AQUI : "Ela morreu em 15 dias, de septicemia."
Faz 26 anos que o Brasil criou a 1ª Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH), ligada ao Ministério da Saúde.
Passados quase 30 anos, o país ainda não tem dados sobre quantas pessoas morrem anualmente por conta dessas infecções ou o índice de infecção que seria, por exemplo, aceitável na UTI, no berçário ou para doentes que estejam com pneumonia.
No entanto, informações retiradas de estudos realizados por todo o país pela Associação Nacional de Biossegurança (Anbio) trazem números alarmantes: em média, 80% dos hospitais não fazem o controle adequado, o índice de infecção hospitalar varia entre 14% e 19%, podendo chegar, dependendo da unidade, a 88,3%, e cem mil pessoas morrem por ano por conta das infecções.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), por sua vez, estima que as infecções hospitalares atinjam 14% dos pacientes internados no país.
- Os números que temos são estimativas. E, sem números, não sabemos quantos morrem por infecção ou por outros fatores. No que se refere às comissões, cada hospital tem a sua, e a grande maioria funciona burocraticamente.
Então, o índice de infecção hospitalar depende da unidade onde o paciente estiver - diz Edmundo Machado Ferraz, fundador e presidente da comissão de controle de infecção hospitalar do Hospital das Clínicas da UFPE e consultor da OMS. - Esse problema só se resolve com transparência.
É preciso saber o que acontece nas unidades, com processos controlados por protocolos. Não pode ter segredo. Tem que saber se o profissional se esqueceu de lavar as mãos corretamente, se o paciente fez uso inadequado de antibiótico.
Presidente da Associação Nacional de Biossegurança (Anbio), Leila dos Santos Macedo diz que "o risco não pode ser eliminado nunca, mas é possível bloqueá-lo para que chegue perto de zero":
- O paciente internado está suscetível. E infelizmente o cumprimento das normas de higiene é aquém do esperado. A gente vê profissionais de jaleco no refeitório, e aí eles levam agentes de risco para fora e trazem outros para o hospital.
Outros não lavam as mãos corretamente ou não usam máscaras.
Em muitas unidades, a troca de filtro do ar-condicionado não é feita frequentemente ou existe alta rotatividade dos profissionais de limpeza, e aí o pano de chão é usado em mais de uma enfermaria.
O país tem mais de sete mil hospitais e eu diria que 1% tem um programa de biossegurança rotineiro.
Superlotação facilita contaminação
Um levantamento feito pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), a pedido do Ministério Público Estadual de SP, em 2009, mostrou a necessidade de os programas serem mais seguros:
em mais de 90% das unidades, o controle da infecção hospitalar era deficiente.
Foram visitadas, ao todo, 158 instituições, na capital e no interior do estado. Dessas, 65 eram públicas e 93, privadas.
De acordo com o estudo, 92,4% dos programas deixaram de atender a pelo menos um dos itens verificados, e 82% das comissões de controle não funcionavam adequadamente em pelo menos um dos itens analisados.
Além disso, o Cremesp constatou que 28,1% das unidades não tinham "de forma adequada o conjunto para lavagem das mãos nas áreas críticas".
- É revoltante. Os dados mostram que no Brasil muita gente morre de problemas evitáveis. As comissões foram implementadas, mas não funcionam corretamente. Auditorias regulares nos hospitais podiam contribuir.
E o governo devia obrigar as unidades a criarem taxas máximas para infecções, por exemplo, nos berçários, em unidades de terapia intensiva e nos centros cirúrgicos, e para infecções urinárias e respiratórias.
Hoje, a pessoa morre por estar no hospital. Em casa, não pegaria bactérias adversas - diz Ferraz.
É a sensação que X. tem depois de ter levado uma parente, de 41 anos, para ser internada no Hospital Municipal Souza Aguiar, no Rio:
- Ela ficou num ambiente infecto. A emergência parecia um depósito de gente e fedia a xixi. No primeiro dia, estava numa maca de metal, sem roupa de cama. De lá, foi para uma enfermaria com três leitos.
No dia da visita, nós a encontramos suja. Estava com diarreia, e a enfermeira disse que já a tinha limpado três vezes. Ao lado, as outras pacientes comiam. Nenhuma higiene.
Ela implorava para ir embora.
A gente leva para o hospital para tentar aliviar o sofrimento, e fica arrasada com essas cenas. Ela morreu em 15 dias, de septicemia.
- Com superlotação, o risco de infecção hospitalar é maior. Quando se deixa macas umas ao lado das outras, por mais que haja vigilância, não se consegue controlar isso.
É quase impossível manter o paciente numa situação adequada se ele está amontoado. Começam a surgir bactérias mais resistentes - diz Julio Noronha, chefe da emergência do Hospital Geral de Bonsucesso, no Rio.
Enquanto isso, em NY...
Na mesma semana em que a Câmara dos Deputados discute a questão do financiamento da Saúde e deve votar a regulamentação da Emenda 29, a presidente Dilma Rousseff falará hoje sobre programas brasileiros de sucesso no setor, durante debate promovido no âmbito das Nações Unidas (ONU).
A presidente reclamou, ainda no Brasil, semana passada, da falta de recursos para a Saúde. Dilma vai discursar na reunião sobre doenças crônicas não transmissíveis, seu primeiro compromisso oficial numa agenda pesada de cinco dias em Nova York.
Carolina Benevides O Globo
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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