Nos poucos meses da presidência iniciada em janeiro, na esfera administrativa, aconteceram coisas jamais vistas nem imaginadas, ainda que os nossos costumes nem sempre fossem imaculados.
Basta dizer que dos cinco ministros que deixaram o governo, quatro foram faxinados, não porque os serviços estatais houvessem apurado incorreções mais ou menos graves em suas gestões, pois nenhum tivera sua revelação creditada a ele, mas todos, sem exceção, a órgãos de comunicação.
Aliás, longe de ser irrelevante, esse dado é da maior importância, pela simples razão de que não fora a imprensa, ou a mídia, como hoje se diz, nada autorizaria supor que eles viessem a ser inventados e publicados. O fato é bastante para indicar que alguma coisa está torta na administração. Mas a gravidade da ocorrência não se esgota aí, antes suscita outra delicada questão.
Enquanto a nação recebeu essas novidades com nojo e indignação, os serviços oficiais, tão zelosos em devassar a vida de pessoas honradas, guardaram sepulcral silêncio, sem uma só ação ainda que retardatária, como se o assunto lhe não dissesse respeito. O mínimo que se pode dizer é que tudo isso parece estranho, tanto mais q
uando alguns serviços dispõem de meios praticamente ilimitados e impalpáveis a permitir que ninguém esteja livre de ser radiografado até em seus pensamentos.
Já não falo no que tem ocorrido com a divulgação privilegiada de trechos inconclusos escolhidos por investigadores ocultos, como se caídos do céu.
Tudo isso concorre para tornar mais nebuloso o silêncio do governo. A propósito, já faz um mês da última revelação e até agora nada foi dito, nem mesmo que a lista está esgotada ou se ainda há coisas a serem aditadas.
Curiosamente, o governo, que anunciara uma faxina na área pustulenta, voltou atrás para dizer que a operação se referia à pobreza... versão que não repercutiu bem. E no recente congresso do partido oficial houve quem pretendesse encerrar a anunciada faxina, sob a alegação de que terminaria atingindo o governo do ex-presidente da República.
Nessa altura o silêncio oficial causou espécie, cada vez mais evidente que não só nada fez para apurar fatos de inegável relevo, limitando-se a receber passivamente a valiosa contribuição da imprensa, como calando em todas as línguas acerca da indolência de seus serviços. O efeito tem sido o pior possível. De muitas pessoas e de variados setores sociais tenho ouvido, em termos absolutos, que todos são corruptos.
Desnecessário dizer que não participo da simplicidade da apreciação. No entanto, desgraçado do país em que seus governantes mais altos e seus representantes mais categorizados são vistos, sem distinção, como delinquentes.
O fato é que a revelação de todos os deslizes cometidos, para não dizer coisa mais adequada, se deve exclusivamente à imprensa, enquanto o governo só aparece depois da publicação. Peço perdão ao leitor pela insistência, mas vale a pena ressaltar, tamanha a impressão a mim causada.
Por fas e por nefas há quem pense que a omissão dos serviços oficiais se deve à incompetência ou à conivência. A alternativa é penosa. As coisas que deixam de ser feitas oportunamente subitamente se convertem em dissabores e amarguras. Ou muito me engano ou o silêncio oficial dá margem às piores ilações, na competência ou conivência, conivência ou incompetência! Que horror!
Paulo Brossard
Jurista, ministro aposentado do STF
Fonte: Zero Hora RS
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário