O embate do século no UFC Ação Penal 470 MENSALÃO já é conhecido das redes: terá o STF no card preliminar e a porrada principal entre José Antônio Dias Toffoli e Ricardo Noblat na luta final da noite.
O jornalista Ricardo Noblat deixou uma nota virulenta em seu blog. O ministro do STF Dias Toffoli (aquele) o teria ofendido com palavrões na saída de uma festa.
Os palavrões são pesados. Quem conhece o Implicante™ sabe que não gostamos de palavrão. Preferimos educação, cortesia e delicadeza para lidar inclusive com nossos desafetos. Nossos e-mails internos são exemplos claros, sempre redigidos com a fineza e amabilidade de verdadeiros nobres que não colocam os cotovelos sobre a mesa para almoçar (“Caro colega, seu movimento brusco longitudinal com a perna direita acabou por criar uma contusão na minha virilha. Caso não for atrapalhar sua natureza, poderia tomar um pouco mais de cuidado com os arrebaldes, s’il vous plaît?”).
Mas é com dor em nossas entranhas que somos forçados (obrigados mesmo) pela imprensa nacional e internacional, e instados por nossos leitores ávidos pela verdade e nada além da verdade – exigindo um trabalho que, se não quisermos fazer por nós, que o façamos pela humanidade – a reproduzir aqui o que o jornalista Ricardo Noblat afirma ter ouvido da boca de Dias Toffoli:
- Esse rapaz é um canalha, um filho da puta.
Repetiu “filho da puta” pelo menos cinco vezes. E foi adiante:
- Ele só fala mal de mim. Quero que ele se foda. Eu me preparei muito mais do que ele para chegar a ministro do Supremo.
Acrescentou:
- Em Marília não é assim.
Foi em Marília, interior de São Paulo, que o ministro nasceu em novembro de 1967.
Por mais de cinco minutos, alternou os insultos que me dirigiu sem saber que eu o escutava:
- Filho da puta, canalha.
Depois disse:
- O Zé Dirceu escreve no blog dele. Pois outro dia, esse canalha o criticou. Não gostei de tê-lo encontrado aqui. Não gostei.
Arrematou:
- Chupa! Minha pica é doce. Ele que chupe minha pica.
De fato, é uma sorte para Toffoli não ter nascido em Santo André ou Campinas (quando um petista diz que “não é assim” em sua cidade natal vindo de alguma dessas, o significado fica um pouco mais claro do que o petista gostaria). Mas parece que trocamos a republiqueta do presidente com aquilo roxo pela do juiz com aquilo doce…
Nós temos alguns ídolos. Sempre que falta assunto neste país continental, basta dar uma olhadinha nos queridos blogs progressistas (a querida blogosfera do dinheiro público). São os blogs das torcidas organizadas dos partidões: antes dos fatos surgirem, estão sempre torcendo para o PT ganhar (sem uma certa ajudinha de grandes nomes ligados ao partido, o dinheiro público seca).
Imediatamente, viu-se um comentário no próprio blog do Noblat escrito por Eduardo Pertence, que se anunciou como filho do ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence (uma boa análise do caso e do texto pode ser encontrada no blog do Reinaldo Azevedo). Segundo a nota, Eduardo garantia que não ouvira o ministro afirmar nada disso, por estar presente na mesma festa, onde Noblat era tratado como um “convidado”, com a mesma tolerância que reservamos às baratas.
Logo pulularam como felizes pipocas doces saltitantes diversos blogs anunciando a mágica – manchetes que variavam de “Filho de ex-ministro do STF desmente Noblat sobre Dias Toffoli” ou “Noblat é pego na mentira via Twitter” até “Barrigueiro Noblat mentiu sobre ofensas de Dias Toffoli”. Era a torcida “Dias Toffoli é nosso, e queremos ver todo mundo livre antes de saber se roubaram ou não!”
Um probleminha surgiu logo a seguir. O próprio Eduardo Pertence ligou para Ricardo Noblat pedindo desculpas pelo comentário. O Noblat publicou a nota em seu blog e no Twitter (os blogs progressistas, tão afoitos em procurar comentários no blog no Noblat, não viram essa nova nota publicada em destaque, e até agora não desmentiram a desmentira):
Eduardo Pertence acaba de me telefonar. Pediu desculpas. Reconheceu q onde estava não dava p/ouvir o que Tóffoli disse ou não.
De onde estava, nem se tivesse ouvido de tuberculoso teria ouvido o q o ministro disse. Há pouco, um amigo comum informou a Eduardo (segue)
… sobre a resposta q eu lhe daria. Ele pareceu ter ficado preocupado. Sem motivo, por sinal.”
Afinal, como Noblat iria inventar uma história dessas, contra uma das 11 pessoas com maior autoridade judicial do país, se não estivesse em pleno gozo de suas capacidades mentais (a hipótese de uma vontade enorme de se sacrificar juridicamente pela pátria parece descartada, visto que um dos réus do julgamento do mensalão é colunista em seu blog)? E por que diabos um filho de ex-ministro do STF advogando de estro próprio a favor do atual ministro iria desistir de tal defesa, dar pra trás e pedir desculpas a um jornalista por defender o seu… amigo?
O que fala mais alto nessa história é o silêncio de Dias Toffoli. Se nós, que somos uns blogueiros que mal têm oitava série, já sairíamos publicando nota e notificação extrajudicial pra tudo quanto é lado se afirmassem por aí que gastamos mais sabonete do que o necessário ao lavar a mão em prédio público (temos todos consciência social e ambiental), o que faria um dos onze ministros do STF, se acusado de proferir palavras de calão baixo (ou subterrâneo, ou na verdade em nível pré-sal)? Um obsequioso silêncio? Uma fungadinha, a demonstrar que não se mistura com essa gentalha? (note-se, ademais, que Noblat cita um agravo contra ele próprio, que é manter um réu do caso que noticia como colunista em sua página)
Daria, então, para juntar-se no coro silencioso de Toffoli e espalhar a resposta tumularmente estrepitosa do ministro (não seria a própria torcida por ele uma prova cabal de que se sabe qual será seu veredicto desde antes de o julgamento começar?).
Entretanto, como afirmamos, esse foi um probleminha.
Escarafunchando a vida em Brasília e os rastros que ela deixa pela internet, lembramos de quando a revista Veja publicou reportagem de capa sobre a proximidade das autoridades em Brasília e arrebaldes (os homens públicos parecem muito ocupados em viajar para festas de amigos em cidades natais).
Em convescotes sobretudo da cidade estatal-modelo com a maior desigualdade social do país, é fácil ver juízes andando com advogados de partes interessadas em processos, jornalistas nas festas de políticos, réus, acusados e defensores em algazarras sociais tão próximas que é impossível esquecer que, naquela distante terra encantada, todos são amigos e tudo que é de Brasília fica em Brasília.
A reportagem comentava sobre uma festa do filho de Sepúlveda Pertence.
O auto-intitulado “filho de ministro do STF” pode ser o mesmo que protagonizou o nababesco banquete ocorrida em Araxá (MG), onde Tóffoli foi um dos convivas – inclusive com direito a jatinho particular (desta feita, o dr. Filho de Ex-Ministro apenas o levou até o carro). A festa foi no Grande Hotel do Barreiro, recheada de autoridades da república (quem mais iria viajar a Araxá para festa de Filho de Ex-Ministro, que não outras autoridades?). Em distribuição liberada aos comensais, dentre outras cositas mas, havia lança perfume. Será que Pertence Pai tem mais de um filho?
Lula já chamou Pertence de “meu advogado” (o Toffoli parece mais um reload de um modus operandi antigo de indicações para o STF “comprometidas”). Mas a estranheza com o Filho do Ex-Ministro não gera contornos assustadores apenas por uma festa com drogas leves.
Em reportagem da revista IstoÉ n.º 1572, de 17 de novembro de 1999, lemos um trecho curioso:
” Há cinco anos, um filho do ministro do STF, Sepulveda Pertence, foi preso e indiciado por tráfico. Tinha um tijolo de maconha e uma balança de precisão.Na Justiça, o caso virou porte.”
Uma saída para a blogosfera progressista sair do silencioso ultra-decoroso seria medir a moral humana pela sua própria moral e, como disse o próprio Lula sobre caixa 2, questionar: quem nunca?
Enquanto Noblat, que deve guardar boas testemunhas ou uma boa gravação (nenhum jornalista anda com gravadores em Brasília, numa época em que qualquer celular grava algo? nós aqui até temos desculpa, por sermos pobres e termos celulares xexelentos, mas… em Brasília?!), guarda suas forças e esperamos o contra-ataque, parece que Toffoli vai fingir que anda ocupado demais para ler o que o Brasil inteiro anda dizendo sobre ele próprio.
Tal como ignorou o clamor público e técnico sobre sua situação, discutida nacionalmente, para julgar o mensalão. Não é de estranhar que o juiz tenha sido recusado, sucessivas vezes, nos concursos que tentou para juiz substituto.
Enquanto nós vemos Brasília de longe e discutimos sobre o poder quase como lendo livros de História em tempo real, sentimos que andam faltando canções de Renato Russo narrando em filigranas as mancomunações na capital.
Post Scriptum: Precisa ser juiz do STF pra poder chamar o Noblat de “rapaz”? Sei lá, é engraçado.
17 de agosto de 2012
Flávio Morgenstern