiça (STJ).”

Adiciona o artigo 233: “Serão faltas absolutas do presidente: morte, renúncia, destituição decretada por sentença do STJ (...), incapacidade física ou mental (...), e o abandono de cargo (...). Quando houver a falta absoluta do presidente eleito antes da posse, haverá uma nova eleição universal, direta e secreta, nos 30 dias consecutivos seguintes. (...) será encarregado da Presidência da República o presidente da Assembleia Nacional”.

Chávez se recupera de um câncer em Cuba. A total falta de transparência a respeito de seu estado de saúde não permitiu, contudo, ocultar a absoluta ausência de condições que o impossibilitam de tomar posse no cargo em 10 de janeiro.

Em afronta à ordem constitucional, o plano chavista é que o presidente da Assembleia Nacional mantenha-se indefinidamente no acúmulo das duas funções (legislativa e executiva), até que o presidente possa tomar posse — que não passaria de uma “formalidade dispensável”, merecendo prevalecer a vontade popular expressa nas eleições de outubro passado.

Cumprir a Constituição não é mera “formalidade”, mas condição essencial ao Estado Democrático de Direito, que tem como pilar ser o “governo das leis”, e não o “governo dos homens”, como observa Bobbio.

O Estado de Direito guia-se pelo respeito às leis a todos aplicáveis, de forma geral e abstrata, o que assegura densidade e estabilidade democrática, contribuindo para o fortalecimento das instituições. Não pode ser refém das vulnerabilidades das conjunturas momentâneas e das conveniências políticas. A vontade de Constituição não pode ser submissa à vontade de poder.

No hiperpresidencialismo latino-americano a gerar o fenômeno das “democracias delegativas”, em que o poder Executivo é cada vez mais agigantado, faz-se essencial proteger as regras do jogo constitucional quanto à sucessão e substituição do presidente da República.

A própria Constituição brasileira — tal como a venezuelana — na hipótese de impedimento do presidente e do vice-presidente da República ou vacância dos respectivos cargos apresenta uma ordem de substituição, a começar pelo presidente da Câmara dos Deputados.

Ao reconhecer que a substituição é sempre precária e temporária — até porque seria um grave risco à separação dos poderes a concentração das funções legislativas e executivas na mesma pessoa —, a Carta brasileira requer eleições (ver artigos 79 e 81 da Constituição).

No caso da Venezuela, a absoluta incapacidade de Chávez de tomar posse no cargo implica a vacância do mesmo. A vacância do cargo demanda a realização de eleições, como expressamente estabelece a Constituição. Não se trata de “apego formal à Constituição”, como entende o governo brasileiro, mas da necessária defesa da democracia.

Como alertou o presidente da Conferência Episcopal da Venezuela, “neste caso estão em jogo o bem comum do país e a defesa da ética. Alterar a interpretação da Constituição para alcançar um objetivo político é moralmente inaceitável”.

Em 2012, a Venezuela passou a integrar o Mercosul. Como bloco regional, o Mercosul ambiciona não apenas fortalecer a cooperação econômica, como também a democracia, mediante a cláusula democrática enunciada no protocolo de Ushuaia.

Em casos de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática, de violação da ordem constitucional ou em qualquer situação que coloque em risco a vigência de princípios democráticos, poderá ser aplicada como sanção a suspensão do bloco — cabe menção à controvertida suspensão do Paraguai em 2012.

Com as responsabilidades de líder regional e ator global, aguarda-se do governo brasileiro o firme compromisso com a causa democrática, superior a uma solidariedade pessoal e afinidade ideológica a simbolizar um nefasto precedente ao futuro da democracia na região.

10 de janeiro de 2013
Flávia Piovesan é procuradora do Estado de São Paulo e professora da PUC-SP

QUANDO O HUMOR RETRATA A REALIDADE



10 de janeiro de 2013

"THE ECONOMIST" : DILMA DESPERTOU PARA A PRIVATIZAÇÃO

 
Reportagem diz que o governo brasileiro atrasou plano das novas concessões, especialmente dos aeroportos, por 'relutar' em aderir às privatizações

A presidente Dilma Rousseff
Revista lembra que muitos planos da infraestrutura não saem do papel e cita a Copa de 2014 (Ueslei Marcelino/Reuters)
A revista britânica The Economist destaca em reportagem na edição que chega nesta quinta-feira às bancas o fato de o Brasil ter "despertado para a necessidade urgente de melhorar a infraestrutura do País", em especial nos transportes. A reportagem diz que o governo de Dilma Rousseff era "relutante" em aderir às privatizações e que isso teria atrasado o plano das novas concessões, especialmente dos aeroportos.

"O governo do Brasil despertou para a necessidade urgente de melhorar a infraestrutura do País. Ele está leiloando concessões de rodovias, estradas e aeroportos. No mês passado, acrescentou portos à lista e prometeu gastar R$ 54 bilhões para expandir, dragar e melhorar os portos ao longo dos próximos cinco anos", afirma a reportagem.

A decisão de repassar projetos à iniciativa privada, no entanto, não foi fácil. A revista britânica diz que o governo de Dilma Rousseff tinha "relutância" em privatizar alguns setores da economia. Para a Economist, o atual governo brasileiro foi "tardiamente convertido" às privatizações.

"Depois de vender 51% das ações em três aeroportos em fevereiro do ano passado, o governo ficou temeroso e passou o restante do ano sondando operadores estrangeiros para verificar se algum consideraria entrar em uma licitação para investimento minoritário. Somente depois de perceber que não teria compradores, o governo decidiu continuar a vender o controle acionário", relata o texto.

A revista cita que o plano de melhoria da infraestrutura também entra no esforço federal para tentar ajudar a impulsionar o crescimento "anêmico" do Brasil. O texto lembra que até mesmo a agricultura, que tem apresentado desempenho positivo recente, sofre com a situação da infraestrutura. "Os altos custos do transporte das exportações dos agricultores corroem os lucros do campo."

A revista lembra, porém, que "muitos planos da infraestrutura brasileira não conseguem sair do papel" e cita as propostas para a Copa do Mundo de 2014 como exemplo. Dos 102 projetos apresentados em 2010 para o mundial de futebol, quase um quinto - ou 19 obras - sequer começaram.

10 de janeiro de 2013
Veja Online
(com Estadão Conteúdo)

EXECUTIVOS DO BB ERAM PRINCIPAIS INTERLOCUTORES DE ROSEMARY, CÚMPLICE DE LULA


Executivos do BB eram principais interlocutores de Rosemary em SP. Agenda de ex-assessora da Presidência registra 39 encontros com dirigentes do banco desde 2007. Irmãos Vieira foram recebidos 29 vezes; documento foi obtido por meio da Lei de Acesso à Informação

Executivos de alto escalão do Banco do Brasil eram os interlocutores mais frequentes de Rosemary Noronha, ex-chefe do escritório da Presidência em São Paulo, segundo a agenda dela, obtida pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.

Rose, amiga íntima do ex-presidente Lula por 19 anos, foi indiciada pela Polícia Federal sob suspeita de formação de quadrilha e tráfico de influência na Operação Porto Seguro.

Entre 2007 e 2012, a agenda de Rose registra 39 reuniões com executivos do BB, sobretudo vice-presidentes.

Os irmãos Paulo, Rubens e Marcelo Vieira, também indiciados na operação, aparecem em segundo lugar em número de citações na agenda, com 35 reuniões -29 delas no escritório da Presidência.

Dos executivos do BB, Ricardo Oliveira, que foi vice-presidente até maio de 2012, é o visitante mais frequente -aparece em 17 reuniões.

Oliveira disse à Folha que Rose apenas agendava encontros com o então presidente Lula. Segundo ele, um dos assuntos que tratou com o ex-presidente foi a compra da Nossa Caixa, em novembro de 2008, por R$ 5,38 bilhões. Ele afirma que é fantasiosa a versão de que Rose ajudou nesse negócio. "Ela não tinha participação no conteúdo das reuniões."

Também são citados encontros com Ricardo Flores, José Luís Salinas, Paulo Oshiro e Alencar Ferreira, todos do Banco do Brasil.

Ferreira, que foi da Companhia de Seguros Aliança, coligada do BB, é citado na agenda de Rose em uma reunião de julho de 2010.

Ele era acusado à época de ter produzido um dossiê contra Marina Mantega, filha do ministro da Fazenda, Guido Mantega. No documento apócrifo, Marina é acusada de fazer lobby a favor de empresáriosusando a sede paulista do BB -o escritório da Presidência onde Rose despachava fica no mesmo prédio.

Ferreira sempre negou ter atuado na montagem do dossiê contra Mantega.

O dossiê foi interpretado no governo como uma chantagem contra o ministro por causa das disputas para nomear o presidente da Previ, o fundo de previdência do BB, que à época administrava recursos de R$ 150 bilhões.

Dentro do BB, havia a suspeita de que Rose teria ajudado a produzir o dossiê junto com sindicalistas bancários porque tinha acesso às câmeras de segurança do prédio.

Rose conseguiu alguns favores do BB. Em 2010, a Cobra, braço tecnológico do banco, contratou sem licitação a empreiteira do atual marido dela, João Vasconcelos, por R$ 1,12 milhão para reformar um prédio.

A Cobra era uma área de influência de Salinas, vice-presidente de tecnologia do BB até junho de 2010, recebido por Rose seis vezes. Ele também foi afastado do cargo por causa do dossiê.

Rose também conseguiu que seu ex-marido, José Claudio, fosse nomeado suplente do conselho da empresa de previdência privada do BB.

A agenda registra ainda encontros de Rose com sindicalistas, empresários e representantes de veículos de comunicação.

10 de janeiro de 2013
PAULO GAMA e MARIO CESAR CARVALHO - FOLHA DE SÃO PAULO

PARA A TRIBO DE DILMA E CHÁVEZ, SÓ EXISTE UM CRIME IMPERDOÁVEL: PERDER O PODER


Em 18 de setembro de 2010, a coluna exibiu pela primeira vez o vídeo em que o venezuelano Hugo Chávez registra o carinho e a admiração que nutre pela presidente do Brasil. “Dilma Rousseff, uma grande companheira, uma grande patriota sul-americana”, derrama-se o chefe da revolução bolivariana no meio da discurseira reproduzida na seção História em Imagens. “Eu a conheci em uma reunião. O que me impressionou foi sua claridade do conceito de sua profundidade”, completou, caprichando no sotaque de milongueiro apaixonado e no olhar 171.

Em junho de 2011, depois de um encontro reservado em Brasília, Hugo e Dilma mantiveram em segredo o que haviam dito um ao outro. Como artistas de cinema de antigamente na fase dos arrulhos, limitaram-se a informar que eram apenas bons amigos. “Ninguém sabe se ainda é só amizade ou se já virou namoro”, conformou-se o post sobre o diálogo misterioso. É algo bem maior que ambas as hipóteses, esclareceu há dias o apoio escancarado do Planalto à vigarice que pretende estuprar a Constituição venezuelana para substituir uma democracia em frangalhos pela monarquia à cucaracha.

Se o mandato de Chávez for estendido por prazo indeterminado, como tramam os golpistas , o trono mudará de dono só depois da morte do rei Hugo I. (Isso se a oposição conseguir provar que é impossível comandar do Além um grotão sul-americano). “Todos sabem do apreço que o governo brasileiro tem pelo presidente Chávez”, recitou Marco Aurélio Garcia, uma boca que à espera de um dentista e, desde 2003, conselheiro presidencial para complicações internacionais. É verdade. Em 2009, por exemplo, García comunicou ao mundo que no reino do companheiro Chávez “existe democracia até demais”. Mas o “governo brasileiro” a que se referiu, visto de perto, é o mais recente codinome de Dilma Rousseff.

Foi Dilma quem resolveu, entre um pito no salva-vidas mais próximo e um passeio de lancha no litoral da Bahia, que Garcia deveria interromper as férias no México, baixar em Cuba e descobrir se a situação do parceiro hospitalizado recomenda um caso para telegrama com palavras de conforto ou autoriza um convite para o desfile na Sapucaí. Foi Dilma quem ordenou ao filhote da política externa da safadeza que consolasse o paciente com a prova de afeto: no peito da gerente durona também bate um coração. Caprichosamente seletivo, só guarda vagas para presidentes venezuelanos que se chamem Hugo Chávez.

Para afagar um farsante companheiro, a presidente mandou às favas as leis venezuelanas, as normas que regem o convívio internacional, o respeito à soberania nacional, a lógica, o bom senso e a noção do ricículo. Para acariciar um bolívar-de-hospício, a doutora em Nada envergonhou o Brasil que pensa. O lado bom do episódio foi ter revelado que o que une a dupla vai muito além da amizade, é mais forte que qualquer namoro. Dilma e Chávez são comparsas nascidos e criados na tribo cujos integrantes se permitem todos os pecados, com uma exceção: o único crime imperdoável é perder o poder.

10 de janeiro de 2013
Por Augusto Nunes - Veja Online

ESQUEMA DO MENSALÃO É MUITO MAIS AMPLO, DIZ PROCURADOR-GERAL


Protagonista no maior julgamento da história do Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, 58, afirmou à Folha que o esquema do mensalão é "muito maior, muito mais amplo, do que aquilo que acabou sendo objeto da denúncia".

"O que constou da denúncia foi o que foi possível provar, com elementos razoáveis para dar a base [a ela]", afirma Gurgel em uma de suas raras entrevistas exclusivas desde que assumiu, em 2009.

Ele diz que o depoimento prestado em setembro pelo operador do esquema, Marcos Valério, pretendia "melar o julgamento".
*
O DESAFIO

Gurgel afirma que o grande desafio do processo foi provar a responsabilidade do núcleo político do esquema, entre eles o do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT).

"O grande desafio desse processo era provar a responsabilidade do chamado núcleo político. Porque essa prova é diferenciada. (...) Pessoas do topo da quadrilha têm sempre uma participação cuidadosa e provas diretas são praticamente impossíveis."

Sérgio Lima/Folhapress
Gurgel, durante entrevista na sala de reuniões de seu gabinete em Brasília
Gurgel, durante entrevista na sala de reuniões de seu gabinete em Brasília


DIRCEU

O procurador-geral afirma ter ficado provada a participação do ex-ministro da Casa Civil de Lula em episódios relacionados ao mensalão. "Fazia-se um determinado acerto com algum partido e dizia-se: quem tem que bater o martelo é o José Dirceu. Aí, ou ele dava uma entrada rápida na sala ou alguém dava um telefonema e ele dizia: 'Está ok, pode fechar o acordo'", diz Gurgel.

Ele diz haver "uma série de de elementos de prova" que apontam para a participação efetiva de Dirceu. "Não é prova direta. Em nenhum momento nós apresentamos ele passando recibo sobre uma determinada quantia ou uma ordem escrita dele para que tal pagamento fosse feito ao partido 'X' com a finalidade de angariar apoio do governo. Nós apresentamos uma prova que evidenciava que ele estava, sim, no topo dessa organização criminosa", diz o procurador.

Ele cita a teoria do domínio do fato, segundo a qual o autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização.

"A teoria do domínio do fato vem para dizer que essas provas indicam que ele se encontrava numa posição de liderança nesse sistema criminoso. Então, é possível, sim, responsabilizá-lo a despeito da inexistência da prova direta. Prova havia bastante do envolvimento dele."

MENSALÃO

"Estávamos diante de algo muito grande e muito maior do que aquilo que acabou sendo objeto da denúncia", diz ele, para quem o autor da denúncia, o antecessor Antonio Fernando Souza, fez uma opção "corretíssima".

"Quando nos defrontamos em qualquer investigação com um esquema criminoso muito amplo, você tem que optar, em determinado momento, por limitar essa investigação. Quando é ampla demais, a investigação não tem fim. Ao final, ninguém vai ser responsabilizado", diz.

Gurgel segue: "Haveria muito mais, esse esquema seria ainda muito mais amplo do que aquilo que constou da denúncia. Mas o que constou da denúncia foi o que foi possível provar, com elementos razoáveis. (...) Eu diria que aquilo que foi julgado representa apenas uma parte de algo que era muito maior".
LULA


O procurador diz não ter visto o mínimo de elementos que apontassem participação do ex-presidente Lula e afirmou que seu caso será provavelmente remetido para análise na primeira instância.

"O que se quis foi oferecer uma denúncia fundamentada em provas", declara Gurgel, acrescentando que era "uma das primeiras vezes que se responsabilizava todo um grupo que dominava o partido do governo". "Em relação ao presidente, precisaria ter a prova mais que robusta porque seria uma irresponsabilidade denunciar um presidente. É muito mais difícil."

VALÉRIO

Gurgel diz que Valério queria obter benefícios, como a redução de penas, com o depoimento prestado em setembro em que acusa Lula de ter sido beneficiado pessoalmente com recursos do esquema.

"Percebi claramente que se fôssemos admitir qualquer tipo de elemento de prova adicional, teríamos que anular o início do julgamento e reabrir a instrução criminal. Aquilo significava em português claríssimo melar o julgamento. Eles queriam melar o julgamento. Eu vi essa tentativa não como dele, mas como uma tentativa que favoreceria todo mundo", diz.

"A primeira coisa que disse a ele: nada nesse novo depoimento seria utilizado e nenhum benefício ele teria na ação 470. Na verdade, acho que ele pensava mais em embolar o julgamento."

O procurador afirma ainda que Valério pediu sigilo, pois "não teria 24 horas de vida", caso o depoimento viesse a público. "Ele prestou um depoimento de duas horas e a primeira impressão foi a de que o depoimento trazia elementos novos, mas nada de bombástico. É um depoimento que robustece algumas teses do Ministério Público em relação a todo o esquema criminoso e da participação do núcleo politico", diz Gurgel.

Ele lembra uma outra história de Valério: "É uma pessoa extremamente hábil. Houve um momento que ele apareceu aqui, quando Antonio Fernando era o procurador, para também prestar um depoimento que derrubaria a República. Não tinha absolutamente nada".

LEGADO

"É um marco, talvez um divisor de águas na história de responsabilizar pessoas envolvidas em esquema de corrupção no país", diz Gurgel.

Para o chefe do Ministério Público Federal, utilizar nos crimes de colarinho branco os mesmos parâmetros de crimes como furto e roubo "é assegurar a impunidade".

"O Supremo assentou que é preciso prova, e robusta, para qualquer condenação, mas o tipo de prova não é o mesmo de crimes mais simples."

10 de janeiro de 2013
FELIPE SELIGMAN e MATHEUS LEITÃO - Folha de São Paulo

POR QUE LULA NÃO PODE FICAR FORA DAS INVESTIGAÇÕES DO CASO ROSE





10 de janeiro de 2013
Marco Antonio Villa

O GOLPE NA VENEZUELA TIRA A MÁSCARA

 
A multidão reunida no centro de Caracas para celebrar Hugo Chávez que jazz morto ou vivo em Cuba ouve discursos pedindo todo o seu apoio ao governo de Nicolás Maduro, o vice de Chávez.

O mandato de Chávez terminou hoje.

Se Chávez não pode assumir o novo mandato conquistado no ano passado, no seu lugar deveria ter entrado o presidente da Assembléia Nacional, também chavista. Que teria 30 dias para convocar nova eleição presidencial.

Mas, não. Dominado por Chávez, que nomeia e demite ministros a seu gosto, o Superior Tribunal de Justiça avalizou a posse de Maduro. A razão: Maduro é o candidato de Chávez à sua sucessão caso ele não se recupere do câncer na pélvis.

Na prática, foi prorrogado o mandato de Chávez que terminaria hoje.



Maduro não tem mandato definido. O vice é nomeado e demitido pelo presidente de acordo com a sua vontade.

A Constituição da Venezuela não prevê prorrogação de mandatos.

Dane-se a Constituição da República Bolivariana da Venezuela!

A do Paraguai, no ano poassado, danou-se quando o presidente Fernando Lugo foi derrubado sem ter contado com amplo direito de defesa.

Por isso, o Paraguai foi expulso do Mercosul. Que não admite ruptura da ordem democrática.

A Venezuela substituiu o Paraguai.

A ordem democrática foi rompida ou não na Venezuela? E por que ela não será expulsa do Mercosul?

Porque Chávez é amiguinho da maioria dos presidentes latinoamericanos. Guarda afinidade ideológica com eles. Como guardava Lugo.

10 de janeiro de 2013
Com Blog do Noblat

COMEÇO DIFÍCIL DE ANO PARA DILMA

O ano começou com uma série de problemas para o governo. As manobras fiscais para que os números encontrassem a meta produziram um desgaste para além da área econômica. A alquimia atingiu também contas de importação de petróleo. O caso Venezuela revelou uma diplomacia casuística e o temor de falta de suprimento de energia pode afetar os investimentos.

O ministro Edison Lobão repetiu a mesma estratégia de negar todos os riscos. Por razões políticas, o governo não quer admitir que existem problemas no suprimento de energia.

Hoje, estamos dependendo do volume de chuvas, principalmente em Minas Gerais. O ministro disse, como prova de que não há risco, que está chovendo em todo o país. Mas especialistas dizem que em certos lugares a chuva não faz diferença do ponto de vista energético, em outros, é essencial:

— É preciso chover muito no Triângulo Mineiro, no Alto Paranaíba e no Rio Grande. Isso encherá reservatórios de Furnas Marimbondo, Itumbiara. Os dois rios, Paranaíba e Rio Grande, vão também formar o Paraná, onde está Itaipu. Chuvas em Unaí e Paracatu abastecem a margem esquerda do Rio São Francisco, que é 80% da capacidade hidrelétrica do Nordeste. E se chover entre Minas e Goiás abastecerá Tucuruí — explica Walter Fróes, diretor da Câmara Comercializadora de Energia.

Um dos piores vexames tucanos foi sem dúvida o apagão de 2001. Houve o fato eventual da seca, mas qualquer matriz tão dependente de hidrelétrica como a nossa terá que contar com esse cenário, dado que não se controla o volume de chuvas. A administração da crise pelo então ministro Pedro Parente foi eficiente, mas só reduziu o dano.

O PT criticou fortemente o apagão nas eleições de 2002 e era isso mesmo que tinha que fazer. Nas outras campanhas, sempre bateu nesse erro gerencial.

Em 2008, quando o nível dos reservatórios caiu muito, o Operador Nacional do Sistema transportou blocos de energia de um lado para o outro, administrando com perícia a escassez, mas o pior só não aconteceu porque o país foi salvo por chuvas torrenciais.

Agora, é com esse imponderável que o governo conta. Admitir o problema é um desgaste político enorme. Por isso, eles continuarão dizendo que está tudo bem, quando não está tudo bem.

Nas contas públicas, a confusão vai mais do que atingir ou não a meta de cada ano. O que preocupa mais do que essa queda é o fato de que todas as maquiagens juntas tiraram a confiança em índices importantes.

Gasta-se tempo para saber o que é verdadeiro e o que é fruto da criatividade em cada número da Fazenda.

O governo ainda deve uma boa explicação pela postergação de dados de importação da Petrobras. A informação que se tem mostra que o que deixou de entrar na conta pode ter sido números robustos o suficiente para reduzirem o superávit comercial.

Na diplomacia, caiu por terra a pouca máscara que ainda havia. O rito sumário que tirou o ex-presidente paraguaio Fernando Lugo do poder estava previsto na Constituição do país, mas fere um princípio básico da democracia, que é o amplo direito de defesa. Por isso, o governo brasileiro comandou a suspensão, no Mercosul, do nosso sócio estratégico na área de energia.

O problema foi a inclusão da Venezuela no Mercosul, logo depois, com seu histórico de desrespeitos aos princípios democráticos. Agora, mais esse evento.

Escamotear números, crises e fatos só é possível em governos autoritários. Numa sociedade aberta, com amplo debate, imprensa livre, instituições robustas, é mais difícil. O ano mal começou, mas para o governo foi um mau começo. Ainda há tempo de mudar de rota.

10 de janeiro de 2013
Miriam Leitão, O Globo

MADURO CONFIRMA QUE DILMA RESPALDA GOLPE NA VENEZUELA

 
Maduro: Dilma respalda decisão tomada por Judiciário. Governo brasileiro confirma conversa; presidente felicitou venezuelano


Nicolás Maduro durante reunião com ministros e chefes militares da Venezuela nesta quarta-feira (9)
Foto: Divulgação
Nicolás Maduro durante reunião com ministros e chefes militares da Venezuela nesta quarta-feira (9)Divulgação
BRASÍLIA E CARACAS - Poucas horas depois de o Tribunal Supremo de Justiça apoiar nesta quarta-feira (9) a tese do chavismo de que a posse de Hugo Chávez para o quarto mandato seria uma formalidade, o vice-presidente Nicolás Maduro disse ter conversado com a presidente Dilma Rousseff sobre o assunto. De acordo com o relato apresentado durante reunião dos países do Petrocaribe e da Alba, a presidente ratificou sua confiança no desenvolvimento da democracia venezuelana.

-- Compartilhamos informações e critérios, e ela ratificou toda sua confiança depois da decisão do Tribunal Supremo de Justiça no desenvolvimento da democracia venezuelana. Transmitimos toda a nossa vontade de trabalhar junto com os irmãos do Brasil, o governo irmão, liderado pela presidente Dilma -- disse, referindo-se a ela como “grande companheira de Chávez”, com quem teria relação de solidariedade profunda.

O governo brasileiro confirmou que Dilma teve a conversa e que Maduro relatou à presidente o que foi decidido pela corte venezuelana. Dilma, então, felicitou Maduro. O apoio do Brasil é particularmente importante para a Venezuela no momento em que se questiona no front interno e externo a legitimidade do governo após a decisão da Justiça. Ontem, Maduro deu suas primeiras declarações rodeado de ministros e chanceleres de países aliados do chavismo, como Cuba, Bolívia, El Salvador, Equador, entre outros. Ele aproveitou para reiterar que os presidente do Uruguai, José Mujica, da Nicarágua, Daniel Ortega, e da Bolívia, Evo Morales, estariam hoje no país para um ato de apoio a Chávez.

-- Acatamos a decisão do Tribunal Supremo de Justiça. É palavra sagrada. A verdade da Constituição está na sentença do TSJ. Temos um governo patriota com um só presidente, um só comandante, que é Hugo Chávez, cujo novo período constitucional começa amanhã (quinta-feira).

Prazo de 180 dias

O governo brasileiro tem acompanhado de perto a situação na Venezuela. O assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, foi para Havana para obter informações sobre o estado de saúde de Chávez no começo deste ano. Ao regressar, Garcia disse que obteve informações que comprovavam que o adiamento da posse era uma opção válida, mas mencionava claramente o prazo de 180 dias. Este é o período previsto na Constituição venezuelana para a chamada ausência temporária, segundo a qual o mandatário pode se ausentar por um prazo de até 90 dias, renováveis por mais 90 pela Assembleia Constituinte.

O próprio Marco Aurélio Garcia evitou mencionar, no entanto, quem deveria ficar no comando do país, o vice-presidente ou o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, argumentando que se tratava de um ponto polêmico do ponto de vista do direito constitucional.

Esta era exatamente a opção defendida pela oposição no país. Sua aplicação significaria que Cabello assumiria a Presidência durante este período. Mas ontem, a presidente do Tribunal Supremo de Justiça, Luisa Estella Morales, deixou claro que na avaliação da corte não é adequado declarar a ausência temporária porque isso exigiria que Chávez tivesse deixado um decreto especificamente para este fim.

Diante da decisão da mais alta corte do país, a oposição venezuelana enviou uma carta para a presidente Dilma, pedindo que ela impeça a “ruptura democrática” no país.

O texto foi entregue no Senado por Milos Alcalay, ex-representante da Venezuela na ONU. A oposição argumenta que a tese de continuidade do mandato de Chávez, que continua internado em Cuba, depois de ser operado pela quarta vez de câncer, não tem respaldo na jurisprudência.

-- Não é a primeira vez que o Tribunal Supremo surpreende com uma decisão gaiata -- disse o ex-diplomata.

Alcalay, que foi embaixador no Brasil entre 1997 e 2001, disse que o país tem papel fundamental na América Latina e deve exercer a função de guardião da democracia regional. Dirigentes da oposição já indicaram que pretendem recorrer ao Mercosul e à OEA. O Brasil foi o principal incentivador da entrada da Venezuela no bloco, em medida que ocorreu após a suspensão do Paraguai, que não havia aprovado o ingresso do país.

O secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, disse ontem que prefere não se pronunciar:

-- Há uma série de coisas propriamente políticas, mais do que jurídicas que estão no meio e creio que é melhor que as resolvam os venezuelanos, antes de me pronunciar sobre elas.

10 de janeiro de 2013
Júnia Gama - O Globo