De uns tempos para cá, os psicólogos, psicanalistas, psiquiatras e afins resolveram tentar recuperar o terreno perdido para as “terapias alternativas” no tratamento dos chamados transtornos mentais. É uma briga dura essa, dos rotos e dos esfarrapados.
E por que rotos e esfarrapados? Porque ambas as terapias - as “alternativas” e as “psicos” - são absolutamente empíricas e nuca tiveram nenhum resultado prático satisfatoriamente confirmado. As alternativas, ainda vá lá que se ature pelo seu descompromisso e despretensão como ciência - se não fizerem bem, mal não fazem -, mas às “psicos”, deram uma importância que de maneira nenhuma corresponde à realidade, tanto em termos de resultados quanto em conceitos.
Desde quando a psicologia pode ser considerada uma ciência, se ela se baseia em interpretações? A prática das terapias que lidam com a psique do indivíduo chega a ser criminosa, tal é a presunção dos seus profissionais em se arvorarem em detentores da panaceia que cura qualquer problema mental. Para eles simplesmente não há o desconhecido. Antiéticos, praticamente todos aceitam tratar o que não conhecem. E o melhor exemplo que conheço dessa irresponsabilidade aconteceu comigo mesmo e relato a seguir, abreviadamente.
Um belo dia (não tão belo assim) de 1978 tive um ataque de pânico do nada. Acontece que nessa época nem se sonhava em existir tal transtorno. Tive outro, e mais outro, e assim foram se sucedendo os ataques, do nada, até que eu ficasse totalmente preso em casa por medo de que eles ocorressem quando eu estivesse sozinho na rua, por causa da sua imprevisibilidade. Procurei então meu médico clínico geral, que me receitou uma batelada de exames, cujos resultados não deram em nada: saúde perfeita. Receita: Lexotan e andar na praia...
Como andar na praia se eu não conseguia sair de casa sem passar mal? E o Lexotan também não adiantou xongas.
Não podendo ficar assim - eu tinha uma fábrica com 150 empregados para administrar e fazia dois meses que eu não conseguia sair de casa -, procurei um psiquiatra e fui parar na mão do presidente da Sociedade Brasileira de Psiquiatria, que além das três sessões de análise semanais (com o próprio) me receitou dois ou três “torpedos” cavalares que simplesmente me transformaram em um zumbi, mas que não conseguiram amenizar as crises de pânico - que, enfatizo, até então era um mal desconhecido de todos. Foram dois ou três meses de sofrimento em dobro porque além dos remédios não resolverem os meus problemas, causavam outros mais graves, quais sejam transformar-me em uma planta que de vez em quando tomava um choque elétrico (os ataques de pânico).
Resolvi então que não iria mais tomar os “torpedos” e comuniquei ao psiquiatra, que receitou outros, mais leves, segundo ele. Mais outros tantos meses, dessa vez menos sofridos pela mudança dos medicamentos, mas nada do pânico melhorar. Parei com eles também, mas as sessões de análise - tremendamente freudianas - continuaram até que o “doutor” se convencesse definitivamente que eu não tinha comido a minha mãe nem sido sodomizado pelo meu pai, nem em sonho. E não há exagero nisso, tal a ênfase que era dada aos aspectos sexuais da minha vida.
Perdi mais ou menos um ano e ganhei “alta”, terminando o ciclo da mesma maneira que comecei: em pânico.
Foi aí que começou a peregrinação por onze doutores “psico-qualquer-coisa”, cada um mais considerado que o outro. Seis meses com um, um ano com outro, frequentando os consultórios de uma sequência de espertalhões que quase sempre diziam “isso é mole!”, mas que foram incapazes de confirmar a “moleza”. Enquanto isso dinheiro que eu tinha obtido com a forçosa venda da fábrica, ia quase todo para as mãos desses charlatães.
Um detalhe: nos intervalos entre uma psicanálise e outra, fiz yoga, fui a um centro espírita (uma única vez) e fiz sessões de hipnose.
Acabei desistindo de tudo, disposto a me conformar com a minha condição de prisioneiro de mim mesmo e sujeito a eventuais ataques de pânico. E foram dez anos vivendo em uma gaiola virtual que era o meu quarteirão. Atravessar a rua, só acompanhado; ficar em casa sozinho era um sofrimento; viajar, nem pensar.
A essas alturas, o pânico já estava devidamente catalogado pela psicologia como um “transtorno mental” e eu já sabia que ele era a consequência de uma deficiência da comunicação intra-neuronial - sinapse - que retardava a ação da serotonina no cérebro. Mas isso não me adiantava em nada, já que eu sou avesso a medicamentos e nem tampouco me arriscaria a tomar alguma coisa por conta própria. E a minha aversão adquirida aos doutores “psicos” também me impedia de procurá-los.
Foi então, em 2003, 25 anos depois da primeira crise, um grande amigo, médico, conseguiu me convencer, depois de muito insistir, a procurar um determinado psiquiatra que “lidava muito bem com drogas” (medicamentos, é claro) que o tinha livrado do pânico pouco tempo antes.
E lá fui eu ao tal psiquiatra depois de dez longos anos sem contatos com essas figuras, para mim, até então, todas abjetas. Muito embora a vontade de me ver livre dessa praga de pânico fosse enorme, armei-me de paus, pedras e ceticismo, em função do que eu já tinha passado nas mãos de doze calhordas. Ele era o número treze. Cabalístico...
Durante uma hora conversamos e, é lógico para quem me conhece, falei 95% do tempo expondo tudo isso que narrei até agora, inclusive a minha renitência a medicamentos, e ao final ele me pediu um crédito de confiança de três meses porque iria me receitar um remédio. Entre o espanto por tanta humildade e a aversão às drogas, fiquei com a primeira e resolvi encarar, até porque o doutor recomendou que eu ligasse para ele relatando as minhas reações para que ele pudesse estabelecer a dosagem inicial até que meu organismo se adaptasse à ideal.
E não é que liguei? E não é que ele me retornou todas as ligações? E não é que em um mês eu já estava me aventurando a longos passeios sozinho, fora da gaiola? E não é que ele me disse ao final da terceira vez que eu fui ao seu consultório que eu não precisaria mais voltar lá porque eu era absolutamente bem resolvido e não tinha nenhum problema psíquico e sim bioquímico, que o tal remedinho milagroso estava resolvendo satisfatoriamente?
Alguém falou “abreviadamente”?...
Mas voltando ao começo, enfatizo que nenhum dos “psicos” recusou-se a me tratar, mesmo não sabendo exatamente qual era o meu mal. Ora, se isso não é charlatanismo coletivo, minha avó é uma bicicleta!
Mas foram duas coisas que me chamaram a atenção nesses dias, me levaram a escrever sobre o assunto, lembrando de tanta coisa que passei. Uma parece boba, mas mostra bem o nível de imbecilidade do meio. O Kinder Ovo - ovinho de chocolate que vem sempre com um brinquedinho-surpresa dentro - resolveu fazer versões diferentes por sexo para evitar que os meninos ganhem brindes de menina e vice-versa, e coloriu as embalagens de azul e rosa. Não é que uma psicanalista e “sexóloga” de nome Regina Navarro Lins declarou ao Globo que a atitude da empresa foi “sexista e absurda” e que “insistir em manter os papéis sexuais limita as pessoas, aprisionando-as a estereótipos e isso começa na infância, com brinquedos diferentes para meninos e meninas”?
Ninguém em sã consciência “aprisiona” crianças a estereótipos, mas ninguém, também em sã consciência, vai presentear uma filha com um boneco do Incrível Hulk ou um filho com uma Barbie, pombas!
Se seguirmos os conselhos dessa gente em breve teremos bonecos de Hulks gays e Barbies lésbicas.
Outra coisa que me chamou atenção foi a entrevista do psiquiatra Luis Augusto Rohde, que foi um dos 160 “especialistas” do mundo convidados pela Associação Americana de Psiquiatria para elaborar o DSM-5, o novo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, um absurdo que diz que 40% das pessoas são portadoras de distúrbios mentais, o que equivale a dizer que os “psicodoutores” têm 2,8 bilhões de pacientes em potencial no mundo. É querer puxar muita brasa para as suas sardinhas, tanto que o próprio Rohde afirma que com o DSM-5 haverá uma explosão no registro e reconhecimento de doenças mentais nos consultórios.
O que não dá para entender é que, em sendo a psiquiatria totalmente subjetiva, tanto nas informações recebidas quanto nos diagnósticos elaborados, como é que se pode afirmar tão categoricamente que isto ou aquilo é uma doença? E eu digo doença, porque “transtorno” é apenas um eufemismo psiquiátrico politicamente correto. Aliás, se não fossem consideradas doenças, não precisariam de tratamento, não é mesmo?
Para se ter um exemplo do absurdo, Rohde diz que a parte que trata da sexualidade é das mais complicadas, para depois citar o “transtorno do exibicionismo” - o sujeito andar nu pela sua casa com as janelas abertas, segundo suas palavras - como sendo uma doença, desde que o sujeito sinta prazer e culpa pelo ato. Então quer dizer que se eu ando pelado sem prazer nem culpa eu sou normal? Eu acho que há uma certa inversão de valores aí. Se o cara anda peladão porque esqueceu de botar a roupa, aí mesmo é que ele tem algum problema mental. Parece piada, mas é lógico.
Outra coisa que não dá para entender é a não inclusão de certas formas de homossexualismo nessa xaropada toda, ou por outra: dá sim. É a porcaria do politicamente correto de novo. Como é que o exibicionismo pode ser considerado uma doença e o homossexualismo não, se o que os gays de ambos os sexos mais fazem é se exibir sexualmente, pelados ou mesmo vestidos?
O que esses caras fizeram foi uma mixórdia que acrescentou os hábitos e os costumes às doenças já conhecidas, tanto que se essa porcaria de DSM-5 for considerada em certos lugares ou até mesmo países, não vai sobrar um só cidadão “normal”. Um sujeito que tem por costume ir à igreja todos os dias para dar uma “rezadinha” - e conheço muitos não carolas que o fazem, a minha esposa, inclusive - vai ser taxado de doido; se fizer sexo demais ou de menos, vai pro divã; se lavar as mãos com frequência é transtornado... Ora, vão lamber sabão e peidar bolhinhas!
Loucos mesmo são esses psicomerdas! Mas não rasgam dinheiro, isso eu garanto...
30 de julho de 2013